Acórdão nº 08A3810 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 20 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelSALAZAR CASANOVA
Data da Resolução20 de Janeiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA, BB e CC intentaram acção declarativa com processo ordinário contra DD e EE (acção que veio a prosseguir apenas contra a primeira) pedindo a condenação dos RR a realizarem no locado e no prazo que o tribunal entender por conveniente todas as obras constantes do auto de vistoria realizado pela Câmara Municipal do Montijo em 10-7-2001 descritas no artigo 13.º da petição; e ainda sua condenação no pagamento aos AA de todos os prejuízos que lhes advenha desta situação de mora dos senhorios na realização das obras a liquidar em execução de sentença em virtude de não ser previsível o tempo que durará a presente acção; serem condenados a pagar uma sanção pecuniária compulsória no montante de 100 euros por cada dia de atraso na realização das obras determinadas ou em alternativa serem condenados a pagar aos AA a quantia de 54.333,42 euros acrescida de juros de mora à taxa de 7% desde a citação até integral pagamento.

  1. Alegaram os AA que são arrendatários de estabelecimento comercial destinado a tipografia desde 1-12-1976 sendo a renda inicial de 3.000$00 ( 14,96€) e a actual (à data de 6-2-2003) de 8.017$00 (39,99€).

  2. A câmara municipal do Montijo em 1991 efectuou uma vistoria ao local e, na sequência da vistoria, deliberou determinar a execução de obras no prazo de 30 dias a contar da notificação.

  3. Na sequência de nova vistoria realizada no ano de 2001 os senhorios foram notificados para realizarem obras no prazo de 60 dias.

  4. Por sua vez foi comunicado aos senhorios por carta de 29-5-2001 que, na sequência de fiscalização técnica à tipografia, foi ordenada a realização de obras no locado sob pena de encerramento de actividade.

  5. O custo máximo das obras constantes do auto de vistoria de 10-7-2001 foi fixado em 54.332,42€ acrescido de IVA, conforme deliberação de 19-6-1992 homologada, o que foi comunicado à arrendatária.

  6. Face à não realização pelos senhorios de quaisquer obras de conservação de 8 em 8 anos e à interpelação que lhes foi feita, atentos os prejuízos que da situação decorrem para os AA arrendatários, concluem os AA que se justifica a condenação da Ré nos termos pedidos.

  7. Alegou a ré que a consequência da não realização de obras pelo senhorio é a da sua realização pela câmara municipal, podendo o arrendatário, nos termos do artigo 16.º do R.A.U, executar ele próprio as obras que serão reembolsadas por dedução de 70% do valor da renda.

  8. Procedeu-se a julgamento e a ré foi absolvida do pedido, considerando o tribunal que as obras em causa devem ser qualificadas legalmente como obras de conservação extraordinária que estão a cargo do senhorio por ter sido notificado pela câmara municipal para as realizar, traduzindo-se as obras em causa numa verdadeira reconstrução parcial do imóvel, constituindo abuso do direito exigir-se obras no valor de 54.332,42€ quando o rendimento líquido anual do prédio é de 478,98€.

  9. O Tribunal da Relação, ponderando que desde a celebração do contrato de arrendamento não foram realizadas quaisquer obras, apesar das insistências da inquilina e das notificações camarárias, considerou evidente que, não fora essa atitude do senhorio, as obras não teriam hoje o custo que foi orçamentado.

  10. Por isso, deixando o senhorio, intencional ou negligentemente, degradar o local arrendado, não pode considerar-se abusivo e contrário à boa fé exigir-lhe a realização de obras cujo custo exceda largamente , no ano da sua realização, dois terços do rendimento líquido desse mesmo ano.

  11. Foi, assim , revogada a decisão recorrida a proferida condenação da ré nos seguintes termos: - Realização, no prazo de 60 dias, das obras constantes do auto de vistoria realizado pela Câmara Municipal do Montijo em 10-7-2001.

    - Pagamento pela ré aos AA dos prejuízos que advenham da mora na realização das obras, a liquidar posteriormente.

    - Condenação da ré no montante de 25€ por cada dia de atraso na realização das obras determinadas, a título de sanção pecuniária compulsória.

  12. Nas suas alegações de recurso para este Supremo Tribunal de Justiça, os recorrentes, porque nem a câmara nem o inquilino usaram da faculdade de procederem eles próprios às obras, sustentam que respondem pela dívida apenas as rendas nos termos do artigo 17.º/3 do R.A.U.

  13. Se os RR procedessem a obras, prosseguem os recorrentes, à luz do R.A.U., considerado que o aumento de renda poderia ir até 402,20€/mês, ainda assim demorariam 135 meses a recuperar sem juros o investimento feito no locado; de acordo com o N.R.A.U., para o valor patrimonial de 35.700 euros, a renda mensal a obter cifra-se em 119,00 €, o que equivale a 456 meses para recuperação do investimento.

  14. Por isso, é claramente ofensivo da boa fé, conforme jurisprudência indicadas, impor aos senhorios a realização de obras de tão elevado e desproporcionado montante face à renda mensal suportada pelos inquilinos.

  15. Exigir obras no montante de 50.000 euros para beneficiar um prédio cuja renda é de 39,99€ mensais está para além de todos os limites do sacrifício.

    Factos provados: 1- Por escritura de trespasse e arrendamento lavrada em 21 de Dezembro de 1976 no cartório notarial do Montijo, exarada a fls. 88-v.º a fls. 90-v.º do Livro B-74, FF e mulher GG trespassaram a HH, BB, CC, AA, II e JJ o estabelecimento de oficina de tipografia instalado no R/C com o n.º ... para a Av. ... e com os nºs ... e ... da freguesia do mesmo nome no Montijo, inscrito na respectiva matriz predial urbana da freguesia e concelho do Montijo sob o artigo 2345 e no R/C destinado a armazém com saída para o Beco particular da Travessa ... no Montijo o qual por sua vez está inscrito na respectiva matriz predial urbana da freguesia do Montijo sob o artigo 1076º (A).

    2- Na mencionada escritura o então proprietário do prédio, LL, arrendou aos então trespassários os locais onde está instalada a oficina trespassada, pelo prazo de um ano, com início em 1-12-1976 (B).

    3- Pela renda de 3.000$00 que actualmente é de 8.017$00 (39,99€) paga adiantadamente no primeiro dia útil do mês anterior àquele a que a renda disser respeito em casa do senhorio ou de quem o representar no Montijo (C).

    4- Os locais arrendados destinam-se a oficina de tipografia (D).

    5- É senhoria do locado a ora ré DD (E).

    6- E no mesmo labora a tipografia G... (F).

    7- Apesar de à data da celebração do contrato se encontrar o locado em bom estado de conservação, o então senhorio e os ora RR não procederam de 8 em 8 anos a obras de conservação no prédio, aliás, desde a...

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