Acórdão nº 0825051 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Dezembro de 2008

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução17 de Dezembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 5051/08-2 ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO 1.

B................ intentou contra C................., SA providência cautelar de suspensão de deliberações sociais.

Peticionou que seja decretada a suspensão da deliberação da requerida tomada na Assembleia realizada no passado dia 31 de Janeiro de 2008, pelas 10,30h, em ........... Póvoa de Varzim, bem como da eleição dos órgãos sociais ali efectivada.

Invoca, para tanto e em síntese, que: Tem sido posto á margem dos negócios e actos de gestão da sociedade por outros accionistas.

A convocação para a Assembleia bem como a deliberação não respeitaram os legais requisitos.

A deliberação tomada encontra-se inquinada de irregularidades jurídicas várias, designadamente a diminuição do número de membros do Conselho de Administração, a qual não foi aprovada por maioria de 2/3 e violou as regras da designação dos membros do Conselho Fiscal.

A deliberação ao impedir que na Ordem do Dia constasse a limitação ao exercício de acesso a informação sensível é abusiva por ofender os bons costumes.

Assim, se executada, a deliberação acarreta-lhe danos apreciáveis, pois que: - afastando-o da administração, priva-o da sua retribuição de 1650,00 euros por mês e, ainda, do direito ao uso de viatura da empresa, telemóvel, etc.

- designou membro do conselho fiscal e do conselho de administração que exercem funções e são gerentes em sociedades concorrentes da requerida.

- tal, com o decurso do tempo, tornará impossível impedir os prejuízos que a requerida poderá sofrer com a perda de negócios para outras empresas.

Citada a requerida, pugnou pela total improcedência da providência.

Para o que impugnou os factos alegados pelo requerente, referindo que a deliberação não padece de qualquer vício, que o requerido não ficou privado de retribuição, nem do que quer que seja e que este a persegue, por via do seu egoístico interesse puramente pessoal decorrente do malogro de negociações a respeito da alienação das acções do requerente.

2.

Prosseguiu o processo com vicissitudes várias suscitadas pelas partes tendo seguidamente sido proferida decisão que julgou a providência totalmente Improcedente e não provada, da mesma absolvendo do pedido a requerida.

Para tanto, entendeu o Sr. Juiz a quo que o requerente não alegou factos dos quais se possa concluir que a execução da deliberação lhe pode causar dano apreciável.

3.

Inconformado recorreu o requerente.

Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: 31.1 - A decisão recorrida baseou-se exclusivamente no facto de não existir a probabilidade de que a execução da deliberação pudesse causar um dano apreciável, de natureza estritamente económica, ao requerente.

31.2 - Se se analisar o requerimento inicial de procedimento cautelar verificar-se-á que o requerente alegou outros danos que a imediata execução da deliberação poderia acarretar para a sociedade requerida e que a sentença recorrida nem sequer analisou e que são os factos articulados nos n.ºs 152 a 156 do requerimento inicial.

31.3. Ora, toda esta matéria de facto não foi apurada pela decisão recorrida e os factos alegados eram e são passíveis de provocar danos apreciáveis à requerida.

31.4 - É, aliás, a própria requerida que confessa nos diferentes articulados e requerimentos que foi apresentando no processo que a sua situação económico-financeira se tem vindo a deteriorar desde 2007.

31.5 - Ora, se até ao final do exercício de 2006 a requerida apresentou lucros, conforme decorre do teor do documento n.º 1 junto aos autos com o requerimento de fls. 764 e seguintes, e se se encontra alegado que o requerente foi, desde então, afastado da gestão, o Tribunal tinha o poder/dever de apurar a que é que se deveu a invocada deterioração da situação económico-financeira da requerida para poder concluir da verificação ou não dos factos alegados nos artigos 152.º a 156.º do requerimento inicial e, em consequência, determinar se as ligações de alguns dos administradores da requerida e seus accionistas maioritários com empresas concorrentes constituíam a causa, ou não, da deterioração da situação da recorrida.

31.6 - Acresce que, o Tribunal, atento o disposto no n.º 3 do artigo 264.º e do n.º 1 do artigo 663.º, ambos do Código de Processo Civil, não poderia deixar de ter também em conta os seguintes factos provados documentalmente nos autos e que se revestem de indiscutível importância para a apreciação do dano que justificou e justifica a presente providência: a) os "auto - eleitos administradores" renunciaram aos cargos de administradores, um dos quais em 8 de Fevereiro de 2008, e tal facto não foi dado a conhecer ao Tribunal, que dele tomou conhecimento quando o requerente soube do mesmo, tendo os registos só sido efectuados quando o requerente solicitou que o Tribunal requisitasse a junção aos autos das alegadas cartas de renúncia, o que traduz um comportamento de todo em todo incompatível com os princípios da boa fé processual; b) os accionistas maioritários, e "auto - eleitos administradores", e o Presidente da Mesa da Assembleia Geral da requerida não convocaram, em violação do disposto no artigo 376.º do Código das Sociedades Comerciais, a Assembleia Geral Anual para aprovação do Relatório de Gestão e as Contas relativas ao exercício de 2007, o que está a fazer incorrer a requerida em contra-ordenação fiscal grave (artigos 65.º do Código das Sociedades Comerciais, artigo 116.º do Regime Geral das Infracções Fiscais Tributárias e artigo 109.º n.º 1 do Código do IRC); c) O Presidente da Mesa da Assembleia Geral da requerida cancelou, sem qualquer fundamento legal, as eleições para o Conselho de Administração desta que tinha designado para o dia 19 de Junho de 2008, encontrando-se a empresa numa situação anómala por exclusiva culpa dos seus accionistas maioritários - cfr. documento de fls. 739 dos autos; d) O modo como registo das alegadas renúncias foi efectuado, aparentemente muito tempo após as mesmas terem ocorrido, e que mereceu da Conservadora da Conservatória do Registo Comercial da Póvoa de Varzim a apreciação que resulta do teor do documento n.º 1 junto com as presentes alegações de recurso, constitui mais uma situação da exclusiva responsabilidade dos "auto - eleito administradores e accionistas maioritários da requerida; 31.7 - A sentença recorrida circunscreveu a questão da apreciação do dano a uma perspectiva meramente económica, e relativamente apenas a um dos factos invocados pelo recorrente, e ignorou tudo o mais que foi alegado e que, no decurso da lide se veio a apurar.

31. 8 - A sentença recorrida subestimou aquilo que não poderia subestimar, ignorou que os danos tanto podem ser do requerente como da sociedade, e o Tribunal absteve-se de apurar factos que teriam importância para a apreciação do "periculum in mora", ou seja, os factos relativos às consequências para a sociedade da ligação de alguns administradores eleitos a sociedades concorrentes com a requerida.

31.9 - Tudo isto quando requerida "auto - classificou" a sua situação de muito grave, o que é dificilmente compreensível atento o facto de, até ao último exercício em que o requerente participou na sua gestão (exercício de 2006), a sociedade sempre deu lucros.

31.10 - A sentença recorrida ajuizou, apenas, dos danos de natureza patrimonial que da execução da deliberação poderiam decorrer para o recorrente e não para a sociedade.

31.11 - E abstraiu que mesmo para o recorrente os danos de natureza não estritamente patrimonial, os chamados danos quase patrimoniais, e até os danos morais, se apreciáveis, devem ser tidos em consideração.

31.12 - Ora, no caso concreto, o "periculum in mora" reside também na impossibilidade de o recorrente exercer o direito social a ver resposta a legalidade do funcionamento dos órgãos sociais e no obviar da inutilização, que na prática o não decretamento da providência provoca, no efeito útil da acção principal pois, em condições normais, é absolutamente impossível que, sendo o mandato dos órgão sociais de apenas três anos, haja uma decisão definitiva antes do termo do mesmo, sendo essa deliberação um exemplo de escola - "Deliberações de Sociedades Comerciais", Almedina, 2005, pág. 781, 31.13 - O conceito de dano nestes casos tem de ser encarado de uma forma muito mais flexível, desde que, evidentemente, esteja apurado a ilicitude da deliberação e, nessa medida, a ilegitimidade do exercício do cargo pelos membros dos órgãos sociais eleitos, pelo que o prejuízo a que alude o artigo 397.º do Código de Processo Civil não pode ser interpretado restritivamente apenas como um dano de natureza...

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