Acórdão nº 0848/08 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Janeiro de 2009

Magistrado ResponsávelEDMUNDO MOSCOSO
Data da Resolução07 de Janeiro de 2009
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO STA 1 - A... S.A, ao abrigo do disposto no artº 150º do CPTA, interpôs recurso de revista do acórdão do T.C.A. Sul, de 11-08-08 (fls. 491/501) que, em processo para prestação de informações e passagem de certidões, intentado pela QUERCUS - ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA, negou provimento ao recurso jurisdicional por si interposto da sentença do TAC de Lisboa, que decidiu no sentido de a intimar "a prestar a informação solicitada pela Quercus, pelo requerimento de 24 de Janeiro de 2008, no prazo de 10 dias", relativa ao processo de construção e exploração da Barragem do Baixo Sabor.

2 - Em alegações e no que respeita ao mérito do recurso a recorrente enunciou CONCLUSÕES, dizendo essencialmente o seguinte: A - Que não é uma «autoridade pública» para efeitos do disposto no artº 2º nº 2 da Directiva 2003/4/CE. E, a não aplicação desta Directiva à recorrente decorre: (i) de se tratar de uma pessoa colectiva de direito privado exercendo a sua actividade de produção de energia eléctrica ao abrigo de um contrato de concessão de uso privativo de recursos hídricos do domínio público, regulado pela Lei nº 58/2005, de 29 de Dezembro, e pelo D-L nº 226-A/2007, de 31 de Maio, e de uma licença de produção emitida nos termos do DL nº 172/2006, de 23 de Agosto; (ii) de o Estado não deter uma participação maioritária no capital da recorrente, não exercendo igualmente qualquer controlo sob a respectiva gestão; (iii) de a recorrente, explorando embora serviços de interesse económico geral, no caso a produção de energia hidroeléctrica, não exercer funções públicas administrativas, nem estar dotada de poderes de autoridade.

B - A recorrente não é uma «autoridade pública» para efeitos do disposto no artº 3 alínea a)/ii), da Lei nº 19/2006, de 12 de Junho, uma vez que não se integra na administração indirecta, pública ou privada, do Estado.

C - Com efeito, a recorrente é uma pessoa pública de direito privado, em cujo capital social o Estado não detém uma posição maioritária e em relação a cuja gestão o Estado não exerce quaisquer direitos de controlo, que desenvolve a respectiva actividade em regime de concorrência, ao abrigo de um contrato de concessão de uso privativo, regulado pela Lei nº 58/2005, de 29 de Dezembro, e pelo DL 226-A/2007, de 31 de Maio, e de uma licença de produção, emitida ao abrigo do disposto no DL nº 172/2006, de 23 de Agosto.

D - A concessão de uso privativo configura um modo de fruição de bens públicos, que não envolve a atribuição ao concessionário de quaisquer poderes jurídico-públicos, nem tão pouco o investem no exercício de funções públicas.

E - Por essa mesma razão, a recorrente não se acha abrangida pelo âmbito de aplicação do artº 61º do CPA, do artº 104º do CPTA, nem tão pouco da Lei nº 46/2007, de 24 de Agosto.

F - Ainda que estejam subjacentes razões de interesse público à construção da Barragem do Baixo Sabor o que releva, no caso dos autos, é o regime jurídico ao abrigo do qual irá ser construída a barragem e exercida a actividade de produção de energia eléctrica a partir de tal barragem, sendo inequívoco que a mesma está atribuída a uma entidade de direito privado, sem envolver a atribuição de quaisquer poderes de autoridade.

G - Ainda que esteja prevista a realização de expropriações no âmbito da construção da Barragem do Baixo Sabor, nem a lei, nem o contrato de concessão de uso privativo, atribuem à recorrente a qualidade de entidade expropriante ou a incumbem da condução dos processos expropriativos, como sucede expressamente em relação às concessões de obras públicas ou serviços públicos.

H - Não faz sentido concluir, com base no decidido no Ac. STA de 27 de Janeiro de 1994, pela caracterização da recorrente como autoridade pública exercendo prerrogativas de direito público na sua relação com os utentes, pois aquele aresto, cuja doutrina nem sequer se discute, apenas incidiu sobre a actividade de distribuição de electricidade, a qual tem enquadramento jurídico completamente diverso do relativo à actividade de produção de energia eléctrica.

I - Ao considerar como obrigadas ao dever de prestar informações regulado na Lei nº 19/2006 as empresas concessionárias de uso privativo, que não se integram na Administração de um ponto de vista orgânico, nem fazem administração material, a decisão recorrida viola o disposto no artº 3º, alínea a), subalínea ii), de tal diploma, bem como o artº 104º nº 1 do CPTA, fazendo uma interpretação destas normas que é contrária ao disposto na Directiva 2003/4/CE e ao disposto nos artº 2º, 61º e 212º nº 3 da CRP, por exceder o sentido e âmbito da jurisdição administrativa e limitar desrazoavelmente a liberdade de empresa.

3 - Contra-alegou a QUERCUS (fls. 574 e sgs.), sustentando a rejeição do presente recurso por considerar que se não mostram reunidos os requisitos previstos no artº 150º para a sua admissão ou, quando assim se não entenda, a sua improcedência.

4 - Pelo acórdão interlocutório de fls. 608/613 foi decidido admitir o recurso de revista, por se verificarem os pressupostos contidos no nº 1 do art. 150º do CPTA.

+ Cumpre decidir: + 5 - O acórdão recorrido deu como demonstrada a seguinte MATÉRIA DE FACTO: A - A QUERCUS - ASSOCIAÇÃO NACIONAL DE CONSERVAÇÃO DA NATUREZA, é uma Organização Não Governamental para a defesa do ambiente - "ONGA".

B - A QUERCUS - Associação Nacional de Conservação da Natureza dirigiu à A..., S.A. em 24 de Janeiro de 2008, requerimento relativo ao assunto "Pedido de acesso a documentos" com o seguinte teor: "A QUERCUS - Associação Nacional de Conservação da Natureza, com sede no Centro Associativo do Calhau, Bairro do Calhau, 1500-045 Lisboa, contribuinte fiscal n° 501 736 492 vem, nos termos e para os efeitos da Lei n° 19/2006 de 12 de Junho (que regula o acesso à informação sobre ambiente que estejam na posse de autoridades publicas ou detidos em seu nome), requerer que lhe seja facultado o acesso à documentação actualizada relativa ao processo de construção e...

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