Acórdão nº 08S2469 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelPINTO HESPANHOL
Data da Resolução14 de Janeiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

I 1.

Em 13 de Junho de 2006, no Tribunal do Trabalho do Porto, 2.º Juízo, AA, BB, CC, DD, EE, FF, GG, HH, II, JJ, KK, LL, MM, NN, OO, PP, QQ, RR, SS, TT, UU, VV, XX, ZZ, AAA, BBB, CCC, DDD, EEE, EEE, GGG, HHH,III, JJJ, KKK, LLL, MMM, NNN, OOO, PPP, QQQ, RRR, SSS, TTT, UUU, VVV, XXX, ZZZ, AAAA, BBBB, CCCC, DDDD, EEEE, FFFF, GGGG, HHHH, IIII, JJJJ, KKKK, LLLL, MMMM, NNNN e OOOO instauraram a presente acção emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra SANTA CASA DA MISERICÓRDIA DO PORTO, pedindo a condenação da ré (i) a reconhecer que, por cláusula dos seus contratos de trabalho, «as respectivas remunerações não podem ser inferiores às remunerações dos enfermeiros vinculados à função pública, em cada momento em vigor e em idênticas condições, acrescidas de 20%», e que, «para aqueles efeitos, a progressão na carreira da função pública se entende como feita segundo módulos de três anos, na progressão de índices fixados para a carreira de enfermagem, independentemente das categorias fixadas naquela carreira», (ii) a pagar-lhes, a título de diferenças salariais, os valores liquidados na petição inicial, com referência a 31 de Dezembro de 2005, (iii) a pagar-lhes as diferenças salariais relativas às remunerações a que cada um tiver direito, vencidas posteriormente a 1 de Janeiro de 2006 e até à efectiva correcção da remuneração, conforme o pedido, (iv) a pagar-lhes as diferenças salariais relativas a prestações complementares vencidas, desde Julho de 1998 até à efectiva correcção da remuneração, conforme o pedido, e que se vierem a liquidar, no decurso da acção ou como incidente a deduzir após o trânsito em julgado da sentença que vier a ser proferida, (v) a pagar-lhes os juros vencidos nos termos liquidados na petição inicial e os juros vincendos, desde 1 de Janeiro de 2006 até efectivo e integral pagamento.

Alegaram, em suma, que foram admitidos ao serviço da ré para exercerem, sob as suas ordens, direcção e fiscalização, funções de enfermagem, mediante uma remuneração composta por uma parte fixa, correspondente, em cada momento, à atribuída aos enfermeiros vinculados à função pública, acrescida de 20%, e por uma parte variável calculada em função do respectivo nível de produtividade, tendo-lhes sido garantido «que as remunerações a que teriam direito acompanhariam as que aufeririam se tivessem ingressado ou se se mantivessem na Função Pública, acrescidas de 20%, em função das carreiras que, em cada momento, estivessem em vigor na Função Pública e da evolução que normalmente delas resultasse, designadamente progredindo segundo módulos de três anos, na escala de índices fixada nessas carreiras e independentemente das carreiras aí previstas», porque «não se podendo considerar a evolução previsível que teriam na Função Pública através de concurso, a transição para o escalão imediatamente seguinte da categoria imediata se faria após três anos de permanência no último escalão da categoria anterior».

Porém, tais condições só foram observadas pela ré até à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 412/98, de 30 de Dezembro, que introduziu alterações no regime legal da carreira de enfermagem na função pública, data a partir da qual a ré deixou de respeitar a remuneração mínima contratualmente garantida.

A ré contestou, por excepção, alegando a prescrição dos créditos dos autores XX e DDD, e aduzindo, em impugnação, que é uma instituição particular de solidariedade social, competindo a definição da política relativa à contratação de pessoal aos seus órgãos de gestão, designadamente à Mesa Administrativa, e que este órgão entendeu, como medida de motivação dos candidatos aos lugares de enfermagem, apresentar-lhes uma proposta de trabalho de um valor superior em 20% ao vencimento que era praticado na função pública para profissionais da mesma categoria, proposta esta que foi efectuada no período negocial e se destinou, exclusivamente, a definir um valor remuneratório a ser pago aos candidatos, caso o aceitassem no início da carreira, nunca tendo sido prometido aos autores que essa regra seria mantida eternamente e que as progressões na carreira acompanhariam as regras definidas, em cada momento, na função pública.

Subsidiariamente, defendeu que o prémio de produtividade, criado em 1995, assumiu, a partir de Janeiro de 1997, o carácter de remuneração, passando a ser pago 14 vezes por ano, termos em que a retribuição global dos autores foi sempre superior em 20% (e até em percentagens superiores) à praticada na função pública.

Os autores responderam à excepção referida, alegando que a ré reconheceu, por forma expressa, ainda que não formalizada, o direito que XX e DDD reclamam na acção, reconhecimento esse que interromperia a prescrição, nos termos do artigo 325.º do Código Civil.

Entretanto, as autoras BB e VV desistiram dos pedidos, desistências que foram homologadas.

Realizado julgamento, foi proferida sentença que julgou a acção procedente, com excepção dos direitos julgados prescritos, respeitantes aos autores XX e DDD, condenando a ré a: «1. Reconhecer que, por cláusula dos contratos individuais dos AA., - as respectivas remunerações não podem ser inferiores às remunerações dos enfermeiros vinculados à função pública, em cada momento em vigor e em idênticas condições, acrescidas de 20%; - para aqueles efeitos, a progressão na carreira da função pública se entende como feita segundo módulos de 3 anos, na progressão de índices fixados para a carreira de enfermagem, independentemente das categorias fixadas naquela carreira; 2. Pagar aos AA.: AA, a quantia de € 23.618,85; CC, € 3.451,35; DD, € 25.809,76; EE, € 5.790,83; FF, € 9.347,08; GG, € 11.742,87; HH, € 12.677,19; II, € 4.758,49; JJ, € 11.041,27; KK, € 12.799,52; LL, € 15.114,66; MM, € 8.229,02; NN, € 4.140,68; OO, € 4.288,18; PP, € 3.268,04; QQ, € 7.756,83; RR, € 3.451,35; SS, € 6.731,03; TT, € 3.953,99; UU, € 11.883,55; ZZ, € 4.249,27; AAA, € 23.618,85; BBB, € 33.416,43; CCC, € 4.182,39; EEE, € 13.695,63; FFF, € 6.540,85; GGG, € 32.177,26; HHH, € 3.794,38; III, € 7.657,90; JJJ, € 23.618,85; KKK, € 17.542,41; LLL, € 16.874,78; MMM, € 17.859,25; NNN, € 14.359,91; OOO, € 5.503,19; PPP, € 23.618,85; QQQ, € 4.958,26; RRR, € 7.657,90; SSS, € 13.760,66; TTT, € 13.020,40; UUU, € 14.092,52; VVV, € 5.998,59; XXX, € 16.949,59; ZZZ, € 9.451,36; AAAA, € 2.140,65; BBBB, € 45.782,00; CCCC, € 12.201,61; DDDD, € 47.105,09; EEEE, € 13.094,94; FFFF, € 8.827,10; GGGG, € 1.481,16; HHHH, € 15.163,98; IIII, € 16.842,27; JJJJ, € 12.441,42; KKKK, € 18.103,15; LLLL, € 4.182,39; MMMM € 14.981,77; NNNN, € 5.826,63; e OOOO, € 14.799,54, a título de diferenças salariais liquidadas com referência a 31 de Dezembro de 2005; 3.Pagar aos AA. as diferenças salariais relativas às remunerações a que cada um dos AA. tiver direito, vencidas posteriormente a 1 de Janeiro de 2006 e até à efectiva correcção da remuneração [por lapso manifesto, a sequência da numeração da parte dispositiva da sentença passa do n.º 3 para o n.º 5]; 5. Pagar aos AA. os juros vencidos sobre as quantias referidas e os vincendos desde 1 de Janeiro de 2006 até efectivo e integral pagamento.» 2.

Inconformada, a ré apelou para o Tribunal da Relação do Porto, arguindo as nulidades da sentença estabelecidas nas alíneas c) e d) do n.º 1 do artigo 668.º do Código de Processo Civil, impugnando a decisão do tribunal de 1.ª instância sobre a matéria de facto e sustentando que não assumiu, contratualmente, o compromisso de efectuar um qualquer paralelismo com o vencimento praticado na função pública, com o acréscimo de 20%, ao longo de toda a vida dos contratos de trabalho, e que não garantiu aos autores que os respectivos vencimentos acompanhariam, sempre e eternamente, os vencimentos fixados para a função pública, com o dito acréscimo.

No exame preliminar dos autos, a Ex.ma Juíza Desembargadora Relatora não admitiu o recurso de apelação em relação às autoras AAAA e GGGG, que pediram, respectivamente, a condenação da ré em € 2.600,67 e € 1.783,98, uma vez que, «sendo o valor do pedido de cada uma das citadas autoras muito inferior ao valor da alçada do Tribunal de 1.ª instância (€ 3.740,98), a sentença é irrecorrível relativamente a elas».

As partes, notificadas desse despacho, não deduziram qualquer impugnação.

Apreciando o recurso, o Tribunal da Relação do Porto decidiu não conhecer das nulidades da sentença, por não terem sido arguidas, expressa e separadamente, no requerimento de interposição de recurso, manter o teor das alíneas E, L, K, U e V da decisão da matéria de facto, negar provimento ao recurso e confirmar a sentença.

É contra esta decisão que a ré agora se insurge, mediante recurso de revista, em que formula as conclusões que se passam a transcrever: «1. A decisão proferida e mantida pelo Tribunal da Relação não tem qualquer fundamento ou correspondência com a matéria de facto dada como provada, não aplicando, por esse motivo, a melhor solução jurídica à questão trazida a pleito; os Tribunais Recorridos efectuaram uma desacertada interpretação da situação de facto e de direito, proferindo uma decisão ao arrepio da Lei aplicável.

  1. Nos presentes autos, os Autores, em coligação, não efectuaram apenas um único pedido; cada um e individualmente, não pediram ao Tribunal que a Ré apenas fosse condenada a pagar-lhes, individualmente, um determinado valor, mas sim ...: a) Que declarasse que, por cláusula dos contratos de trabalho individuais celebrados, as respectivas remunerações não poderiam ser inferiores às remunerações dos enfermeiros vinculados à função pública, em cada momento em vigor e em idênticas condições, acrescidas de 20%; b) Que, para aqueles efeitos, a progressão na carreira de enfermagem se entendesse como efectuada segundo módulos de 3 anos, na progressão de índices fixados para a carreira de enfermagem da função pública, independentemente das categorias fixadas naquela carreira; c) E, por último, que a Ré/Recorrente fosse condenada a pagar as quantias que, em...

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