Acórdão nº 162/09.1YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Maio de 2009
Magistrado Responsável | SEBASTIÃO PÓVOAS |
Data da Resolução | 14 de Maio de 2009 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: "AA - Companhia de Seguros, SA", intentou acção, com processo ordinário, contra "BB, SA", "CC SA" e "DD AS" pedindo a sua condenação a pagarem-lhe a quantia de 345.257,56 euros, acrescida de juros vincendos desde a citação.
Alegou, em síntese que, no exercício da sua actividade seguradora, celebrou com "EE e Irmão, SA" dois contratos de seguro de duas gruas; que a segurada alugou-as às 1.ª e 2.ª Rés para a construção de um viaduto na auto-estrada A2; que, por sua vez, as Rés alugaram à sociedade "Zagope" uma viga de lançamento para sustentação da cofragem do tabuleiro do viaduto; que a 1.ª e 2.ª Rés subcontrataram a 3.ª Ré para prestar assistência técnica à viga de lançamento, designadamente à sua operação de montagem e desmontagem; que, no dia 24 de Julho de 2002 as duas gruas ficaram danificadas quando sobre elas caiu uma viga de lançamento, o que se deveu a ter sido iniciada a desmontagem sem a retirada de qualquer contrapeso o que provocou o desequilíbrio da estrutura da viga; que a Autora pagou, pelos danos nas gruas, 334.959,05 euros, quantia que já solicitou às Rés, em 25 de Fevereiro de 2003.
A Ré "DD" contestou por impugnação e requereu a intervenção principal da sua seguradora norueguesa "IF-Skadeforsikring".
As Rés "BB" e "CC" também contestaram.
E requereram a intervenção principal de "FF, Limitada", por autora do procedimento técnico para a Ré "DD" e terem eventual direito de regresso contra ela.
As intervenções foram admitidas.
A "IF- Skadeforsikring" contestou por adesão ao articulado da Ré "DD" No círculo judicial de Portimão a acção foi julgada parcialmente procedente e condenadas as Rés "BB" e "CC" a pagarem à Autora 334.952,05 euros, com juros de mora contados desde 26 de Fevereiro de 2003.
A Ré "DD" e as chamadas foram absolvidas.
Apelaram as condenadas tendo a Relação de Évora confirmado a sentença recorrida.
Pedem agora a revista assim concluindo a sua alegação conjunta: - A decisão dos pontos da matéria de facto af) a al), ap) e am), por um lado, e ar) (tal como estão identificados no acórdão), pelo outro lado, configuram contradições na decisão sobre a matéria de facto que inviabilizam a decisão jurídica do pleito da matéria de facto, pelo que o S.T.J. deve determinar a baixa do processo, nos termos do art. 729/3 do C.P.C.; - Na determinação do sentido do contrato, ao abrigo do disposto no art. 236CC, deve ser tido em conta o modo como o contrato foi executado; - Ora, atendendo à matéria provada, nomeadamente a elaboração da sequência de desmontagem, a sua evidente complexidade técnica, as suas exigências em meios humanos qualificados, o seu tempo de duração, impõe-se a conclusão de que o sentido da previsão contratual de assistência técnica, no contrato celebrado entre a R. DD e a Recorrente, abrange a elaboração da sequência de desmontagem, não fazendo sentido que essa sequência de desmontagem seja entendida como mera estratégia/cortesia comercial; - A A. moveu a presente acção contra as Recorrentes qualificando expressamente a sua responsabilidade como tendo natureza delitual, mas as instâncias alteraram a qualificação da responsabilidade para contratual e entenderam que, consequentemente, competia às Recorrentes o ónus da prova e alegação de não terem culpa pela ocorrência do dano, relevando, na condenação das Recorrentes, a falta dessa alegação e prova; - Com essa nova qualificação, e em face das circunstâncias do caso concreto, inverteu-se o ónus de prova de factos essenciais, e o consequente ónus de alegação, pelo que às Recorrentes passou a competir, mas apenas a partir do momento em que foi proferida a sentença em primeira instância, o ónus de alegar e provar que não tinham culpa; - Assim, as Recorrentes não dispuseram da possibilidade de efectiva defesa, pelo que o Tribuna] não deveria ter conhecido da sua responsabilidade a título contratual, e como o fez, conheceu de questão que lhe era vedado conhecer, nos termos do disposto nos arts. 3/3 e 668/1/d do C.P.C.; - Entendimento contrário destes preceitos, e ainda do disposto no art. 664 do C.P.C., viola o art. 20 da Constituição; - Os danos verificados, tendo em conta o modo como se produziram, situam-se claramente fora do perímetro delimitado pelo contrato, pois poderiam ter ocorrido mesmo que não existisse nenhum contrato, de aluguer ou de outro tipo, entre a lesada e as Recorrentes; - Assim, não estão preenchidos os pressupostos da responsabilidade contratual; - E não estando provada a culpa das Recorrentes, que não se presume, deveriam estas ter sido absolvidas do pedido; - A A. invoca como causa de pedir o facto de as Recorrentes serem empreiteiras gerais da obra, o que, em relação à R. CC, é falso, pois não se provou, e terem o dever de vigilância da coisa, respondendo assim, segundo a A., nos termos do art. 493/1, mas também não se provou que as Recorrentes tivessem o dever de vigilância da coisa, pelo que deveriam ter sido absolvidas do pedido; - Não foi alegada, nem se provou, a perigosidade, de modo a qualificar a situação em questão no âmbito da figura prevista no art. 493º, n.º 2, pelo que as Recorrentes não poderiam ser condenadas a este título; - Por todo o exposto, ao condenar as Recorrentes, o acórdão recorrido violou, além dos preceitos legais anteriormente indicados, ainda o disposto nos arts. 483º, 493º e 798º do C.P.C.
Contra-alegou a chamada "FF" a pugnar pela bondade do Acórdão recorrido.
Com as alterações introduzidas pelo Acórdão recorrido, ficou assente a seguinte matéria de facto: a) a Autora é uma sociedade que, devidamente autorizada e em conformidade com a legislação portuguesa aplicável, se dedica à actividade seguradora - Al. a) dos factos assentes; b) no exercício da sua actividade, a Companhia de Seguros "AA, SA" celebrou com a firma "EE & Irmão, SA" dois contratos de seguro denominados "Máquina Cascos" com o nº de apólice 0-0-00-0000/09 e 0-0-00-000000/02, no âmbito dos quais se encontravam, respectivamente, seguras duas gruas da marca Liebherr, modelo LTM 1060/2, série n° 057335 e modelo 1035, nº série 0115407 - Al. b) dos factos assentes; c) a segurada da "AA", "EE & Irmão, SA", é uma empresa que, entre outras actividades, se dedica ao aluguer de gruas destinas a ser utilizadas na construção de grandes obras - Al. c) dos factos assentes; d) as gruas supra identificadas e seguras pela "AA" tinham sido adquiridas pela segurada através do Sistema de Locação Financeira à "Mello Leasing, SA", actual "BCP Leasing, SA" - Al. d) dos factos assentes; e) no âmbito da sua actividade, a firma segurada, alugou às Rés "BB" e "CC" as gruas supra identificadas, para que fossem utilizadas na construção de um viaduto na Auto-Estrada A2, junto à localidade de Barreira - São Bartolomeu de Messines - Al. e) dos factos assentes; f) o dono da obra era a "Brisa, SA" que a encomendou em regime de empreitada, ao consórcio constituído pelas Rés "BB, SA" e "CC, SA" - Al. f) dos factos assentes; g) para a construção do viaduto as Rés "BB, SA" e "CC, SA" alugaram à firma "Zagope" uma viga de lançamento para sustentação da cofragem do tabuleiro do viaduto - Al. g) dos factos assentes; h) em 24 de Julho de 2002, as gruas seguras pela "AA" encontravam-se a operar na obra supra referida, auxiliando na desmontagem de vários componentes da viga de lançamento do viaduto supra identificado - Al. h) dos factos assentes; i) essa viga caiu, precipitando-se sobre as duas gruas, pertencentes à segurada da "AA" - Al. i) dos factos assentes; j) tal viga de lançamento tinha aproximadamente 100 (cem) toneladas de peso e 40 (quarenta) metros de comprimento - Al. j) dos factos assentes; k) a queda da referida viga ocorreu a cerca de 30 (trinta) metros de altura - Al. k) dos factos assentes; l) a viga de lançamento é constituída por vários componentes principais, designadamente: - Viga em caixão; - Extensões em treliça nas extremidades; - Apoios; - Contrapesos; - Triângulos e barras - Al. l) dos factos assentes; m) a montagem da viga de lançamento tem de seguir determinadas regras devidamente definidas por forma a evitar o desequilíbrio causado pelos acessórios que a integram - barras e triângulos - e os contrapesos - Al. m) dos factos assentes; n) para regularização dos danos provocados na grua LTM 1035, liquidou a "AA", no âmbito do contrato de seguro existente, a quantia de 4.940,03 € (quatro mil novecentos e quarenta euros e três cêntimos), ao "BCP Leasing, SA", enquanto locadora - Al. n) dos factos assentes; o) no tocante aos danos ocorridos na grua LTM 1060, a "AA" liquidou à sua segurada a quantia de 330.012,02 € (trezentos e trinta mil, doze euros e dois cêntimos), a título de indemnização por perda total da mesma - Al. o) dos factos assentes; p) a Autora solicitou às Rés "BB, SA" e "CC, SA", em 25.02.2003, o reembolso dos pagamentos efectuados à sua segurada e ao "BCP Leasing, SA" - Al. p) dos factos assentes; q) à Ré "BB", em consórcio com outra sociedade, foi adjudicada pela "Brisa, SA" a empreitada para a construção da obra geral e das obras de arte e viadutos - lote L do sublanço Almodôvar/São Bartolomeu de Messines da A 2 - Auto Estrada do Sul - Al. q) dos factos assentes; r) a...
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