Acórdão nº 2817/09.1TBFIG.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelS
Data da Resolução18 de Fevereiro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra A Autora intentou a presente acção com processo ordinário, pedindo a condenação da Ré a: - pagar-lhe a quantia de € 193.681,55, acrescida de juros de mora vencidos e não pagos, calculados, segundo as taxas legais, e à data de 12 de Outubro de 2009, no valor de € 35.163,97; - pagar-lhe uma sanção pecuniária compulsória, à razão de € 500 por dia de atraso no cumprimento da prestação devida, desde 31 de Dezembro de 2007, data do vencimento da segunda das facturas aludidas nos autos, e ainda no pagamento de juros, à taxa de 5% ao ano, desde a data em que a sentença condenatória transitar em julgado, os quais acrescerão aos juros de mora acima aludidos.

Para fundamentar a sua pretensão alegou, em síntese: Ø É uma sociedade comercial que se dedica à construção civil, obras públicas e empreitadas gerais, tendo sido contactada pela Ré, no início do ano de 2006, para que realizasse uma obra de reconstrução de uma sua moradia composta de casa de habitação de rés-do-chão sita em ...

Ø Após a elaboração de um orçamento prévio da obra a realizar, a Autora apresentou à Ré o mapa de preços, que acabou por sofrer revisões até se tornar definitivo, sendo-lhe então a obra adjudicada, que a começou em Maio de 2006, ascendendo o respectivo preço ao valor global de € 152.974,12, acrescido do inerente imposto sobre o valor acrescentado (I.V.A.), ou seja, à quantia total de € 185.098,78.

Ø Porém, no decorrer da execução da obra a Ré propôs diversas alterações ao contrato as quais, na sua globalidade, fizeram ascender o valor final da obra a € 290.653,84.

Ø Em 19 de Outubro de 2006, após a realização das obras indicadas no auto de medição anexo à petição inicial, foi emitida uma factura no valor de € 98.939,97, que, entregue à Ré, foi pela mesma satisfeita integralmente.

Ø Em 31 de Dezembro de 2007 foi emitida outra factura no valor de € 139.150, correspondente aos trabalhos até então executados, a qual, porém, e apesar de não impugnada pela Ré, não foi por esta paga até à data de hoje.

Ø Tendo a Autora procedido à conclusão da obra, encontra-se ainda por facturar a quantia de € 54.531,55 (I.V.A. já incluído) para perfazer a totalidade do montante acordado.

Ø A dívida da Ré para com a Autora é de € 193.681,55.

Citada, a Ré contestou a acção, alegando, em síntese: Ø Não são devidos os juros reclamados pois não se encontra em mora, dado não estar a obra ainda concluída, Ø A Ré reclamou a existência de diversos defeitos, tendo a Autora assumido e tentando corrigir alguns deles, o que não logrou fazer, e protelado a eliminação de outros.

Reconvindo, disse a Ré não ter aceitado a obra, dados os inúmeros defeitos ostentados pela mesma, defeitos cuja eliminação importa em montante não inferior a € 100.000,00 Conclui, pedindo a improcedência da acção e a procedência da reconvenção e, em consequência, a condenação da Autora a eliminar os defeitos apontados pela reconvinte, ou, quando tal não seja possível, a efectuar nova construção, em ambos os casos dentro de um prazo justo a fixar pelo Tribunal, de acordo com os parâmetros legais, ou, em alternativa, ser considerado que a eliminação dos defeitos orça em quantia nunca inferior a € 100.000,00 reduzindo-se o preço final neste mesmo valor, não se contabilizando também quaisquer juros; acrescerá ainda a condenação da reconvinda a pagar à reconvinte, a título de compensação pelos danos morais a esta causados, uma quantia nunca inferior a € 10.000,00 A Autora apresentou réplica, excepcionando a caducidade dos pedidos formulados pela reconvinte, porquanto tendo a mesma denunciado os defeitos em Junho de 2009, tinha o prazo de seis meses para propor a competente acção, ou seja, até ao final do mês de Dezembro de 2009, porém, a reconvenção só foi deduzida em 18 de Janeiro de 2010, para além dos seis meses legalmente estabelecidos na lei de defesa do consumidor.

Alegou ainda que a caducidade sempre terá ocorrido, porquanto é a própria reconvinte que alega existirem os defeitos desde 31 de Dezembro de 2007 e a denúncia só veio a ocorrer ano e meio depois.

Por impugnação, alegou não corresponder à verdade a existência de defeitos na obra, pois que os mesmos, para além de nunca terem sido invocados aquando da entrega da obra, e até depois, pura e simplesmente não existem, pois foram sempre estudadas e conseguidas diversas soluções tendentes à debelação dos pequenos problemas que surgiram no decurso da realização da obra.

Conclui pela procedência da excepção de caducidade ou improcedência da reconvenção apresentada pela Ré.

A Ré apresentou tréplica, mantendo a sua posição.

Proferido despacho saneador foi o conhecimento da excepção de caducidade relegado para final.

Veio a ser proferida sentença que julgou a acção nos seguintes termos: Por todo o exposto, julgando-se a acção parcialmente provada e procedente: - Condena-se a Ré M… a pagar à A. “C… & Cª. Lda.” a quantia de € 193.681,55 (cento e noventa e três mil, seiscentos e oitenta e um euros e cinquenta e cinco cêntimos), a que acrescerão juros de mora, contados à taxa legal, desde o momento em que a A. cumpra o que lhe vai ser imposto em sede decisória de reconvenção, até efectivo e integral pagamento; - Todavia, a aludida Ré M… só estará obrigada a efectuar o pagamento da quantia acabada de referir à A. “C… & Cª. Lda.” depois que esta última proceda à reparação a que será condenada infra, em sede decisória de reconvenção; - Absolve-se a Ré M… do demais contra si peticionado nos autos pela A. “C… & Cª. Lda.”.

… No mais, julgando-se a reconvenção parcialmente provada e procedente: - Condena-se a reconvinda “C… & Cª. Lda.” a reparar e eliminar de forma permanente, a expensas suas, no prazo de 120 (cento e vinte) dias a contar do trânsito em julgado da presente decisão, os defeitos e anomalias (supra referidos nos pontos 30 a 43, 45 e 49 a 52 dos factos assentes desta sentença) da obra pela reconvinda levada a cabo no prédio (melhor identificado no ponto 3 da factualidade provada desta mesma sentença) da reconvinte M…; - Condena-se a reconvinda “C… & Cª. Lda.” a pagar à reconvinte M… o montante compensatório por danos não patrimoniais de € 3.500 (três mil e quinhentos euros); - Absolve-se a reconvinda “C… & Cª. Lda.” do demais contra si peticionado nos autos pela reconvinte M...

A Autora inconformada interpôs recurso, formulando as seguintes conclusões: ...

Conclui pela procedência do recurso.

A Ré apresentou resposta, defendendo a confirmação da decisão proferida.

  1. Do objecto do recurso Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações cumpre decidir as seguintes questões: a) Devem ser alteradas as respostas dadas aos quesitos 1º, 2º, 3º, 32º e 33º? b) O contrato celebrado deve ser qualificado como contrato de prestação de serviços para consumo? c) A Autora não é responsável pelos defeitos referidos nos pontos 30º, 31º, 33º, 34º, 37º, 39º, 40º e 50º da sentença recorrida? d) O direito à eliminação dos defeitos caducou devido aos mesmos não terem sido denunciados atempadamente? e) O direito à eliminação dos defeitos caducou devido à respectiva demanda judicial ter sido deduzida para além do prazo legal? f) A excepção do cumprimento defeituoso por parte da Autora é desproporcionada tendo em consideração o custo da eliminação dos defeitos perante o montante do preço da obra ainda em dívida? g) A Ré deve ser condenada a pagar juros de mora desde a constituição da dívida ou, pelo menos, desde a sua citação para a presente acção? g) Não são indemnizáveis os danos não patrimoniais invocados pela Ré? 2. Dos factos … Factos provados: São, pois, os seguintes os factos provados nesta acção: … O direito aplicável 1. Qualificação do contrato Na presente acção a Autora pede o pagamento de parte do preço acordado com a Ré para a realização de obras de demolição, reconstrução e ampliação da casa de habitação desta última.

    No nosso Código Civil o contrato de empreitada é uma espécie autónoma dos contratos de prestação de serviço, os quais se caracterizam pela circunstância de uma das partes (o prestador de serviço) proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição – art.º 1154º.

    O que individualiza os contratos de empreitada do âmbito da figura mais vasta dos contratos de prestação de serviço é o de que o resultado a que se obriga o empreiteiro é o de realização de uma obra – art.º 1207º do C. Civil –, devendo esta traduzir-se por uma alteração física de coisa corpórea.

    Assim, tendo a Autora se comprometido a realizar obras de alteração a uma casa já existente, estamos perante a outorga de um contrato de empreitada.

    Respeitando essas obras à casa de habitação da Ré e sendo a Autora uma empresa que se dedica profissionalmente à construção civil estamos perante uma empreitada de consumo, regulada pelo disposto no...

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