Acórdão nº 870/10.4TTMTS.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Março de 2014

Magistrado ResponsávelMELO LIMA
Data da Resolução12 de Março de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I 1. AA instaurou, em 12 de março de 2010, no Tribunal do Trabalho de Matosinhos, a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra BB, agremiação de utilidade pública, com sede no ..., pedindo que seja declarada a ilicitude do seu despedimento e, por via disso, o R. seja condenado a pagar ao autor as retribuições correspondentes a 4 épocas desportivas, o subsídio mensal de renda de casa correspondente às quatro épocas, o bónus pela participação em jogos em cada época desportiva e o prémio pela assinatura do contrato, tudo no valor de € 304.000,00, acrescido de juros de mora.

Para tanto alegou que é jogador profissional de futebol, com a categoria de sénior, tendo celebrado, em 10 de junho de 2009, contrato de trabalho desportivo com o R. para as épocas de 2009/2010 a 2012/2013, tendo ficado acordado que o A. se deslocaria, passado uma semana, à cidade do ... para proceder à realização dos exames médicos na sede do R., para o que esta o contactaria.

Apesar disso, o R. não voltou a contactar o A., tendo as tentativas de contacto do A. com o legal representante do R. ficado frustradas até que, por intermédio do empresário do autor, o R. lhe fez saber, em 22/06/2009, que prescindia dos seus serviços.

2.

O R. contestou, arguindo a exceção da litispendência, sob a alegação de que, quando a ação foi instaurada, estava pendente a ação ordinária nº 3711/10.9TBMTS, no 6º juízo cível do Tribunal da Comarca de Matosinhos, sendo os mesmos os sujeitos, o pedido e a causa de pedir. Alegou o R., ainda, a caducidade do contrato celebrado com o A., por este, à data da celebração do mesmo, não estar desvinculado do CC. – Futebol SAD, com o qual mantinha um contrato, pelo que o contrato com o R. se tornou de cumprimento impossível, já que não era possível ao réu inscrever o autor para a época desportiva 2009/2010.

De igual passo, invocou a nulidade, ineficácia e inexigibilidade do contrato, uma vez que o A., sabendo que se mantinha vinculado ao CC, nunca se apresentou no BB, nem para exames médicos.

Impugnou, outrossim, o alegado pelo A., justificando que o contrato nunca iniciou a sua vigência, motivo pelo qual não podia ter cessado, concluindo nada dever ao A., seja a título de remunerações, prémios ou outras obrigações.

Sob a invocação dos prejuízos decorrentes do não cumprimento do contrato, designadamente de eventual venda de direitos de inscrição desportiva e direitos económicos, o R. deduziu pedido reconvencional contra o A., pedindo a condenação deste no pagamento ao R. da quantia de € 150.000,00.

Requereu, finalmente, a condenação do A. como litigante de má-fé, em multa e indemnização condignas.

3.

O A. respondeu às exceções e ao pedido reconvencional, concluindo pela improcedência quanto àquelas e quanto a este.

4.

Na audiência preliminar, foi proferido despacho de não admissão do pedido reconvencional.

No saneamento do processo, foi julgada improcedente a exceção da litispendência.

A seleção da matéria de facto assente como a base instrutória, não foram objeto de reclamação.

5.

Procedeu-se a julgamento, com prolação de decisão sobre a matéria de facto, que não mereceu reclamação.

Na sentença proferida, foi do seguinte teor o segmento dispositivo (decisum): «Por todo o exposto julgo a ação improcedente e em consequência decido absolver o R. BB de todos os pedidos contra ele formulados pelo A. AA.

Custas da ação pelo A. (art. 446º, nº 1 do C.P.C.).

Valor da ação: € 454 000,00 (quatrocentos e cinquenta e quatro mil euros), sendo € 304 000,00 (trezentos e quatro mil euros) da ação e € 150 000,00 (cento e cinquenta mil euros) da reconvenção, nos termos do disposto pelo art. 308º, nº 2 do C.P.C.)».

6. Inconformado com o assim decidido, o A. interpôs recurso de apelação, impugnando a matéria de facto e pedindo a revogação do sentido decisório alcançado na sentença, devendo esta ser substituída por outra que, atendendo a pretensão do Autor, condene a Ré no pedido inicial.

7. O Tribunal da Relação do Porto, na apreciação da questão de facto, aditou ao acervo comprovado os factos que consignou sob os nºs 23 e 24.

No conhecimento das questões de direito, exarou, a final, o seguinte dispositivo: «Revogam a sentença recorrida, substituindo-a pelo presente acórdão que julga a ação parcialmente procedente por provada e em consequência:

  1. Declara que o A. foi ilicitamente despedido; b) Condena o R. a pagar ao A. a quantia, que se vier a apurar em liquidação do presente acórdão, relativa à diferença entre os valores totais de retribuição, subsídio de renda de casa e prémio de assinatura do contrato, estabelecidos no contrato de trabalho firmado entre as partes, e os valores auferidos pelo A. em função do contrato que manteve com a CC Sport Clube S.A.D. nas épocas desportivas de 2009/2010 e 2010/2011, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento. Custas por ambas as partes, em ambas as instâncias, na proporção do decaimento, que se fixa em 1/8 para o A. e 7/8 para o R.» 8.

    Agora inconformado, na parte do respetivo decaimento, o R. interpôs revista para este Supremo Tribunal, apresentando as respetivas alegações, que concluiu da seguinte forma: I - O Clube R., não despediu por qualquer forma o ora A.

    II - O A. e ora Recorrido, eventualmente considerou-se "despedido", por conversa, que diz ter havido entre ele A. e o seu empresário DD, que lhe terá feito saber que o Clube R. não estaria interessado na concretização do contrato ... , sendo certo que este empresário, não depôs em audiência de julgamento, antes foi prescindido pelo A.

    IIII - O agente DD, era agente FIFA, contratado pelo jogador ora A., para o negócio "sub judice" IV - Não estava, de forma nenhuma, mandatado pelo R., nem podia estar, por incompatibilidade de interesses - art°. 22/2 da LCTD, e art. 19°/1 do Regulamento de Agentes FIFA, no negócio que ora se discute.

    v - Tal situação, do referido desinteresse da concretização do contrato, nunca foi acionada, confirmada, ratificada, pelo R. CDN, ao A. e Recorrido, VI - Nem nunca o A. procurou, junto do R. CDN, por forma alguma, confirmar ou infirmar tal comunicação que lhe terá sido feita pelo empresário DD.

    VII - E, tal dever e interesse de agir competia-lhe. Era expectável que assim o fizesse, antes de, VIII - voltar a outorgar um contrato de trabalho de praticante desportivo profissional, com o CC Sport Clube - Futebol SAD, de quem, afinal, não estava desvinculado quando outorgou o contrato em apreço com o R. CDN, embora tivesse afirmado expressamente o contrário - item 19 da PI, e, IX - item 5 dos Factos Provados, da douta sentença da 1ª instância, o que levou a Mª Juiz que dirigiu o julgamento a afirmar: "Basicamente o que nós tínhamos era o Sr. AA a jogar em dois tabuleiros ao mesmo tempo ... ".

    x - Mas, ainda é premiado por tal comportamento (art°s. 355°/3/4 e 358°/2 do CC), e revelador de boa fé contratual (art. 227°/1, do CC), que não anda dissociada do princípio da confiança, dos deveres de lealdade, para com a entidade patronal - art°. 13°.-a) do CCT/LPFP/SJPF, ou do princípio da estabilidade ou eficácia dos contratos (contrato com o CC SC - Futebol SAD, com o R CDN, com o CC de novo) art° 1°/3-b) art°. 13, com referência ao artº. 406° do CC.

    XI - O A. no contrato "sub judice", indicou como domicilio a sede social do R. CDN - R. … …, … da cidade do ... - e posteriormente nunca indicou ou supriu esta situação, indicando o local de residência ou onde poderia ser encontrado ou procurado, e tal conduta competia-lhe se queria ser contactado pelo R. CDN XII - O A. não se apresentou, no início da época, ao trabalho, ou seja, no dia 1 de Julho de 2009, como estava contratualmente estipulado, ou para fazer os exames médicos a que estava vinculado - art° 13° da LCTD, XIII - Nem nunca requisitou a passagem aérea ao R. CDN, para a RAM.

    XIV - O que se fala no contrato de trabalho que constitui doc. 2, junto com a PI, é de um subsídio de fixação, ou seja, mais do que um apoio para a renda de um apartamento, era necessário, que o titular do direito se fixasse na RAM. O que nunca aconteceu.

    xv - Também se não concorda, que o A., tenha direito ao prémio de assinatura, porque este direito estava subsumido, ao início ou execução do contrato o que nunca aconteceu. Não se trata de salário, de vencimento, de ordenado, mas de um prémio, de um bónus.

    Conclusões que rematou com as seguintes indicação normativa e impetração: «Em consequência, com a douta sentença recorrida, …, violou o douto acórdão do TRP “a quo'', O disposto nos art°s. 82°, 83°, 219°, 220°, 227°/1, 260°, 334°, 355°/3/4, 358°/2, 406°, 1157°, do CC, arts°. 128°/1-b), 260°/1-A), do CT, arts. 237°-A/1/2, 515° do CPC, artsº 6°/1, 22°/2 LCTD (Lei 28/98), art°s 5°/1/3, 8°, 13°-B) e 48°/2 do CCTJ/IPFP/SJPF e art°s. 5°/1/2 e 19°./1 do Reg. Agentes FIFA.

    Nestes termos, e, nos mais de Direito, …, deverá ser concedido provimento ao recurso revogando-se o douto acórdão do Venerando TRP, e substituindo-se por outro, em tudo idêntico à doutamente produzida na 1ª instância.» 9. O A. apresentou contra-alegações, pugnando no sentido da improcedência do recurso, concluindo do seguinte modo: 1 - A matéria de facto julgada pelo Venerando Tribunal da Relação não pode ser reapreciada com fundamento em erro.

    2 - Não foi apontada, nem existe, qualquer ofensa de disposição expressa de lei que exija certa espécie de prova para a existência dos factos dados como provados.

    3 - Consequentemente, não se verificam os pressupostos exigidos ao artigo 722.°, nº 3 do C.P.C.

    4 - Porque assim é, deve manter-se a matéria de facto dada como provada pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto.

    Sem prescindir, 5 - A quantia de € 500,00 atribuída pelo contrato de trabalho a título de alojamento - apartamento - integra retribuição.

    6 - Tal quantia não corresponde a nenhum subsídio de insularidade, tanto mais que no contrato de trabalho que o Autor viria posteriormente a...

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