Acórdão nº 632/08 de Tribunal Constitucional (Port, 23 de Dezembro de 2008
Magistrado Responsável | Cons. Maria Lúcia Amaral |
Data da Resolução | 23 de Dezembro de 2008 |
Emissor | Tribunal Constitucional (Port |
ACÓRDÃO N.º 632/2008
Processo n.º 977/2008
Plenário
Relatora: Conselheira Maria Lúcia Amaral
Acordam, em Plenário, no Tribunal Constitucional
I
Relatório
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O Presidente da República requereu, nos termos do n.º 1 do artigo 278.º da Constituição da República Portuguesa e dos artigos 51.º, n.º 1, e 57.º, n.º 1, da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, que o Tribunal Constitucional aprecie a conformidade com a Constituição da norma constante da alínea a) do n.º 1 do artigo 112.º do Código do Trabalho, na Revisão aprovada pelo Decreto n.º 255/X da Assembleia da República, recebido na Presidência da República no dia 5 de Dezembro de 2008 para ser promulgado como lei.
O pedido de fiscalização de constitucionalidade apresenta, em síntese, a seguinte fundamentação:
A norma prevista na alínea a) do n.º 1 do referido artigo 112.º dispõe sobre a duração do período experimental nos contratos de trabalho por tempo indeterminado e procede a um significativo alargamento da duração do período experimental quanto aos trabalhadores indiferenciados;
Esta norma é uma norma restritiva de direitos, liberdades e garantias, pois quanto mais dilatado for o período experimental maior a precariedade da relação jurídico-laboral e mais frágil a garantia na segurança do emprego;
E a regra constante do n.º 1 do artigo 53.º da Constituição, sistematicamente inserida no domínio dos Direitos, liberdades e garantias dos trabalhadores, reconhece aos trabalhadores o direito à segurança no emprego, dela resultando a garantia da proibição dos despedimentos sem justa causa;
Atendendo à natureza do direito à segurança no emprego e à natureza restritiva da norma em apreço, deve verificar-se se a restrição operada respeita, nos termos do n.º 2 do artigo 18.º da Constituição, o princípio da proporcionalidade, no contexto dos seus sub-princípios da adequação, necessidade e, complementarmente, da razoabilidade;
À luz do corolário da adequação, o aumento da duração do período experimental para os trabalhadores indiferenciados (de 90 para 180 dias) suscita dúvidas quanto à sua idoneidade para atingir o fim atribuído ao período experimental (avaliação pelas partes do seu interesse na prossecução do vínculo laboral). As dúvidas emergem, desde logo, do contexto histórico-jurídico do período experimental (onde se enquadra a evolução do instituto entre nós e elementos de Direito comparado);
Assim, e por um lado, um trabalhador não carecerá do dobro do prazo em vigor estipulado para o período experimental para aferir sobre a conveniência das condições oferecidas pela empresa, tanto mais que pode rescindir o contrato a todo o tempo, sem necessidade de justa causa, desde que observe o aviso prévio exigido; por outro lado, no que respeita às profissões indiferenciadas, carentes de qualquer especialização relevante, não parece líquido que o empregador necessite, objectivamente, de meio ano para avaliar as qualidades profissionais dos seus trabalhadores tendo em vista a celebração de um contrato de trabalho por tempo indeterminado;
A regra constante do n.º 4 do artigo 112.º não compensa o alargamento operado pela norma em análise;
O alargamento do período experimental para trabalhadores indiferenciados parece não se harmonizar também com a medida de valor da necessidade, a qual, nos termos textuais do n.º 2 do artigo 18.º da Constituição, impõe que a restrição legal a um direito, liberdade ou garantia se afigure exigível ou mesmo indispensável para salvaguardar outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos;
O alargamento do período experimental para os trabalhadores indiferenciados não serve na mesma medida o trabalhador (que pode sempre rescindir o contrato mediante aviso prévio) e a entidade empregadora (que só naquele período pode rescindir o contrato sem justa causa e evitar vincular-se a um contrato indesejável);
O aumento do período experimental para trabalhadores indiferenciados parece não ser um meio necessário para permitir à entidade empregadora avaliar as qualidades dos seus trabalhadores do regime geral, pelo que, a constituir uma medida inidónea ou desnecessária, muito dificilmente poderá ter-se como exigível ou indispensável para salvaguardar a sua autonomia contratual;
Da ponderação entre o bem jurídico afectado pela restrição (o direito à segurança no emprego e à garantia da proibição do despedimento sem justa causa - artigo 53.º da Constituição) e a autonomia privada das partes e direito de iniciativa privada (n.º 1 do artigo 26.º e n.º 1 do artigo 61.º, ambos da Constituição) não resulta que o alargamento do período experimental para os trabalhadores indiferenciados seja uma medida exigível;
No contexto global do sistema, constata-se que a revisão do Código do Trabalho aprovada pelo Decreto n.º 255/X implica um maior rigor e onerosidade na celebração de contratos a termo, tornando mais limitada a utilização desta forma de trabalho precário que tem sido convocada por vezes, excessivamente, como modo de atenuar a alegada rigidez do sistema de cessação do contrato do trabalho por tempo indeterminado;
O alargamento do período experimental nos termos discutidos pode operar como factor compensatório da maior dificuldade ou onerosidade de celebração de contratos a termo certo;
No entanto, a concordância prática entre dois direitos em tensão, como efeito de restrições que o legislador possa determinar ao seu modo de exercício, tem como limite a necessidade de as mesmas restrições não subverterem o finalismo dos institutos jurídicos que lhes subjazem, nomeadamente, a teleologia dos contratos a termo e do período experimental. No caso, não parece ser possível operar uma concordância prática entre a salvaguarda do direito de iniciativa privada e o sacrifício do direito à segurança no emprego;
Independentemente do uso que tenha sido feito em relação à contratação a termo certo, uma maior limitação do seu uso (como forma de recondução do seu regime aos respectivos pressupostos legais e constitucionais) não pode ser legitimamente compensada, por via indirecta, com o aumento de outra forma de precariedade laboral, através de um expressivo alargamento do período experimental, em violação do princípio da segurança no emprego constante do n.º 1 do artigo 53.º da Constituição;
Assim, o período experimental dos contratos por termo indeterminado seria convolado em nova forma de contratação a prazo pelo período de seis meses, com a agravante de se tratar de um regime laboral cuja rescisão se encontra desprovida de forma específica, direito a indemnização e justa causa para a sua resolução, constituindo, ainda, um factor de agravamento da precariedade laboral, na medida em que, contrariamente à contratação a prazo, não seria susceptível de renovação;
O direito à iniciativa privada exerce-se em conformidade com o interesse público ao qual não será estranho o acréscimo da precariedade laboral;
A consagração de um período experimental sem atender à distinção entre trabalhadores indiferenciados e trabalhadores especializados suscita dúvidas quanto a uma eventual violação do princípio da igualdade.
O Presidente da República conclui da seguinte forma:
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Existem, em conclusão dúvidas sobre se, à luz da Jurisprudência do Tribunal Constitucional (Acórdão n.º 54/91), a liberdade de conformação do legislador para a fixação do período experimental na alínea a) do n.º 1 do artigo 112.º do decreto não terá excedido, para o trabalho indiferenciado incluído no regime geral, os limites constitucionais impostos pelo principio da proporcionalidade, ao fixar um período de tal forma prolongado que resulte desvirtuado o princípio da segurança no emprego mediante uma duração estendida por um tempo demasiado longo que possa constituir uma forma ( ) de permitir o despedimento sem justa causa.
E requer o pedido de fiscalização de constitucionalidade nos seguintes termos:
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Atenta a fundamentação das dúvidas de constitucionalidade expostas no presente pedido, venho requerer ao Tribunal Constitucional que aprecie a conformidade da norma da alínea a) do n.º 1 do artigo 112.º do Decreto n.º-255/X da Assembleia da República, quando aplicada aos trabalhadores do regime geral que exercem trabalho indiferenciado, com a norma do artigo 53.º da CRP, conjugada com o n.º 2 do artigo 18.º da CRP e com os n.ºs 1 e 2 do artigo 13.º da CRP.
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Nos termos do n.º 8.º do artigo 278.º da CRP, fixo o encurtamento do prazo de pronúncia do Tribunal Constitucional para quinze dias.
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O requerimento deu entrada neste Tribunal no dia 12 de Dezembro de 2008 e o pedido foi admitido na mesma data.
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Notificado para o efeito previsto no artigo 54.º da Lei do Tribunal Constitucional, o Presidente da Assembleia da República veio apresentar resposta na qual oferece o merecimento dos autos.
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Apresentado e discutido o memorando a que alude o artigo 58.º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional, cumpre decidir de acordo com a orientação que então se fixou.
II
Fundamentos
A)
A questão de constitucionalidade
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O pedido apresentado ao Tribunal vem circunscrito como se depreende do relato atrás feito à apreciação de uma única norma.
Pretende, com efeito, o requerente que o Tribunal se pronuncie, a título preventivo, sobre o disposto na alínea a) do artigo 112.º do Código do Trabalho, na Revisão aprovada pelo Decreto n.º 255/X da Assembleia da República.
Sob a epígrafe «Duração do período experimental», dispõe do seguinte modo o referido n.º 1 do artigo 112.º:
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No contrato de trabalho por tempo indeterminado, o período experimental tem a seguinte duração:
a) 180 dias para a generalidade dos trabalhadores;
b) 240 dias para trabalhador que exerça cargo de direcção ou quadro superior.
A redacção do preceito visa alterar o disposto no artigo 107.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n.º 99/2003, e que vigora hoje com o seguinte teor:
Contratos por tempo indeterminado
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