Acórdão nº 2006/13.0TTLSB.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 26 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelJERÓNIMO FREITAS
Data da Resolução26 de Fevereiro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I.RELATÓRIO I.1 No Tribunal do Trabalho de Lisboa, o Ministério Público instaurou a presente acção de anulação e interpretação de cláusulas de convenções colectivas de trabalho, com processo especial, regulada nos artigos 162.ºº e 183.º e segts. do CPT, a qual veio a ser distribuída ao 4.º Juízo – 2.ª Secção, contra FEVICOM – Federação Portuguesa dos Sindicatos da Construção, Cerâmica e Vidro, pedindo a declaração de nulidade dos estatutos desta, publicados no Boletim do Trabalho e Emprego, n.º 25, de 08 de Julho de 2004 Fundamenta a sua pretensão alegando, no essencial, que a R não procedeu à alteração dos seus estatutos, nomeadamente do n.º2 do art.º 20.º , que contém uma formulação excessivamente genérica da regulação do direito de tendência, por isso insuficiente para satisfazer a exigência da norma constitucional sobre a matéria, não sendo, assim, conformes com o direito de tendência que a lei exige esteja previsto, violando a norma imperativa do artigo 450.º, n.º 2 do Código do Trabalho.

A Ré foi citada para apresentar as suas alegações por escrito (art.º 184.º do CPT), o que observou no prazo legal, vindo pugnar pela validade dos estatutos e, consequentemente, pela improcedência da acção e a sua absolvição dos pedidos.

No essencial, sustenta o seguinte: - O n.º 2 do art.º 20.º dos seus estatutos, não pode ser lido e interpretado de forma isolada dos n.ºs 1, 3 e 4.

- Os seus associados não são os trabalhadores (estes já estão filiados nos sindicatos) mas os próprios sindicatos, pelo que a tese do MP, caso tivesse validade, apenas teria aplicação – em termos de grau de densificação – aos sindicatos onde os trabalhadores se encontram filiados e não às federações sindicais e uniões de sindicatos.

- O texto dos Estatutos não põe em causa ou impede a organização no interior da R. de diversas correntes de opinião, bem como a possibilidade de as mesmas aí intervirem.

- O art.º 450.º, n.º 2 do Código do Trabalho deve ser interpretado de forma a não restringir o disposto no art.º 55.º, n.º 2, als. c) e e) da Constituição.

- Ao contrário do que é defendido na PI, a Constituição e a lei não entendem o “direito de tendência” como um direito do tipo “parlamentar” distinto dos direitos individuais dos associados, nomeadamente do direito à livre opinião, e muito menos pressupõe a existência de um somatório de organizações (tendências) no interior dos sindicatos.

- As “tendências” também não são parte da estrutura de órgãos das associações sindicais e os grupos, ainda que organizados e reconhecidos, não podem ser impostos às organizações sindicais sem violação do princípio da liberdade sindical.

- Aos estatutos cabe garantir o seu exercício sem exceder e/ou constranger os direitos individuais de cada associado, sendo a intensidade da concretização do direito de tendência matéria que só os estatutos podem regular.

- No caso dos autos – uma Federação Sindical - exigir um maior nível e intensidade de regulamentação parece apontar e determinar por si só para formas concretas do exercício do direito, e como tal, consubstancia uma intromissão na auto-regulação da vida interna das associações sindicais.

Findos os articulados foi proferido despacho saneador e, na consideração do estado do processo permitir o conhecimento imediato do mérito da causa, foi proferida sentença, culminando com a decisão seguinte: - «Face ao exposto, julgamos esta acção procedente e consequentemente declaramos a nulidade dos estatutos do R.

(..)» I.2 Inconformada com essa decisão, a R. apresentou recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito próprios.

No requerimento de interposição de recurso arguiu expressa e separadamente a nulidade da sentença, com fundamento em omissão de pronúncia, por Tribunal “a quo” não se ter pronunciado sobre questões de que devia conhecer, violando o disposto na alínea d) do n.º 1 do artigo 615.º (668.º na redacção anterior), do Código de Processo Civil, ex vi do artigo 1.ºdo Código de Processo do Trabalho.

As alegações foram concluídas nos termos seguintes: (…) I.3 O Recorrido apresentou contra alegações, finalizadas com as conclusões seguintes: (…) I.4 Foram colhidos os vistos legais.

I.5 Delimitação do objecto do recurso Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso (artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e art.º 640.º do Código de Processo Civil), aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho), as questões que se colocam para apreciação consistem em saber o seguinte: i) Se a sentença é nula por omissão de pronúncia, em razão do Tribunal “a quo” não se ter pronunciado sobre o facto alegado pela R., no artigo 11.º e seguintes do seu articulado, de se estar perante uma União de Sindicatos; ii) Se o Tribunal a quo errou o julgamento na aplicação do direito aos factos, ao considerar que não se encontra viabilizado o exercício do direito de tendência nos Estatutos da R., nomeadamente no art.º 20.º, violando o disposto nos artigos 445.º e 447.º, ambos do Código do Trabalho.

  1. FUNDAMENTAÇÃO II.1 MOTIVAÇÃO DE FACTO Com interesse para a apreciação da questão relevam os factos considerados assente pelo tribunal a quo, abaixo sob os números 1 e 2, bem assim o que se passa a consignar no facto 3, de tudo resultando o seguinte: 1. Os estatutos da R encontram-se publicados no BTE, 1.ª série, n.º 25, de 08/07/2004.

    1. Notificado para, no prazo de 180 dias, proceder à alteração das normas dos seus estatutos consideradas contrárias à lei, o R nada fez.

    2. O Artigo 20.º, com a epígrafe “Direito de tendência”, dos estatutos da R., apresenta o teor seguinte: 1—A Federação, pela sua própria natureza unitária, reconhece a existência no seu seio de diversas correntes de opinião político-ideológicas e confessionais, cuja organização é, no entanto, exterior ao movimento sindical e da exclusiva responsabilidade dessas mesmas correntes de opinião.

      2—As correntes de opinião exprimem-se através do exercício do direito de participação dos associados, a todos os níveis e em todos os órgãos.

      3—As correntes de opinião podem exercer a sua...

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