Acórdão nº 08S2596 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Fevereiro de 2009

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1.

Em 11 de Julho de 2002, no Tribunal do Trabalho de Lisboa, 1.º Juízo, AA intentou a presente acção, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho contra CAIXA ECONÓMICA MONTEPIO GERAL pedindo que a ré fosse condenada: a) a pagar-lhe € 28.978,55, a título de remunerações vencidas e não pagas até à data do despedimento; b) a reconhecer a nulidade da cessação unilateral do respectivo contrato de trabalho, por despedimento sem justa causa, e a pagar-lhe as remunerações que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data da sentença, sendo € 952,95 de retribuições vencidas, e a reintegrá-lo ou a pagar-lhe € 89.577,62, a título de indemnização por despedimento sem justa causa e sanção abusiva; c) a pagar-lhe € 30.000,00 por danos não patrimoniais; d) a pagar-lhe juros moratórios sobre tais importâncias até integral pagamento e a sanção pecuniária compulsória a que alude o artigo 829.º-A, n.º 4, do Código Civil; e) subsidiariamente, caso não procedesse o pedido de reconhecimento de despedimento sem justa causa, a pagar-lhe € 28.978,55 de retribuições vencidas e não pagas até à data do despedimento, acrescidos de juros, € 40.000,00 de danos não patrimoniais e, a título de indemnização por danos patrimoniais, € 89.577,62, por culposamente o ter colocado na impossibilidade de prestar trabalho e as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até à data da sentença.

Alegou, para tanto, que trabalhou, sob as ordens, direcção e fiscalização da ré, desde 2 de Novembro de 1981, e que entrou em «baixa médica», em Outubro de 1994, situação que se manteve cerca de três anos, sendo entretanto convocado pela ré para uma junta médica, na sequência da qual, em 7 de Agosto de 2000, lhe ordenou que se apresentasse ao trabalho, o que sucedeu em 8 de Agosto seguinte; porém, face às condições de trabalho que lhe foram proporcionadas, o seu estado de saúde piorou, entrando de «baixa médica», em 16 de Agosto de 2000, situação que se manteve até 2 de Novembro de 2000, data em que voltou a trabalhar, tendo retomado a situação de «baixa médica», em 15 de Novembro seguinte, em virtude de se manterem as referidas condições de trabalho e de não lhe ser paga a retribuição.

Em 14 de Setembro de 2001, teve lugar nova junta médica, na sequência da qual a ré, por carta datada de 6 de Junho de 2002, recebida em 11 de Junho de 2002, alegando caducidade do contrato de trabalho, por impossibilidade superveniente de prestação do trabalho, pôs fim à relação contratual; contudo, inexistem fundamentos que sustentem tal caducidade, pelo que tal declaração configura um despedimento, ilícito por não ter sido precedido de processo disciplinar, aduzindo, igualmente, que a conduta da ré provocou um agravamento geral do seu estado de saúde psiquiátrico.

A ré contestou, impugnando os fundamentos da acção invocados pelo autor e, em sede reconvencional, sustentou que, uma vez que nenhuma das juntas médicas concluiu pela doença alegada pelo autor nos seus atestados médicos, as faltas dadas em tal período se devem reputar injustificadas, pelo que pediu a condenação do autor a restituir-lhe as quantias por ele ilegitimamente recebidas, a título de retribuições e subsídios de férias e de Natal, no período em que faltou injustificadamente.

O autor respondeu, concluindo pela improcedência da reconvenção.

Realizado o julgamento, no decurso do qual o autor declarou optar pela sua reintegração em caso de procedência da acção, foi exarada sentença que: «a) [Julgou] a acção parcialmente procedente e, em consequência, condenou a ré a reintegrar o A. no seu posto de trabalho e a pagar-lhe as remunerações que deixou de auferir desde 11/06/2002 até à data do trânsito em julgado da sentença, deduzidas das relativas a rendimentos auferidos posteriormente a 11/06/2002 até à mesma data (do trânsito em julgado da sentença) e até ao limite do montante global da liquidação das remunerações em que a ré foi condenada, que se relega para execução de sentença; a pagar ao A. a importância de € 26.613,31 (vinte e seis mil, seiscentos e treze euros e trinta e um cêntimos), relativa a remunerações e créditos vencidos a título de diferenciais das retribuições de Janeiro de 2000 a 11 de Junho de 2002, de diferenciais de férias e subsídio de férias vencidos a 1 de Janeiro de 1999[,] 2000[,] [2001] e 2002[,] de diferenciais de diuturnidades de Janeiro de 2000 até 11 de Junho de 2002[,] diferenciais a título de subsídio de Natal de 2000 e 2001. Quantia a que acrescem juros de mora[,] desde as respectivas datas de vencimento até integral pagamento, à taxa legal supletiva em vigor e ainda de juros à taxa de 5% ao ano, a título de sanção pecuniária compulsória, estes a contar do trânsito em julgado da sentença; absolvendo-se a ré do demais peticionado[;] b) [Julgou] a reconvenção improcedente, absolvendo-se o autor do pedido reconvencional formulado.» 2.

Inconformada, a ré apelou para o Tribunal da Relação de Lisboa, o qual julgou improcedente o recurso, confirmando a sentença da primeira instância, sendo contra esta decisão que a ré agora se insurge, mediante recurso de revista, ao abrigo das conclusões que se passam a transcrever: «1.ª Salvo o devido respeito e melhor opinião, o douto acórdão recorrido não fez a melhor interpretação do direito aplicável.

  1. A verificação de doença e de invalidez no sector bancário está prevista na Clª 139.ª e regulamentada a sua composição e funcionamento na Clª 141.ª, ambas do ACT do Sector bancário, bem como nos n.os 6 a 8 do art. 86.º do Estatuto dos Trabalhadores da recorrente.

  2. É sabido que, no sector bancário, a junta médica é composta por três membros, nela estando, à partida, um representante do trabalhador que, com o da entidade patronal, escolhe o terceiro membro, o qual assume a qualidade de um verdadeiro árbitro a quem cabe, se necessário, voto de desempate.

  3. E que, no ACT do sector bancário e no Estatuto dos Trabalhadores do recorrente, não está prevista qualquer comissão de reavaliação ou de recurso.

  4. Conjugando os sobreditos normativos, há que saber, por um lado, se no âmbito do sector bancário, a deliberação de junta médica que decida pela impossibilidade absoluta e definitiva para o trabalho é susceptível de revisão e, por outro lado, [...] se ela for sindicável pelos tribunais, saber em que termos pode ser impugnada.

  5. Desde logo, afigura-se imprescindível para melhor compreensão da questão da conclusão anterior, comparar a estrutura do regime da junta médica do sector bancário com o que se passa, neste domínio, nos sistemas públicos de Solidariedade e Segurança Social e da Caixa Geral de Aposentações, para assim se obterem critérios directivos por comparação.

  6. No âmbito da Caixa Geral de Aposentações, existe uma junta médica composta por dois peritos médicos que intervêm, para certificação de incapacidade permanente (E.A. - art.s 37.º e 89.º), como junta de revisão (E.A. - art. 95.º) ou como junta de recurso (D.L. 503/99 - art. 39.º), para reavaliação da decisão tomada pela anterior junta.

    8.º O sistema de Solidariedade e Segurança Social comporta dois tipos de meios técnicos de verificação de incapacidade, quer temporária (comissão de verificação e comissão de reavaliação), quer definitiva (médico relator, comissão de verificação e comissão de recurso).

  7. O traço que é comum a estas duas estruturas do sistema público, traduz-se no facto de que as chamadas comissões de verificação serem como que uma primeira instância de decisão, onde não intervém o perito médico do interessado.

  8. E só nas comissões de reavaliação ou de recurso, que são uma segunda instância da decisão, a composição é tripartida, com a escolha de médico pelo interessado.

  9. Ao comparar-se estes regimes com o instituído na Clª 139.ª do ACT do sector bancário, verifica-se que, em caso de desacordo entre a instituição bancária e o trabalhador, reúne--se uma junta médica com a intervenção de um médico de cada parte, que escolherão o terceiro árbitro, esquema tripartido de peritagem/arbitragem também previsto no art. 86.º do Estatuto dos Trabalhadores da recorrente.

  10. Contrariamente ao que sucede no sistema público, a junta médica do ACT do sector bancário comporta uma dupla intervenção do interessado, traduzida na nomeação de um representante médico e na escolha do terceiro médico, que funciona como árbitro presidente e tem voto de desempate.

  11. Daí que, e ao contrário do que se verifica no sistema público, da deliberação da junta médica, à partida de composição tripartida, inexiste via de reavaliação ou de recurso.

  12. Pelo que, os efeitos do resultado da deliberação da junta do ACT do sector bancário estabilizam-se, formando como que um caso julgado no âmbito das partes, e são definitivamente vinculativos e executórios.

  13. A junta médica foi convocada e reuniu para deliberar o que relatou em 03/01/02 e aditou em 14/05/02, nos termos de fls. 60 e 66 e em total conformidade com os normativos e procedimentos institucionalizados, no âmbito do ACT do sector bancário e no do ETCEMG.

  14. Essa unânime deliberação colegial não está afectada por nenhum vício ou ilegalidade e observou escrupulosamente o princípio do contraditório nas suas dimensões de participação, publicidade e fundamentação, dada a natureza tripartida da sua composição e funcionamento.

  15. Assim, o processo propriamente legal e procedimental da junta médica realizada nos termos do ACT do sector bancário foi o próprio e adequado, sendo o processo de verificação clínica, por sua vez, rigoroso, isento, competente e deliberado pela unanimidade retratada a fls. 60 e 66.

  16. Um aspecto que é de nevrálgica importância no contexto da interpretação das afirmações produzidas pela junta médica de fls. 60 e 66 diz respeito à longevidade do conflito entre recorrente e o próprio recorrido, devido à personalidade que este apresenta e que conduziu à ausência ao trabalho pelo prazo de quase seis anos, compreendidos de...

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