Acórdão nº 714/11.0TTALM.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Maio de 2014

Magistrado ResponsávelFRANCISCA MENDES
Data da Resolução21 de Maio de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

Acordam os juízes na Secção Social do Tribunal da Relação de Lisboa: I- Relatório AA instaurou a presente acção declarativa de condenação emergente de contrato individual de trabalho contra BB, S.A., alegando em síntese : (…) O A. concluiu, pedindo: - Que se julgue verificada a justa causa de resolução do contrato que ligava o autor à ré; - Que a ré seja condenada a pagar-lhe, as seguintes quantias: a) 5.941,60 euros, a título de retribuição dos meses de Janeiro e Fevereiro de 2011; b) 3.218,10 euros, a título de abonos não pagos de Dezembro a 2010 a Fevereiro de 2011; c) 3.041,54 euros, a título de subsídio de férias vencidas em 01-01-2011; d) 1.857,22 euros, a título de proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal prestado pelo trabalho prestado em 2011; e) 39.418,36 euros, a título de indemnização por antiguidade, nos termos do artigo 396.º do Código de Trabalho; f) 15.000,00 euros, a título de indemnização por danos não patrimoniais; g) Os juros legais desde a data do vencimento de cada uma das obrigações até integral pagamento.

Originariamente, interpuseram a acção igualmente JMB e HLCV, mas quanto aos mesmos a instância extinguiu-se por transacção de fls. 325 e 326.

Foi realizada audiência de partes na qual não se logrou obter a conciliação entre o autor e a ré.

A ré apresentou contestação, alegando em síntese: (…) Concluiu peticionando que seja absolvida do pedido.

* Após realização da audiência de discussão e julgamento foram considerados provados os seguintes factos : (…) Com base nestes factos, o Tribunal a quo proferiu a seguinte decisão: « Pelo exposto julgo a presente acção parcialmente procedente e, em consequência: a) Reconhece-se que resolução do contrato de trabalho realizada pelo autor foi realizada com justa causa, mas sem concessão de indemnização; b) Absolve-se a ré dos restantes pedidos, por improcedentes.

* Custas do pedido a cargo do autor - artigo 446º do Código do Processo Civil e artigo 6.º, n.º 1, do Regulamento das Custas Processuais, por referência à tabela I-A».

O A. recorreu e formulou as seguintes conclusões: (…) A apelada contra-alegou e formulou as seguintes conclusões: (…) A Exmª Procuradora Geral Adjunta emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso.

* II- Importa solucionar as seguintes questões: 1ª- Se a decisão sobre a matéria de facto deverá ser alterada, no que tange às alíneas i) a p); 2ª- Se a apelada, à data dos factos em apreço, deveria ser qualificada como empresa pública; 3ª - Se a apelada, à data dos factos em apreço, deveria ser qualificada como empresa pública para efeitos de aplicação do regime de incompatibilidades constante dos arts. 78º e 79º do Estatuto da Aposentação ( na redacção dada pelo Dec-Lei nº 137/2010, de 28 de Dezembro) ou se deverá ser defendida posição contrária de acordo com os princípios da segurança jurídica (por os estatutos e a lei não estabelecerem que o capital social da apelada tivesse de pertencer exclusiva ou maioritariamente a entidades públicas) e da igualdade; 4ª - Se o recorrente não exercia “funções públicas” para os efeitos indicados, mas sim funções de natureza técnica; 5ª- Se a interpretação do regime de incompatibilidades constantes dos arts. 78º e 79º do Estatuto da Aposentação da qual resulte a aplicação deste regime ao recorrente ( que trabalhava para a apelada desde 2002) é inconstitucional, por contrariar os princípios da confiança ( art. 2º da Constituição da República Portuguesa), da segurança no emprego e da proibição de despedimento sem justa causa ( art. 53º da CRP); 6ª- Se a suspensão do vencimento do recorrente viola o princípio da irredutibilidade da retribuição e o princípio trabalho igual salário igual ( art. 59º da CRP), bem como, no mercado empresarial, os princípios da igualdade e da livre concorrência; 7ª- Se o apelante deverá ser indemnizado, por a apelada ter violado, de forma culposa, a obrigação de pagamento da retribuição; 8ª- Se deverá ser atribuída ao apelante uma indemnização por danos não patrimoniais; 9ª- Se assiste ao apelante o direito às retribuições peticionadas.

* III- Apreciação Vejamos, em primeiro lugar, a primeira questão supra enunciada : Se a decisão sobre a matéria de facto deverá ser alterada, no que tange às alíneas i) a p).

(…) * Os factos provados são, assim, os seguintes: (…) * Passemos, agora, à 2ª questão colocada : apurar, à luz do regime jurídico que regula o sector empresarial do Estado, se a apelada, à data dos factos em apreço, deveria ser qualificada como empresa pública.

Acerca da evolução histórica das empresas públicas em Portugal, refere o prof. Freitas do Amaral in “Curso de Direito Administrativo”, 3ª edição, página 389, que deveremos distinguir três períodos bem distintos: «- Antes do 25 de Abril de 1974: - De 25 de Abril de 1974 até 1999; - De 1999 em diante.

Até ao 25 de Abril de 1974, as empresas publicas eram poucas e vinham do passado setecentista. Algumas foram criadas por transformação de velhos serviços públicos tradicionais, para obter ganhos de eficiência e produtividade.

Com a Revolução, muitas empresas privadas foram nacionalizadas e converteram-se, por isso, em empresas públicas. Outras foram criadas ex novo, ao abrigo de programas socializantes. Foi um período de 25 anos.

Mas com a entrada de Portugal para a então CEE, em 1 de Janeiro de 1986, com a moda das privatizações nas décadas de 80 e 90, e com a aplicação na ordem interna das directivas comunitárias e dos mecanismos de defesa da concorrência, a situação modificou-se por completo.

No segundo período considerado, o estatuto jurídico das empresas públicas constava do Decreto-lei nº 260/76 de 8 de Abril. O terceiro período (…) começou com a revogação desse diploma e a substituição pelo Decreto-Lei nº 558/99, de 17 de Dezembro».

Recentemente, foi publicada o Decreto-Lei nº 133/2013, de 3 de Outubro ( que revogou o Decreto-Lei nº558/99). Este último diploma entrou em vigor sessenta dias a contar da sua publicação ( art. 75º).

Conforme resulta do disposto no art. 12º, nº1 do Código Civil, « a lei só dispõe para o futuro; ainda que lhe seja atribuída eficácia retroactiva, presume-se que ficam ressalvados os efeitos já produzidos pelos factos que a lei se destina a regular».

Os factos em apreço reportam-se ao período de vigência do Decreto-Lei nº 558/99, pelo que será este o diploma aplicável ao caso subjudice.

O Decreto-Lei nº 260/76, de 8 de Abril considerava, no artigo 1.º, como empresas públicas «as empresas criadas pelo Estado com capitais próprios ou fornecidos por outras entidades públicas, para a exploração de actividades de natureza económica ou social, tendo em vista a construção e desenvolvimento de uma sociedade democrática e de uma economia socialista» (n.º 1); eram tidas também como empresas públicas as empresas nacionalizadas ( nº2).

Conforme refere o parecer do Conselho Consultivo da Procuradoria Geral da República de 18.01.2007 ( www.dgsi.pt), o Decreto Lei nº 260/76 « adoptou, pois, em primeira linha, «uma concepção restrita de empresa pública – reconduzível aos organismos de carácter empresarial expressamente criados por acto legislativo – dela excluindo todas as empresas com forma societária, ainda que o seu capital pertencesse exclusivamente ao Estado ou a outras pessoas colectivas públicas (…) O Decreto-Lei n.º 558/99, de 17 de Dezembro, adopta um conceito de empresa pública amplo, passando a incluir no respectivo âmbito, não só as empresas de base institucional (que passam a designar-se entidades públicas empresariais), como as empresas do tipo societário, que o Decreto-Lei n.º 260/76 remetera para o regime comum do direito comercial, o que se traduziu – como é reconhecido no preâmbulo do diploma – num significativo aumento do universo das empresas abrangidas, mas também numa maior variedade de figuras jurídicas que o integram».

O Decreto-Lei nº 558/99, de 17 de Dezembro foi alterado pelo Decreto-Lei nº 300/2007, de 23 de Agosto. Este último diploma manteve, contudo, incólume o conceito de empresa pública consagrado no art. 3º do Decreto-Lei nº 558/99.

Estabelece este último artigo, sob a epígrafe, “empresas públicas” : 1 — Consideram-se empresas públicas as sociedades constituídas nos termos da lei comercial, nas quais o Estado ou outras entidades públicas estaduais possam exercer, isolada ou conjuntamente, de forma directa ou indirecta, uma influência dominante em virtude de alguma das seguintes circunstâncias: a) Detenção da maioria do capital ou dos direitos de voto; b) Direito de designar ou de destituir a maioria dos membros dos órgãos de administração ou de fiscalização.

2 — São também empresas públicas as entidades com natureza empresarial reguladas no capítulo III.

Conforme refere o prof. Freitas do Amaral ( op. cit., pág. 390), o sector empresarial do Estado é constituído por três espécies de empresas: «a)- As empresas públicas sob a forma privada, que são sociedades controladas pelo Estado; b)- As empresas públicas sob a forma pública, também chamadas “ entidades públicas empresariais”, que são pessoas colectivas públicas; c)- As empresas privadas participadas pelo Estado, que não são empresas públicas, mas integram igualmente o SEF » .

De acordo com a noção dada pelo art. 2º, nº2 do Decreto-Lei nº 558/99, as « empresas participadas são as organizações empresariais que tenham uma participação permanente do Estado ou de quaisquer outras entidades públicas estaduais, de carácter...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT