Acórdão nº 08B2777 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Janeiro de 2009
Magistrado Responsável | GARCIA CALEJO |
Data da Resolução | 20 de Janeiro de 2009 |
Emissor | Supremo Tribunal de Justiça (Portugal) |
Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I- Relatório: 1-1- No Tribunal Judicial de Vila Viçosa, AA, residente na Rua ..., n.º 00, em Borba, propôs a presente acção de alteração da regulação do poder paternal contra BB, residente na Via ..., n.º 00, San Fili (Cosenza), em Itália, relativamente aos filhos de ambos, CC, DD e EE nascidos, respectivamente, em 19-5-90, 17-9-95 e 18-2-97.
Citado o requerido para deduzir oposição ao pedido, veio invocar a incompetência absoluta na ordem comunitária e internacional do Tribunal Judicial de Vila Viçosa, nos termos do Regulamento CE 2201/2003 de 27 de Novembro, com a consequente absolvição da instância, sustentando serem os tribunais italianos os competentes para conhecer do pleito.
Pelo despacho judicial de 5-4-2005, foi declarado competente para conhecer do pleito, o Tribunal Judicial de Vila Viçosa, julgando-se improcedente a excepção de incompetência internacional do tribunal invocado pelo requerido.
Não se conformando com esta decisão, dela recorreu de agravo para o Tribunal da Relação de Évora o requerido, tendo-se aí, por acórdão de 15-5-2008, julgado improcedente o recurso, confirmando-se a decisão recorrida.
Novamente não se conformando com a decisão, dela recorreu o requerido para este Supremo Tribunal, recurso que foi admitido como agravo, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito devolutivo.
O recorrente alegou, tendo dessas alegações retirado as seguintes conclusões: 1ª- Ao não reconhecer a incompetência internacional do Tribunal Judicial de Vila Viçosa, para julgar a presente acção, deixando de decretar a legal e consequente absolvição da instância, o douto acórdão recorrido violou o disposto pelos artigos 1 °, "b", 2º, 3°, 7.° e 9°, do Regulamento (CE) 1347/2000, de 29 de Maio e violou, ainda, o disposto pelos artigos 8 nº 2, 10º, 15º e 17º, todos do Regulamento (CE) 2201/2003 de 27 de Novembro, assim como violou os artigos 105° e 288° nº 1, "a" do CPC.
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- Desconsiderou o douto acórdão recorrido que tanto o Regulamento (CE) 1347/200 de 29 de Maio, quanto o Regulamento (CE) 2201/2003 de 27 de Novembro, consagram a mesma e única solução jurídica: a da manutenção da competência do tribunal da residência habitual dos menores, anterior ao rapto internacional, para a apreciação de questões respeitantes ao poder paternal.
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- Em razão de ter o douto acórdão recorrido confundido, salvo o sempre o devido respeito, duas matérias distintas: a respeitante à decisão sobre o regresso imediato dos menores, ao abrigo da Convenção da Haia de 1980, Sobre os Aspectos Civis do Rapto Internacional de Crianças, com a que corresponde ao critério respeitante à fixação da competência internacional, para a discussão judicial do poder paternal, com a fixação judicial da sua residência, em sede de acção própria.
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- Por ter desconsiderado o jurídico sentido da expressão "regresso imediato", atribuindo a esta, por equívoco, o significado de "regresso", o douto acórdão recorrido acabou por tentar inutilmente, salvo sempre o devido respeito, equipará-la a uma decisão de guarda, no âmbito de uma acção própria de regulação do poder paternal.
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- Desconsiderando, por completo. que a competência internacional apenas se altera caso venha a ser proferia ."..uma decisão sobre a guarda...", que autorize a criança a passar a residir no outro Estado-Membro.
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- O facto de o Regulamento (CE) 1347/2000, de 29 de Maio, não ter previsto a sobreposição, desde logo, de uma decisão de regresso imediato, não afecta a competência para a acção de fundo, nem inibe que, por força de uma decisão de guarda, a residência legal dos menores continue a ser no Estado-Membro anterior ao rapto internacional, como inclusivamente já decorria do quanto disposto pelo seu artigo 15 nº 2, salvo sempre o devido respeito.
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- Não sendo possível estabelecer qualquer discussão jurídica a este respeito, nesta fase, por força do caso julgado, por já ter sido proferido pelo Venerando Tribunal da Relação de Évora, douto acórdão que reconheceu a decisão que regulou o poder paternal dos menores, em conformidade com o referido regulamento.
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- Por ocasião da instauração do presente processo, não apenas já havia sido reconhecida, na ordem interna, com seus legais efeitos, a douta decisão que regulou o poder paternal dos menores, colocando-os à guarda do pai, mantendo a residência destes em Itália, na casa de morada da família, como a recorrida não havia obtido qualquer decisão, mesmo cautelar ou provisória, que lhe tivesse atribuído a guarda dos menores.
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- Assim, ainda que não se pudesse reconhecer a incompetência internacional do Tribunal Judicial de Vila Viçosa, por violação do disposto pelos artigos 8° nº 2 e 10°, ambos do Regulamento 2201/2003, de 27 de Novembro, face ao rapto perpetrado pela recorrida, salvo sempre o devido respeito, por mero argumento, sempre se dirá que esta mesma incompetência decorreria da correcta aplicação, do quanto disposto pelo artigo 8° nº 1, deste mesmo regulamento.
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- Que deveria ter sido interpretado e aplicado, no douto acórdão recorrido, no sentido de respeitar-se os efeitos jurídicos do reconhecimento decretado, especialmente no que se refere à consideração da legal residência licita dos menores que, na data da instauração da presente, era em Itália, na casa de morada da família, por força da referida douta decisão judicial devidamente reconhecida, salvo sempre o devido respeito.
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- Mas ainda que assim não fosse e pudesse ser o Tribunal Judicial de Vila Viçosa considerado competente na ordem internacional, o que se admite apenas por hipótese de argumento, salvo sempre o devido respeito, ao permitir a alteração da reconhecida decisão de regulação do poder paternal, pelo próprio tribunal do Estado-Membro requerido, encarregado da sua execução, o douto acórdão recorrido violou o disposto pelos artigos 19°, 21° nº 1 e 24° n°3, do Regulamento (CE) 1347/2000, de 29 de Maio, assim como os artigos 26.°, 28°, nº 1 e 31° n° 3, do Regulamento (CE) 2201/2003. de 27 de Novembro.
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- Disposições que determinam o respeito pelo caso julgado, por parte do Tribunal do Estado-Membro requerido, encarregado da execução, que fica proibido de promover, "em caso algum", especialmente em sede de acção de alteração, qualquer exame ou alteração da sua adequação.
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- Sob pena de restarem frustrados os objectivos comunitários perseguidos pelos referidos regulamentos, a expressão "...em caso algum...", consignadas nos respectivos artigos antes referenciados, necessariamente alcançam qualquer tipo de invocação, mesmo que lhe seja emprestado carácter de "superveniência".
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- Porque a referenciada proibição de revisão quanto ao fundo, da douta decisão reconhecida, conjugada com a obrigação comunitária da sua imperativa execução, pelo tribunal do Estado-Membro requerido, impede perante este possa ser instaurada e discutida, acção específica de alteração da regulação do poder paternal, que no entanto não obsta, naturalmente, a adopção de medidas cautelares.
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- Sendo certo que no caso presente o próprio douto acórdão recorrido assumiu, expressamente, ter praticado a proibida revisão quanto ao fundo, sustentando, equivocadamente, salvo sempre o devido respeito, que esta pode ter assento mesmo em "factos anteriores", não tido como provados, no processo próprio, de regulação do poder paternal.
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- E por não ser a douta decisão que vier a ser proferida por este Venerando Supremo Tribunal de Justiça, sujeita a recurso, o recorrente requer, não obstante obrigatório, o reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias (cfr. artigos 68° e 234°, do Tratado CE), com pedido de aplicação da tramitação prejudicial urgente (tramitação acelerada), por tratar-se de processo respeitante ao poder paternal de menores, para que seja por este dada resposta, dentre outras questões que Vossas Excelências tenham por bem formular, às seguintes: "Proferida pelo tribunal do Estado-Membro requerido, uma douta decisão de reconhecimento de uma sentença de regulação do poder paternal, em conformidade com o disposto pelos arts. 15º, 21º e 24º, todos do Regulamento (CE) 1347/2000 de 24 de Maio, bem como já requerida a sua execução, a superveniência da entrada em vigor do Regulamento (CE) 2201/2003, de 27 de Novembro, fez com que esta "deixe de produzir os seus efeitos executórios", por ter sido proferida anteriormente a esta sentença de regulação, uma decisão de não regresso imediato dos menores, ao abrigo da Convenção de Haia de 1980, sobre os Aspectos Civis de Rapto Internacional de Crianças? "Para efeitos de competência dos tribunais de um Estado-Membro, em matéria de responsabilidade parental relativa a uma criança, no âmbito do Regulamento (CE) 2201/2003, de 27 de Novembro, a expressão "que resida habitualmente nesse Estado-Membro à data que o processo seja instaurado no tribunal ", consignada no nº 1 do seu artigo 8º, reporta-se a uma "residência de facto" da criança, ou reporta-se à sua residência legal juridicamente estabelecida, nomeadamente quando esta última decorre do reconhecimento de uma sentença que regulou o poder paternal e fixou a sua residência previamente reconhecida e declarada executória, na ordem jurídica do Estado-Membro requerido, nos termos do Regulamento 147/2000, de 19 de Maio, antes mesmo da instauração do processo que visa a alteração desta mesma sentença? "A proibição de revisão quanto ao fundo, em caso algum, e "em caso algum" estabelecida pelos arts. 19º e 24º nº 3 do Regulamento (CE) 1347/200 de 29 de Maio, assim como pelos arts. 26º e 31º nº 3 do Regulamento (CE) 2201/2003 de 27 de Novembro, não impede que o tribunal do Estado-Membro requerido possa vir a decretar a alteração da decisão, já reconhecida para cumprimento, com a justificação de que factos anteriores a esta mesma decisão, especialmente conflituantes com os nesta consignados, não foram levados ao conhecimento do julgador que proferiu a referida decisão, no processo próprio em que veio proferida...
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