Acórdão nº 528/07.1GCVIS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 19 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelOLGA MAUR
Data da Resolução19 de Fevereiro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 4ª secção do Tribunal da Relação de Coimbra: RELATÓRIO 1.

Nos presentes autos foram os arguidos A...

, B...

e C...

absolvidos da prática, em co-autoria e na forma consumada, de um crime de furto qualificado, dos art. 26º, 203º, nº 1, e 204º, nº 2, al. e), do Código Penal.

  1. Inconformado, o Ministério Público recorreu, retirando da motivação as seguintes conclusões: «1ª- Vem o presente recurso interposto, além do mais, da decisão da Mmª juiz que, em sede de sentença e como questão prévia, considerou nulas as escutas cujas transcrições foram juntas aos autos (acompanhadas dos despachos que as fundamentaram e respectivos CDS, nos termos do artigo 187, nº8 do CPP, conforme determinado pelo Venerando Tribunal Relação de Coimbra fls. 1211 e ss), por se entender que tal decisão traduz errada interpretação do disposto no artigo 187, nº 6 do CPP.

    1. - Com efeito, considerou a Mmª Juiz que as escutas são nulas por se mostrar ultrapassado o prazo de 60 dias fixado pelo JIC para realização das mesmas, ao abrigo do disposto no artigo 187, nº 6 do CPP.

    2. - Para tanto, alegou que tendo sido autorizadas por despachos proferidos em 10/4/2007 e 4/5/2007, em ambos os casos pelo prazo de 60 dias, viriam a ser efectuadas em 12/6/2007, 15/7/2007 e 16/7/2007 - aquelas que foram autorizadas por despacho de 10/4/2007, isto é, para além dos 60 dias posteriores a tal despacho - e em 24/7/2007 e 17/7/2007 - aquelas que foram autorizadas por despacho de 4/5/2007, isto é, para além dos 60 dias posteriores a tal despacho.

    3. - Ou seja, entendeu que o prazo fixado para realização das escutas ao abrigo do disposto no 187, nº6 do CPP, se conta a partir da data da prolação dos despachos que as autorizaram.

    4. - Contudo, tal traduz uma errada interpretação de tal normativo.

    5. - Na verdade, tal prazo só começa a correr no início efectivo da intercepção e não a partir do momento de prolação do despacho de autorização da medida. (Neste sentido cfr. Cláudio Lima Rodrigues, Mestre em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, «Dos pressupostos materiais de autorização de uma escuta telefónica, http://www. verbojuridico.com/ficheiros/doutrina/ppenal/ claudiolimarodrigues_autorizacaoescutatelefonica. pdf. e Ac. do TC n.º 4/2006; Processo nº 665105; Relator: Mário Torres).

    6. - Este entendimento é, aliás, o único que se mostra compatível com as diligências (técnicas e de comunicação entre as diversas entidades envolvidas) que sempre são necessárias para a concretização da escuta autorizada, determinando que a mesma nunca possa ocorrer no momento imediato á sua autorização; assim como é o único compatível com o prescrito no artigo 188 nº 3 do CPP que expressamente se refere ao momento do inicio da intercepção.

    7. - A decisão em recurso violou, pois, por errada interpretação, o disposto no artigo 187, nº 6 do CPP.

      Assim, 9ª- e sendo certo que nunca foi alegado nos autos por quem quer que fosse, nem se mostra minimamente indiciado que as escutas autorizadas pelos despachos referidos tivessem decorrido durante mais de 60 dias, como nelas expressamente autorizado, tudo indicando, antes, em sentido contrário - sendo certo que as escutas em causa nos autos se reportam a período manifestamente inferior, não existindo noticia de outras anteriormente efectuadas, ao que acresce que as mesmas foram sujeitas á apreciação da JIC que, considerando-as válidas, as mandou transcrever, 10ª- Requer-se seja revogada a douta decisão que as declarou nulas e, consequentemente, seja determinado que se profira nova sentença em que as mesmas sejam atendidas como meio de prova válido no processo de formação da convicção do tribunal, sendo certo tratar-se de meio de prova de grande relevo, determinante, aliás, para a condenação do arguido A....

      Subsidiariamente, B- Da matéria de facto.

    8. - Subsidiariamente, se assim se não entender (ou seja, caso se entenda que as escutas certificadas nos autos são inválidas não podendo ser valoradas no processo de formação de convicção do tribunal) impugna-se a decisão proferida sobre a matéria-de-facto desta feita no que respeita aos arguidos B... e C...(cfr. o art. 403º nºs1 e 2,al. e) do Código do Processo Penal), nos termos e com os fundamentos que seguem.

    9. - Relativamente à matéria fáctica constante da pronúncia, o tribunal recorrido: a) Deu como provado que: - os factos dados como provados sob os artigos 1 a 5 da factualidade provada, foram da autoria de desconhecidos.

      1. E como não provado que: 1. Foram os arguidos que praticaram tais factos; 2. Os arguidos agiram sempre de comum acordo e em conjugação de esforços e intentos, com o propósito conseguido de se apoderarem e fazerem seus os objectos e/ou valores que lograssem encontrar, bem sabendo que os mesmos não lhes pertenciam e que agiam contra a vontade e em prejuízos do(s) respectivo(s) dono(s).

  2. Quando escalaram e abriram a janela, trepando a mesma e entrando através dela na habitação, agiram os arguidos com o propósito de, dessa forma, se introduzirem na residência para dali retirarem e levarem os objectos e/ou valores que encontrassem, o que lograram.

  3. Ao usaram uma das chaves que haviam subtraído no interior da residência para abrir o veiculo ali estacionado, os arguidos agiram também com o propósito de levar o dito veiculo para dele se apropriarem, como conseguiram.

  4. Os arguidos sabiam que a casa, os objectos e valores nela existentes e o veículo que ali estava estacionado, não lhes pertenciam, que não estavam autorizados a nela entrar, e que, ao actuarem da forma supra descrita, agiam contra a vontade e em prejuízo dos respectivos donos.

  5. Os arguidos agiram sempre de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo as suas condutas proibidas e punidas por lei.

    1. - Ora, quanto a estes concretos pontos da matéria de facto dados como não provados, temos por inequívoco que a prova testemunhal produzida em audiência, conjugada com a prova documental constante dos autos, impunha que se dessem os mesmos como provados relativamente aos arguidos C...e B... e apenas como não provados relativamente ao arguido A... (no pressuposto, reafirma-se mais uma vez, da não consideração das escutas que é o que ora nos ocupa), consequentemente, também quanto ao mencionado ponto da matéria de facto dada como provada não deveria ter sido dado como provado que «os factos dados como provados sob os artigos 1 a 5 da factualidade provada, foram da autoria de desconhecidos», mas, sim, como provada a autoria de tais factos pelos arguidos C...e B....

    2. - Na verdade, com relevância para a decisão a proferir sobre estes concretos pontos da matéria de facto, e a impor que os mesmos fossem dados como provados nos exactos termos vindos de referir, sumariamos a seguinte prova coligida nos autos: a - Relatório de vigilância de fls. 46, elaborado pelo agente F...

      ; b - depoimento deste mesmo agente F... prestado na sessão de julgamento de 19/12/2011, documentada na acta de fls. 962 e ss, gravado no sistema integrado de gravação digital das 11:58 horas às 12:14 horas, do qual se destacam os seguintes e concretos excertos relevantes: - Com inicio aos 01:32, em resposta à Mmª Juiz, aquando da sua identificação: - «A única coisa que participei nesses factos foi num relatório de vigilância aqui no Porto».

      E a instâncias do MP, com inicio aos 01:57: MP: «Já disse que fez uma vigilância e temos efectivamente a fls. 46 um relatório de vigilância subscrito por si, recorda-se ainda em que circunstâncias é que fez essa vigilância e quando e o que é que viu?» Respondendo, diz a testemunha com inicio aos 01:57: «Recordo. Foi na noite de 16 de Julho de 2007, ali junto ao Norte Shoping, em que vi, eram quatro a altura, agora só estão três a ser julgados, já houve o falecimento de um dos irmãos, a sair do Norte Shoping e a dirigirem-se para uma viatura que constava ara apreender, essa viatura em causa que tinha sido furtada em Viseu. Portanto, eu avistei os quatro a sair do Norte Shoping a caminhar para o parque exterior desse parque, o C... abriu a viatura com o comando, entrou para o lado do condutor, ficando o B... ao lado dele e atrás o E... e o A..., no banco traseiro, portanto».

      E questionado pelo MP sobre a que A... se referia disse: - com inicio aos 03.40: « D..., a alcunha dele é X...».

      Ao que o MP atalha, aos 03:46: «Nós estamos aqui hoje a julgar um A...», respondendo a testemunha: - com inicio aos 03:52: «Pois, mas eu esse A... não o vi na viatura, o que vi foi o D..., com a alcunha X..., esse que a dr está a falar tem a alcunha de Y..., o ex jogador do (...)».

      E especificando também melhores elementos identificativos do C... e do B... a quem se referira disse: Com inicio aos 04:27, tratar-se de « C...» e de « B..., de alcunha W...» (aos 04:36).

      Mais confirmando, a instâncias do MP, com inicio aos 04:48 tratar-se das 4 pessoas que identificou no relatório de vigilância que elaborou.

      De seguida, continuando a descrição do ocorrido na vigilância que efectuou disse, aos 05:14 até 06:11: «Eu estava no parque, vi-os entrar no carro, eles começaram a pôr a viatura em movimento e eu segui-os, meti-me na retaguarda deles, entretanto julgo que eles se terão apercebido de mim, por uma razão muito simples, eles fizeram lá umas manobras contra um senhor, contra um arrumador que estava lá no local, houve uma travagem brusca da parte deles, eu também parei. Eles, um deles, quase que saí fora do carro, devem ter-se apercebido de mim nessa altura, e o C... começa a acelerar por aquela rua fora até á circunvalação e eu ainda tentei persegui-los mas a condução dele era um bocado perigosa, no sentido em que eu não iria arriscar e deixei de o perseguir, ou seja, perdi-o de vista na circunvalação. Já perto dos Produtos estrela. Foi a única coisa que eu presenciei.» A pergunta do MP sobre se já tinha conhecimento, na altura, de que o carro era furtado disse, com inicio aos 06:24: «Sim, tinha conhecimento que a viatura era furtada, sim».

      E a pergunta do MP, aos 06:45: «Estava a fazer essa...

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