Acórdão nº 330/09.6TVLSB.OL1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 01 de Abril de 2014

Magistrado ResponsávelGREGÓRIO SILVA JESUS
Data da Resolução01 de Abril de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Recurso de Revista Excepcional nº 330/09.6TVLSB.L1.S1[1] Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I— RELATÓRIO AA, residente no Lugar ..., ..., Braga, intentou acção declarativa de condenação, sob a forma ordinária, contra BB, com domicílio profissional na Rua .... nº …, Lisboa, pedindo a sua condenação a pagar-lhe uma indemnização no valor de 250.000,00€, acrescido de juros a contar da citação, por danos patrimoniais e não patrimoniais causados pela conduta do réu[2].

Para tanto, alegou, em síntese, que no dia 22/01/06 o réu, que conhecia o autor por este ser há vários anos cliente de uma sua colega de escritório, a Dra. CC, encontrou-se com o autor num hotel de Lisboa, onde dialogaram sobre uma acção administrativa especial e a eventual desistência da mesma, acção essa que havia sido interposta pelo irmão do réu, Dr. BB, e que o réu patrocinava contra a “DD -Investimentos Imobiliários, SA”, da qual é administrador e accionista o autor, encontrando-se a defesa dessa sociedade confiada à aludida Dra. CC.

O réu efectuou uma gravação da conversa que manteve com o autor, sem conhecimento nem consentimento deste, que posteriormente entregou na PJ, e, passando a actuar como agente encoberto daquela polícia, estabeleceu contactos telefónicos com o autor que foram gravados pela PJ, o que culminou com a constituição do autor como arguido no âmbito do processo nº 263/06.8JFLSB e com a divulgação pelos meios de comunicação social que o autor se teria proposto pagar certa quantia ao irmão do réu, com a finalidade de pôr termo à mencionada acção, e com a condição de o mesmo fazer uma declaração pública reconhecendo a legalidade dos negócios do DD, cuja anulação havia peticionado.

O autor entende que a acção encoberta levada a cabo pelo réu consubstancia uma violação dos seus deveres deontológicos, tendo dado origem a participação disciplinar ao Conselho de Deontologia da Ordem dos Advogados de Lisboa, para além de o fazer incorrer em responsabilidade civil extracontratual porquanto o mesmo praticou actos ilícitos que lhe causaram prejuízos incomensuráveis, desde logo pelo imediatismo que envolveu o caso, tendo o autor visto a sua imagem denegrida perante o público, passando a ser identificado como um corruptor sem escrúpulos, em consequência do que sofreu um enorme desgosto e um fortíssimo abalo psíquico que perturbaram a sua capacidade de trabalho e lhe causaram dificuldades de motivação e concentração no desempenho das suas tarefas como empresário, e passou a enfrentar dificuldades nos contactos com as mais diversas entidades públicas.

Regularmente citado, o réu contestou controvertendo o essencial dos factos alegados, pugnando pela improcedência da acção e pela condenação do autor como litigante de má fé.

O autor respondeu ao pedido da sua condenação como litigante de má fé concluindo pela respectiva improcedência.

Convidado a aperfeiçoar a petição no sentido de caracterizar, concretizando e quantificando, os danos patrimoniais que teria tido e, concomitantemente, para apontar o valor que atribuía aos danos não patrimoniais, o autor esclareceu que todos os danos fundamento do pedido indemnizatório que reclamava eram de natureza não patrimonial (fls. 125/126, 128/129, 136/137), vindo a ser proferido despacho que admitiu a restrição do pedido aos danos não patrimoniais (fls. 373).

Teve lugar uma audiência preliminar na qual foi concedido às partes prazo para juntarem documentos que se afiguravam pertinentes e proporcionadores de imediata decisão da causa (acta de fls. 149/151). O autor veio a pronunciar-se no sentido de que os autos ainda não reuniam condições para a decisão sobre o mérito, requerendo a suspensão dos seus termos até que a Ordem dos Advogados se pronunciasse disciplinarmente quanto aos factos que imputava ao réu, e juntando diversos documentos e dois Pareceres (fls. 153/228).

Por sua vez, o réu ofereceu a certidão judicial que se encontra de fls. 233 a 362, relativa a diversas peças e decisões do processo-crime referenciado, não se opôs à junção dos documentos e Pareceres oferecidos pelo autor, e discordou do pedido de suspensão dos autos.

Exarado tabular despacho saneador, de seguida, considerando que os autos dispunham de todos os elementos necessários para a decisão do mérito da causa, foi proferida sentença que julgou a acção improcedente e, em consequência, absolveu o réu do pedido, bem como o autor do pedido de condenação como litigante de má fé (fls. 374/399).

Inconformado, apelou o autor, mas sem êxito, porquanto a Relação de Lisboa, por unanimidade, no seu acórdão de 2/07/13 (fls. 1005 a 1042), julgando improcedente o recurso, confirmou a sentença recorrida.

Continuando irresignado, pediu revista excepcional a este Supremo Tribunal, invocando o disposto no art. 672.º, nº 1, al. c) do Código de Processo Civil, na redacção introduzida pela Lei nº 41/2013, de 26/06 (correspondente ao art. 721.º-A, nº 1, al. c) na redacção anterior do revogado Dec. Lei nº 303/2007, de 24/08), aceite pelo colectivo de Juízes que constituem a Formação a que alude nº 3 do mesmo normativo.

Nas alegações que apresentou formula as seguintes conclusões[3]: 10.ª - O Recorrente não se conforma com o acórdão recorrido, subscrevendo, ao invés, o entendimento sufragado pelo acórdão fundamento. Daí o presente recurso.

  1. - Manda o Código de Processo Civil que o Juiz, ao fixar a base instrutória, seleccione a matéria de facto relevante para a decisão da causa, segundo as várias soluções plausíveis da questão de direito, que devam considerar-se controvertidas (cfr. art. 511.º do CPC na redacção do DL 303/2007); no caso em apreço o Tribunal de 1.ª instância procedeu de outro modo, em violação do referido preceito legal: primeiro terá optado por uma determinada solução da questão de direito e só depois terá seleccionado a matéria de facto, desprezando toda a factualidade alegada na petição inicial que está em oposição com a opção trilhada; para além de violar a lei, a decisão sobre a matéria de facto padece de deficiência, tal como alegado no recurso de apelação, não tendo sido possível ao Autor/Recorrente reclamar contra a selecção da matéria de facto visto que a Merítissima Juiz de 1.ª instância proferiu despacho saneador-sentença.

  2. - Na P.I. o Autor/Recorrente imputa ao Réu/Recorrido a prática de alguns comportamentos que, se provados, são passíveis de ser qualificados como factos ilícitos, geradores de responsabilidade civil extracontratual e o Autor/Recorrente alega também factos que, se provados, são passíveis de ser qualificados como danos não patrimoniais, merecedores da tutela do direito, mais invocando o nexo de causalidade entre o comportamento do Réu/Recorrido e tais danos (vide artigos 79.º a 83.º da P.I.): - Em virtude do comportamento do Réu, o Autor viu a sua imagem perante o público completamente denegrida, - Porquanto passou a ser identificado publicamente como um corruptor sem escrúpulos, - Vendo afectada, de modo irreversível, a imagem de homem probo, digno, consciencioso, sério e honesto de que sempre gozou junto de todas as pessoas em geral; - Em consequência do comportamento do Réu, o Autor sofreu igualmente um enorme desgosto e um fortíssimo abalo psíquico.

  3. - Daí a invocação pelo Recorrente nas suas alegações de apelante da necessidade de ampliação da matéria de facto por forma a abarcar-se a dita factualidade invocada na P.I., tendo o acórdão recorrido decidido, contudo, pela irre1evância de tal factualidade, para de seguida concluir pela não invocação pelo Autor/Recorrente de factos concretizadores do nexo de causalidade invocado! Ora, todos aqueles factos - considerados irrelevantes pelo Tribunal a quo - são da maior relevância para a decisão da causa, por sustentarem a verificação, in casu, de requisitos da responsabilidade civil por factos ilícitos - o dano e o nexo de causalidade.

  4. - Entendeu o Tribunal recorrido, e mal, que o Autor/Recorrente não alegou factos conducentes ao estabelecimento do nexo de causalidade entre a conduta do Réu/Recorrido e os alegados danos, pelo que faleceria esse pressuposto da responsabilidade civil. Ora, tal como defendido no acórdão fundamento, se a Meritíssima Juiz de 1." instância entendia que não tinham sido alegados factos suficientes para o estabelecimento do nexo de causalidade entre a conduta do Réu/Recorrido e os danos alegados pelo Autor/Recorrente - o que teria sido facilmente ultrapassado com o deferimento da ampliação da matéria de facto requerida pelo Autor/Recorrente por forma a abarcar a supra referida factualidade invocada na P.I. -, deveria então a Meritíssima Juiz, em homenagem ao princípio da verdade material, em detrimento da verdade formal, e nos termos do disposto no art.º 508.°, n.º 2, do C.P.C., ter convidado o Autor/Recorrente a suprir a dita irregularidade na concretização da matéria de facto alegada. 15. ª - Ao ter omitido o mencionado despacho de convite ao aperfeiçoamento, nos termos do art.º 508.°, n.º 2, do C.P.C., cometeu o Tribunal a quo, como tem vindo a entender a Jurisprudência, uma irregularidade susceptível de influir no exame e decisão da causa e, por isso, uma nulidade processual, nos termos do art.º 201°, n.º 1 do C.P.C., que o Recorrente arguiu, nos termos do art.º 205.° do C.P.C. e para todos os devidos efeitos legais.

  5. - O dever imposto ao Tribunal pelo disposto no citado art.º 508.°, n.º 2 do C.P.C. encontra-se amplamente retratado no Acórdão fundamento - Ac. deste STJ de 04.02.2010 (disponível em www.dgsi.pt e publicado na CJSTJ, ANO XVIII, TOMO 1/2010, P. 48 - Processo n." 199-D/1982.Ll.SI - 2.a Secção, relatado por João Bernardo), que se anexa. Ali se defende que, estando em causa o êxito ou o malogro da acção, tal como manifestamente se verifica no caso concreto, na medida em que na decisão recorrida se entende não ter sido alegada factualidade referente a um dos pressupostos essenciais à verificação de responsabilidade civil extracontratual- o nexo de causalidade -, são de subsumir no n.º 2 e não no n.º...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT