Acórdão nº 08S2586 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelBRAVO SERRA
Data da Resolução14 de Janeiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)
  1. AA intentou no 5º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa e contra BB, Ldª, acção de processo comum, peticionando a condenação da ré a: - - reintegrá-lo, sob a cominação de uma sanção pecuniária compulsória de € 500; - pagar-lhe uma indemnização por antiguidade até à data da sentença, correspondente ao dobro da que normalmente caberia, face ao disposto no nº 2 do artº 24º do Decreto-Lei nº 215-B/75, de 30 de Abril, computando o valor da já vencida em € 77.617,28; - pagar-lhe todas as remunerações vencidas e vincendas desde a data do despedimento e até à data da sentença, cifrando-se as vencidas em € 2.300,66; - pagar-lhe juros até efectivo pagamento.

    Alegou, para tanto e em súmula, que ele, autor, que é dirigente do CESP - Sindicato dos Trabalhadores de Comércio, Escritórios e Serviços de Portugal, trabalhou sob as ordens e direcção da ré desde 4 de Março de 1985 até 19 de Dezembro 2003, tendo a categoria de adjunto técnico-administrativo, vindo, nesta última data, a ser despedido pela ré na sequência de processo disciplinar, sendo que inexistia justa causa para tanto.

    Contestou a ré, defendendo, em síntese, que a sanção de despedimento imposta ao réu se ancorou em justa causa.

    Prosseguindo os autos seus termos, e após o autor ter optado pela «indemnização por antiguidade», veio, em 4 de Janeiro de 2007, a ser proferida sentença que, julgando a acção procedente, condenou a ré, após rectificação do que anteriormente se encontrava nela escrito, a pagar ao autor € 175.932,50 e juros desde a citação até integral pagamento.

    Inconformada, apelou a ré para o Tribunal da Relação de Lisboa, impugnando ainda a matéria de facto.

    Fê-lo com êxito, já que aquele Tribunal de 2ª instância, por acórdão de 9 de Abril de 2008, após alterar a redacção de um item da matéria de facto dada por provada na 1ª instância, revogou a sentença recorrida e absolveu a ré dos pedidos contra si formulados.

  2. Irresignado com esse aresto, vem o autor dele pedir revista, rematando a alegação que produziu com a seguinte corte conclusiva: - "1. O autor não cometeu as infracções de que vem acusado.

  3. Para compreender o contexto do presente despedimento, torna-se necessário chamar à colação o circunstancialismo que lhe subjaz.

  4. À data dos factos o autor era dirigente sindical e já tinha sido alvo dum despedimento com alegada justa causa.

  5. O (primeiro) despedimento do autor foi declarado ilícito por sentença transitada em julgado.

  6. O acórdão do STJ (leia-se, do primeiro despedimento), e, de algum modo também o acórdão da Relação que absolveu o autor dos crimes de injúrias e de difamação, chamam a atenção para o nível de relação entre as partes se dever à actividade sindical exercida pelo autor.

  7. Ao retomar o serviço, no dia 4.4.2003, o autor é confrontado, por duas vezes, com novas regras que não podem deixar de ser tipificadas como vexatórias e discriminatórias relativamente ao autor.

  8. Vexatórias porque têm apenas como fim mostrar quem manda e aniquilar a força e a coragem de quem ousa zelar pela aplicação dos direitos dos trabalhadores, incluindo os seus.

  9. Discriminatórias porque só ao autor são exigidas.

  10. Neste contexto, tais ordens não podem deixar de ser consideradas ilícitas, e, como tal, a sua não observância não poderia nunca constituir infracção disciplinar.

  11. Ainda assim, o ora Recorrido cumpriu, sempre e dentro do possível, as novas regras, tendo apresentado os registos dos Kms efectuados.

  12. Como cumpriu a proibição de estacionar o automóvel no parque e garagem da ré.

  13. Os condicionalismos impostos pela ré na utilização do automóvel, apenas no trajecto trabalho/casa e casa/trabalho são incompatíveis com a qualidade de trabalhador estudante e com o exercício da actividade sindical.

  14. O autor foi obrigado a estacionar o automóvel perto das instalações da ré.

  15. Não abandonou o automóvel, propriedade da ré.

  16. A questão disciplinar ‘chamadas telefónicas', apreciada em sede de recurso da decisão que considerou o primeiro despedimento ilícito, também não teve o acolhimento pretendido pela ré, e não vemos razão para que assim não seja.

    O douto acórdão recorrido violou a al. c) do art.º 429º do Código do Trabalho.

    " Respondeu a ré à alegação do autor, sustentando o acerto da decisão impugnada.

    A Ex.ma Magistrada do Ministério Público neste Supremo exarou «parecer» no qual veio a propugnar pela improcedência da revista.

    Notificado esse «parecer» às partes, sobre ele apenas se pronunciou o autor, que continuou a sustentar que o seu despedimento não se suportou em justa causa.

    Corridos os «vistos», cumpre decidir.

    II 1.

    É a seguinte a matéria de facto alcançada pelo acórdão impugnado e que, por aqui se não colocar qualquer das situações aludidas no nº 2 do artº 722º do Código de Processo Civil, tem de ser acatada por este Supremo: - - 1) o autor foi admitido na ré, para trabalhar por conta desta e sob as suas ordens e direcção em 4 de Março de 1985; - 2) tinha a categoria profissional de adjunto técnico-administrativo e auferia a remuneração base mensal de € 2.2042,56, acrescida de € 149,64 [por mês], a título de subsídio de combustível [ ], e de subsídio de alimentação no valor de € 4,93 por dia de trabalho efectivamente prestado, - 3) o autor, conforme declaração do CESP - Sindicato dos Trabalhadores do Comércio e Serviços de Portugal datada de 31 de Março de 2004, era, na data da mesma declaração, dirigente deste mesmo Sindicato desde Maio de 2002; - 4) o autor foi despedido com invocação de justa causa, na sequência de um processo disciplinar, precedido de um processo prévio de inquérito, processos que constituem os documentos números 2 e 3 [juntos] com a contestação e que aqui se dão por integralmente reproduzidos; - 5) a ré comunicou ao autor a instauração do processo disciplinar por carta registada com aviso de recepção, enviada em 7 de Julho de 2003 e por este recebida no dia seguinte; - 6) essa carta continha, em anexo, a nota de culpa, fazendo referência expressa, designadamente, à intenção da ré de proceder ao despedimento do autor com justa causa, à suspensão do exercício das suas funções, sem perda de retribuição, a partir do dia 18 de Agosto de 2003, e à possibilidade de apresentação de defesa e de consulta do processo; - 7) de todo esse expediente foi enviada, nesse mesmo dia, também por carta registada com aviso de recepção, igualmente recebida no dia seguinte, cópia integral ao sindicato de que o autor era, à data, dirigente sindical, o CESP - Sindicato dos Trabalhadores de Escritórios, Comércio e Serviços de Portugal; - 8) o autor apresentou resposta escrita à nota de culpa, com dois documentos, a qual foi recebida em 15 de Julho de 2003; - 9) não tendo nela solicitado a produção de qualquer outra diligência probatória, nem o tendo feito posteriormente; - 10) terminada a instrução do processo disciplinar, foi, do mesmo, em 13 de Novembro de 2003, entregue cópia integral ao CESP, para efeitos de emissão do respectivo parecer, o que veio a acontecer em 19 de Novembro de 2003; - 11) o instrutor concedeu ao autor a possibilidade de se pronunciar sobre todos os documentos e elementos juntos ao processo disciplinar após a sua resposta à nota de culpa, o que ele não fez; - 12) o instrutor do processo disciplinar elaborou o relatório final e, em 18 de Dezembro de 2003, foi, então, tomada pela ré a decisão de despedimento do autor, com invocação de justa causa; - 13) decisão essa com efeitos [reportados] a 20 de Dezembro de 2003, [a qual], juntamente com o relatório final, foi capeada por carta entregue ao autor em 19 de Dezembro de 2003; - 14) e entregue ao CESP, por cópia integral, nesse mesmo dia; - 15) o autor era dirigente sindical quando foi despedido com invocação de justa causa na sequência de processo disciplinar que lhe foi instaurado pela ré em 21 de Maio de 2002, concluído em 8 de Agosto de 2002; - 16) tal despedimento foi judicialmente suspenso, providência que veio, aliás, a ser seguida por sentença que declarou a ilicitude do despedimento; - 17) em consequência (da decisão da providência cautelar), o autor foi reintegrado nas suas funções na ré em 4 de Abril de 2003; - 18) no próprio dia (4 de Abril de 2003) em que o autor retomou o serviço por via da decisão judicial que deferiu a providência cautelar de suspensão do despedimento (o primeiro despedimento), [em reunião tida] entre o autor e o director técnico, RL, foi-lhe comunicado que a utilização do automóvel de serviço só por tolerância da empresa poderia ser utilizado no percurso casa trabalho e trabalho casa; - 19) em meados de 1999, a ré propôs apenas ao autor, ao adjunto do director financeiro e à tesoureira, a troca do automóvel ligeiro de passageiros por um outro de mercadorias, mantendo o pagamento de todas as despesas, ou o pagamento de uma importância correspondente a 60 km vezes 22 dias vezes 11 meses; - 20) os trabalhadores em causa, à excepção do autor, uma vez que o automóvel de mercadorias os impedia de transportar a família, e por morarem em Lisboa, aceitaram o pagamento do dito subsídio; - 21) o autor, que mora em Fernão Ferro, recusou as propostas apresentadas, mas foi-lhe, pela ré, imposta a troca da viatura que tinha até então - automóvel ligeiro de passageiros - por uma outra, de mercadorias; - 22) em 29 de Setembro de 1999, foi atribuído ao autor, a partir de Outubro de mesmo ano, um subsídio mensal de transporte de Esc. 30.000$00, em lugar da atribuição do cartão Shell, conforme consta do documento nº 4 [junto] com a petição inicial, que aqui se dá por reproduzido; - 23) o autor, até 4 de Abril de...

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