Acórdão nº 01943/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 02 de Abril de 2014
Magistrado Responsável | PEDRO DELGADO |
Data da Resolução | 02 de Abril de 2014 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1 – A………………….., LDA., melhor identificada nos autos, vem recorrer para este Tribunal da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria que julgou improcedente a reclamação por si deduzida contra o despacho do Director de Serviços da Direcção de Serviços de Cobrança Voluntária - IVA , da qual pedia que a compensação automática realizada pela AT fosse efectuada no processo de execução fiscal nº 1929920121026534.
Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «I. A Recorrente pretende que os actos tributários de compensação automática praticados pela Autoridade Tributária em relação aos pagamentos efectuados no valor de € 106.929,19 sejam declarados ilegais e compensados no processo de execução fiscal n.º 19299201201026534, com efeitos retroactivos à altura do respetivo pagamento, actualizando-se o valor deste processo executivo, bem com o valor indicativo para garantia do processo.
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Não tendo pago liquidações relativas a IVA 2008 e 2009 no prazo de pagamento voluntário, depois de instaurado processo de execução fiscal, a Recorrente deslocou-se à tesouraria do Serviço de Finanças de Entroncamento e aí procedeu ao pagamento total de € 106.929,19, emitindo documentos de pagamento de autoliquidação referentes a declarações de substituição que também apresentou, juntamente com os pagamentos das coimas respectivas a tais períodos.
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Por segurança, a Recorrente via comunicação electrónica informou e solicitou junto do serviço de Finanças de Abrantes que face ao pagamento efectuado, fosse operada a devida compensação, actualizando-se o valor do processo executivo e o valor a prestar em sede de garantia, IV. Tendo a Direção de Serviços de Cobrança - Divisão de Cobrança Voluntária - IVA informado que os pagamentos efectuados teriam originado regularizações a crédito que migraram para o novo sistema do IVA (SLIVA), tendo sido efectuadas compensações automáticas em 18/12/2012, 21/1/2013 e 22/1/2013, tendo ainda comunicado que a ser como a Recorrente pretendia, teria de se adoptar o procedimento de reversão para o MGIT, do saldo que havia migrado para o novo sistema situação que se revelaria bastante complexa “porque teria como efeito a reactivação das CD”s atrás referidas, que já tinham sido emitidas e posteriormente anuladas com a compensação feita quando ainda estava pendente Reclamação Graciosa instaurada pela Recorrente em 27/8/2012.
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A Recorrente, inconformada, em 14-05-2013, apresentou junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Leiria, nos termos do artigo 276.º do CPPT, Reclamação Judicial, que foi julgada improcedente.
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A douta sentença de que se recorre considerou que o artigo 40.°/3 da LGT faculta aos contribuintes que efectuem o pagamento o direito de indicar os tributos e períodos de tributação a que se referem, desde que tal indicação siga a forma prescrita na lei.
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Essas formas seriam, nomeadamente o DUC, nos termos do n.º 4 do artigo 11.º do Decreto-Lei n.º 191/99, de 5 de Junho, o pagamento nos termos do artigo 1° do Decreto-lei n.º 229/95, de 11 de Setembro ou o pagamento por conta a que alude o artigo 274.º/2 do CPPT.
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Não o tendo feito, a AT aplicou o disposto no artigo 9.° do Decreto-Lei n.º 229/95, de 11 de Setembro: Sempre que na DSCIVA seja recebido algum meio de pagamento emitido à ordem da Direção Geral do Tesouro que não seja acompanhado da correspondente declaração periódica, sendo, no entanto, possível identificar o sujeito passivo que o enviou, deverá a respectiva importância ser considerada no pagamento do imposto que vier a mostrar-se devido.”, tendo efectuado compensações automáticas em 18/12/2012, 21/1/2013 e 22/1/2013, quando ainda estava pendente Reclamação Graciosa instaurada pela Recorrente em 27/8/2012.
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Foi com base no supra exposto que a Reclamação foi improcedente, não partilhando a Recorrente do entendimento do Tribunal Recorrido.
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Salvo melhor opinião, a compensação automática operada pela AT é ilegal, discordando-se em absoluto da interpretação que o Tribunal recorrido fez dos artigos 1° e 9° do Decreto-Lei n.º 229/95, de 11 de Setembro.
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Desde logo porque os pagamentos em causa foram efectuados nas tesourarias da Fazenda Pública, como a lei indica, tendo os mesmos sido acompanhados das correspondentes declarações periódicas de substituição - períodos 11 e 12/2008 e 01, 02 e 03/2009 - e respectivas coimas alusivas a pagamentos de imposto fora de prazo, nos quais se identificam expressamente os períodos em questão, não sobrando qualquer margem de dúvida de que a AT cometeu um erro grosseiro.
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Para além das próprias declarações indicadas no artigo 9.º do Decreto-Lei do n.º 229/95, de 11 de Setembro, tendo os documentos de cobrança referentes a coima e respectivo pagamento dos períodos em questão sido aceites e o seu conteúdo integralmente assimilado pela AT, a interpretação que o Tribunal recorrido devia ter adoptado daquele preceito era que a Recorrente, pretendendo proceder ao pagamento de imposto relativo aos períodos constantes das próprias declarações, fez uso de um dos meios admissíveis de pagamento para os devidos efeitos.
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Tendo operado uma compensação automática para dividas mais recentes e mesmo futuras, a AT prejudica a Recorrente, que continua a constatar que os juros a pagar da avultadíssima dívida em questão continuam a vencer, e viola o princípio civil e comercial previsto nos artigos 783.º e 784.º do Código Civil, e mesmo preceituado no n.º 4 do artigo 89.º do CPPT de que caso o devedor não faça designação, deverá o cumprimento imputar-se na dívida contraída em data mais antiga.
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A Autoridade Tributária não poderia ter operado a compensação automática nos termos cegos, mecânicos e arbitrários em que o fez, sendo a sua argumentação a este propósito facilitista e inadmissível, sendo o contribuinte alheio à pretensa complexidade inerente à sua pretensão, ainda para mais quando cumpriu com os formalismos impostos pelas normas que o Tribunal recorrido invoca.
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Urge ainda ressalvar que se encontrava pendente Reclamação Graciosa relativamente aos valores aqui em discussão que foram alvo da referida compensação, e que, mesmo que a Reclamação não tenha efeito suspensivo (artigo 69.º/ al. f) do CPPT), sempre se referirá que, face a tal circunstância, enquanto não for decidida a reclamação, os créditos não estarão em condições de ser compensados.
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É nosso entendimento que estando a Recorrente munida da documentação necessária imposta pelo artigo 9.º do Decreto-Lei para o pagamento de imposto junto da Fazenda Pública, mal andou o Tribunal recorrido na interpretação que fez daquele artigo, tendo igualmente sido violado o principio civil e comercial legalmente previsto nos artigos 783° e 784° do Código Civil e n.º 4 do artigo 89.º do CPPT que preceitua que caso o devedor não faça designação, deverá o cumprimento imputar-se na divida contraída em data mais antiga.» 2 – A Fazenda Publica não contra alegou.
3 – O Ministério Público emitiu parecer a fls. 281/283, no sentido do não provimento do recurso e com a fundamentação que, na parte mais relevante, se transcreve: «(…..) QUESTÃO PRÉVIA: Como resulta do disposto no artigo 276° do CPPT, são objecto da reclamação ali prevista «as decisões proferidas pelo órgão da execução fiscal e outras autoridades da administração tributária que no processo afectem os direitos e interesses legítimos do executado ou de terceiro...».
No caso concreto dos autos, o acto contra o qual a Recorrente se insurgiu - aplicação do valor dos cheques emitidos a favor do IGCP no pagamento de dívidas de IVA que se encontravam em pagamento - é da autoria da Direcção de Serviços de Cobrança do IVA e não do órgão de execução fiscal onde corre termos o processo de execução fiscal. Por outro lado o referido acto não foi praticado pela DSCIVA no âmbito de competências conexas com o processo de execução fiscal nº 19299201201026534.
Afigura-se-nos, assim, que a reclamação apresentada ao abrigo do disposto no artigo 276° do CPPT não é o meio processual adequado para impugnar o acto em causa, verificando-se erro na forma de processo, que inquina de nulidade todos os actos praticados a partir da data da apresentação da petição, nulidade que é de conhecimento oficioso e pode ser conhecida até sentença final e conduz à absolvição da instância - arts. 199°, 202°, 206° e 288°, n°1, alínea e), todos do CPC.
Mas mesmo que se entenda que a Recorrente se insurgiu contra o indeferimento implícito do seu pedido de abatimento na quantia exequenda dos pagamentos efectuados, apresentado ao órgão de execução fiscal em 16/01/2013, ao ser-lhe comunicada a informação da DSCIVA, afigura-se-nos que a sentença não merece a censura que o Recorrente lhe faz.
Com efeito e desde logo a Recorrente embora invoque de forma genérica a injustiça decorrente da improcedência da reclamação que apresentou, não indica que normas foram violadas ou qual a interpretação que o tribunal recorrido devia ter adoptado. O que revela a falta de fundamento legal que suporte o presente recurso.
Como se deixou supra enunciado, na sentença recorrida deu-se conforme com a lei a actuação da AT ao imputar os pagamentos efectuados pela Recorrente em sede de IVA nas dívidas entretanto liquidadas, ao abrigo do disposto no artigo 9° do Dec.-Lei nº 229/95, de 11 de Setembro. E a este propósito importa ter em consideração o disposto no n°2 do artigo 93º do CPPT, segundo o qual os pagamentos de dívidas que se encontrem na fase de cobrança coerciva serão...
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