Acórdão nº 08B4008 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 18 de Dezembro de 2008
Magistrado Responsável | SALVADOR DA COSTA |
Data da Resolução | 18 de Dezembro de 2008 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Decisão Sumária I L... - L... de A... Ldª instaurou, no dia 17 de Março de 2005, contra AA, acção executiva para pagamento de quantia certa, para obter deste o pagamento coercivo de € 18 348,75 e juros vencidos no montante de € 1 007,01, baseada em cheque com o valor inscrito de € 21247,50, dito emitido a seu favor pelo executado para pagamento de dois veículos automóveis que lhe vendera no dia 22 de Setembro de 2004, devolvido pela entidade sacada, com recusa de pagamento, acrescentando ter-lhe o executado pago posteriormente € 2 898, 75.
AA deduziu, no dia 20 de Maio de 2005, oposição a essa execução, afirmando ter comprado as duas viaturas em leilão realizado pela exequente, uma delas sem desenvolvimento em termos de arranque e velocidade, e que a exequente negou qualquer responsabilidade, pelo que pagou o outro veículo e mandou cancelar o cheque quanto ao veículo defeituoso.
A exequente contestou, afirmando, em síntese, que o veículo automóvel com a marca BMW por si vendido em leilão, pertencente a BB, estava em bom estado de funcionamento, e que o executado, na hora seguinte ao recebimento do veículo, não apresentara reclamação.
E sob o argumento de o oponente ter alegado factos tendentes à sua responsabilização civil e, por isso, justificativos do exercício do direito de regresso, chamou BB a intervir no âmbito do instituto da intervenção acessória provocada.
O executado respondeu que quem se inscreveu no leilão foi CC, e que agira como procurador dela, e que não se opunha à intervenção de BB, a qual foi admitida naquela posição por despacho de 9 de Janeiro de 2006.
Em contestação, BB respondeu, por um lado, no sentido de que comprara o veículo automóvel da marca BMW para revenda, não haver registado a sua aquisição, ter proposto à exequente a venda dele em leilão, não conhecer a sua quilometragem, não dispor do respectivo livro de revisões, e estar em bom estado de funcionamento, e que não lhe foi comunicado ter o oponente denunciado algum seu defeito.
Respondeu o oponente, impugnando factos afirmados pelo interveniente, e sob o fundamento de o veículo automóvel ter sido vendido por A... S... F... P... à R...-C... de A..., Ldª, com cerca de 270 000 quilómetros, requereu a intervenção dela associada à exequente e a BB, a exequente opôs-se a essa intervenção, e o tribunal recusou-a com fundamento na não invocação pelo requerente de factos que a justificassem.
Dispensada a selecção da matéria de facto e realizado o julgamento, foi proferida sentença no dia 27 de Julho de 2007, por via da qual a oposição foi julgada parcialmente procedente e reduzida a quantia exequenda relativa ao capital a € 12 063,37.
Apelaram L... Ldª, BB e AA, e a Relação, por acórdão proferido no dia 24 de Junho de 2008, julgou improcedentes os recursos de apelação interpostos pelos dois primeiros e procedente o do último, reduzindo a quantia exequenda ao montante de € 10 063,37.
Interpuseram BB e L..., Ldª recurso de revista, formulando o primeiro, em síntese útil, as seguintes conclusões de alegação: - o desgaste normal das coisas usadas não consubstancia vício delas, nos termos e para os efeitos do referido artigo 913.º do Código Civil; - é facto notório que as necessidades de reparação identificadas do veículo correspondem ao desgaste normal do veículo usado em causa; - o recorrido não alegou nem provou, como lhe incumbia, nos termos do artigo 342º, nº 1, do Código Civil, os factos reveladores de a necessidade de reparação derivar dos vícios do veículo e não do desgaste normal do seu uso, ou que os defeitos já existissem à data da sua entrega; - ao aplicar o regime da venda de coisa defeituosa, apesar de não provado excederem as anomalias o desgaste normal de um veiculo usado, o acórdão interpretou e aplicou incorrectamente o artigo 913º do Código Civil; - o recorrido não solicitou a reparação do veículo, que era possível, só pretendendo a quantia necessária para a deduzir no preço acordado; - a entender-se haver venda de coisa defeituosa, face à matéria alegada na oposição, o recorrido não tem direito à redução do preço em função do valor da reparação, porque não respeitou a ordem lógica dos meios jurídicos legalmente previstos e a recorrente não estava de má fé; - o artigo 914.º do Código Civil não confere ao comprador o direito de se substituir ao vendedor na reparação da coisa vendida, e não provada a urgência na reparação do veículo, esta só podia ser exigida em juízo em execução de sentença no caso de incumprimento da condenação da recorrente a reparar e dever ser realizada por outrem, nos termos dos artigos 817.º do Código Civil e 933.º do Código de Processo Civil, pelo que o acórdão violou essas normas; - a entender-se que o executado podia pedir a redução do preço sem previamente exigir do exequente a reparação dos defeitos no veículo, não poderia o acórdão ter reconhecido ao recorrido o direito à redução do preço, em função do valor da reparação; - os pressupostos da redução do preço e o custo de eliminação dos defeitos são coisas diversas, irrelevando último, e a primeira não corresponde ao segundo, sob pena de sobreposição de meios jurídicos, devendo atender-se ao preço pago pelo veículo e ao que tinha com o defeito apresentado - não foi provado pelo recorrido, ao invés do que lhe incumbia, que, nas circunstâncias em que ocorreu o negócio, teria comprado o veículo pelo preço que foi considerado no acórdão, só alegando as anomalias do seu funcionamento e pretender ser indemnizado pelo montante necessário para mandar proceder à reparação.
- por falta de prova da verificação dos pressupostos do artigo 911.º do Código Civil, não podia o acórdão julgar verificado o direito do recorrido à redução do preço em função do valor da reparação; - foi proferida condenação com fundamento estranho à causa de pedir invocada pelo executado, pelo que foi cometida a nulidade prevista na alínea d) do n.º 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil, e violados os artigos 911.º, 913.º e 914.º do Código Civil; - na petição inicial o oponente não formula pedido de redução do preço em função da real quilometragem nem alega valor concreto ou formula pedido genérico nesse sentido, nem solicita que a determinação desse valor se faça por avaliação ou segundo critérios de equidade; - o oponente não alegou, para poder provar que nas circunstâncias em que ocorreu o negócio, teria comprado por preço inferior, nem que havia diferença entre o que pagou na aquisição da viatura e o que esta valeria objectivamente com a real quilometragem, nem qual o valor dessa diferença porventura existente; - por carência de prova da verificação dos pressupostos contidos no artigo 911º do Código Civil, não podia o acórdão considerar procedente a apelação do opoente e diminuir em € 2000 o preço acordado; - da análise da petição inicial do oponente, embora tenha a final formulado o pedido de absolvição do pedido executivo, resulta apenas que este apenas pretende a dedução ao preço acordado do valor da reparação, ou seja, € 6 563,20; - ao reduzir o capital da quantia exequenda em € 2000 o acórdão proferiu condenação em quantidade superior ao do pedido, cometendo assim a nulidade prevista na alínea e) do nº 1, do artigo 668º do Código de Processo Civil; - o acórdão violou os artigos 817º, 911º, 913º e 914º do Código Civil e 668º, nº1 alíneas d) e e), do Código de Processo Civil, pelo que a oposição deve ser julgada improcedente.
L..., Ldª formulou, por seu turno, em síntese útil, as seguintes conclusões de alegação: - a recorrente foi mera intermediária, por via do leilão por si promovido e organizado, na compra e venda do veículo automóvel entre BB, como vendedor, o e recorrido, como comprador, e pagou ao segundo o respectivo preço de € 18 200; - não está provado que o recorrido tenha reparado o veículo automóvel em causa, ou que haja despendido algo na sua hipotética reparação, ou que na revenda a que se destinava haja sido prejudicado no respectivo preço; - não se encontra provado que as peças descritas no orçamento impugnado fossem necessárias para que o veículo tivesse o valor venal de € 18 200; - não de encontra provado que o recorrido, conhecendo os pretensos e alegados defeitos, teria adquirido o veículo automóvel por valor inferior àquele montante; - o pedido formulado pelo executado na oposição consistiu na absolvição do pedido executivo, e não na redução do preço do veículo, e não apresentou à recorrente proposta de pagamento ou redução do preço do veículo, e não está provada a reparação; - caso o recorrido pretendesse a redução do preço, deveria tê-la oportunamente exercitado junto do respectivo vendedor e anterior proprietário e não a exercitou; - a Relação não podia operar a redução do preço em função do valor do orçamento, cujo conteúdo foi impugnado pela recorrente, sem que o recorrido tenha logrado provar o que nele constava, sem que lhe tenha sido feita inspecção, e o ónus da prova, face à referida impugnação, impendia sobre ele; - ainda que se considerasse pretender o recorrido a redução do preço em função do valor da reparação, não podia o tribunal, para além da medida de reparação, ainda reduzir o preço com base na não peticionada desvalorização do veículo em função da diferença de quilometragem, no exageradíssimo valor de € 2 000, pelo que a Relação julgou extra vel ultra petitum, o que importa a nulidade do acórdão; - não tendo o executado provado ter despendido qualquer quantia com a reparação do veículo, a parcela do preço a reduzir teria de obter-se por recurso à avaliação, o que não ocorreu; - o acórdão violou os artigos 884º do Código Civil, e 661º, nº 1, segunda parte, e 668º, nº 1, alínea e), do Código de Processo Civil, sendo nulo por ter condenado a exequente em objecto diverso do pedido pelo executado, pelo que a oposição deve ser julgada improcedente.
II É a seguinte a factualidade considerada provada no acórdão recorrido: 1. A exequente dedica-se à actividade comercial de leilões de veículos automóveis, aos quais...
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