Acórdão nº 10/12.5SFPRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Maio de 2014

Magistrado ResponsávelHELENA MONIZ
Data da Resolução22 de Maio de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, em conferência, no Supremo Tribunal de Justiça: I Relatório 1.

Em primeira instância, a arguida M, identificada nos autos, e julgada em tribunal coletivo na 2.ª Vara Criminal do ..., no âmbito do processo n.º 10/12. 5SFPRT, foi condenada pela prática, em co-autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art. 21.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 15/03, de 22 de janeiro, com referência à tabela I-A, I-B e I-C, na pena de 4 (quatro) anos e 9 (nove) meses de prisão, a qual se suspendeu por um idêntico período, sujeito ao regime de prova, sob condição de se submeter a acompanhamento do IRS que lhe deverá delinear um projeto para a sua inserção na vida ativa (cf. fls. 769).

2.

Inconformado com a decisão, o magistrado do Ministério Público interpôs recurso alegando, em súmula, quanto à arguida que não era merecedora de um juízo de prognose favorável, nos termos do art. 50.º, n.º 1 do Código Penal (doravante, CP), pois já tinha anteriormente praticado um crime da mesma espécie, no qual tinha sido condenada em pena de prisão efetiva e, todavia, praticou novamente o mesmo ilícito, o que permitia concluir que as finalidades de prevenção geral e especial não se encontram asseguradas com a aplicação daquela pena de substituição.

3.

Posição a que aderiu a Procuradora-Geral Adjunta no Tribunal da Relação do ..., no parecer n.º 109/2013, a fls. 847 e ss.

4.

Em sede de recurso, o Tribunal da Relação do Porto, por acórdão de 18 de setembro de 2013 (fls. 883 e ss), deliberou condenar a arguida pela prática, em co-autoria material, de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo artigo 21.º, da Lei n.º 15/93, de 22/01, com referência à tabela I-A, I-B e I-C, na pena de prisão de 4 (quatro) anos e 9 (nove) meses efetiva.

5.

Desta decisão interpôs a arguida recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, concluindo que: «

  1. Andou mal, o Tribunal a quo, na consideração da questão em causa e, mal assim, na decisão pela não aplicação do art. 50.° do Código Penal, na suspensão da pena de prisão de 4 anos e 9 meses aplicada à Arguida.

  2. O presente recurso, funda-se na possibilidade de ao Recorrente ser aplicado a suspensão da pena aplicada por estarem preenchidos os pressupostos do art. 50.° do C.P .

  3. As razões pelas quais foi decidido que a pena não poderia ser suspensa na sua execução, foi alicerçada no passado da arguida, nomeadamente no crime de igual natureza em que foi condenada, em 2003, por factos ocorridos no ano 2000.

  4. Conforme resulta do acórdão proferido em 1.ª Instância a existência de apoio familiar e o desempenho do papel de mãe parecem constituir-se como fatores favoráveis, que se a pena concretamente aplicada o permitir, consideramos que a arguida reúne condições para a execução de uma medida na comunidade, sendo fundamental que a mesma diligencie no sentido da sua inserção profissional.

  5. De igual, ainda. a arguida é mãe de duas filhas de tenra idade, 1 e 3 anos, e a ameaça do afastamento das mesmas e possível perda do poder parental constituem um fator potenciador da reabilitação da arguida.

  6. Não há noticia de que a Arguida se tenha envolvido novamente neste, ou em qualquer outro tipo, de atividade ilícita.

  7. O relatório social deixa uma réstia de esperança na ressocialização da Arguida, pelo que se deve explorar essa situação, H) Em todo o caso parece-nos e não deve ser desconsiderado que já decorreu cerca de 1 ano e meio desde a prática dos factos que deram origem a este processo e hoje.

  8. Sendo certo que este tempo é muito importante para a averiguação da consciencialização dos atas praticados, bem como uma antecâmara do que pode acontecer no futuro.

  9. De onde resulta que a simples ameaça da prisão parece ter surtido o efeito prescrito pelo art. 50.°, realizando as finalidades da punição.

  10. Pelo que deve ser considerado e feito um juízo de prognose favorável à arguida e ser suspensa a execução da pena a que condenada.

  11. Face aos fins de pena, e ao tempo que o Arguido já cumpriu preventivamente, a função de punição preparando-o para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável, sem cometer crimes e ressocializadora já se encontram preenchidos.» 6.

O recurso interposto pela recorrente não foi admitido, por despacho de 6 de novembro de 2013, do Tribunal da Relação do ... — «O recente acórdão proferido pelo Pleno das Secções Criminais do S.T.J. em 9 de outubro de 2013 fixou a seguinte jurisprudência: "Da conjugação das normas do artigo 400.° alíneas e) e f) e artigo 432.° n,? 1 alo c), ambos do C.P.Penal, na redacção da Lei n." 48/2007, de 29/8, não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdão da Relação que, revogando a suspensão de execução da pena de prisão decidida em 1 a instância, aplica ao arguido pena não superior a 5 anos de prisão".

O recurso interposto pela arguida M a fls. 919 ss. está nas exatas condições do caso decidido pelo S.T.J.

Assim, em acatamento de tal jurisprudência uniformizadora, decido rejeitar o recurso em causa.» 7.

Inconformada, a arguida interpôs recurso deste despacho para o Tribunal Constitucional, para que fosse apreciada a inconstitucionalidade da norma constante do acórdão de uniformização de jurisprudência, de 9 de outubro de 2013, fundamentando o pedido com base no acórdão n.º 324/2013, do plenário do Tribunal Constitucional.

8.

O Tribunal Constitucional nestes autos, por decisão sumária n.º 45/2014, de 15 janeiro de 2014, decidiu «

  1. Julgar inconstitucional a norma resultante da conjugação dos preceitos do artigo 400.° alíneas e) e j) e artigo 432.° n." 1 alínea c), ambos do Código de Processo Penal, na redação da Lei n." 48/2007, de 29 de Agosto, no sentido de que não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de acórdão da Relação que, revogando a suspensão de execução da pena de prisão decidida em I." instância, aplica ao arguido pena não superior a 5 anos de prisão; b) conceder provimento ao recurso, revogando-se a decisão recorrida que deve ser reformada em conformidade com este juízo de inconstitucionalidade.» 9.

Em cumprimento desta decisão foi o recurso admitido, e a Procuradora-Geral Adjunta, junto do Tribunal da Relação do ..., respondeu concluindo que: « 1. Por força do disposto nos arts. 50.°, n.º 1, e 40.°, n.º 1, do Cód. Penal, são as exigências de prevenção geral e especial que, no caso concreto, se fazem sentir que determinam a suspensão da execução da pena de prisão.

2. Atentos os antecedentes criminais da arguida e o seu modo de vida, o Tribunal não conseguiu fazer um juízo de prognose favorável, no sentido de que, uma vez em liberdade, não voltaria a cometer outros crimes, nomeadamente o de tráfico de estupefacientes, o que é de todo justificado pelo facto de a mesma já ter sofrido uma condenação em pena de prisão efectiva pela prática de crime idêntico.

3. Por outro lado, são muito elevadas as exigências de prevenção geral, as quais não se satisfazem com a pena de suspensão da execução da pena de prisão, já que, face à matéria de facto dada como provada, não se verificam quaisquer razões ponderosas que diminuam a ilicitude da conduta da arguida e as necessidades de reprovação e prevenção do crime.

4. A suspensão da execução da pena de prisão não satisfaz, pois, nem as exigências de prevenção especial, nem as exigências de prevenção geral que, no caso, se fazem sentir, pelo que o douto acórdão recorrido, ao não decretar a suspensão da execução da pena de 4 anos e 9 meses de prisão em que a arguida foi condenada, pela prática de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21°, n." 1, do DL n." 15/93, de 22 de Janeiro, com referência às tabelas I-A, I-B e I-C, não violou o disposto no art. 50°, n.? 1, do Cód. Penal.» 10.

Subidos os autos ao Supremo Tribunal de Justiça e colhidos os vistos do MP, este Tribunal, por decisão sumária, rejeitou a interposição do recurso, por força do art. 417.º, n.º 6, al. b) do Código de Processo Penal (doravante, CPP), com fundamento de que a decisão de 1.ª instância era posterior à entrada em vigor da Lei n.º 20/2103, de 21 de fevereiro, por ter considerado que aquela decisão teria sido proferida a 14 de abril de 2013.

11.

Desta decisão sumária pediu a requerente aclaração, com base no lapso manifesto de aquela decisão se ter baseado na data de 14 de abril de 2014 como sendo a da prolação do acórdão de 1.ª instância, e reclamação, para a conferência, entendendo que a decisão se deveria ter baseado na redação dada ao CPP pela Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, e não com base na redação dada pela Lei nº 20/2013, de 21 de fevereiro.

12.

Respondeu, em súmula, a Procuradora-Geral Adjunta no Supremo Tribunal de Justiça considerando que, tendo havido manifesto lapso na data tida como sendo a da prolação do acórdão de 1.ª instância, a admissibilidade da interposição do recurso deveria ser avaliada à luz da redação dada ao CPP pela Lei n.º 48/2007, de 29 de agosto, e o recurso admitido por força da decisão sumária n.º 45/2014 do Tribunal Constitucional, já transitada em julgada.

13.

Colhidos os vistos em simultâneo, o processo foi presente à conferência para decisão.

II Fundamentação 1.

No acórdão de 1.ª instância consta a data de 14/04/2013 (cf. fls. 771), todavia retificada a fls. 772, onde se diz expressamente que “verifica-se agora que a folhas 43 do acórdão se encontra a data de 14/04/2013 quando deveria ser 14/02/2013, pelo que ordena a sua correção. Notifique.” Constitui um lapso manifesto do qual decorreu uma qualificação diversa daquela que teria ocorrido com a consideração da data de prolação do acórdão de 12 de fevereiro de 2014.

Com efeito, sabendo que o momento relevante para a interposição de recurso é o momento da publicação da sentença de 1.ª instância, e que a lei que regula a recorribilidade de uma decisão é a lei que está em vigor no momento em que a 1.ª instância tenha decidido (a não ser no caso em que a lei posterior seja mais favorável ao arguido), então, nos presentes autos, a...

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