Acórdão nº 0989/11 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelFERNANDA MAÇÃS
Data da Resolução13 de Fevereiro de 2014
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo I-RELATÓRIO 1- A……………….., B…………. e C……………… e D…………., E………. e F……………, G…………………, H………… e Campo Aberto – Associação de Defesa do Ambiente, devidamente identificados nos autos, intentaram no TAF de Porto, Acção Popular, contra actos proferidos pelo Presidente da Câmara Municipal do Porto; o Vereador do Pelouro do Urbanismo e Mobilidade da Câmara Municipal do Porto; e o Director do Departamento Municipal de Gestão Urbanística da Câmara Municipal do Porto, tendo como contra-interessada a I………….. S. A.

1.1- Aquele Tribunal, por sentença de fls. 398 e segs., decidiu julgar procedente a excepção da irrecorribilidade do acto de emissão do alvará de licença de construção nº. 166/2002, que titula o licenciamento referido, de 24/07/2002 e, consequentemente, rejeitar, nessa parte, a acção, por manifestamente ilegal e, no mais, julgar não verificados os vícios invocados pelos autores/recorrentes, nem qualquer outro de conhecimento oficioso, e em consequência, negar provimento à acção.

2- Não se conformando, A……………., B………….. e C……….. vieram interpor recurso desta sentença.

3- Com o recurso da sentença subiu o interposto pela contra-interessada-I……….. S. A., - do despacho do Mmº Juiz do TAF do Porto, de 18/10/2006 (fls. 240 a 244), que julgou improcedente a excepção de ilegitimidade activa invocada pela recorrida particular.

4- Transcrevem-se, de seguida, as conclusões das alegações e contra-alegações dos referidos recursos, pela ordem da sua interposição.

4.1- Recurso do despacho interlocutório do Mmº Juiz do TAF do Porto, de 18/10/2006, admitido a fls. 256 dos autos, com as seguintes conclusões das alegações: “1°. O facto dos ora recorridos eventualmente se encontrarem no pleno gozo dos direitos civis e políticos, residirem na zona e constituírem uma organização não governamental de defesa do ambiente não implica, por si só, a atribuição de legitimidade activa para o presente recurso contencioso (v. art. 821° do Cód.Adm.) — cfr. texto n°s. 1 e 2; 2°. Os recorrentes não concretizaram, não especificaram, nem provaram quaisquer prejuízos concretos e reais, que tenham ou lhes possam vir a ser pessoalmente causados pelos actos em análise, limitando-se a invocar conceitos genéricos e juízos conclusivos - “equilíbrio de ocupação do espaço urbano”, “qualidade de vida dos munícipes” e “qualidade do ambiente e harmonia paisagística” (v. art. 3° da p.r.) — cfr. texto n°s. 3 e 4; 3º. Os ora recorrentes não juntaram com a p.r. qualquer documento, estudo ou relatório técnico susceptível de demonstrar, de qualquer forma, em que medida a construção e subsequente utilização de uma nova construção numa zona da cidade do Porto é susceptível de pôr em causa o equilíbrio da ocupação do espaço urbano, a qualidade de vida dos munícipes ou a qualidade do ambiente - cfr. texto n°s. 3 e 4; 4°. Os recorrentes não concretizaram, não especificaram, nem provaram quaisquer prejuízos reais que lhes possam ser pessoalmente causados, limitando-se à invocação de juízos conclusivos, afirmações genéricas e fórmulas passe-partout, que não concretizam, não especificam, nem individualizam minimamente os alegados prejuízos invocados (v. Sentença do Tribunal a quo, de 2003.07.28, Proc. 877/02), pelo que a sua ilegitimidade activa é inquestionável (v. art. 821°/3 do Cód. Adm.; cfr. art. 268°/4 da CRP, art. 2° da LPTA, art. 46° do RSTA e art. 26° do CPC) - cfr. texto nºs. 3 e 4; 5°. O douto despacho recorrido enferma assim de manifestos erros de julgamento, sendo violado frontalmente, além do mais, o disposto nos arts. 268°/4 da CRP, no art. 821° do Cód. Adm., no art. 46° do RSTA, no art. 26° do CPC e no art. 12° da Lei 83/95, de 31 de Agosto.

NESTES TERMOS, Deverá ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se o douto despacho recorrido, com as legais consequências.

SÓ ASSIM SE DECIDINDO SERÁ CUMPRIDO O DIREITO E FEITA JUSTIÇA”.

4.1.1- A……………… e os demais autores vieram contra-alegar a fls. 284 e segs. dizendo que é evidente e manifesta a legitimidade processual activa dos ora agravados.

4.2- Recurso da sentença proferida pelo TAF do Porto, de 29 de Novembro de 2010, com as seguintes conclusões dos Recorrentes: “I. O despacho de 18 de Julho de 2002 do Vereador do Pelouro do Urbanismo e Mobilidade da Câmara Municipal do Porto (VPUMCMP), que licenciou a construção de três edifícios contíguos da recorrida particular, viola o disposto no art. 15.°, 9.° e 5.° do RNPMP (normas igualmente violadas pelo tribunal recorrido) — e por isso é nulo —, pois que admite a realização de uma obra a que corresponde um índice de construção bruto e uma área de construção bruta superiores aos máximos permitidos no art. 15.° do RNPMP.

II. De acordo com a definição constante do art. 5.° do RNPMP, a variável área total do prédio (At) incluída na fórmula do art. 15.° do RNPMP refere-se, exclusivamente, à área do terreno do requerente do licenciamento, não permitindo a contabilização de outros terrenos, designadamente terrenos públicos.

III. A área total do prédio (conceito definido no art. 5.° do RNPMP) da recorrida particular não é, ao contrário do que considera o tribunal recorrido, de 17 857, 64 m2, uma vez que neste valor se acha incluída, como os autos evidenciam (designadamente a informação de 05/08/2002, constante do PA), além do terreno realmente pertencente à recorrida particular, parte dos terrenos municipais ocupados pela licenciada pelo acto contenciosamente recorrido.

IV. A área total do prédio da recorrida particular, de acordo com os factos assentes, considerando já a aquisição resultante do contrato de permuta celebrado entre aquela e o Município do Porto em 25/10/2001, não ultrapassa 13 094 m2.

V. Ao determinar a edificabilidade do prédio da recorrida particular, através da fórmula prevista no art. 15.º do RNPMP, o tribunal recorrido incluiu, pois, na variável área total do terreno (At), que computou em 17 857, 64 m2, terreno pertencente ao domínio municipal.

VI. O que, para além de violar o disposto nos arts. 15.° e 5.°/1 do RNPMP, constitui uma grosseira e insuprível violação dos princípios da justiça, da imparcialidade e da transparência — princípios a que está sujeita toda a actividade administrativa.

VII. É intolerável, na verdade, para qualquer consciência jurídica solidamente formada, que os tribunais possam acoitar o entendimento de que um particular possa beneficiar de terrenos públicos para efeitos de determinação dos índices de edificabilidade dos seus próprios terrenos.

Eis, assim, Senhores Juízes Desembargadores, as razões pelas quais se pede a Vexas revoguem a decisão recorrida, substituindo-a por outra que declare nulo, ou anule, o despacho de 18 de Julho de 2002 do Vereador do Pelouro do Urbanismo e Mobilidade da Câmara Municipal do Porto, que licenciou a construção de três edifícios contíguos da recorrida particular”.

4.2.1- Em resposta, o Município do Porto veio apresentar contra-alegações contendo as seguintes conclusões: “

  1. A área total do prédio a que haveria que atender para cálculo da respectiva área bruta de construção era de 17 857,64 m2, correspondente à área global constante da planta do processo administrativo junto aos autos e em conformidade com a informação camarária de 08.05.2002.

  2. Para determinação da área total do terreno, necessária ao cálculo da respectiva área de construção, haveria que atender à totalidade do terreno, tal como efectuado pelo Tribunal recorrido.

  3. A área bruta de construção admissível para o terreno em causa é de 32 697 m2, sendo certo que a área efectivamente licenciada pelo acto posto em crise é de 27 756,43 m2.

  4. Conforme referido na douta sentença recorrida, “a propriedade que o Município do Porto detinha sobre as parcelas que compõem o terreno” sobre o qual incidiu o licenciamento da construção em causa ‘foi transferida para a I………. através das escrituras públicas de 22.12.1997 e de 25.10.2001, pelo que o licenciamento das construções respeitou a obra particular porque a realizar em obra particular por pessoa particular”, sendo que “ o facto de o terreno ou parte dele ter pertencido em propriedade ao Município não significa que o mesmo seja público”, pois “a partir do momento em que a sua propriedade se transfere para um particular, o terreno deixa de pertencer a pessoa pública”.

  5. O despacho de 18.07.2002 não enferma de qualquer nulidade, por violação do disposto no artigo 15.º RNPMP, porquanto autoriza a realização de uma construção em estrito respeito pela área bruta de construção admissível para o terreno em causa.

  6. Pelo exposto, andou bem o Tribunal a quo no julgamento efectuado da causa, não podendo ser apontado qualquer vício à decisão recorrida, motivo pelo qual deverá improceder o recurso interposto.

    Termos em que, julgando-se improcedente o recurso, se fará inteira Justiça!” 4.2.2- Contra-alegando também, a I…………………, S. A., concluiu nos termos que se seguem: “A - DA NÃO IMPUGNACÃO DA MATÉRIA DE FACTO 1ª. Os ora recorrentes não impugnaram a matéria de facto provada, nomeadamente a relativa à área do terreno e à sua edificabilidade (v. Alíneas J), L) N) e O), dos FP); 2ª. As considerações genéricas e conclusivas avançadas pelos ora recorrentes não cumprem minimamente o prescrito nos arts. 685°-B e 712°/1 do CPC, pelo que as conclusões formulados assentam em factos não provados no presente processo - cfr. texto n.ºs 1 a 5; B — DOS FUNDAMENTOS DO PRESENTE RECURSO 3ª. O recurso jurisdicional agora interposto pelos ora recorrentes apenas tem por objecto a parte restrita dos segmentos decisórios da douta sentença recorrida que foram especificamente referidos e delimitados nas conclusões (cfr. arts. 684°/2 e 3 e 690º do CPC; cfr. arts. 1° e 102° da LPTA) — cfr. texto n.º s 6 e 7; 4ª. A douta sentença recorrida transitou assim em julgado relativamente às demais questões apreciadas e decididas em sentido desfavorável aos ora recorrentes (v. arts. 671° e segs. do CPC), não podendo ser alterada (v. arts. 660°/2...

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