Acórdão nº 0572/07 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Julho de 2008
Magistrado Responsável | FERNANDA XAVIER |
Data da Resolução | 14 de Julho de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I - RELATÓRIO A CÂMARA MUNICIPAL DE LEIRIA interpõe recurso da sentença do Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra, que julgou parcialmente procedente a presente acção de responsabilidade civil extracontratual por factos ilícitos, instaurada por A... e mulher B... e condenou o Réu MUNICÍPIO DE LEIRIA a pagar aos AA a quantia de € 123.005,12.
Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes CONCLUSÕES: I- A caducidade do alvará de loteamento em causa verificou-se em 30.01.1994, extinguindo-se, assim, de uma forma automática todos os direitos decorrentes do alvará nº 455/82.
II- Todavia, e contrariamente à verdade "insofismável" alcançada pelo Tribunal a quo, este, e salvo o devido respeito, esqueceu-se que, até pela própria natureza das coisas, a caducidade do alvará tem como consequência a extinção dos direitos por ele titulados e que a alteração de um alvará pressupõe a existência de direitos e a possibilidade do seu efectivo exercício.
III- Significa isto que as operações de loteamento tituladas pelos respectivos alvarás não são estáticas, são dinâmicas. Estando o alvará em causa nos presentes autos caducado este não é válido e eficaz.
IV- A caducidade das licenças de loteamento apenas permite que os interessados iniciem junto da entidade competente um novo procedimento administrativo de licenciamento tendente à renovação da licença de loteamento caducada.
V- O alvará em discussão nos autos foi emitido ao abrigo do DL nº 289/73 de 06 de Junho, o qual foi revogado pelo artº 84º, nº 1 do DL nº 400/84, de 31.12.
VI- A caducidade da licença de loteamento titulada pelo alvará de loteamento nº 455/82, conforme acima se disse, não constitui uma alteração do alvará emitido ao abrigo de legislação anterior, designadamente do DL 289/73, de onde resulta que a caducidade e suas consequências terão que ser analisadas à luz deste último instrumento legal.
VII- Assim e contrariamente a entendimento perfilhado pela sentença em crise, não será de aplicar o regime do DL 448/91 à situação dos autos, mas sim o DL 289/73.
VIII- À data da caducidade do alvará em questão apenas era obrigatório proceder ao registo da autorização de loteamento.
IX- Só com o DL 533/99, passou a ser obrigatório proceder ao registo dos aditamentos e alterações à autorização de loteamento.
X- Ora, não sendo, conforme supra se demonstrou, a caducidade em discussão nos autos uma situação de alteração ao alvará de loteamento não se lhe aplicam - por absoluta impossibilidade- as invocadas disposições do CR Predial.
XI- Consequentemente e contrariamente ao decidido, não impende, nem impendia sobre o ora recorrido- o dever de promover o cancelamento do registo do alvará nº 455/82.
XII- Consequentemente e caso este Tribunal venha a confirmar a sentença objecto de recurso, sempre se dirá, de acordo com a doutrina acima citada, que a presente acção sempre teria que ser precedida dos procedimentos recomendados pelo Parecer nº 1/96 R.P.4 da Direcção Geral de Registos e Notariado.
XIII- Não recaindo, como supra se demonstrou, sobre o Recorrido/seu Presidente, a obrigação de comunicação da caducidade do alvará de loteamento, para cancelamento do registo desse alvará, não existe qualquer dever do recorrido indemnizar os ora recorrentes.
XIV- Consequentemente, não se mostram, assim, preenchidos os requisitos de responsabilidade civil extracontratual, com referência aos quais se condenou o Município Réu.
XV- Assim e de harmonia com todo o exposto, forçoso é concluir que a Sentença recorrida violou, por erro de julgamento, o preceituado nos artº 39º e 72º do DL 448/91, de 29.11, artº 2º, nº 1, d) e artº 101º, nº 2, f) do CR Predial, artº 2, nº 1 e artº 4º do DL nº 48051, de 21.11.1967, artº 483º, 487º, 496º, nº 1, 564º, nº 1, 1ª parte do CC e nº 4 do artº 646º do CPC, pelo que deverá ser revogada e substituída por outra que faça JUSTIÇA.
XVI- PORÉM E PARA A HIPÓTESE DE ASSIM NÃO SER ENTENDIDO; SEMPRE SE CONCLUIRÁ AINDA O SEGUINTE: XVII- O Tribunal deu como provado os quesitos 7 e 8, os quais são puramente conclusivos, pois não contêm qualquer factualidade com referência à qual o Tribunal pudesse aquilatar a dimensão do sofrimento e angústia invocados e em que medida é que este afectou o dia a dia dos ora recorridos.
XVIII- Assim sendo, não podia o Tribunal a quo ter dado como provado os referidos quesitos e com base na sua prova condenar o ora recorrente a pagar uma indemnização de 20.000 euros aos recorridos.
XIX- Por outro lado, e quando assim se não entenda, sempre se dirá que a quantia de 20.000 euros atribuída pelo Tribunal aos recorridos é manifestamente excessiva, face aos montantes que os Tribunais têm vindo a atribuir em situações de indemnizações por danos morais.
XX- Nos presentes autos, não se encontra provado que por via da caducidade ora em discussão: XXI- -Os recorridos não podem mais construir no lote 79; XXII- - Que este lote sofreu uma desvalorização equivalente a uma determinada quantia pecuniária em virtude da aludida caducidade.
XXIII- Não obstante o teor conclusivo do quesito 8, o Tribunal deu como provado que os recorridos ficaram com "um terreno (lote 79) sem qualquer valor".
XXIV- Esta é uma conclusão que o Tribunal deu como provada, sem previamente se ter considerado provada (a existir) a desvalorização do lote 79.
XXV- Carece, em absoluto de fundamento, a condenação do recorrente no pagamento aos recorridos do valor que estes pagaram pelo referido lote.
XXVI- Não estando provado nos autos a impossibilidade de construção no lote 79 por parte dos autores e não estando provada a impossibilidade de renovação do procedimento de licenciamento da operação de loteamento tendo em vista a emissão de um novo alvará de loteamento e sendo os recorridos proprietários de um lote destinado imediata ou subsequentemente à construção urbana, é normal que paguem as referidas quantias.
XXVII- Resulta dos autos que nunca foi intenção dos recorridos construir a casa para posteriormente a vender e lucrar com a venda.
XXVIII- Consequentemente, à data em que adquiriram o lote em questão e entregaram o processo de licenciamento na CM de Leiria, os recorrentes não tinham a expectativa de licenciar a construção para depois a vender e obter, assim, um benefício resultante da venda.
XXIX- Não sendo esta a intenção dos recorridos, não é justo que o Tribunal condene o Município de Leiria no pagamento de uma quantia que os recorridos só obteriam "se" decidissem alienar a moradia objecto do pedido de licenciamento referido nos autos.
XXX- A prova do pagamento do projecto de arquitectura deveria ser feita através de documento, ou seja, através da apresentação de um recibo de honorários com a indicação do valor a pagar pelo projecto e a indicação da isenção ou não do pagamento de IVA.
XXXI- Consequentemente e de acordo com o nº 4 do artº 646º do CPC deverá ser dado como não escrita a resposta do Tribunal ao quesito nº 5.
XXXII- Assim e de harmonia com todo o exposto, forçoso é concluir que a Sentença recorrida violou por erro de julgamento o preceituado no artº 2º, nº 1 e artº 4º do DL nº 48051, de 21.11.1967, artº 483º, 487º, 496º, nº 1, 564º, nº 1, 1ª parte do CC e nº 4 do artº 646º do CPC, pelo que deverá ser revogada e substituída por outra que faça JUSTIÇA!*Contra-alegaram os recorridos, CONCLUINDO assim: 1. O tribunal deu como provado a produção do dano (pela diferença do valor da venda do terreno referido em 8) e o respectivo nexo de causalidade (imputando a responsabilidade à actuação do recorrente e a lesão comprovadamente na esfera dos recorridos).
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Dos artº 483º, 562º e 569º do CC resulta a obrigação de indemnizar por parte de quem esteja obrigado a reparar um dano, pelo que o douto tribunal devia ter condenado o recorrente numa indemnização correspondente aquele dano.
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Ao não arbitrar aos AA nenhuma indemnização o douto tribunal julgou em violação do disposto nos artº 483º, 562º e 569º do CC.
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Neste aspecto, merece censura o entendimento do douto tribunal, que aqui se efectiva ao abrigo do disposto no artº 664º-A/1 do CPC (ampliação do âmbito do recurso a requerimento do recorrido).
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Com base na disposição do artº 664º-A/1 CPC deve a douta sentença recorrida ser revista, fixando-se aos recorridos a justa indemnização pelo seu dano, com recurso à aplicação da regra de equidade, ou relegando para execução de sentença a demonstração e liquidação do dano sofrido.
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No que concerne à matéria de facto, a decisão está em rigorosa conformidade e harmonia com os meios de prova que foram trazidos ao processo, triados através de uma criteriosa e acertada valoração, devendo ser mantida a decisão em recurso.
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Andou bem a sentença em recurso, ao aplicar o disposto no DL 448/91, entendendo que a alteração ao alvará de loteamento é a caducidade do direito, que nesse momento modifica o conteúdo do direito de propriedade dos recorridos e não uma qualquer alteração em momento posterior.
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Face ao disposto nos artº 39º do DL 448/91, de 29.11 e 101º, nº 2 do CR Predial, é acertada a conclusão do douto tribunal recorrido de que impendia sobre o Município a obrigação de proceder ao seu cancelamento, acrescida da obrigação, na pessoa do presidente da câmara, de comunicação ao conservador do registo predial competente, requerendo o cancelamento do registo predial pela comunicação da caducidade, pelo que não merece acolhimento a tese do recorrente.
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Não tendo o recorrente adoptado nenhuma das condutas a que se encontra obrigado, andou bem a sentença recorrida ao valorizar esta omissão como "uma conduta ilícita e culposa, que preenche os requisitos da responsabilidade extracontratual".
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É manifesto que o recorrente se encontrava obrigado a comunicar a caducidade do alvará de loteamento, protegendo assim terceiros de boa-fé, pelo que andou bem a sentença em apreço, ao decidir que a omissão da recorrente permitiu que os recorridos -...
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