Acórdão nº 421/11.3TBSPS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Maio de 2014

Magistrado ResponsávelARLINDO OLIVEIRA
Data da Resolução27 de Maio de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra Os autores A... e B... , menores de idade, representadas pelos seus pais, também autores, C... e esposa D..., instauraram a presente acção declarativa, com forma de processo ordinário, contra os réus E... e esposa F...

, alegando, em síntese, o seguinte: Sendo donos da fracção autónoma designada pela letra “B”, correspondente ao 1º andar direito, do edifício ou prédio urbano constituído em regime de propriedade horizontal, sito na Rua (...), freguesia e concelho de São Pedro do Sul, inscrito na respectiva matriz sob o art. 2 (...)º, e descrito na Conservatória do Registo Predial sob o nº 1 (...), o réu E..., dono da fracção “D”, correspondente ao 2º andar direito, do mesmo edifício ou prédio urbano, ocupou de forma exclusiva, e com impedimento de acesso dos demais condóminos, o vão do telhado, situado acima do segundo andar e debaixo do telhado, que se localiza por cima da sua fracção, para habitação, afirmando que o mesmo lhe pertence, por integrar a sua fracção. Porém, como esse vão do telhado constitui parte comum do prédio, e não está licenciado para utilização como habitação, nem os demais condóminos a autorizam, tal ocupação é ilegítima.

Além disso, os autores construíram uma lareira na sua fracção, com caldeira para aquecimento, cuja chaminé atravessa a fracção dos réus, com o consentimento destes, e colocaram o respectivo vaso de expansão ou depósito no dito vão do telhado, com o consentimento de todos os condóminos. Sucede que os réus passaram, desde há cerca de 2 anos, a impedir o uso pelos autores de tal vaso de expansão ou depósito, negando ainda o acesso ao mesmo, opondo-se ao uso da sua lareira pelos autores, o que impossibilita ou dificulta tal utilização, com os inerentes prejuízos.

Por outro lado, os réus mantêm, desde há cerca de 3 ou 4 anos, um pequeno cão na varanda da sua fracção, que se situa por cima da varanda da fracção dos autores, aí defecando e urinando, provocando maus cheiros e escorrimento de urina para a varanda dos autores, sujando os seus bens pessoais, e degradação e sujidade do tecto dessa varanda. Além disso, os réus sacodem roupas e outros objectos, incluindo as mantas do cão, na sua varanda, projectando pelos e parasitas deste para a varanda dos autores.

Por fim, os réus mantêm constantemente depositados reboques e materiais de construção no logradouro comum do prédio, estorvando o acesso dos demais condóminos às respectivas garagens.

Desta forma, peticionam os autores a condenação dos réus no reconhecimento de que o dito vão do telhado constitui parte comum do edifício, não integrando a sua fracção autónoma, nem gozam de qualquer direito de utilização exclusiva dessa área, abstendo-se de a utilizarem para habitação e de impedirem o acesso dos demais condóminos à mesma. Pretendem ainda os autores a condenação dos réus no reconhecimento do seu direito de utilização da sua lareira, chaminé e vaso de expansão ou depósito, abstendo-se de impedirem essa utilização.

Por outro lado, solicitam os autores a condenação dos réus a retirarem o cão da varanda da sua fracção, abstendo-se de manterem qualquer animal nesse local, e de aí sacudirem quaisquer roupas e objectos com resíduos. Rogam ainda os autores a condenação dos réus na limpeza, reparação e pintura do topo e parte inferior da sua varanda, e a retirarem os bens que mantêm depositados no logradouro comum, abstendo-se de aí colocaram quaisquer objectos sem autorização dos demais condóminos.

Citados pessoal e regularmente para o efeito, os réus contestaram, em tempo útil, por via de excepção e de impugnação, afirmando que o vão do telhado situado por cima da fracção pertencente ao réu integra-a, correspondendo ao respectivo sótão, que utiliza para habitação, como proprietário, desde 1987, altura em que adquiriu a referida fracção, com a convicção de que esta dispunha do dito sótão. Afirma ainda o réu que a sua utilização do sótão era feita com conhecimento e autorização dos demais condóminos.

Assim sendo, o réu sustenta que tem possuído tal espaço desde a referida data, pelo que já o adquiriu pelo menos por usucapião, que expressamente invoca.

Por outro lado, os réus negam terem consentido na passagem da chaminé dos autores pela sua fracção, e na colocação do depósito do sistema de aquecimento no sótão desta, afirmando tratar-se de obras realizadas sem o seu conhecimento e autorização. Aceitam os autores terem fechado as torneiras do dito depósito, impedindo o seu uso pelos autores, por este ter causado uma infiltração na sua fracção.

Por fim, os réus negam que o seu cão perturbe de qualquer modo os autores, ou lhes cause danos, que sacudam quaisquer roupas ou objectos na sua varanda, alegando que a utilização que fazem do logradouro comum do prédio foi acordada entre todos os condóminos, não impedindo o acesso às garagens.

Terminam os réus solicitando a improcedência da acção, com a sua absolvição dos pedidos.

Replicaram os autores, impugnando o alegado na contestação, e concluindo como na petição.

Findos os articulados, e dispensada a realização da audiência preliminar, foi proferido despacho saneador, afirmando-se a validade e a regularidade da instância.

Seleccionaram-se os factos assentes e elaborou-se base instrutória, actividade que não mereceu reclamação.

Teve lugar a audiência de discussão e julgamento, com recurso à gravação da prova nela produzida, finda a qual foi proferida a sentença de fl.s 153 a 172, a qual incorpora a decisão sobre a matéria de facto constante da base instrutória, com indicação da respectiva fundamentação, tendo-se a final decidido o seguinte: “Pelo exposto, julgo parcialmente procedente acção, pelo que condeno os réus E... e esposa F...: I. A reconhecerem que o vão do telhado do edifício constituído em regime de propriedade horizontal, inscrito na matriz urbana da freguesia de São Pedro do Sul, deste mesmo concelho, sob o artigo 2 (...)º, sito no Bairro da Ponte, composto de rés-do-chão, 1º e 2º andares e logradouro, descrito na Conservatória do Registo Predial sob a ficha 1 (...), constitui parte comum do edifício, não integrando a sua fracção autónoma identificada sob a letra “D”, destinada a habitação, correspondente ao 2º andar direito; II. A reconhecerem o direito dos autores A..., B..., C... e esposa D... a utilizarem a sua lareira, chaminé (na parte em que não atravessa a fracção autónoma identificada sob a letra “D” do edifício, correspondente ao 2º andar direito, pertencente ao réu), e vaso de expansão ou depósito, e a absterem-se de impedirem essa utilização.

Absolvo os réus do demais peticionado.

Custas da acção pelos autores e pelos réus, na proporção do respectivo decaimento, que fixo em 80/100 para os autores e 20/100 para os réus (cfr. art. 527º, nº 1 e 2, do C.P.C. revisto).”.

Inconformados com a mesma, interpuseram recurso os autores, recurso, esse, admitido como de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo (cf. despacho de fl.s 208), rematando as respectivas motivações, com as seguintes conclusões: 1 – ao julgar improcedentes os pedidos das alíneas c), d), e) (este na parte em que não obteve vencimento), f), g) e j) dos autores, o tribunal errou na apreciação da prova produzida em julgamento, ou não enquadrou devidamente a matéria de facto dada como provada à luz das normas legais aplicáveis e foi mesmo contraditório na sua decisão; 2 – como claramente resulta da conjugação da matéria dos pontos 6.10. e 6.11. dos factos provados, à data em que o réu adquiriu a sua fração era já pela referida abertura que se acedia ao dito vão para vigilância, revisão e limpeza do telhado, caleiras, beirais, chaminés, bem como para vigilância e manutenção de equipamentos ali colocados, fossem próprios dos condóminos, ou comuns, pelo que o pedido dos autores efetuado sob a alínea c) deveria ter sido julgado como procedente, por provado; 3 – se a lareira em apreço faz parte da fração dos autores e tem que ter, obrigatoriamente, como tem, uma conduta que sirva para a exaustão dos respetivos fumos desde a sua fonte até ao exterior, e que essa conduta se deve elevar, como efetivamente acontece, acima da parte mais elevada das coberturas do prédio, deveria o pedido dos autores efetuado sob a alínea e) ter sido julgado como totalmente procedente, por provado; 4 – a matéria de facto do ponto 9º foi erradamente restringida e a dos pontos 10º e 14º da base instrutória foi erradamente dada como não provada, pois que se deverá entender ter sido efetuada prova cabal, também, dessa matéria.

5 – de acordo com a prova produzida em julgamento, a matéria de facto do pontos 9º, 10º e 14º deveria ter sido julgada da seguinte forma:  os maus cheiros das fezes e urina do cão dos réus são sentidos também na fração dos autores, especialmente no verão – resposta ao quesito 9º da base instrutória;  que as urinas desse mesmo animal escorrem para a varanda dos autores, sujando quaisquer objetos que ali possam estar – resposta ao quesito 10º da base instrutória;  que devido ao que vai provado no ponto 6.28. a varanda da fração dos autores fica repleta de pelos do canídeo – resposta ao quesito 14º da base instrutória.

6 – os pedidos dos autores efetuados sob a alínea f) e g) deveriam ter sido julgados como totalmente procedentes, por provados.

7 – finalmente, o espaço ou espaços que se situa(m) por cima das frações do 2º andar, não são destinados a habitação, nem foi junto aos autos qualquer documento que comprove, sequer, que tal espaço, ou espaços, estão em condições legais para essa utilização, pelo que os condóminos só poderão servir-se desses espaços na medida em que os não empreguem para fins diferentes daqueles a que se destinam, sendo que o da habitação não é nenhum desses fins.

8 – o pedido dos autores efetuado sob a alínea j) deveria ter sido também julgado como totalmente procedente, por provado.

Normas Jurídicas Violadas –  as normas dos art. 1406º, nº 1, aplicável por força do art. 1420º, nº 1, ambos do...

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