Acórdão nº 08P3629 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 05 de Fevereiro de 2009
Magistrado Responsável | RODRIGUES DA COSTA |
Data da Resolução | 05 de Fevereiro de 2009 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
-
RELTÓRIO 1.
AA (nascido a 2/02/1983), foi julgado na 1ª Vara Criminal do Porto, no âmbito do processo n.º 70/07.0PEPRT, ao qual estavam apensados 11 outros inquéritos e, por acórdão de 28 de Maio de 2008, foi decidido condená-lo (absolvendo-o do mais imputado), mas sem o considerar reincidente como referia a acusação, pelos crimes e nas penas que a seguir vão indicadas: - 1 crime de roubo qualificado, p. e p. nos art.ºs 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e 204.º, n.º 2, al. f), do CP95, na pena de 39 meses de prisão (ofendido BB); - 3 crimes de roubo qualificado, pp. e pp. nas mesmas disposições legais, na pena de 38 meses de prisão cada um (ofendidos CC, DD e EE); - 2 crimes de roubo qualificado, pp. e pp. nas mesmas disposições legais, na pena de 37 meses e 15 dias de prisão por cada um (ofendidos FF e GG); - 2 crimes de roubo qualificado, pp. e pp. nas mesmas disposições legais, na pena de 37 meses de prisão cada um (ofendidos HH e II); - 1 crime de roubo simples, p. e p. nos art.ºs 210.º, n.º 1 e 204.º, n.º 4, do CP95, na pena de 15 meses de prisão (ofendido NN); - 1 crime de roubo qualificado tentado, p. e p. nos art.ºs 210.º, n.ºs 1 e 2, al. b) e 204.º, n.º 2, al. f), e ainda nos art.ºs 22.º, n.ºs 1 e 2, al. b), 23.º, n.ºs 1 e 3, e 73.º, todos do CP95, na pena de 9 meses de prisão (ofendido JJ); - 3 crimes de roubo simples tentado, p. e p. nos art.ºs 210.º, n.º 1 e 204.º, n.º 4, e ainda nos art.ºs 22.º, n.ºs 1 e 2, al. b), 23.º, n.ºs 1 e 3 e 73.º, todos do CP95, na pena de 6 meses e 15 dias de prisão para cada um de dois crimes (ofendidos André Pereira e Tiago Rocha) e de 6 meses de prisão para o outro (ofendido LL); - na pena única de 7 (sete) anos e 4 (quatro) meses de prisão, que abrange as 13 penas parcelares supra referidas.
2.
Deste acórdão recorre o Ministério Público para o Supremo Tribunal de Justiça e, da sua fundamentação, concluiu o seguinte: 1. O Ministério Público imputou ao arguido, além do mais, a prática de 14 crimes de roubo agravados, quatro deles na forma tentada, e um crime de roubo, todos cometidos durante os meses de Outubro e Novembro de 2007. Considerou ainda o Magistrado que deduziu a acusação que o arguido deveria ser condenado como reincidente, posto que em Junho de 2003, com trânsito em Março de 2004, o mesmo arguido tinha sido condenado na pena de única de 5 anos e 2 meses de prisão pela prática de 9 crimes de roubo e de 1 crime de condução ilegal, cometidos nos meses de Junho e Julho de 2002, sendo certo que esteve preso, à ordem do processo onde foi condenado por aqueles factos, entre Julho de 2002 e Setembro de 2007.
2. Realizada a Audiência de discussão e Julgamento acabou o arguido por ser condenado pala prática, durante os meses de Outubro e Dezembro de 2007, de 13 crimes de roubo, 9 deles na forma agravada, sendo-lhe fixada a pena única de 7 anos e 4 meses de prisão.
3. Conforme tinha sido alegado na acusação, foi dado como provado que o arguido esteve preso até Setembro de 2007, durante mais de 5 anos, pela prática de 9 crimes de roubo. Restituído à liberdade, ou seja, assim que pôde, muito poucos dias depois e num escasso lapso de tempo (menos de 2 meses) praticou mais 13 crimes de... roubo!.
4. Assim, manifestamente o tempo de reclusão, a privação da liberdade por mais de 5 anos, em nada, rigorosamente nada, serviu de obstáculo ao reinício de actividade criminosa exactamente igual à que lhe valera tal pena.
5. A argumentação usada pelo tribunal a quo (para afastar a verificação do pressuposto material da reincidência) assenta num equívoco, qual seja o de considerar que o arguido não tem qualquer responsabilidade por não ter aproveitado o tempo de reclusão para abandonar os hábitos de consumo de drogas.
6. Esta linha de raciocínio conforta-se com a ideia que está subjacente precisamente ao instituto da reincidência: o arguido nada fez para se afastar dos consumos, a pena não surtiu qualquer efeito, pelo que a conclusão a retirar terá de ser necessariamente antagónica à defendida no douto acórdão. Se para nada serviu é porque ao arguido foi indiferente a condenação, não foi «suficiente a advertência contra o crime».
7. Ao decidir desta forma, ou seja, não condenando o arguido como reincidente, o Douto Tribunal Colectivo violou frontalmente o comando dos arts. 75° e 76°, ambos do C. Penal.
Termina pedindo a condenação do arguido como reincidente, nos termos do disposto nos arts. 75° e 76° do C. Penal, agravando-se em conformidade as respectivas penas parcelares e subsequente pena única.
3.
O arguido não respondeu ao recurso.
A Sra. Procuradora-Geral Adjunta neste Supremo Tribunal teve vista dos autos.
4.
Não tendo sido requerida audiência, foram colhidos os vistos e realizada conferência com o formalismo legal.
-
FUNDAMENTAÇÃO 5. Matéria de facto apurada 5.1. Factos dados como provados: Intróito: 1. No período compreendido entre 07OUT e 10NOV 2007, o Arguido, conhecido pela alcunha "Bica", encontrando-se desempregado e sem quaisquer rendimentos que lhe permitissem sustentar os encargos resultantes do seu consumo de estupefacientes concebeu um plano para se apoderar de quantias em dinheiro e objectos que conseguisse retirar a terceiros que circulassem nas diversas artérias da Cidade do Porto mediante o uso de ameaças através da exibição de armas brancas e de violência, se necessário fosse.
2. Em execução de tal propósito, o Arguido procurou localizar transeuntes que circulassem em artérias pouco movimentadas da Cidade do Porto e, sobretudo, de idade e compleição física inferior à sua por forma a conseguir manietá-los e impedir que os mesmos lhe oferecessem resistência abrindo mão dos objectos que possuíam.
3. Na concretização dos seus intentos apropriativos, tendo sido apreendida cerca das 18h 30 m de 11.11.2007, a navalha de cor prateada com 12,7 cm de comprimento tendo a lâmina 5,5 cm, documentada fotograficamente a fls. 12 do apenso INQ 731/07.4 SJPRT, o Arguido muniu-se para o efeito da navalha com lâmina de 5 cm de abertura automática tipo ponta e mola, dissimulada em forma de isqueiro em metal de cor prateada, que sabia ser de uso e porte proibido, que lhe foi encontrada e apreendida em 12.11.2007 conforme Auto de fls. 106 e 204, a qual pretendia utilizar para intimidar os Ofendidos a entregar-lhe os objectos que possuíam e eventualmente usá-la em caso de resistência oferecida por aqueles.
Atinentes ao apensado INQ 731/07.4 SJPRT: 4. Assim, pelas 19h 45m de 07.10.2007, o Arguido, ao avistar o Ofendido HH a caminhar pela Alameda Eça de Queirós, em Bonfim área desta Comarca, de imediato decidiu abordar aquele Ofendido forçando-o a entregar objectos e quantias em dinheiro que possuísse, se necessário com recurso a violência.
5. Para o efeito, começou por perguntar as horas ao Ofendido e quando aquele retirou do bolso das calças o seu telemóvel marca Nokia modelo 6070 no valor de 150 €, para informar o Arguido, este de imediato exibiu-lhe a navalha de cor prateada com 12,7 cm de comprimento tendo a lâmina 5,5 cm e apontando-a ao abdómen do Ofendido proferiu, em tom, sério e exaltado, a expressão: "Passa já para cá o telemóvel".
6. Temendo que o Arguido o pudesse atingir na sua vida ou integridade física com a aludida navalha, o Ofendido abriu mão do aludido telemóvel entregando-o ao Arguido que na posse do mesmo abandonou o local, fazendo-o seu, contra a vontade do Ofendido.
7. Na posse do mencionado telemóvel, o Arguido dirigiu-se ao Bairro do Aleixo, no Porto, onde o entregou a indivíduos de identidade não apurada recebendo dos mesmos produtos estupefacientes como contrapartida do telemóvel que lhes entregou.
Atinentes ao apensado INQ 1049/07.8 PIPRT: 8. De igual modo, pelas 10h de 12.10.2007 o Arguido, ao avistar o Ofendido FF na Rua do ..., no Porto, a preparar-se para entrar na sua residência, abeirou-se daquele e exibindo-lhe a sobredita navalha de 12,7 cm encostou-a ao abdómen do Ofendido ao mesmo tempo que, em tom sério e exaltado, proferiu a expressão: "Dá-me o teu telemóvel e o dinheiro".
9. Com receio que o Arguido pudesse atingi-lo no seu corpo ou na sua saúde com a mencionada navalha, o Ofendido FF incapaz de oferecer resistência ao Arguido entregou àquele: 9.1. O seu telemóvel marca Nokia modelo 5300, de cor cinza, no valor de 200 €, e, 9.2. Um leitor de MP4 marca Zipy, cor preta, no valor de 40 €.
10. Na posse dos objectos que mediante ameaça de uso de violência lhe foram entregues pelo Ofendido, o Arguido abandonou o local deles se apoderando contra a vontade do Ofendido.
11. Em seguida, dirigiu-se ao Bairro do Aleixo onde vendeu a indivíduos não concretamente apurados os mencionados objectos recebendo dos mesmos a correspondente contrapartida monetária que de imediato gastou na aquisição de estupefacientes para o seu consumo.
Atinentes ao apensado INQ 1066/07.8 PIPRT: 12. E o mesmo sucedeu pelas 17h 20m de 16.10.2007, prosseguindo o Arguido com os seus intentos apropriativos, ao avistar a Ofendida GG a caminhar sozinha na Rua Bairro Areosa, em Paranhos, Porto, de imediato resolveu seguir a Ofendida interceptando-a naquela artéria.
13. Acto contínuo, agarrou a Ofendida pelo pescoço e, em tom exaltado e sério, proferiu a ex-pressão "Dá-me o dinheiro depressa" ao mesmo tempo que lhe exibiu a sobredita navalha de 12,7 cm.
14. Em face do estado de medo e nervosismo em que a Ofendida se encontrava, com receio que o Arguido a pudesse atingir na sua vida e integridade física com a aludida arma, aquela demorou a retirar os objectos do interior da carteira que trazia, tendo então o Arguido, novamente em tom exaltado, se voltado para a Ofendida e ao mesmo tempo que proferia a expressão: "Estás a demorar muito, depressa" encostou a navalha ao abdómen da Ofendida pressionando aquele objecto no corpo daquela que em pânico entregou ao Arguido: 14.1. Um porta-moedas contendo a quantia de 07 €, em notas e moedas do BCE, e, 14.2. Um telemóvel de marca Nokia modelo N70 no valor de 190 €.
15. Na posse dos mencionados objectos que mediante uso de violência...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO-
Acórdão nº 165/09.6PABCL. G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 31 de Janeiro de 2011
...a falha dissuasora da condenação anterior e a prática do novo crime. Neste sentido Ac. STJ de 27/02/08, Proc. nº 08P419; de 05/02/09, Proc. nº 08P3629; de 20/01/10, Proc. nº 587/O8.0PAVFR.P1.S1, in Porém, ao analisarmos tais acórdãos, verificamos que os factos exigidos são do género dos que......
-
Acórdão nº 636/13.0PBGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Março de 2014
...tem a ver com a reincidência. Os seus pressupostos verificam-se. Retenha-se o que se sumariou no acórdão do STJ de 05/02/2009, proc. 08P3629, sendo seu relator o conselheiro Rodrigues da Costa: I -A lei - art. 75º do CP , exige dois pressupostos para a verificação da reincidência: - a) o co......
-
Acórdão nº 90/16.4JASTB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 06 de Outubro de 2020
...não escrito os referidos pontos 1, 2, 6 e 18 (nesse sentido, o Doutíssimo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05/02/2009 (Processo 08P3629, in dgsi.pt)), daí decorrendo a absolvição do A não ser assim, estaremos perante uma violação do Princípio do Acusatório e, também, do Princípio d......
-
Acórdão nº 165/09.6PABCL. G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 31 de Janeiro de 2011
...a falha dissuasora da condenação anterior e a prática do novo crime. Neste sentido Ac. STJ de 27/02/08, Proc. nº 08P419; de 05/02/09, Proc. nº 08P3629; de 20/01/10, Proc. nº 587/O8.0PAVFR.P1.S1, in Porém, ao analisarmos tais acórdãos, verificamos que os factos exigidos são do género dos que......
-
Acórdão nº 636/13.0PBGMR.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Março de 2014
...tem a ver com a reincidência. Os seus pressupostos verificam-se. Retenha-se o que se sumariou no acórdão do STJ de 05/02/2009, proc. 08P3629, sendo seu relator o conselheiro Rodrigues da Costa: I -A lei - art. 75º do CP , exige dois pressupostos para a verificação da reincidência: - a) o co......
-
Acórdão nº 90/16.4JASTB.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 06 de Outubro de 2020
...não escrito os referidos pontos 1, 2, 6 e 18 (nesse sentido, o Doutíssimo Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 05/02/2009 (Processo 08P3629, in dgsi.pt)), daí decorrendo a absolvição do A não ser assim, estaremos perante uma violação do Princípio do Acusatório e, também, do Princípio d......