Acórdão nº 17113/12.9YIPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Maio de 2014

Magistrado ResponsávelCARLOS GIL
Data da Resolução05 de Maio de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

17113/12.9YIPRT.P1 Sumário do acórdão proferido no processo nº 17113/12.9YIPRT elaborado pelo seu relator nos termos do disposto no artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil: 1. No actual processo civil as partes continuam oneradas à alegação dos factos essenciais que constituem a causa de pedir e daqueles em que se baseiam as excepções invocadas (artigo 5º, nº 1, do Código de Processo Civil), apenas podendo ser oficiosamente considerados os factos instrumentais, com função meramente probatória, que resultem da instrução da causa (artigo 5º, nº 2, alínea a), do Código de Processo Civil), os factos complementares ou concretizadores dos factos essenciais alegados pelas partes que resultem da instrução da causa e sobre os quais as partes tenham tido a oportunidade de se pronunciar (artigo 5º, nº 2, alínea b), do Código de Processo Civil) e os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções (artigo 5º, nº 2, alínea c), do Código de Processo Civil).

  1. A circunstância de certa questão ser de conhecimento oficioso do tribunal, como sucede, por exemplo, com as excepções peremptórias cuja invocação a lei não torne dependente da vontade do interessado (artigo 579º do Código de Processo Civil) ou com a culpa do lesado (artigo 572º do Código Civil), não significa que o tribunal deva oficiosamente carrear para os autos a factualidade integradora dessas questões de conhecimento oficioso; a oficiosidade nesses casos, na falta de previsão expressa que disponha em sentido diverso, como sucede, por exemplo, no artigo 11º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, apenas opera no conhecimento das questões e em face dos factos que tenham sido adquiridos no processo.

  2. A relação obrigacional não é actualmente atomisticamente concebida, mas antes percepcionada em termos complexos ou orgânicos, avultando nela, além dos deveres principais ou primários de prestação, entre outros, os denominados deveres acessórios de conduta, nos quais se inclui o dever de zelar por que seja conservada a integridade da coisa prestada.

  3. A natureza e a finalidade da prestação executada pela recorrente para protecção do trabalho por si desenvolvido conduz a que a aferição do correcto cumprimento desta obrigação não coincida com o termo da prestação principal, mas antes se estenda até ao momento em que deve ser removida aquela protecção.

  4. Tirando os casos previstos no artigo 429º do Código Civil, a excepção de não cumprimento do contrato apenas é invocável pelo contraente que deva cumprir em último lugar ou, nos casos em que o cumprimento seja simultâneo, por qualquer dos contraentes.

  5. A excepção de não cumprimento do contrato está subordinada ao requisito da proporcionalidade no seu uso quando esteja em causa um incumprimento parcial ou um cumprimento defeituoso.

  6. Porque a culpa do lesado é de conhecimento oficioso do tribunal (artigo 572º do Código Civil), mesmo tratando-se de questão que não foi suscitada perante o tribunal a quo, deve o tribunal ad quem conhecer dela.

  7. A fase de eliminação dos defeitos da obra é ela própria uma fase potencialmente litigiosa, pelo que não se apresenta com a certeza inerente ao decurso do tempo ou à interpelação que justificam o regime excepcional do artigo 610º do Código de Processo Civil.

  8. Pelas razões acima enunciadas, o artigo 610º do Código de Processo Civil não é aplicável, nem sequer por analogia, ao caso de procedência da excepção de não cumprimento do contrato, o que conduz a que, numa tal eventualidade, haja lugar a uma absolvição do pedido, embora essa absolvição tenha uma projecção restrita, na medida em que superado o obstáculo que determinou a procedência da excepção, poderá o titular do crédito cujo exercício foi paralisado obter a satisfação do mesmo, se necessário, por via coerciva, usando para tanto os meios declarativos.

    *** * ***Acordam, em audiência, os juízes abaixo-assinados da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto: 1. Relatório A 31 de Janeiro de 2012, no Balcão Nacional de Injunções, B…, Lda.

    intentou procedimento de injunção contra C… e D… pedindo que sejam notificados para lhe pagarem a quantia de € 13.343,68, sendo € 12.901,74, a título de capital, € 339,94, a título de juros de mora e taxa de justiça de € 102,00, indicando como fonte das suas pretensões um contrato de fornecimento de bens ou serviços, celebrado a 06 de Janeiro de 2011.

    Para fundamentar as suas pretensões, B…, Lda.

    alegou o seguinte: “1) A Requerente dedica-se com intuito lucrativo à actividade de prestação de serviços de carpintaria.

    2) Por sua vez, os Requeridos contrataram os serviços de carpintaria da Requerente, os quais foram prestados na moradia dos Requeridos, sita na Rua …, s/n, …, Paredes, e que constam as seguintes facturas: FACTURA Nº 0411 DATA: 28/11/2011 VALOR: € 17.114,71 (incluído IVA) DESCRIÇÃO: 1 Roupeiro Suc. C/260x286x60; 2 Portas MDF c/260x89x5; 230 m2 soalho 14 mm em madeira de nogueira.

    FACTURA Nº 0421 DATA: 28/11/2011 VALOR: € 787,03 (Incluído IVA) DESCRIÇÃO: 1 Porta C.F. Suc. c/203x90x22; 1 painel Suc. c/451x142x1.5; 19 m rodapé alumínio com 15x5; 2,42 m perfil alumínio c/30x30; 2,50 m perfil alumínio c/15x15.

    TOTAL: --------------------------------------------------------------- € 17.901,74 (incluído IVA) 3) Acontece que, apesar de por diversas vezes terem sido interpelados pela Requerente para procederem ao pagamento daquela quantia, a verdade é que, até hoje, os Requeridos ainda só pagaram à Requerente a quantia de € 5.000,00 (cinco mil euros).

    4) Pelo que, actualmente, os Requeridos ainda devem à Requerente a quantia de € 12.901,74 (doze mil novecentos e um euros e setenta e quatro cêntimos), a que acrescem juros comerciais à taxa legal em vigor, desde a data de vencimento de cada uma das referidas facturas até hoje, que se computam nesta data em € 339,94 (trezentos e trinta e nove euros e noventa e quatro cêntimos).

    5) Globalmente, devem os Requeridos à Requerente a quantia de € 13.241,68 (treze mil duzentos e quarenta e um euros e sessenta e oito cêntimos), a que acrescem juros comerciais à taxa legal em vigor sobre a quantia de € 12.901,74, desde a data da propositura do presente procedimento de injunção até efectivo e integral pagamento.” Efectuada a notificação de C… e D…, vieram os mesmos deduzir oposição ao requerimento de injunção, suscitando a ilegitimidade passiva do requerido, em virtude do seu nome não figurar nas facturas emitidas pela requerente; além disso, impugnaram a pretensão injuntiva afirmando que foi combinado entre as partes que o pagamento dos serviços de carpintaria apenas se efectuaria após a sua conclusão, em perfeitas condições e com a qualidade devida, o que não se verificou, pois que uma porta não fechava correctamente, em virtude da indevida aplicação de um batente e o soalho flutuante apresentava imperfeições e defeitos, nomeadamente, arrancamento de parte do verniz do soalho e existência de cola no mesmo, defeitos que foram reconhecidos pela requerente, comprometendo-se esta a repará-los até 10 de Janeiro de 2012, o que não fez; finalmente, os requeridos pedem a condenação da requerente ao pagamento da quantia de € 1.500,00, a título de danos não patrimoniais.

    O procedimento de injunção foi remetido à distribuição nos Juízos Cíveis do Tribunal Judicial da Comarca de Paredes, ordenando-se a notificação da requerente para, querendo, se pronunciar sobre a prova pericial requerida pela parte contrária.

    A requerente declarou nada ter a opor à realização de prova pericial e pronunciou-se sobre a ilegitimidade passiva e os defeitos arguidos pelos requeridos, pugnando pela total improcedência desta defesa e suscitou a inadmissibilidade legal do pedido de condenação ao pagamento de uma compensação por danos não patrimoniais formulado pelos requeridos, em virtude de não terem deduzido reconvenção, nem terem indicado valor para tal pretensão, impugnando ainda os factos aduzidos para sustentar esse pedido.

    Proferiu-se decisão a não admitir o pedido formulado pelos requeridos de condenação da requerente ao pagamento de uma compensação de mil e quinhentos euros, a título de danos não patrimoniais, julgou-se improcedente a excepção dilatória de ilegitimidade passiva do requerido e deferiu-se a realização da prova pericial.

    Realizou-se perícia singular com o objecto definido pelo tribunal, vindo a requerente solicitar um esclarecimento e os requeridos solicitar a prestação de informações por parte da requerente, em ordem a permitir uma resposta completa do Sr. perito a uma das questões, pretensões que foram deferidas.

    O Sr. Perito respondeu aos esclarecimentos solicitados pela requerente.

    Após notificação ao Sr. Perito das informações solicitadas pelos requeridos, foram prestados os esclarecimentos solicitados por estes.

    Realizou-se a audiência de discussão e julgamento em quatro sessões, efectuando-se inspecção judicial à moradia em que foram prestados os serviços de carpintaria por parte da requerente.

    A 17 de Dezembro de 2013 foi proferida sentença que julgou procedente a excepção de não cumprimento do contrato e, consequentemente, julgou improcedente a acção, absolvendo os requeridos do pedido contra eles deduzido.

    A 10 de Janeiro de 2014, inconformada com a sentença, B…, Lda.

    veio arguir a nulidade da falta de junção aos autos de um documento por si oferecido e cuja junção foi admitida, interpondo do mesmo passo recurso contra a sentença, terminando as suas alegações de recurso com as seguintes conclusões: “QUANTO AOS FACTOS 1./Face à ausência de, prova testemunhal- Testemunha E… (gravação áudio 00.00.01 -00.13-47 /00.00.01- 00.13.06/00.00.01-00.00.47- , de prova pericial e de prova documental com excepção das facturas nºs 0411 e 0421 juntas aos autos, que provam o contrário, deve dar-se por “Não provado que “Ficou acordado entre as partes que o pagamento dos serviços de b, apenas seria realizado após a conclusão dos trabalhos contratados”(alínea d) 2./ Por força da...

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