Acórdão nº 2974/2008.4TVLSB.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Fevereiro de 2009

Magistrado ResponsávelABRANTES GERALDES
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

I - A...interpôs contra C..., Ldª, procedimento cautelar comum, visando o decretamento do encerramento do estabelecimento comercial ou, subsidiariamente, a proibição da continuação de execução pública não autorizada de fonogramas musicais, a apreensão de bens de que se suspeite violarem os direitos conexos e os instrumentos que sirvam para a prática do ilícito e obrigação de conceder à requerente o livre acesso ao seu estabelecimento comercial com o objectivo de escutar e registar os fonogramas que aí são executados publicamente, se necessário com recurso aos meios policiais.

Alegou para o efeito que é uma entidade de gestão colectiva de direitos de autor relacionados com fonogramas e que a requerida não obteve licença para a execução daqueles que a requerente tem legitimidade para defender, o que constitui causa de prejuízos.

O procedimento cautelar foi liminarmente indeferido com fundamento na falta de alegação de factos integrantes do requisito legal ligado ao perigo de lesão grave e dificilmente reparável dos direitos em causa.

Apelou a requerente e concluiu que:

  1. A decisão recorrida teve por base uma errada interpretação dos preceitos legais aplicáveis em face dos factos alegados.

  2. Contrariamente ao que é sustentado na douta decisão recorrida, resultaram verificados os requisitos específicos que permitiam a aplicação da providência cautelar prevista no art. 210º-G do CDADC que implicavam a aceitação da providência cautelar.

  3. Todos os factos alegados com interesse para a aceitação e decisão da providência comprovam a violação dos direitos conexos que com a providência em causa a Requerente pretendeu salvaguardar.

  4. A providência cautelar prevista no art. 210º-G do CDADC resultou da transposição para a ordem jurídica nacional do disposto no art. 9º, al. a) da Directiva nº 2004/48/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de Abril (denominada Directiva Enforcement), relativa ao respeito pelos direitos de propriedade intelectual.

  5. Num movimento de uniformização dos direitos substantivos nos diversos Estados Membros no âmbito da tutela e defesa dos direitos de propriedade intelectual o legislador nacional sentiu necessidade de in1roduzir, na nossa prática judicial, um mecanismo próprio para a defesa preventiva e cautelar dos direitos de propriedade intelectual (direitos de autor e direitos conexos).

  6. Assim sendo, o objectivo da providência cautelar prevista no art. 210º-G do CDADC é inibir qualquer violação eminente daqueles direitos ou proibir a sua continuação, sendo que, estando como se está no âmbito de providências cautelares específicas do direito de autor e direitos conexos, deve entender-se que a lei se satisfaz com a prova dos respectivos requisitos específicos.

  7. Bastará para a aplicação da providência cautelar prevista no art. 210º-G do CDADC ser demonstrada, através de prova sumária, a violação ou o risco de violação actual ou eminente do direito invocado, a existência e titularidade do mesmo, assim como a sua legitimidade no caso de não ser o próprio titular a exercê-lo, o que, face aos factos alegados, entende a ora Apelante, já resultar demonstrado.

  8. Aliás, é a letra da própria lei, no corpo do nº 1 do art. 210º-G do CDADC que, ao utilizar uma conjunção alternativa (ou) e não cumulativa (e) se basta para a sua aplicação com a demonstração da violação do direito, dispensando assim a demonstração da gravidade da lesão e da sua difícil reparação (requisito do periculum in mora).

  9. De facto, utilizando o legislador nacional neste âmbito uma redacção diferente da utilizada no Código Processo Civil quanto aos requisitos para o decretamento de uma providência cautelar pretendeu alertar para as especificidades da lesão que esta providência cautelar visa evitar.

  10. A verificação do acto ilícito e o risco de tal acto vir a causar danos graves e dificilmente reparáveis são questões bem distintas, bastando-se o legislador neste âmbito, face aos direitos a tutelar com a verificação da sua violação.

  11. A idêntica conclusão se é forçado a atingir perante a natureza específica dos direitos de propriedade intelectual, pois trata-se de direitos absolutos, exclusivos, dotados de eficácia erga omnes, nos quais, a faculdade de autorizar (ou proibir) a continuação do ilícito esvazia, por completo, esse mesmo direito.

  12. Face à natureza exclusiva do direito, o prejuízo está in re ipsa, tendo-se por integralmente verificado.

  13. Acresce que, a própria Directiva, à luz da qual se deverá ler, nomeadamente, o art. 210º-G do CDADC, se basta, igualmente, com a demonstração da violação actual ou eminente, não instituindo como requisito de aplicação destas "medidas provisórias ou cautelares" a gravidade da lesão ou a dificuldade da sua reparação.

  14. Atendendo à ponderação de um critério de adequação da medida a decretar no intuito de impedir a violação eminente ou a continuação da violação, tal critério deve ser aferido em atenção à natureza do direito violado (art. 210º-G do CDADC).

  15. A providência cautelar prevista no art. 210º-G destina-se a assegurar a tutela provisória do direito violado ou ameaçado e não os elementos que se relacionem, directa ou indirectamente, com a prova dessa violação ou com a sua extensão, o que não obsta a que na mesma possa ser requerida a apresentação de uma qualquer prova ou mesmo a apreensão de bens objecto do ilícito ou instrumentos que sirvam para o exercício daquele, ficando a aplicação de tais medidas na ponderação do julgador.

  16. Devem, assim, ser decretadas as medidas que se revelem adequadas e necessárias para assegurar quer o não início, quer a continuação da violação ilícita de direitos de autor e conexos, o que, no mínimo, se tem de consubstanciar no decretamento da inibição ou proibição da continuação da execução pública não autorizada de fonogramas musicais, acompanhada da respectiva tutela penal, a que, necessariamente, acrescerá a apreensão de bens utilizados em tal violação até ao encerramento do estabelecimento.

  17. Qualquer outro entendimento, constituirá, na prática, uma autêntica "autorização judicial" para a continuação da prática de um ilícito cível e penal, nos termos dos arts. 195º e 197º do CDADC, ex vi, art. 184º, nº 2.

  18. Mesmo que não se venha a entender que, na hipótese de violações actuais, o decretamento da providência plasmada no art. 210º-G do CDADC, dispensa a invocação e demonstração do periculum in mora, consubstanciado no risco (receio) de lesão grave e dificilmente reparável do direito invocado, ainda assim a providência não deveria ter sido liminarmente indeferida.

  19. Pois, a lesão não deve ser buscada no valor concreto da contrapartida pecuniária devida pela autorização ou licença a emitir pela Apelante (valor esse que nunca esteve em causa rio presente procedimento) mas antes na impossibilidade prática ditada pela força das circunstâncias e por uma conduta contra legem criminalmente punida - de requerente poder exercer, "sem qualquer restrição" os seus direitos.

  20. Ora, é evidente que, com o indeferimento liminar e, consequentemente, sem o decretamento da providência cautelar intentada, a requerente encontrar-se-á impedida de exercer o direito de proibir a utilização em causa (vertente negativa do direito plasmado no nº 2 do art. 184º do CDADC), que constitui, precisamente, o núcleo essencial do direito invocado.

  21. Por isso, mesmo que não seja adoptado o entendimento da ora apelante e se considere que o periculum in mora é um requisito essencial do decretamento da providência, sempre se deverá entender que este se encontra, in casu, preenchido, sob pena de violação do nº 7 do art. 210º-G do CDADC.

  22. Tendo em consideração a situação plasmada no presente procedimento cautelar, resulta que, estamos perante uma providência sobre interesses imateriais e são acções sobre direitos imateriais as que não têm valor pecuniário e visam realizar um interesse não patrimonial.

  23. Pelo que, a quantificação dos danos, na presente providência não se mostra, no entendimento da Apelante necessária, bem como, a sê-lo...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT