Acórdão nº 09A0370 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 19 de Março de 2009

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução19 de Março de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

1 Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, intentou em 26.9.2001, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Esposende - 1º Juízo - acção declarativa com processo sumário, que por despacho de fls. 50, em virtude do pedido reconvencional, passou a seguir a forma ordinária, contra: BB-Empresa Têxtil, Ldª.

Pedindo a sua condenação a pagar-lhe a quantia de 2.112.606$00, acrescida da percentagem de 6% sobre todas as vendas realizadas pela Ré a partir de Setembro de 2000, inclusive, até à prolação da sentença, no âmbito de um contrato de representação entre ambos celebrado e reproduzido a fls.

  1. Alega para tal e, em síntese, que, a partir de Junho de 2000, a Ré incumpriu o referido contrato deixando de lhe enviar a relação das encomendas recebidas do estrangeiro por intermédio da sociedade "CC", referenciada no contrato, e deixou de lhe pagar a retribuição ajustada, que, no mês de Agosto de 2000, ascenderia ao pedido líquido que formula, não tendo, todavia, elementos relativamente aos meses subsequentes.

    Contestou a Ré para dizer que o contrato invocado pelo Autor foi celebrado no pressuposto de ele ser representante da sociedade "CC", mas esta sociedade, quando tomou conhecimento que o Autor se intitulara como tal, comunicou-lhe que a partir da "Estação 08" passaria a contactá-la directamente, advertindo que cessaria a relação comercial entre ambas, caso a Ré consentisse a interferência do Autor nas encomendas dos seus clientes.

    Concluiu, assim, pedindo pela improcedência da acção e, reconvindo, pediu, também, que se declare a caducidade do contrato celebrado com o Autor, com efeitos reportados a Junho de 2000.

    Respondeu o Autor para pugnar pela improcedência da reconvenção e reiterar o pedido feito na petição inicial.

    Seleccionada a matéria de facto relevante, prosseguiram os autos seus termos com a instrução e a audiência de discussão e julgamento.

    A final, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a Ré do pedido.

    Inconformado, recorreu o Autor para o Tribunal da Relação de Guimarães que, por Acórdão de 2.10.2008, fls. 564 a 574, julgou o recurso improcedente e confirmou a sentença apelada.

    De novo inconformado recorreu para este Supremo Tribunal e, alegando, formulou as seguintes conclusões: 1. O objecto do acórdão deve coincidir com o do processo e, para isso, deve atender à vontade das partes e ao que estas manifestaram na petição e na contestação, não podendo o Tribunal interpretar os pedidos formulados de forma a que os mesmos tenham um meio de tutela jurisdicional efectiva que não foi objectivamente o pretendido pelas partes.

  2. A anulabilidade tem de ser invocada por quem tem legitimidade para o fazer (nunca ipso jure ou ex officio), e sana-se pelo decurso do tempo, pelo que o acto somente pode ser anulado se o respectivo pedido for formulado no processo, dentro de determinado prazo legal.

  3. Se nenhuma das partes invocou ou peticionou a anulabilidade do contrato, não pode o tribunal ex officio decretá-la.

  4. Independentemente de o Tribunal poder qualificar juridicamente os factos apurados de forma diferente da qualificação feita pelas partes, isso não lhe confere o poder de alterar a pretensão formulada, sob pena de nulidade.

  5. Ao conhecer oficiosamente de anulabilidade não suscitada, o Tribunal da Relação desrespeitou as mais básicas noções doutrinárias que informam o instituto da anulabilidade, ignorou o preceituado no art. 287° do mesmo diploma, e nem sequer cuidou de aplicar ao caso o art. 247° do Código Civil, cuja matéria tampouco está alegada também nos autos.

  6. Os direitos obrigacionais operam inter partes, isto é, apenas vinculam as pessoas determinadas ou determináveis, que são os sujeitos da relação jurídica.

  7. Nos termos do n°1 do art. 406° do Código Civil, os contratos devem ser cumpridos pontualmente.

  8. Quando o devedor falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor - art. 798° do Código Civil.

  9. No domínio da responsabilidade contratual, presume-se a culpa do devedor, incumbindo-lhe ilidir essa presunção - art. 799, n°1 do mesmo Código.

  10. Dos factos provados, é forçoso concluir que a recorrida não cumpre o contrato celebrado com o recorrente, incorrendo numa situação de incumprimento definitivo e não logrou ilidir a presunção de culpa.

  11. Aliás, toda a defesa da recorrida se baseou na confissão de que de facto não cumpriu e que não o fez porque um terceiro - completamente alheio ao negócio - assim o impôs, como condição para a manutenção das relações comerciais.

  12. Para que releve a falta de culpa e se demonstre que a prestação se tornou impossível, é necessário que essa prestação seja absolutamente impossível e não que a mesma traga para o devedor uma extraordinária onerosidade ou excessiva dificuldade.

  13. De tudo quanto ficou apurado, não ocorre impossibilidade da prestação por causa não imputável à recorrida, antes, toda a sua actuação, se configura num incumprimento contratual culposo.

  14. O acórdão recorrido violou, salvo melhor entendimento, o disposto nos artigos os arts. 664° e 668° n°1, d) e e) do Código de Processo Civil e 406°, 483° e 799° do Código Civil.

    Assim sendo, revogando o Acórdão proferido, julgando procedentes os pedidos do recorrente e condenando a recorrida farão a esperada Justiça.

    A recorrida contra-alegou, batendo-se pela confirmação do Acórdão.

    Colhidos os vistos legais cumpre decidir, tendo em conta que as instâncias consideraram provados os seguintes factos: 1) O Autor é agente comissionista e desenvolve a sua actividade na área têxtil.

    2) Por seu turno a Ré é uma empresa de confecção de artigos têxteis e de vestuário.

    3) E a "CC-Agência de Serviços Têxteis, Ldª" é uma sociedade sediada na Maia, que se dedica à representação de clientes estrangeiros que pretendem mandar confeccionar em Portugal produtos têxteis e de vestuário.

    4) Anteriormente a Janeiro de 2000 a Ré não tinha contactos profissionais com a dita CC.

    5) Em 12.01.00 a Ré representada pela gerente Lúcia Lages e o Autor subscreveram o documento de fls. 6, que se dá por integralmente reproduzido.

    6) A partir da data aludida na resposta dada ao quesito C 3), a ré começou a confeccionar encomendas têxteis para clientes da CC no estrangeiro, designadamente, para a "Tom Taylor", de Hamburgo.

    7) Nos termos do acordo celebrado entre a Ré e o Autor, em todas as encomendas feitas à Ré por empresas estrangeiras através da CC, este último receberia 6% do valor das mercadorias vendidas a esses clientes.

    8) Ficou acordado entre ambos que a retribuição do Autor seria paga mensalmente, sendo o respectivo valor determinado com referência ao valor mensal das vendas realizadas através da CC.

    9) Para formalizar este acordo celebrado entre o Autor e a Ré foi elaborado por ambos e assinado pelo Autor e pela gerente da Ré, DD, o contrato junto aos autos a fls. 6, no qual se declarou que a Ré contratou o Autor como seu agente representante de todos os clientes representados pela CC, Ldª, bem como que a Ré pagaria ao Autor uma comissão de 6% sobre toda a facturação realizada no âmbito desse contrato.

    10) A partir de Junho de 2000 a Ré passou a encetar contactos directamente com a CC e, por intermédio desta, continuou a receber encomendas de empresas estrangeiras, sendo que essa conduta da Ré se ficou a dever a imposição da CC que deixou de aceitar qualquer intermediação remunerada do Autor, exigindo à Ré, como condição para que esta mantivesse as encomendas recebidas por seu intermédio, nomeadamente da "Tom Taylor", que deixasse de utilizar a intermediação do Autor e lhe deixasse de pagar qualquer comissão e de a imputar no preço das mercadorias.

    11) A partir dessa data a Ré deixou de pagar ao autor qualquer "retribuição" determinada pelo valor das mercadorias por si vendidas através da CC.

    12) No mês de Agosto de 1999 a Ré recebeu da "Tom Taylor" encomendas que confeccionou.

    13) No segundo semestre de 1999 uma funcionária da CC e o Autor propuseram à Ré que esta passasse a confeccionar as encomendas recebidas por aquela empresa do cliente "Tom Taylor".

    14) A Ré aceitou essa proposta e seguiram-se diversas encomendas a pedido da CC.

    15) O Autor acompanhava a funcionária da CC; 16) O Autor e a Ré a 12.01.00 assinaram o documento de fls. 6.

    17) Por vezes a Ré quando tinha dúvidas sobre aspectos das encomendas ou sobre o respectivo modo de execução pedia informações ao Autor ou à funcionária da CC e, na maior parte das situações, durante a execução das encomendas, mandava uma funcionária sua às instalações da Ré para controlar essa execução; 18) Por ter ocorrido uma baixa significativa nos preços no sector das confecções, o referido cliente "Tom Taylor" passou a apertar consideravelmente o preço das mercadorias; 19) Aquando da discussão dos novos preços a CC tomou conhecimento da percentagem de 6% que a Ré vinha pagando ao Autor.

    20) E mostrou-se revoltada pelo facto de o Autor se fazer passar por representante dos clientes que ela representava e ter vindo a exigir da Ré a referida comissão de 6%.

    21) Em 28.06.00 a CC enviou à Ré a comunicação que consta do documento de fls. 26.

    22) A Ré deu conhecimento ao Autor dessa comunicação e de que a partir...

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