Acórdão nº 2264/06.7TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Maio de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA DOS PRAZERES PIZARRO BELEZA
Data da Resolução22 de Maio de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA – Sociedade de Advogados, instauraram uma acção contra BB, pedindo a sua condenação no pagamento de € 750.000,00, com juros vencidos, calculados à taxa legal, como pagamento por “serviços de assessoria jurídica, de natureza contratual e fiscal”, relativos à venda de um terreno a CC. Segundo alega, o réu desistiu da venda, circunstância em que a autora entendeu não cobrar honorários; mas, na realidade, o terreno veio a ser vendido a CC, através de uma sociedade, beneficiando do trabalho por si desenvolvido, o que lhe proporcionou “uma considerável poupança fiscal”.

O réu contestou. Invocou ineptidão da petição inicial, por falta de concretização da causa de pedir, alegou a falta de apresentação de nota de honorários e impugnou diversos factos alegados.

A autora replicou.

Convidada a aperfeiçoar a petição inicial pelo despacho de fls. 147, a autora apresentou o articulado de fls. 154, parcialmente não admitido pelo despacho de fls. 206.

No despacho saneador, por entre o mais, foi afastada a ineptidão invocada pelo réu.

Por iniciativa do tribunal, foi solicitado à Ordem dos Advogados que desse parecer sobre os honorários pretendidos; foi apresentado parecer no sentido de ser concedido laudo favorável pelo valor de € 35.000,0¸ mas não pelo montante peticionado.

A acção foi julgada improcedente pela sentença de fls. 434. Em síntese, o tribunal entendeu que a autora tinha renunciado ao recebimento de honorários (renúncia abdicativa), numa carta dirigida ao réu, com data de 11 de Março de 2005, na qual “a autora (…) declarou não cobrar quaisquer honorários, uma vez que a metodologia da operação por si proposta não tinha merecido acolhimento” (sentença, fls. 444).

Esta sentença, todavia, foi revogada pelo acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de fls. 547, que condenou o réu a pagar à autora a quantia de € 35.000,00, acrescida de juros de mora vencidos desde a citação e vincendos até integral pagamento, contados à taxa legal.

Começando por observar que a renúncia abdicativa é uma causa específica de extinção do direitos reais, mas não de créditos, a Relação considerou não ser possível interpretar a carta de 11 de Março de 2011, com o sentido de acto unilateral de extinção gratuita do crédito de honorários, que a 1ª Instância lhe atribuiu, nestes termos: “Ora, da conjugação dos factos G), H) e U) resulta, para nós à evidência, que a chamada "renúncia" da A teve como pressuposto que o R. tinha desistido de levar a bom termo as operações com vista às quais contactou a A, e bem assim, tinha ínsita uma condição resolutiva: o R. nada pagaria à A desde que não viesse a fazer uso dos elementos que obteve por força dos trabalhos desenvolvidos pela A. (…) Resumindo: a "remissão" por banda da A. não se pode considerar concretizada porque, desde logo, não revestiu a natureza contratual; não está demonstrada a aquiescência do devedor; mas ainda que se pudesse defender que essa concordância foi dada, sempre haveria que atender à condição imposta pela a A. – a remissão só operava na medida em que do trabalho realizado pela A. não fosse retirada qualquer utilidade prática. Assim, verificada a condição, a remissão (a aceitar-se a sua concretização), enquanto contrato, tem-se por resolvido – artº 270º e 276º do CC, assistindo à A. o direito de ser ressarcida pelos trabalhos desenvolvidos” (acórdão recorrido, fls. 560-561).

Concluindo que a autora tinha direito a ser paga, a Relação entendeu aceitar o laudo da Ordem dos Advogados, “dado ser a entidade com a mais reconhecida competência técnica para emitir um juízo justo e equilibrado, em respeito pelas regras que norteiam a profissão”.

  1. O réu recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça. Nas alegações que apresentou, formulou as seguintes conclusões: “1. A Recorrida não tem direito a receber quaisquer honorários do Recorrente por, aliás livremente, a eles ter abdicativamente renunciado, conforme carta que lhe dirigiu em 11 de Março de 2005 (cfr. fls. 135-147 dos autos), recebida em 14 de Março de 2005; 2. Ainda que se entenda que, por se tratar de um direito obrigacional e não de um direito real, a renúncia abdicativa ao crédito por honorários não é juridicamente admissível mas tão só o sendo a respectiva remissão, a carta de fls. 135-137 constituiu uma verdadeira e própria proposta de remissão, formulada pela Recorrida, tácita e inequivocamente aceite pelo Recorrente, conforme decorre do comportamento concludente deste último posterior à recepção de tal comunicação remitiva; 3. Assim, por força da proposta de remissão, dirigida pela Recorrida ao Recorrente, da eventual dívida deste, para consigo, de honorários, este último não deve à primeira qualquer importância a tal título; 4. E, mesmo que se entenda ter tal remissão, proposta e aceite, ficado sujeita à condição resolutiva da não utilização, pelo Recorrente, da solução que lhe foi proposta pela Recorrida, a verdade é que, porque tal solução não foi utilizada, a sobredita condição não se verificou e, logo, também por esta via há que concluir nada dever o primeiro à segunda; 5. Os artºs 682º, nº 2 e 674º, nº 3 do Cód. Proc. Civil, permitindo ao Supremo Tribunal de Justiça que conheça e que, consequentemente, repare, via de revista, ofensa expressa de lei que fixe a força de determinado meio de prova, implicam que a mesma instância suprema considere, no seu elevado julgamento, os factos constantes de escritura pública constante dos autos nos quais, inclusivamente, se louvou o tribunal de primeira instância; 6. É que, por força do disposto nos artºs 368º/1 e 383º/1, do Código Civil, os factos constantes da certidão da escritura inserta nos autos a fls. 138-142, mormente os resultantes da apreensão do notário fazem prova plena e, por isso, não podem ser desconsiderados no juízo rogado a este Supremo Tribunal; 7. Tais factos e outros constantes dos autos...

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