Acórdão nº 00756/07.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 14 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelCarlos Lu
Data da Resolução14 de Fevereiro de 2014
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: 1.

RELATÓRIO MAGVN..., EMD..., GISF..., MJSS…, MDE…, AMM…, AGF…, JFC…, AMA…, JMSC…, MMMMM…, JRSA…, CMSO…, MCM…, PCM…, JMS…F, ADLD… e AMAMF…, inconformados, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF do Porto, datada de 18.03.2010, que julgou improcedente a ação administrativa especial pelos mesmos deduzida contra o “FUNDO GARANTIA SALARIAL, IP” [doravante apenas «FGS»], na qual peticionavam, por um lado, a anulação dos atos de indeferimento proferidos pelo Presidente do «FGS», em 21.12.2006 e 26.12.2006 [que recaíram sobre os respetivos requerimentos de pagamento de créditos emergentes de contrato de trabalho que haviam apresentado junto dos serviços do Instituto de Solidariedade e Segurança Social na Póvoa de Varzim], e, por outro lado, a condenação do R. no pagamento das quantias ali peticionadas.

Formulam os AA., aqui recorrentes jurisdicionais, nas respetivas alegações [cfr. fls. 130 e segs.

- paginação processo em suporte físico tal como as referências posteriores a paginação salvo expressa indicação em contrário], as seguintes conclusões que se reproduzem: “...

  1. A interpretação que o tribunal a quo faz do art. 319.º da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, conduz a resultados de manifesta injustiça, resultados esses que o legislador não quis, e que são contrários à razão de ser da existência do próprio Fundo.

  2. Em casos como o presente, em que os trabalhadores recorrem aos tribunais do trabalho antes de requererem a insolvência da entidade patronal, a ação a que se refere o mencionado art. 319.º é a ação laboral.

  3. Uma interpretação conforme ao direito comunitário não pode tornar impossível na prática ou excessivamente difícil o acesso ao Fundo.

  4. A interpretação que o acórdão recorrido faz da referida norma viola a alínea a) do art. 59.º, n.º 1 da Constituição, em conjugação com o n.º 3 do mesmo artigo e com o princípio da igualdade (art. 13.º da CRP).

  5. Assim sendo, o acórdão recorrido violou o referido art. 319.º, e as mencionadas normas comunitárias e constitucionais.

  6. Os atos administrativos impugnados são ainda inválidos por falta de fundamentação …”.

    O R., aqui recorrido, devidamente notificado veio produzir contra-alegações onde pugna pela manutenção do julgado [cfr. fls. 171 e segs.

    ], formulando conclusões nos termos seguintes: “… ... A questão objeto do presente recurso prende-se com a interpretação da norma contida no n.º 1, do art. 319.º, da Lei n.º 35/2004, de 29/07.

    … O n.º 1, do art. 319.º, da Lei n.º 35/2004, de 29/07, estabelece que «O Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento dos créditos previstos no artigo 317.º que se tenham vencido nos seis meses que antecedem a data da propositura da ação ou apresentação do requerimento referido no artigo anterior».

    … A única interpretação que resulta da lei é a de que, o período de referência, a partir do qual o Fundo de Garantia Salarial assegura o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, conta-se a partir da data em que foi interposta a ação judicial de insolvência ou da entrada do requerimento do procedimento de conciliação, pois só nestas duas situações é que, de acordo com o n.º 1 e 2, do art. 318.º, da citada lei, o Fundo de Garantia Salarial intervém …”.

    O Digno Magistrado do Ministério Público junto deste Tribunal notificado nos termos e para efeitos do disposto no art. 146.º do CPTA emitiu pronúncia no sentido do improvimento do recurso [cfr. fls. 349/350], pronúncia essa que objeto de contraditório não mereceu qualquer resposta [cfr. fls. 351 e segs.

    ].

    Por despacho do Juiz Relator inserto a fls. 201 dos autos foi aberto contraditório quanto à possível utilidade/suscetibilidade de dedução de pedido de reenvio prejudicial junto do Tribunal Justiça da União Europeia [abreviadamente «TJUE»] nos termos do art. 267.º do Tratado de Funcionamento da União Europeia [doravante «TFUE»] [ex-art. 234.º do TCE], tendo os AA. vindo manifestar expressa posição concordante com a necessidade de proceder àquele reenvio nos termos do requerimento de fls. 206/207 que, notificado, não mereceu qualquer discordância por parte do R..

    Por acórdão inserto a fls. 210/220 dos autos foi suscitado o aludido reenvio prejudicial com consequente suspensão da presente instância, reenvio esse que foi admitido sob o n.º C-309/12 [cfr. fls. 219/229].

    No âmbito deste processo veio a ser prolatado em 28.11.2013 acórdão pelo TJUE pronunciando-se sobre o pedido de reenvio prejudicial formulado [cfr. fls. 333/343], decisão essa notificada às partes sem que nada haja sido dito ou requerido [cfr. fls. 346 e segs.

    ].

    Dispensados os vistos legais juntos dos Exmos. Juízes-Adjuntos foram os autos submetidos à Conferência.

  7. DELIMITAÇÃO DO OBJETO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelos recorrentes, sendo certo que, pese embora por um lado, o objeto do recurso se acha delimitado pelas conclusões das respetivas alegações, nos termos dos arts. 144.º, n.º 2 e 146.º, n.º 4 do CPTA, 660.º, n.º 2, 664.º, 684.º, n.ºs 3 e 4 e 690.º, n.º 1 todos do Código de Processo Civil (CPC) [na redação anterior à introduzida pelo DL n.º 303/07, de 24.08, e pela Lei n.º 41/2013, de 26.06 - cfr. arts. 11.º e 12.º daquele DL e 07.º da referida Lei -, tal como todas as demais referências de seguida feitas relativas a normativos do CPC] “ex vi” arts. 01.º e 140.º do CPTA, temos, todavia, que, por outro lado, nos termos do art. 149.º do CPTA o tribunal “ad quem” em sede de recurso de apelação não se limita a cassar a decisão judicial recorrida porquanto ainda que a declare nula decide “o objeto da causa, conhecendo de facto e de direito” reunidos que se mostrem no caso os necessários pressupostos e condições legalmente exigidas.

    As questões suscitadas resumem-se, em suma, em determinar se a decisão judicial recorrida ao julgar totalmente improcedente a pretensão anulatória/condenatória deduzida pelos AA. incorreu ou não em erro de julgamento por enfermar de violação do disposto, nomeadamente, nos arts. 124.º e 125.º do CPA, 319.º da Lei n.º 35/2004, de 29.07, 13.º e 59.º, n.º 1, al. a) da CRP, e da Diretiva 80/987/CEE [cfr. alegações e demais conclusões supra reproduzidas].

  8. FUNDAMENTOS 3.1.

    DOS FACTOS ASSENTES NOS AUTOS Resulta como provado o seguinte quadro factual: I) A entidade patronal dos AA. deixou de pagar os respetivos salários em abril de 2003, tendo estes rescindido os respetivos contratos de trabalho no dia 15.09.2003, nos termos da Lei n.º 17/86, de 14.06.

    II) Os AA. ficaram com um crédito para com a empregadora, correspondente a salários e indemnizações, tendo recorrido para o Tribunal de Trabalho, em 10.02.2004, com vista à fixação judicial do valor em dívida e à cobrança coerciva dessas quantias.

    III) Nas ações que correram termos no Tribunal de Trabalho de Barcelos a entidade empregadora foi, por sentenças aí proferidas, considerada culpada e condenada no pedido.

    IV) Os AA. requereram a execução das referidas sentenças pretendendo obter o pagamento mediante a venda judicial dos bens que integravam o património da empregadora.

    1. Face à insuficiência dos bens para pagar os créditos laborais em dívida, os AA. intentaram, em 28.11.2005, no Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia ação de insolvência contra a entidade empregadora.

    VI) A insolvência foi decretada, tendo sido reclamados os créditos laborais.

    VII) Os AA. requereram em 26.07.2006 o pagamento dos créditos salariais pelo Fundo de Garantia Salarial - cfr. requerimentos constantes do «P.A.».

    VIII) No dia 20 de dezembro foi elaborado parecer com o seguinte teor: “1. De acordo com a análise efetuada ao processo pelo Centro Distrital, os requerimentos foram analisados, tendo sido entendido que não se encontram preenchidos os pressupostos legais impostos no âmbito da Lei n.º 35/2004, de 29 de julho, conducentes ao deferimento das pretensões formuladas pelos ex-trabalhadores/requerentes, a saber: 2. Foi declarada a insolvência da entidade empregadora, encontrando-se, assim, preenchido o requisito previsto no n.º 1 do artigo 318.º da Lei n.º 35/2004 (…).

  9. Os requerentes reclamam créditos emergentes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação, em conformidade com a previsão do artigo 317.º da Lei n.º 35/2004, (…).

  10. A cessação dos contratos de trabalho dos requerentes ocorreu em 15 de setembro de 2003.

  11. Tendo ocorrido interrupção da prescrição, os requerimentos foram apresentados no prazo previsto no n.º 3 do artigo 319.º da Lei n.º 35/2004, …, e observam as regras para instrução dos mesmos, pelo que se encontra preenchido o requisito exigido pelo artigo 324.º da Lei n.º 35/2004 (…).

  12. Contudo, o Fundo de Garantia Salarial abrange os créditos que se tenham vencido nos seis meses que antecedem a data de propositura da ação ou apresentação do requerimento conforme plasmado no n.º 1 do artigo 319.º da Lei n.º 35/2004 (…).

    Por outro lado, no caso, de não existirem créditos vencidos nos seis meses anteriores à data da propositura da ação ou quando não atingem o plafond legal previsto nos termos do n.º 1 do artigo 320.º do diploma legal citado, pelo que o Fundo assegura o pagamento de créditos vencidos após o referido período de referência, conforme previsto no número 2 do artigo 319.º do mesmo diploma.

  13. No caso em apreço, face à data de propositura da ação de insolvência, em 28 de novembro de 2005, o Fundo de Garantia Salarial abrange os créditos vencidos a partir de 28 de maio de 2005.

  14. Sucede que os créditos requeridos encontram-se vencidos até à cessação dos contratos de trabalho, em 15 de setembro de 2003, pelo que não se enquadram no período de referência previsto nos termos do n.º 1 e n.º 2 do artigo 319.º da Lei n.º 35/2004, …, não sendo assegurados pelo Fundo.

  15. Nestes termos, propomos o indeferimento dos requerimentos, por não se encontrarem preenchidos os requisitos previstos nos artigos 316.º e...

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