Acórdão nº 256/09.3YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Junho de 2009

Magistrado ResponsávelURBANO DIAS
Data da Resolução02 de Junho de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I.

Relatório AA intentou, no Tribunal Cível da Comarca de Lisboa, acção ordinária contra BB, com vista a obter a sua condenação na realização de obras consideradas urgentes na habitação de que é arrendatária e a R. senhoria.

A R. contestou, impugnando, por um lado, parte da factualidade vertida na petição e, por outro, excepcionando, com a invocação do abuso do direito, por parte da A., na medida em que, enquanto fiduciária do locado, não é responsável pelas reparações de natureza extraordinária, ou seja, daquelas que no ano em que forem necessárias excedam 2/3 do rendimento líquido desse mesmo ano, certo que o pedido formulado pela A., tendo em conta o montante das despesas a suportar, avaliadas entre 196.350 e 183.974 €, e o montante da renda percebida consubstancia um caso abrangido na previsão do instituto convocado.

Na réplica, a A. contrariou a versão da R., defendendo mesmo que a posição desta constitui, essa sim, um abuso de direito.

Após o saneamento e condensação, a acção seguiu a tramitação normal até julgamento e, findo este, foi proferida sentença a julgar a acção improcedente.

Mediante apelação da A., o Tribunal da Relação de Lisboa manteve o julgado.

Continuando irresignada, pede, ora, revista do aresto ali proferido, a coberto do mesmo quadro conclusivo que apresentou na apelação e que é o seguinte: - Ao longo da duração do contrato o locador é obrigado a manter o locado nas condições requeridas pelo fim do contrato e existentes à data da sua celebração, assegurando assim ao inquilino o gozo da coisa para os fins a que se destina.

- O elevado custo das obras é culpa exclusiva da requerida, dado que estas obras não se devem a qualquer facto fortuito, mas tão só ao facto de se tratar de um prédio centenário onde aquela, há mais de quarenta anos, não tem feito quaisquer obras de conservação, estando a isso obrigada por força da sua posição contratual de senhoria.

- A proporcionalidade entre o valor das obras e o valor das rendas só é exigível quando o valor das obras não é consequência directa de qualquer comportamento omissivo dos deveres contratuais por parte do senhorio.

- Não se pode estabelecer uma relação de proporcionalidade entre o valor da renda anual de uma fracção e o valor das obras respeitantes a todo o prédio e não efectuadas durante várias décadas.

Respondeu a recorrida em defesa da manutenção do aresto impugnado.

II.

Das instâncias vem provada a seguinte factualidade: - A 01 de Julho de 1947, foi celebrado o contrato que se encontra a fls. 9-9vº, nos termos do qual CC cedeu a DD o gozo temporário do imóvel sito no rés-do-chão do nº 16 da Rua ..., mediante o pagamento de uma renda.

- A A. é a actual inquilina do referido rés-do-chão.

- Desde há quarenta e cinco anos nunca a R. fez quaisquer obras de conservação do telhado, algerozes e prumadas de águas pluviais.

- O imóvel é antigo e com o passar dos anos sem obras de conservação, sobretudo no telhado, tem vindo a degradar-se.

- Actualmente as paredes e os tectos do locado em causa nos autos apresentam infiltrações e humidade.

- A A. avisou a R. quando o algeroz referido no artigo 3° se partiu.

- A R. não substituiu o algeroz.

- A A. fez uma exposição à Câmara Municipal de Lisboa e ao delegado de Saúde da Sub-região de Saúde de Lisboa sobre o estado de conservação no locado em causa nos autos.

- A Autoridade de Saúde constatou uma situação de insalubridade.

- Em 11/02/04, a A. deu entrada a requerimento para Notificação Judicial Avulsa da R. para que esta iniciasse, em 30 dias, obras urgentes no imóvel, incluindo a substituição do algeroz.

- Essa notificação foi tentada no domicílio convencionado entre A. e R. para tratar de todos os assuntos relacionados com o locado.

- A notificação da R. frustrou-se.

- A degradação do imóvel, as infiltrações e humidades no locado têm vindo a causar à A. inúmeros incómodos - A A. teme pela sua vida e integridade física.

- Em 19/12/1959, Isaura .... fez o testamento cuja certidão se encontra a fls. 34 seguintes.

- Nesse testamento consta " (...) deixa a BB (...) livre de todo e qualquer ónus e encargo, o usufruto de dois prédios urbanos que possui em Lisboa, um na rua de ... e outro na rua do Passadiço (...). (...) deixa ao Asilo António Feliciano de Castilho a nua propriedade do seu prédio sito na rua de ... em Lisboa e à (...) Sociedade Protectora dos Animais o seu outro prédio sito na rua do Passadiço ficará depois da morte da BB o a quem o deixa em propriedade plena com o encargo hipotecário que o onera e na condição de o transmitir à referida Sociedade Protectora dos Animais".

- A R. recebe da A. uma renda mensal de € 14,03.

- A solicitação da R., Niveláge, Lda. elaborou, em 20.12.2004, o relatório que se encontra a fls. 39, respeitante ao imóvel sito na Rua do Passadiço, nºs 112, 114 e 116, em Lisboa.

- Do relatório referido na alínea anterior consta "na sequência da visita ao local nomeadamente do imóvel acima mencionado depois de devidamente inspeccionado, chegamos à seguinte conclusão: O imóvel não tem condições de habitabilidade nomeadamente em segurança.

As infiltrações de água da chuva podem causar uma derrocada, o telhado pode vir a abater-se sobre o piso inferior com graves consequências, em nosso entender só obras profundas puderam resolver a situação.

Queremos lembrar que estamos perante um imóvel com mais de cento e cinquenta anos, que tem vindo a sofrer algumas reparações nomeadamente no telhado, pois as telhas já não são as de origem, e as reparações feitas em tela de alumínio já não são suficientes para evitar infiltrações devido ao envelhecimento do prédio.

Assim sendo torna-se necessário realizar as seguintes obras: 1º Remodelar todo o telhado, removendo todo o existente, telhas velhas e madeira podre, substituindo por telhas novas e a madeira por uma madre em viga de betão, sendo as pernas em vigas tipo premolde, e vigotas de betão para apoio das telhas, fabricadas para o efeito.

  1. Para que a nova estrutura possa ser executada terá que ser reforçada a estrutura de alvenaria existente, nomeadamente os lenteis, fazer algeroz e prumadas, águas fluviais todas novas.

  2. Reforçar todo o piso do primeiro andar pois está em risco de ruir, assim como o tecto do mesmo, e bem assim outros trabalhos de isolamento, conforme orçamento que juntamos.

Nota: Para que se proceda às obras é necessário que todo o prédio esteja devoluto".

- Para a execução das obras descritas nesse relatório a R. obteve um orçamento da Niveláge, Sociedade...

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