Acórdão nº 10820/14 de Tribunal Central Administrativo Sul, 06 de Março de 2014

Magistrado ResponsávelCRISTINA DOS SANTOS
Data da Resolução06 de Março de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

O Sindicato dos Trabalhadores dos Impostos, com os sinais nos autos, inconformado com a sentença proferida pelo Mmo. Juiz do Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa dela vem recorrer, concluindo como segue.

1. A implementação de um novo regime de horário para os aqui representados do Recorrente, constituiu uma nova medida introduzida de forma inesperada que afetou os seus planos de vida, traduzindo-se numa violação dos princípios da proibição do retrocesso social, da segurança jurídica e da confiança legitimamente consideradas, que se extraem da definição do Estado de direito democrático consagrado no art 2° da CRP; 2. Para a sua implementação nenhum princípio da exigibilidade ou necessidade, ou da adequação e da proporcionalidade foi devidamente invocado e justificado na adopção da presente restrição e imposição, o que acarreta a sua invalidade; 3. Como consequência imediata desta nova medida - aumento da duração semanal do trabalho para 40 horas, mais 5 horas do que a duração atual - encontramos uma clara redução permanente da remuneração dos trabalhadores em funções públicas (mais trabalho por mais horas, mantendo-se inalterada a remuneração, o que se traduz numa perda da remuneração),com expressa violação de um direito fundamental dos trabalhadores, cuja consagração constitucional se encontra plasmada no art.° 59°, n.° 1, alínea a) da CRP; 4. A imposição como período normal do horário de trabalho de 8 horas diárias e 40 semanais constituiu uma ofensa clara dos preceitos constitucionais invocados, motivo que por si só formula o juízo positivo de probabilidade, e a subsequente justificação pela adopção da presente medida cautelar; 5. No que respeita à alegada falta de concretização dos prejuízos que a presente medida legislativa impõe aos associados do Recorrente, sempre se diga que esta consubstancia, por si mesmo, um dano irreparável aos direitos, liberdades e garantidas dos associados do Recorrente, constitucionalmente consagrados, com sacrifício sério e grave, em face dos direitos em causa, constituindo claramente uma situação que, consumando-se, será de muito difícil reparação no futuro; 6. Este acréscimo de horas de trabalho representa uma redução efetiva do valor da remuneração até aqui auferida pelos associados do Recorrente, consubstanciando tal medida, também, um dano irreparável no direito a uma justa retribuição do trabalho; 7. É por demais evidente a procedência da pretensão material a formular no processo principal, razão que por si só justificaria a adopção da presente medida cautelar, de forma a evitarem-se os alegados prejuízos e sacrifícios, inevitáveis e impossíveis de atenuação.

* O Ministério das Finanças e da Administração Pública contra-alegou, concluindo como segue: 1. No caso sub judice, não é manifesta a procedência da pretensão a formular no processo principal, porquanto as questões a resolver "se revelam complexas e carecidas de mais indagações, o que é evidenciado pelos argumentos aditados não só pelo Recorrente", como também pelo conteúdo da oposição do Requerido e ora Recorrido.

2. Com efeito, perante os argumentos esgrimidos pelas partes não se afigura possível asseverar, de forma evidente e por via de uma análise sumária e perfunctória, que a alteração do período normal de trabalho de 35 para as 40 horas semanais determinada pelos artigos 2° e 3° da Lei n° 68/2013, incorra na alegada violação dos direitos à justa retribuição do trabalho e a um limite máximo da jornada de trabalho, bem como dos princípios constitucionais da irredutibilidade da retribuição, da proteção da confiança, da proibição do retrocesso social e da igualdade; 3. Tanto assim que, como é sabido, a matéria da constitucionalidade das normas em questão, por suscitar relevante controvérsia jurídica, foi sujeita à apreciação do Tribunal Constitucional, tendo já originado a prolação do Acórdão n° 794/2013, de 21 de novembro de 2013, no qual o mesmo tribunal decidiu não declarar a inconstitucionalidade das normas da Lei n° 68/2013, de 29 de agosto; 4. Acresce que no domínio da providência antecipatória, a procedência da ação deve ser concatenada com uma probabilidade qualificada de que tal se venha a verificar; 5. Todavia, no caso presente, não é de concluir que ocorra uma séria de probabilidade de êxito da pretensão principal, atendendo à discussão jurídica suscitada sobre a conformidade constitucional das normas legais invocadas e ao teor do acórdão do Tribunal Constitucional supra-referido que se pronunciou sobre idênticas questões de direito; 6. Noutro plano, para que se possa julgar verificado o requisito dopericulum in mora teria de resultar da alegação do Requerente e ficar demonstrado, ainda que indiciariamente, que sem a adoção da providência cautelar existe o perigo de constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses para os interesses visados no processo principal; 7. Para o efeito, a lei manda atender a todos os prejuízos relevantes para os interesses do requerente e por este alegados e demonstrados que têm de se consubstanciar em prejuízos que pela sua gravidade sejam dignos de tutela preventiva, quer porque possam colocar em causa a própria sobrevivência dos interessados, quer porque se traduzam em prejuízos de tal monta que só muito dificilmente se poderia proceder à sua reparação efetiva no plano dos fatos; 8. Em primeiro lugar, não se pode dizer que há perda ou redução de qualquer porção do rendimento mensal esperado pela generalidade dos trabalhadores que cumpram o novo período normal de trabalho de 40 horas semanais, na medida em que não há correlação, direta e lógica, entre o valor da hora de trabalho e o valor da remuneração base mensal geralmente auferida; 9. Na verdade, o valor absoluto da respetiva remuneração base mensal não é afetado pelo que não se pode concluir pela verificação de qualquer perda patrimonial direta e real para os associados do Recorrente, quanto muito, a potencial redução do quantum de trabalho extraordinário que poderia vir a ser realizado por aqueles em função das necessidades de serviço público, conforme reconhece o Recorrente nas suas Alegações, a pag 19. No mesmo sentido aponta, aliás, o teor da Acórdão do Tribunal Constitucional n° 794/2013 atrás invocado.

10. Por outro lado, ainda que prevaleça outro entendimento - o que não se concede -, nada impede que, através da ação principal, seja ela qual for, se consiga o efeito pretendido nesta ação, pois será sempre possível aos associados do Requerente que forem sujeitos ao novo período de duração do tempo de trabalho propor uma ação de reconhecimento do direito à manutenção do anterior regime de tempo de trabalho, solicitando ainda uma compensação pecuniária relativamente ao tempo em que o aumento do tempo de trabalho acarretou uma efetiva lesão para a sua esfera jurídica; 11. De resto, o Requerente e ora Recorrente nunca logrou concretizar minimamente, por referência a situações concretas e individualmente identificadas, qual o prejuízo patrimonial, pessoal e familiar que poderá resultar para cada um dos seus associados da não adoção da providência requerida, ou seja, em que medida o alargamento do período normal de trabalho de 35 para 40 horas semanais afeta, seriamente, a organização da vida pessoal e profissional dos associados cujos "interesses individuais" diz representar; 12. Ao invés, limita-se a hipotisar circunstâncias insuficientemente determinadas e genéricas que alegadamente resultariam ou poderiam resultar do aumento do período normal de trabalho imposto aos seus associados pela aplicação da Lei n° 68/2013; 13. Perante a motivação invocada, importa referir que impendia sobre o Requerente e ora Recorrente o ónus geral de alegação da matéria de facto integradora dos requisitos legais de que depende a concessão da providência cautelar requerida, articulando fatos concretos que fundamentam o seu pedido, bem como o ónus de oferecimento da prova sumária de tais requisitos - cfr artigo 114° n°3 do CPTA, em decorrência do principio geral do dispositivo, artigo 5° do CPC e da regra geral do ónus de prova - artigo 342° n°l do Código Civil; 14. Ora, como diz a decisão recorrida, dúvidas não subsistem que a alegação do requerente relativamente ao pmculum in mora se quedou numa invocação genérica e abstrata de danos, não estando suportada por fatos concretos e suficientemente especificados e demonstrados; 15. Assim sendo, mesmo que se estivesse perante caso de probabilidade séria de êxito da ação principal — o que nem sequer é o caso, como já se referiu — dos factos alegados e provados pelo Sindicato Recorrente não resulta demonstrado o fundado receio de constituição de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação para os interesses que pretende ver reconhecidos no processo principal; 16. Posto isto, a Entidade aqui Recorrida mantém e reitera tudo quanto já aduziu aos autos, requerendo a confirmação da sentença recorrida por considerar que a mesma não enferma das ilegalidades arguidas pelo Recorrente.

* Com substituição...

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