Acórdão nº 0825759 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelGUERRA BANHA
Data da Resolução17 de Dezembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação n.º 5759/08-2 NUIP .../06.4TJPRT Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto.

I 1. Na acção declarativa com processo comum sumário que correu termos no ..º Juízo Cível do Porto, ..ª Secção, com o n.º .../06.4TJPRT, proposta por B.........., residente na Rua .........., em Lisboa, contra C.........., LDA, com sede na Rua .........., no Porto, o autor deduziu a seguinte pretensão: - que seja decretada a resolução de contrato de arrendamento para fins comerciais celebrado entre autor e ré, titulado pelo documento que juntou e consta a fls. 20-23, e que a ré seja condenada: a) a entregar o locado livre de pessoas e bens; b) a pagar ao autor a quantia a apurar em sede de execução de sentença, para demolição das obras feitas sem consentimento, situadas no logradouro do prédio arrendado; c) a pagar ao autor a quantia a apurar em sede de execução de sentença, para reposição do locado no estado em que foi entregue, no caso de se apurarem no seu interior deteriorações ilícitas; d) a pagar ao autor a quantia de € 50,04 (cinquenta euros e quatro cêntimos), referente às actualizações da renda para os anos de 2005 e 2006; e) a pagar ao autor todos os valores referentes a rendas que se vençam na pendência desta acção e até à data da efectiva entrega do arrendado.

Fundamentou esta sua pretensão alegando, em síntese, que há mais de dois anos que a ré mantém o arrendado encerrado e votado ao mais absoluto abandono; que a ré, sem qualquer autorização do senhorio, procedeu à construção de uns anexos no logradouro do prédio arrendado; e que a ré ainda não pagou as actualizações legais da renda dos anos de 2005 e seguintes, até à presente data.

A Ré contestou, negando, em síntese, os factos alegados pelo autor relativos ao encerramento do estabelecimento comercial, às obras ilegais e à actualização das rendas, e concluiu pela improcedência total da acção.

Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença, a fls. 176-181, que, julgou a acção totalmente improcedente e absolveu a ré do pedido.

  1. Não se conformando com essa decisão, o autor apelou para esta Relação, extraindo das suas alegações as conclusões seguintes: 1.º - A sentença recorrida deverá ser alterada, por errada, porquanto: 2.º - O tribunal a quo errou notoriamente ao apreciar a prova, consubstanciada: - nos documentos juntos à petição inicial sob os números 3 a 13; - na resposta ao ofício enviado à D.........., junto a fls.; - na resposta ao ofício enviado à E.........., junto a fls.; - na confissão da recorrida, plasmada na carta junta aos autos a fls.; - no depoimento de parte do representante legal da recorrida; - no depoimento das testemunhas arroladas pelo recorrente, F.........., G.......... e H..........; - nos depoimentos contraditórios e inverosímeis das testemunhas arroladas pela recorrida, I.........., J..........; - e, ainda, na livre apreciação do comportamento processual da recorrida, referente aos meios de prova oferecidos, bem como na omissão de junção aos autos dos documentos respeitantes à liquidação de IVA e IRC solicitados pelo recorrente; 3.º - Sendo que todos os supra referidos meios de prova impunham decisão diversa da recorrida, devendo por conseguinte ter sido dado como provada toda a matéria alegada nos artigos 6.º, 7.º, 8.º, 10.º, 11.º, 13.º e 14.º da petição inicial, 4.º - E consequentemente, ter sido a recorrida condenada na entrega do locado ao ora recorrente, livre de pessoas e bens, por aplicação do disposto no artigo 64.º, número 1, alínea h), do Regime do Arrendamento Urbano; 5.º - A prova da matéria alegada nos artigos 6.º, 7.º, 10.º, 13.º e 14.º da petição inicial opera-se ainda por via da certidão do registo comercial da recorrida, documento que se junta sob o n.º 1.

    6.º - Errou ainda o tribunal a quo ao não ter julgado provada a matéria alegada nos artigos 25.º e 27.º da petição inicial, quando a mesma se encontrava plenamente demonstrada através do documento junto naquele articulado, sob o n.º 13.

    7.º O que acarretaria a condenação da recorrida na entrega do locado ao recorrente, livre de pessoas e bens, e ainda no pagamento da indemnização peticionada para aquele ano de 2005, no montante correspondente à diferença entre o montante efectivamente pago pela primeira, e o valor de renda actualizado, nos termos do disposto nos artigos 1038.º e 1047.º do Código Civil, e artigo 64.º, número 1, alínea a) do Regime do Arrendamento Urbano; 8.º - Mais errou o tribunal a quo ao não ter considerado provada a matéria alegada no artigo 19.º da petição inicial, no qual se peticionava o despejo da recorrida com base na realização de obras sem o consentimento do senhorio, quando pelas regras do ónus da prova, se impunha que a recorrida/inquilina provasse ter obtido consentimento por escrito para a feitura de tais obras, o que a mesma não fez.

    9.º - Como tal, também por este fundamento, deveria ter sido a recorrida condenada na entrega do locado ao recorrente, livre de pessoas e bens, nos termos do disposto no artigo 64.º, número 1, alínea d), do Regime do Arrendamento Urbano, devendo ainda ser condenada no pagamento de uma indemnização para reposição do locado no estado em que se encontrava, antes daquelas obras.

    10.º - Nestes termos, ... deverá ser revogada e alterada a douta sentença recorrida, e consequentemente, ser a recorrida condenada, na entrega do locado ao recorrente, livre de pessoas e bens, com base no encerramento do locado por mais de um ano, na omissão de pagamento das rendas, e finalmente, na realização de obras no locado que alteraram substancialmente a estrutura externa do mesmo, sem consentimento do senhorio, e no pagamento do montante indemnizatório peticionado, referente, por um lado, à diferença entre o valor de renda efectivamente pago no decurso do ano de 2005, e por outro, à reposição do locado no estado em que se encontrava, antes da realização das obras ilícitas.

    A ré não contra-alegou.

  2. Já depois de proferida a sentença, o autor apresentou o requerimento que consta a fls. 196-199, em que, invocando a mora da ré, por período superior a três meses, no pagamento das rendas vencidas na pendência da acção, requereu que a ré fosse notificada para os efeitos previstos no art. 14.º, n.º 4, do Novo Regime do Arrendamento Urbano.

    Por despacho proferido a fls. 367, foi decidido indeferir aquela pretensão do autor, com o fundamento de que, uma vez proferida a sentença, esgotou-se o poder jurisdicional do tribunal quanto à matéria da causa e da decisão proferida na sentença implicava considerar inexistente o direito de acção do autor.

    O autor também não se conformou com este despacho e recorreu para esta Relação, concluindo as respectivas alegações do seguinte modo: 1.º - O Tribunal a quo errou ao escusar-se a conhecer da questão incidental que foi submetida à sua apreciação; 2.º - Ao escusar-se a conhecer a questão incidental que foi submetida à sua apreciação, o Tribunal a quo violou os princípios da proibição de non-liquet e do acesso ao direito; 3.º - O Tribunal a quo errou ao considerar que os poderes jurisdicionais do juiz de primeira instância, para conhecer da questão incidental que foi submetida à sua apreciação, se esgotaram com a prolação da sentença proferida nos autos principais; 4.º - O Tribunal a quo errou ao considerar que o efeito atribuído ao recurso interposto da decisão final proferida nos autos principais impede o aqui recorrente de utilizar o expediente plasmado nos números 3 a 5 do artigo 14.º NRAU, por lhe retirar "direito de acção".

    5.º - Nestes termos ... deverá conceder-se integral provimento ao recurso, modificando a decisão recorrida, determinando-se o prosseguimento dos posteriores termos processuais aplicáveis ao incidente interposto pelo recorrente.

    Também quanto a este recurso a ré não contra-alegou.

  3. Aos presentes recursos é ainda aplicável o regime processual anterior ao Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24/08, porquanto respeitam a acção instaurada antes de 1 de Janeiro de 2008 (foi instaurada em 03-02-2006). E por força do disposto no n.º 1 do art. 11.º do Decreto-Lei n.º 303/2007, o regime introduzido por este diploma legal não se aplica aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor, que ocorreu em 1 de Janeiro de 2008 (art. 12.º do mesmo decreto-lei).

    De harmonia com as disposições contidas nos arts 684.º, n.ºs 2 e 3, e 690.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, na redacção aqui aplicável, são as conclusões que o recorrente extrai da sua alegação que delimitam o objecto do recurso, sem prejuízo das questões de que, por lei, o tribunal pode conhecer oficiosamente (art. 660.º, n.º 2, do Código de Processo Civil).

    Tendo em conta o teor das conclusões formuladas em cada um dos recursos, as questões suscitadas são as seguintes:

    1. No recurso de apelação: 1) Impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto descrita nos arts. 6.º, 7.º, 8.º, 10.º, 11.º, 19.º, 25.º e 27.º do articulado da petição inicial, no sentido de que as provas indicadas pelo recorrente impõem que tais factos sejam julgados provados; 2) Omissão de pronúncia quanto aos factos alegados nos arts. 13.º e 14.º da petição inicial, os quais diz serem relevantes para a decisão e que resultaram provados; 3) Se, perante aqueles novos factos provados, deve ser decretada a resolução do contrato de arrendamento, nos termos do disposto nos artigos 1038.º e 1047.º do Código Civil, e artigo 64.º, número 1, alíneas a), d) e h) do Regime do Arrendamento Urbano (RAU) e a ré condenada nos demais pedidos formulados pelo autor.

    2. No recurso de agravo: 1) Se, com a prolação da sentença, o autor ficou impedido de requerer o incidente de despejo imediato por falta de pagamento das rendas vencida na pendência da causa e ainda se o tribunal da acção ficou impedido de conhecer do referido incidente.

    Cumpridos os vistos legais, cabe decidir.

    II 4. Na 1.ª instância foram julgados provados os factos seguintes: 1) Por escritura pública de partilha de 13 de Abril de 2005, correspondente ao documento...

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