Acórdão nº 413/06.4TBBAO.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Junho de 2014

Magistrado ResponsávelAMARAL FERREIRA
Data da Resolução26 de Junho de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

TRPorto.

Apelação nº 413/06.4TBBAO.P1 - 2014.

Relator: Amaral Ferreira (876).

1º Adj: Des. Deolinda Varão.

2º Adj: Des. Freitas Vieira.

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: I - RELATÓRIO.

  1. Junta de Freguesia …, do concelho de Baião, instaurou, no Tribunal Judicial desta localidade, contra B… e C…, acção declarativa, com forma de processo sumário, pedindo se declare extinta, por desnecessidade, a servidão de passagem que impende sobre o prédio da A. inscrito na matriz predial urbana da freguesia … sob o artº 1299º, melhor identificado no artigo 4º da petição inicial, a favor do prédio das RR., inscrito na matriz predial urbana da referida freguesia sob o artº 2120º, e melhor identificado no artigo 5º do mencionado articulado, e que se condenem as RR. a abster-se de passar sobre o prédio da A.

    Alega, em síntese, que é dona do prédio onerado com a servidão de passagem a favor do prédio das RR., prédios que são confinantes, confrontando ambos com a via pública, e que a servidão de passagem, que foi reconhecida judicialmente por sentença de 14/11/2005, transitada em julgado, era feita a favor do logradouro do prédio das RR., através das escadas exteriores que dão acesso ao prédio da A. até uma abertura que existia no muro de demarcação de ambos os prédios, abertura em que existia um portão e que tinha sido tapada pela A. em 2002; as RR. procederam a alterações no seu prédio, em virtude das quais deixou de fazer sentido a manutenção da passagem, pois o prédio das RR. têm três acessos directos à rua, sendo dois a pé e um de carro; o acesso que era efectuado pelo prédio da A. destinava-se a aceder a um quintal com árvores de fruto e outros, que detinha autonomia em relação à casa, que foi destruído e transformado em logradouro e anexado à habitação, onde veio a ser construída uma piscina; o acesso em causa visava o cultivo e a apanha de fruta e era utilizado por um caseiro e outros trabalhadores que acediam ao quintal, sem necessidade de passarem pela habitação das RR.; actualmente, o acesso pela passagem visa aceder exclusivamente à piscina, que é até mais cómodo pela habitação, além de que, caso as RR, precisassem de um quarto acesso, poderiam edificá-lo directamente a partir da …, construindo umas escadas ou uma rampa, à semelhança do que sucede com o prédio da A..

  2. Contestaram as RR.

    que apresentaram defesa por excepção, invocando a ilegitimidade passiva, por preterição de litisconsórcio necessário, com o fundamento de que a R. C… é casada e que o marido da R. B…, que era casada no regime da comunhão geral de bens, faleceu, tendo-lhe sucedido, além da viúva, uma filha de ambos, e por impugnação, aduzindo que a servidão em causa era insusceptível de extinção por desnecessidade, porque constituída voluntariamente com base num acordo entre o então proprietário do prédio dominante e o então presidente do Município, há mais de 50 anos, que o seu prédio sempre manteve a mesma configuração e sempre teve acesso à via pública, e que utilizam a passagem em causa para agora acederem à piscina, designadamente para a sua manutenção, bem como do jardim, por aí entrando as pessoas encarregues de tais serviços, assim como máquinas e produtos.

    Concluem pela procedência da excepção e pela improcedência da acção, com a consequente extinção da instância e/ou do pedido.

  3. Após resposta da A. em que, reafirmando o alegado na petição, requereu a intervenção principal provocada do marido da 2ª R. – D… - e da filha da 2ª R. – E… -, neste caso depois de requerer a notificação das RR. para informarem a identidade da filha da 1ª R. e a data do óbito do marido, informação que as RR. prestaram depois de notificadas para o efeito, intervenções que foram admitidas sem oposição, não tendo os intervenientes apresentado qualquer articulado.

  4. Proferido despacho saneador tabelar que, afirmando a validade regularidade da instância, dispensou a selecção da matéria de facto, procedeu-se a julgamento com gravação e observância do formalismo legal, em que teve lugar inspecção judicial ao local e, sem que a decisão da matéria de facto tivesse sido objecto de censura, veio, a final, a ser proferida sentença que julgou improcedente a acção e a absolveu os RR. do pedido.

  5. Inconformada, apelou a A. que, nas respectivas alegações, formula as seguintes conclusões: 1ª: Estatui o artigo 1569, nos seus nºs 2 e 3, do C.C. que “as servidões constituídas por usucapião serão judicialmente declaradas extintas, a requerimento do proprietário do prédio serviente, desde que se mostrem desnecessárias ao prédio dominante”.

    1. : Ora, da prova testemunhal produzida em Audiência de Julgamento, concatenada com as provas documental e por inspecção ao local constantes dos autos, resultaram comprovados os factos a que a autora se propôs no seu desiderato: ver declarada extinta a servidão que impende sobre o seu prédio, por actualmente se mostrar desnecessária ao prédio dominante.

    2. : Assim, todavia, não o entendeu a Meritíssima Juiz a quo que, não obstante dar como provados factos cruciais alegados pela autora para a procedência da acção (vid. os factos da douta sentença nºs. 11., 13. e 15. A 23.), não deu - e devia ter dado, porque ficou consignado no próprio Auto de Inspecção ao Local e foi confirmado pela testemunha dos réus - igualmente como provado que “para a zona do logradouro onde se encontra a piscina, o acesso directo também é possível na entrada que existe na Rua …, pedonal e para veículos”; 4ª: Outrossim, deu como provados factos que o não deviam ter sido (vid. os factos 25., 26. e 27. da mesma decisão), porquanto, a prova testemunhal em que baseou a sua convicção, não só foi manifestamente insuficiente para tal, como, em alguns pontos, contraria até o próprio sentido da decisão quanto aos mesmos; é o caso da testemunha F… que reconheceu expressamente que para cuidar da piscina (única utilidade valorada pelo Tribunal para a subsistência da servidão) o melhor acesso é outro que não pelo prédio da autora.

    3. : O mesmo se diga relativamente ao facto plasmado em 32. Da douta sentença, que foi erradamente tido por confessado, visto que o depoente apenas se limitou a dar a sua opinião/convicção sobre o que lhe estava a ser perguntado relativamente aos factos 31. e 32., não tendo conhecimento directo, nem sequer qualquer informação da Entidade competente para eventual licenciamento de um novo acesso do prédio dos réus.

    4. : Destarte, entendemos ter havido um claro erro na apreciação da prova produzida por parte do Tribunal recorrido que, por isso, agora importa reparar.

    5. : Além disso, também não podemos partilhar do entendimento da Meritíssima Juiz de que o reconhecimento judicial da servidão consubstancia a constituição de um ónus por via judicial (ou da propositura da acção que conduziu a tal reconhecimento) e que a servidão tinha à data da imposição desse ónus, a mesma configuração que tinha à data da entrada desta acção e, por isso, foi constituída em benefício do prédio urbano e não apenas do quintal! 8ª: Na verdade, constituição da servidão e reconhecimento da servidão são coisas distintas e, in casu, a servidão foi constituída por usucapião, portanto, muitos anos antes (mais de 30, 40 anos, nas palavras dos réus) do seu reconhecimento judicial e a superveniência da desnecessidade (mesmo a admitir que é necessário provar essa superveniência, o que não é pacífico) é...

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