Acórdão nº 08A2124 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 17 de Fevereiro de 2009
Magistrado Responsável | HÉLDER ROQUE |
Data da Resolução | 17 de Fevereiro de 2009 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
ACORDAM OS JUÍZES QUE CONSTITUEM O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA, por si e em representação de seu filho menor, BB, residentes na Rua ......................., ...., ....., em Braga, propuseram a presente acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, contra DD SA, com sede na Rua A........................, em Lisboa, Transportes Centrais Monte Pedral, Lda, com sede na Rua Padre ......................, 210-212, no Porto e EE, residente na Rua ...................., r/c, Dto, Vilar do Paraíso, em Vila Nova de Gaia, pedindo que, na sua procedência, os réus sejam condenados a pagarem aos autores a quantia de €700.500,00, a título de indemnização, por danos patrimoniais e não patrimoniais, decorrentes de um acidente de viação que teve lugar, no dia 12 de Setembro de 2003, e no qual faleceu CC respectivamente, marido e pai dos autores, ao embater num veículo conduzido pelo réu EE, sob as ordens e direcção da ré Transportes Centrais Monte Pedral, Lda, que, por sua vez, havia transferido para a ré DD SA, a responsabilidade civil emergente da circulação desse veículo.
Para o efeito, e, em síntese, os autores alegam que o réu EE, atravessou o veículo automóvel que conduzia, na hemifaixa de rodagem por onde, a cerca de cinco metros, e, em sentido contrário, circulava o CC, tripulando um motociclo, dentro da sua mão de trânsito, provocando o embate dos veículos e, com ele, a morte de seu marido e pai.
Na contestação, os réus alegam, no que ora ainda releva, que o réu EE, antes de iniciar a manobra de mudança de direcção, tomou o eixo da via e deteve a marcha, só a executando depois de se certificar que não circulava qualquer veículo em sentido contrário.
Porém, continuam, quando estava prestes a concluir a manobra, surgiu o malogrado A......, a mais de 50/80/90Kms/hora, sem atenção ao trânsito, não tendo logrado, por esse facto, imobilizar o motociclo, no espaço livre e visível à sua frente.
Assim, imputam ao falecido CC a culpa pelo acidente e impugnam os danos alegados pelos autores, concluindo pela improcedência ou, pelo menos, pela sua parcial improcedência da acção.
A sentença julgou a acção, parcialmente, procedente por provada, e, em consequência, condenou os réus a pagar aos autores a quantia de €690.131,46, sendo a ré DD SA, até ao montante de €600.000,00, e juros, desde a citação, e bem assim como, também, parcialmente procedente, o pedido formulado pelo ISSS, condenando a ré seguradora a pagar-lhe a quantia de €10.368,64 e juros.
Desta sentença, a ré DD SA, interpôs recurso, tendo o Tribunal da Relação julgado procedente a apelação, e, em consequência, condenou a ré seguradora a pagar aos autores a quantia de €65.400,00 (sessenta e cinco mil e quatrocentos euros), correspondente à soma dos danos morais sofridos pela vítima (€5.000,00), ao valor compensatório pela perda do direito à vida (€60.000,00) e aos danos emergentes (€400,00), acrescida de juros, à taxa de 4%, desde a citação, a pagar aos autores, a título de danos patrimoniais próprios, a quantia de €289.631,39 (duzentos e oitenta e nove mil, seiscentos e trinta e um euros e trinta e nove cêntimos), acrescida de juros vincendos, até efectivo pagamento, à mesma taxa legal, a pagar à autora AA a quantia de €30.000,00, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros, vencidos e vincendos, à referida taxa, e, finalmente, a pagar ao ISSS a quantia de €10.368,64 e juros, nos exactos termos fixados pela sentença, absolvendo os réus Transportes Centrais Monte Pedral, Lda e EE do pedido contra eles deduzido.
Do acórdão da Relação, os autores e a ré DD SA, interpuseram recurso de revista, terminando as respectivas alegações com as seguintes conclusões que, textualmente, se reproduzem: OS AUTORES: 1ª - O Douto Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, de que se recorre alterou as respostas a três artigos de base instrutória, fazendo um uso indevido dos poderes que lhe conferia o artº 712º nºs 1 e 2 do CPC, sobrepondo-se a pareceres que envolvem conhecimentos técnicos especiais, quer por parte de doutores em engenharia mecânica, quer mesmo por um especialista em traumatologia.
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- Não obstante o estatuído no artº 722 nº 2 do CPC, será admissível ao STJ censurar o mau uso pela Relação de tais poderes, conforme se decidiu no Acórdão do STJ de 25-09-2007, proferido no processo 07A090.
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- Apesar da alteração indevida da matéria de facto, não houve, naturalmente, alteração do decidido em Primeira Instância em matéria de culpa.
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- Na verdade o condutor do veículo de mercadorias ..-...-.. seguro pela (R-) Apelante nunca poderia ter atravessado a hemi-faixa de rodagem contrária, sem previamente se ter assegurado de que da sua manobra não resultaria perigo nem embaraço para o restante tráfego e daí a sua culpa exclusiva na produção do acidente a que os autos se reportam.
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- O A. BB, não pode deixar de ser considerado como filho da vítima e como tal com direito a ser ressarcido do dano não patrimonial que a morte do pai lhe causou.
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- A Lei reconhece o nascituro como filho dos respectivos progenitores e, como tal, terá de reconhecer-se o A. BB como filho da vítima.
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- O artº 496º nº 2 do Código Civil ao atribuir aos filhos direito de indemnização por danos não patrimoniais por morte da vítima, engloba neles os filhos nascituros.
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- O nascituro tem o direito a danos morais pela morte do pai em acidente de viação, desde que se venha a verificar o condicionalismo do artigo 66º nº 2 do Código Civil.
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- O A. BB nasceu com vida em 18 de Outubro de 2003, logo os seus direitos absolutos de personalidade - retrotraem-se ao momento em que foi concebido.
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- O A. BB não chegou a conhecer o pai e irá padecer ao longo da sua vida a ausência da figura paterna.
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- O A. BB não poderá beneficiar do acompanhamento, do amparo, da assistência, do carinho e afecto do pai, que são importantes para o desenvolvimento equilibrado de uma criança, de um adolescente e de um jovem.
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- Assim, deve manter-se a indemnização que lhe foi fixada pela Primeira Instância no valor de €10.000,00 que só peca por defeito.
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- A vítima e a A. AA viviam em grande harmonia, em clima de dedicação e afeição, nutriam laços recíprocos de amor e estima, tendo aumentado a felicidade de ambos com a espera do A. ....
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- A vítima contribuía para as despesas do seu agregado familiar, (água, electricidade, telefones, alimentação e outros) e desde o casamento até à sua morte foram adquiridos bens móveis e imóveis com os proventos auferidos.
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- A vítima auferia em rendimentos de trabalho comprovados por recibo €3.423,24 por mês.
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- A vítima, à data, da morte tinha 35 anos de idade e era sócio de varias sociedades comerciais, para lá de desportista de renome nacional e mesmo internacional.
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- A vítima recebia patrocínios de marcas pelas quais corria que lhe permitiam suportar as despesas com corridas, material, equipamentos, alojamento (próprio e da A. AA).
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- O nível de vida do casal era pois elevado, passando fins-de-semana fora e tomando, frequentemente, refeições em restaurantes.
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- A morte da vítima causou um elevado dano patrimonial aos AA.
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- O quantum indemnizatório deve ser calculado tendo em conta o rendimento anual da vítima € 47.925,36, no ano de 2003.
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- Os cálculos efectuados pela 1ª Instância tiveram em conta a situação real da vítima e dos AA..
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- A indemnização apurada pela 1ª Instância no valor de € 693.509,00 foi calculada tendo em conta a idade de 70 anos de vida, mas foi reduzida para €600.000,00.
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- Tal redução é compatível com os cálculos indemnizatórios tendo em conta apenas a idade activa da vítima de 65 anos.
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- Não se pode igualar o que é diferente, como fez a Relação.
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- Não é justo, nem equitativo o valor de indemnização "actualizada" atribuída pelo Tribunal da Relação aos AA por danos futuros de €300.000,00.
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- Antes é justo o valor de €600.000,00 fixado pela Primeira Instância, valor sujeito a actualização correspondente ao acréscimo de juros de mora à taxa legal em vigor, desde a citação.
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- A decisão, ora recorrida, violou o disposto nos art.ºs 483º, 495º, 496º, 564º, 566º, 570º, 804º, 805º e 806º, do CC, 712º e 659º do CPC.
A RÉ SEGURDORA: 1ª - Após a sindicância da matéria de facto pelo Tribunal "a quo" ficou assente que o motociclo circulava a mais de 50 kms/horários, tal como tinha sido alegado pela Ré na acção quanto ao modo de produção do sinistro.
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- Este caracterizou-se pela colisão do motociclo contra a lateral direita, sobre o pneu traseiro, dum ligeiro de mercadorias com caixa frigorífica de cerca de 6 ms. de comprimento, a circular em sentido contrário à moto e em vias de efectuar uma mudança de direcção à esquerda na via.
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- Essa colisão verificou-se quando o veículo automóvel ligeiro tinha o seu rodado dianteiro, sob a cabina, já fora da via e ocupava, com a sua parte restante (i.e. a cx. frigorífica e o rodado traseiro), apenas a hemi-faixa de rodagem contrária àquela donde provinha e por onde vinha já o motociclo.
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- O local do sinistro situa-se junto ao entroncamento de acesso ao MAXMAT, dentro do perímetro da freguesia e localidade de Real, e está assinalado por placas de limitação de velocidade de 40 kms/hora para o trânsito que circulava na EN 205-4, que liga a EN 201 a Mire de Tibães, e respectivo sentido de trânsito, como era o caso do motociclo em questão.
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- Isso mesmo está já documentado nos autos através da certidão emitida pela "ESTRADAS DE PORTUGAL, SA" e/ou respectiva Direcção de Estradas de Braga em 03 de Abril de 2008, e que, enquanto documento superveniente devido ao julgamento efectuado na Relação, foi agora junta aos autos com a minuta de alegações de revista.
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- Esse facto era e é público e notório e, aliás, do conhecimento geral, pelo menos em relação ao julgamento operado na 1.ª instância dos autos, efectuado até no local, como se vê da acta respectiva.
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- Tanto na 1.ª instância, como na Relação, a questão da velocidade e das distâncias de visualização e aproximação entre os condutores dos dois...
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