Acórdão nº 50/09 de Tribunal Constitucional (Port, 28 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelCons. Vítor Gomes
Data da Resolução28 de Janeiro de 2009
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 50/2009

Processo n.º 796/08

  1. Secção

Relator: Conselheiro Vítor Gomes

Acordam, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional

  1. Relatório

1. A. interpôs recurso para este Tribunal, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, do acórdão do Tribunal de Relação de Évora de 29 de Novembro de 2007, que considerou susceptível de resolução em benefício da massa insolvente, ao abrigo do regime jurídico instituído pelo Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 57/2004, de 18 de Março (CIRE), um contrato de compra e venda de (parte de) uma fracção autónoma de um imóvel, celebrado anteriormente à entrada em vigor desse Código entre o recorrente, como comprador, e o insolvente, como vendedor.

Pretende ver apreciada a inconstitucionalidade da norma resultante do n.º 1 do artigo 120.º do CIRE em conjugação com o n.º 1 do artigo 12.º do Código Civil, interpretada no sentido de que o regime de resolução de actos prejudiciais à massa previsto naquele primeiro preceito legal é aplicável a contratos celebrados anteriormente à sua entrada em vigor.

  1. Tendo o recurso sido admitido e prosseguido, o recorrente apresentou alegações em que sustenta o seguinte:

    “(…)

    A interpretação perfilhada no R. acórdão do Tribunal da Relação de Évora, na interpretação que fez de tais normas, permitindo a sua aplicação retroactiva do novo regime legal ao contrato de compra e venda celebrado em 31/07/2003, é inconstitucional:

    1. Porque viola o princípio da confiança que os cidadãos em geral e o recorrente em particular devem depositar nas normas que o Estado cria para vigorar nas relações jurídicas que estabelecem num determinado período temporal em que moldam as suas expectativas e vontades ao abrigo de um determinado quadro jurídico sem que fosse de prever que posteriormente à conclusão de tal negocia viesse a ser alterado radicalmente tal instituto, aplicando-se o mesmo retroactivamente, traindo-se a confiança e segurança jurídica daqueles que confiaram na estabilidade e segurança jurídica de tais normas em vigor à data do negócio jurídico realizado e concluído e sem respeito pelos direitos entretanto adquiridos e que o princípio constitucional do Estado de Direito democrático tem de salvaguardar e preservar.

    2. Bem como o princípio da segurança jurídica contemplado no artigo 2.º da CRP, como subprincípios normativos que o Estado de Direito democrático tem de respeitar;

    (,..).”

    A “Massa Insolvente de B.” sustenta que o acto já era impugnável ao abrigo do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 132/93 (CPEREF), pelo que a sua resolubilidade ao abrigo do novo regime é insusceptível de afectar aquele mínimo de certeza e segurança na ordem jurídica ou o princípio da confiança que o recorrente diz violados.

    II- Fundamentos

    3. A situação de facto a que foi aplicada a norma cuja apreciação de constitucionalidade se pretende surge assim caracterizada na decisão recorrida:

    O recorrente celebrou, em 31 de Julho de 2003, um contrato de compra e venda de metade de uma fracção autónoma de um prédio. O vendedor foi declarado insolvente por sentença de 21 de Abril de 2006, em processo instaurado em 30 de Março de 2006. Em Outubro de 2006, o administrador da insolvência remeteu ao recorrente uma notificação a declarar resolvido esse contrato, invocando como fundamento o n.º 1 do artigo 120.º do CIRE. O recorrente impugnou judicialmente a decisão de resolução do contrato, suscitando, além do mais, a inconstitucionalidade da norma do n.º 1 do artigo 120.º do CIRE em conjugação com o n.º 1 do artigo 12.º do Código Civil, na interpretação de que o novo regime legal se aplica aos contratos celebrados anteriormente à sua entrada em vigor.

    No âmbito dessa impugnação, veio a ser proferido o acórdão recorrido que, quanto a esta questão, decidiu o seguinte:

    “Defende ainda o agravante que, celebrado em 31/07/2003 o contrato de compra e venda objecto de resolução, é aplicável a lei à data da celebração do contrato, ou seja, o CPEREF e não o (Dec-Lei 53/2004 de 18 de Março, que entrou em vigor em 18 d Setembro.

    Com efeito, o Código a Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei 57/2004, de 19 de Março, entrou em vigor no dia 15 de Setembro de 2004, substituindo o Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e Falência, aprovado pelo Decreto-Lei 132/93, de 23 de Abril

    Mas o actual Código de Insolvência e da Recuperação de Empresas é obviamente aplicável ao caso sub judice, sem que da sua aplicação resulte a inconstitucionalidade alegada.

    Vejamos.

    A situação de insolvência de B., foi reconhecida por decisão de 21-04-2006.

    A lei aplicável ao presente processo e que regula todas as relações jurídicas conexas ou atingidas pela declaração de insolvência é o Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 57/2004, de 19 de Março e republicado pelo Decreto-Lei n.º 200/2004, de 18 de Agosto em vigor desde 15 de Setembro de 2004.

    Trata-se do princípio geral de aplicação das leis no tempo consagrado no art.º 12.º do C. Civil, não se trata de aplicação retroactiva da lei nova.

    Aliás, como expressamente consta da decisão sob censura, que acompanhamos inteiramente, já na lei anterior os artigos 156.º a 160.º do CPEREF, conjugados com os artigos 610.º a 618.º do CC, permitiam atacar actos como aquele que foi resolvido pelo administrador da insolvência.

    Já no domínio da lei anterior quem praticasse actos que fossem susceptíveis de prejudicar os interesses dos credores sabia, ou tinha obrigação de saber, que esses actos eram atacáveis em benefício dos credores.

    É certo que, de acordo com o artigo 156.º, n.º 1, alínea c) do CPEREF, os actos praticados a título oneroso pelo falido só eram atacáveis se tivessem ocorrido nos seis meses anteriores à data da abertura do processo conducente à falência, mas também é verdade que o art.º 157.º do mesmo diploma salvaguardava sempre a possibilidade de recurso à impugnação pauliana.

    O que a lei nova fez foi alterar o equilíbrio entre resolução e impugnação pauliana, alargando a possibilidade de resolução e restringindo de necessidade de recurso à impugnação pauliana, com vista a, na globalidade do regime e com maior agilidade, alcança os efeitos que já se pretendia obter antes.

    Em suma, perante o acervo legislativo anterior não deixava ser expectável que pessoas que praticassem os actos ora previstos nos 120.º e 121.º do CIRE vissem a sua conduta impugnada em benefício do interesse dos credores.

    Eis por que inexiste qualquer aplicação retroactiva da lei, mostrando-se prejudicada consequentemente a inconstitucionalidade suscitada perante tal pressuposto, além de que se não descortina igualmente qualquer inconstitucionalidade por “violação do principio da segurança jurídica e confiança dos cidadãos na ordem jurídica que os rege”, não vislumbrado sequer da acuidade no caso, dos dispositivos constitucionais referenciados e menos ainda do suscitado abuso de direito.”

  2. Importa começar por em destaque o preceito de que foi extraída a norma sujeita a apreciação, o artigo 120.º do CIRE, que dispõe o seguinte:

    “Artigo 120.º

    Princípios gerais

  3. Podem ser resolvidos...

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