Acórdão nº 00048/10.7BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 28 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelCarlos Lu
Data da Resolução28 de Fevereiro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO ALRP...

, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Braga, datada de 14.06.2012, proferida nos autos de ação administrativa comum, sob a forma sumária, emergente de responsabilidade civil extracontratual instaurada contra a atual “ASCENDI NORTE - Auto- Estradas do Norte, SA” [anterior “AENOR - Auto-Estradas do Norte, SA”] e na qual é interveniente acessório a atual “CE..., SA - sucursal em Portugal” [anterior “AE..., LIMITED”] e que, julgando improcedente a sua pretensão de condenação da R. no pagamento de indemnização no valor de 6.037,09 € [referente à reparação da sua viatura e a danos decorrentes da privação do uso da mesma], absolveu a R. do pedido.

Formula o A. aqui recorrente nas respetivas alegações as seguintes conclusões que se reproduzem [cfr. fls. 252 e segs. e fls. 392 e segs. após convite ao seu aperfeiçoamento - paginação processo suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário]: “...

  1. Entre os factos dados como provados nos pontos 11) e 12) e 14) e 15) dos factos provados, existe uma contradição insanável; B) O Mm.º Juiz «a quo» considera erradamente que a vigilância e o patrulhamento dos tabuleiros superiores das auto-estradas é da responsabilidade de outras entidades e que os mesmos não integram a concessão; C) As passagens superiores às auto-estradas integram estas vias e são zonas de restabelecimento de ligações existentes; D) Se não incumbe à Ré a vigilância dos tabuleiros superiores, porque razão no dia do acidente efetuaram diversos patrulhamentos no local deste e não detetaram qualquer objeto no viaduto ou nas imediações do local; e ainda, porque é que refere que nesse mesmo dia e na sequência dos patrulhamentos não foram avistadas quaisquer pessoas suspeitas no tabuleiro do viaduto; E) Esta contradição insanável, motiva a necessidade de se proceder à alteração da matéria de facto e em consequência alterar os pontos 11), 12), 14) e 15) dos factos provados, por forma a que fique, num único quesito a constar que a vigilância e patrulhamento das passagens superiores na A7 é da responsabilidade da Ré e que, apesar de nesse dia terem passado no local os colaboradores desta, de nada se aperceberam; F) Sobre a concessionária (Ré) impende uma presunção legal de culpa; G) A Ré teria que ilidir essa presunção, demonstrando que tudo fez para que o caso que motivou o acidente dos autos, não ocorresse; H) Nada disso a Ré demonstrou, limitando-se a afirmar que nesse dia efetuou vários patrulhamentos ao local e que de nada se apercebeu; I) Ficou provado que o viaduto em causa possui apenas um gradeamento «guarda-corpos» e mais nenhuma proteção, que impeça inclusivamente o arremesso de objetos para a via; J) O Mm.º Juiz «a quo», a este propósito refere que, mesmo a existência de uma outra proteção no viaduto, nunca impede o arremesso de objetos para a via; K) «In casu», foi diretamente arremessado um boneco acolchoado que possuía igual silhueta à de uma pessoa; tal boneco nunca poderia ser arremessado para a via, com a eficácia intencional conseguida, se no local existisse outro tipo de proteção; é que é bem diferente poder debruçar-se sobre a via e calcular milimetricamente o arremesso, de atirar um objeto por cima de uma vedação, com a dose de incerteza do local onde o mesmo pode cair; L) É da responsabilidade da Ré, a colocação nas passagens superiores de proteções adicionais; M) O facto de ter sido dado como provado que até à data do acidente dos autos, não havia registo de quaisquer outros casos similares, não é elemento bastante para a ilisão da presunção que impende sobre a Ré; N) E nem as passagens pelo local, dos colaboradores da Ré, é por si só suficiente para ilidir a presunção de culpa que impende sobre esta; O) Face ao supra referido temos que a douta sentença recorrida, aplicou ao caso em presença os pressupostos da responsabilidade civil ínsitos no artigo 483.º do Código Civil, o que pressupõe a prática de um facto ilícito e culpa, in casu, da recorrida AENOR; P) Ao invés, ao caso dos autos tem que ser aplicada a Lei n.º 24/2007, de 18 de julho, que define direitos dos utentes nas vias rodoviárias classificadas como auto-estradas concessionadas, itinerários principais e itinerários complementares; Q) Em concreto a norma a aplicar é a constante do artigo 12.º, alínea a) do referido diploma legal e no que tange à responsabilidade, em caso de acidente rodoviário em auto-estrada, provocado por objeto arremessado para a via; R) Nos termos deste preceito legal é a concessionária que tem o ónus de prova do cumprimento das obrigações de segurança; S) Impende, por isso, sobre a recorrida uma presunção de culpa, que teria que ilidir, o que não fez, pelo que a douta sentença teria que julgar a ação procedente; T) Assim, ao aplicar o regime geral da responsabilidade civil, ao caso dos autos, o Mm.º Juiz «a quo», violou o disposto no artigo 12.º, alínea a) da Lei n.º 24/2007, de 18 de julho, lei especial, que derroga a lei geral, pelo que violou também os preceitos legais que aplicou, por inaplicáveis - artigos 2.º e 4.º do DL n.º 48051, de 21 de novembro e 483.º, 487.º, n.º 2 e 493.º do Código Civil …”.

    Termina no sentido do provimento do recurso com revogação da decisão judicial recorrida e total procedência da pretensão deduzida.

    Devidamente notificada a R. e a interveniente acessória ambas vieram produzir contra-alegações [respetivamente, a fls. 333 e segs./fls. 414 e segs. e a fls. 343 e segs.

    ] nas quais pugnam pela improcedência do recurso do A. sem que hajam efetuado qualquer síntese conclusiva.

    O Digno Magistrado do Ministério Público (MP) junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA, emitiu parecer no sentido da procedência do recurso [cfr. fls. 374/375], pronúncia essa que objeto de contraditório mereceu resposta discordante por parte da R. [cfr. fls. 379 e segs.

    ].

    Colhidos os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos foram os autos submetidos à Conferência para julgamento.

    1. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo recorrente, sendo certo que, pese embora por um lado, o objeto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos arts. 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º 4 do CPTA, 05.º, 608.º, n.º 2, 635.º, n.ºs 4 e 5 e 639.º do CPC/2013 [na redação introduzida pela Lei n.º 41/013, de 26.06 - cfr. arts. 05.º e 07.º, n.º 1 daquele diploma -, tal como todas as demais referências de seguida feitas relativas a normativos do CPC] [anteriores arts. 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 685.º-A, n.º 1 todos do CPC - na redação introduzida pelo DL n.º 303/07, de 24.08] “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal “ad quem” em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a decisão judicial recorrida porquanto ainda que a declare nula decide “o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito” reunidos que se mostrem no caso os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.

      As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida ao julgar totalmente improcedente a pretensão deduzida pelo A. incorreu ou não em erro de julgamento de facto e de direito por enfermar de violação do disposto, nomeadamente, nos arts. 12.º, al. a) da Lei n.º 24/2007, de 18.07, 02.º e 04.º do DL n.º 48051, de 21.11.1967, 483.º, 487.º, n.º 2 e 493.º do CC [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas].

    2. FUNDAMENTOS 3.1.

      DA DECISÃO JUDICIAL RECORRIDA O TAF de Braga em apreciação da pretensão formulada pelo A., aqui recorrente, veio a julgar a mesma totalmente improcedente absolvendo a R. porquanto considerou que esta não era responsável civilmente pelos danos que terão sido sofridos pelo A. em decorrência do arremesso de objeto de viaduto para a A7.

      ð3.2.

      DA TESE DO RECORRENTE Contra tal julgamento se insurge o A. sustentando que, no caso, o tribunal recorrido incorreu quer em erro de julgamento de facto [n.ºs XI), XII), XIV) e XV) dos factos fixados - respostas dadas aos itens 16.º), 17.º), 18.º) e 19.º) da «B.I.»] e direito traduzido na infração, nomeadamente, ao disposto nos arts. 12.º, al. a) da Lei n.º 24/2007, 02.º e 04.º do DL n.º 48051, 483.º, 487.º, n.º 2 e 493.º do CC, termos em que pugna pela revogação do julgado e procedência da sua pretensão.

      ð3.3.

      DO MÉRITO DA INSTÂNCIA DE RECURSO 3.3.1.

      DO ERRO JULGAMENTO DE FACTO I.

      Centrando nossa atenção na impugnação do julgamento de facto realizado importa, desde logo, ter presente que a este Tribunal assiste o poder de alterar a decisão de facto fixada pelo tribunal “a quo” desde que ocorram os pressupostos vertidos nos arts. 662.º CPC/2013 [anterior art. 712.º do CPC/07] e 149.º do CPTA, incumbindo-lhe, nessa medida, reapreciar as provas em que assentou a decisão impugnada objeto de controvérsia, bem como apreciar oficiosamente outros elementos probatórios que hajam servido de fundamento à decisão sobre aqueles pontos da factualidade controvertidos.

      II.

      Com o DL n.º 39/95, de 15.02, foram introduzidas profundas alterações no nosso ordenamento jurídico adjetivo ao se possibilitar o registo da audiência de discussão e julgamento com gravação integral da prova produzida.

      III.

      Tal alteração em conjugação com as revisões do CPC [operadas, no que releva para os autos, pelo DL n.º 329-A/95, de 12.12, pelo DL n.º 180/96, de 25.09, e pelo DL n.º 183/2000, de 10.08] vieram instituir, de forma mais efetiva, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto consagrando-se, como regime-regra, a gravação da prova produzida em audiência de julgamento e, dessa forma, permitir uma verdadeira e conscienciosa reapreciação da decisão de facto ditada na...

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