Acórdão nº 298/12.1TTMTS-A.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelANTÓNIO LEONES DANTAS
Data da Resolução12 de Fevereiro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam na Secção Social do Supremo Tribunal de Justiça: I AA instaurou contra BB, SA, a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, formulando os seguintes pedidos: a) - a anulação da sanção disciplinar de seis (6) dias de suspensão do trabalho com perda de retribuições e de antiguidade aplicada ao A. pela Ré, sem causa justificada, por aquele cumprida de 1 a 9 de Fevereiro de 2011; b) - a condenação da R. no pagamento ao A. dos montantes retributivos que este não recebeu mas que normalmente auferiria caso não tivesse sido sujeito à dita sanção disciplinar, os quais ascendem, na sua globalidade, a € 4.894,09; c) - a condenação da R. no pagamento ao A. da indemnização por aplicação de sanção abusiva nos termos previstos no artigo 331º n.º 5, do Código do Trabalho, no montante de € 48.940,90 ou, pelo menos, a pagar-lhe a quantia de € 3.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais por ele sofridos em consequência da conduta ilícita da R., consubstanciada na instauração do processo disciplinar e na subsequente aplicação injustificada da sanção disciplinar, o que subsidiariamente pede; d) - a condenação da Ré no pagamento do prémio para gozo de férias vencidas em 1 de Janeiro de 2009, no montante de € 1.437.75; e) - Juros de mora vencidos e vincendos sobre as quantias referidas nas als. b), c) e d), a calcular em condições que discrimina.

A acção prosseguiu seus termos e, tendo sido invocada pela Ré a excepção de caducidade do direito de impugnar a sanção disciplinar em causa, o Tribunal conheceu desta excepção no despacho saneador, considerando-a procedente e, por consequência, absolveu a Ré dos pedidos formulados nas als. a), b), c) e e), «este apenas no que se reporta aos créditos referidos naquelas alíneas», mais havendo ordenado o prosseguimento da acção relativamente aos outros pedidos formulados.

Inconformada com esta decisão dela interpôs o Autor recurso de apelação para o Tribunal da Relação do Porto, recurso que, tendo subido em separado, veio a ser decidido por acórdão de 17 de Junho de 2013, cujo dispositivo é do seguinte teor: «Em face do exposto, acorda-se em conceder provimento ao recurso, em consequência do que se revoga, na totalidade, a decisão recorrida, que é substituída pelo presente acórdão, considerando improcedente a exceção peremptória da caducidade do direito de impugnação da sanção disciplinar aplicada ao A. em 17 de Janeiro de 2011 e, consequentemente, se revoga o segmento decisório que, com esse fundamento, absolveu a Ré dos pedidos formulados sob as als. a), b), c) e e) [este na parte considerada na decisão recorrida]. Custas, na 1ª instância, pela Recorrida (correspondentes a 97,41% das devidas a final, proporção considerada na decisão recorrida e que se mantém).

Custas do Recurso pela Recorrida».

Irresignada com o assim decidido veio agora a Ré recorrer de revista para este Supremo Tribunal, integrando nas alegações apresentadas as seguintes conclusões: «A - O presente recurso vem interposto do douto Acórdão proferido pelo Venerando Tribunal da Relação do Porto (TRP), que decidiu julgar improcedente a excepção peremptória de caducidade do direito de impugnação judicial da sanção disciplinar aplicada ao A. e ora Recorrida pela R. e ora Recorrente de suspensão do trabalhador com perda de retribuição e antiguidade pelo período de 6 (seis) dias.

B - No entender do TRP, o A. e ora Recorrido não estava sujeito ao prazo de caducidade de 1 (um) ano a contar da comunicação da sua aplicação para deduzir a competente impugnação judicial, mas antes ao prazo prescricional previsto no n.° 1, do art.° 337° do Cód. do Trabalho que, no caso em apreço, não se iniciou, na medida em que a relação laboral se mantém em vigor, tanto mais que in casu se discute a aplicação de sanção disciplinar reputada como abusiva. C - Salvo o devido respeito, ao perfilhar tal tese o douto acórdão recorrido aplicou incorrectamente à situação sub judice os artigos 331°, n° 5, 337°, n°s 1 e 2, ambos do Cód. do Trabalho, e art.° 287°, n° 1, do Cód. Civil, porquanto, atenta a inexistência de preceito legal que fixe o prazo de que o trabalhador dispõe para impugnar sanção disciplinar distinta do despedimento, a solução que melhor se harmoniza com os princípios de estabilidade e certeza do direito disciplinar é a que considera que o prazo para a impugnação de sanção disciplinar diversa do despedimento é de 1 (um) ano a contar da data de comunicação da sua aplicação ao trabalhador.

D - Com efeito, o Cód. do Trabalho (bem como os diplomas legais que o precederam) não estabelece qualquer prazo para os trabalhadores impugnarem sanções disciplinares distintas do despedimento, pelo que estamos perante uma (óbvia) lacuna jurídica, que deve ser preenchida com recurso às regras consagradas no artº 10° do Cód. Civil.

E - Para preencher a aludida lacuna não pode, porém, aplicar-se analogicamente o artº 337.°, n° 1, do Cód. do Trabalho, na medida em que a previsão desta norma é diametralmente oposta ao que o espírito do sistema jurídico em geral, e do laboral em particular, reclama.

Inexistindo preceito análogo do qual nos possamos recorrer para suprir a aludida lacuna, o n° 3 do citado artigo 10° do Cód. Civil determina que se recorra à denominada analogia iuris, ou seja, à criação da norma que o próprio intérprete produziria se tivesse de legislar dentro do espírito do sistema.

F - Existem ponderosas razões de paz jurídica a exigir que não se protele excessivamente no tempo a resolução efectiva dos litígios associados à prática de uma infracção disciplinar e ao seu sancionamento, tanto mais que o legislador não foi indiferente e estabeleceu apertados prazos no âmbito do exercício disciplinar por parte do empregador.

Sendo assim tão prementes as razões de paz jurídica nesta matéria, resulta evidente que o espírito do sistema jurídico impõe que se estabeleça um prazo para a impugnação das sanções disciplinares não expulsivas e que tal prazo corra na vigência do contrato individual de trabalho.

Efectivamente, atenta a relevância que os princípios da estabilidade e da certeza jurídica assumem no domínio laboral, revela-se inconveniente a manutenção durante anos de uma situação de indefinição quanto à viabilidade da sanção disciplinar aplicada. G - Dado que, a impugnação de uma sanção disciplinar visa obter a sua anulabilidade, reputa-se adequado, na senda da jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, a aplicação do regime geral da anulabilidade dos actos jurídicos, previsto no art.° 287.° do Cód. Civil, devendo, em consequência, a sanção disciplinar distinta do despedimento ser impugnada judicialmente no prazo de 1 (um) ano a contar da data da sua comunicação ao trabalhador.

Convirá, igualmente, salientar que, do ponto de vista da prova, que se vai diluindo com o decurso do tempo, a solução acima sufragada revela-se como a mais adequada, na medida em que não deixa correr um prazo demasiadamente longo entre a ocorrência dos factos e a sua apreciação em juízo.

H - Em sentido contrário, aduz-se no douto acórdão recorrido que do n° 2 do art.° 337° do Cód. do Trabalho "decorre que, relativamente a impugnação das sanções abusivas - que é o caso em apreço nos autos - e ao pedido da correspondente indemnização, o legislador não pretendeu estabelecer qualquer prazo de caducidade (de um ano ou outro) a contar da comunicação da sua aplicação, antes considerando que o prazo de impugnação é o (de prescrição) previsto no art.° 337°, n.° 1 (e apenas tendo pretendido estabelecer, no n° 2 desse preceito, um regime de prova mais restritivo relativamente à indemnização por sanções abusivas vencidas há mais de cinco anos)." Ora, a tese sufragada pela decisão recorrida deverá manifestamente improceder, na medida em que o aludido normativo legal não se refere à prescrição do direito de o trabalhador reclamar créditos advenientes da aplicação de uma sanção disciplinar que o mesmo reputa de abusiva, limitando-se a estabelecer um regime probatório especial, através de documento idóneo, relativamente aos créditos advenientes da aplicação de uma sanção disciplinar abusiva vencidos há mais de 5 anos, conforme, aliás, tem vindo a ser pacificamente reconhecido pela maioria dos tribunais superiores.

I - Mas ainda que se entendesse que a o n.° 2 do art.° 337.° do Cód. do Trabalho pudesse alterar enquadramento jurídico-decisório da questão sub judice, o que se refuta, apenas se admitindo à cautela e sem conceder, sempre se deveria ter em consideração que o art.° 331.° do Cód. do Trabalho engloba duas indemnizações, uma prevista no seu n.° 3, que visa ressarcir o trabalhador, nos termos gerais, consagrados nos artigos 483.° e 562.° e ss. do Cód. Civil, por todos os danos patrimoniais e não patrimoniais que sofreu em resultado do exercício abusivo do poder disciplinar por parte da entidade empregadora, e outra prevista no seu n.° 5, que visa punir o comportamento ilícito adoptado pelo empregador e acautelar que o mesmo, de futuro, não incorra em condutas semelhantes. J - Ora, a proceder a tese plasmada na decisão recorrida, o que não se concede e apenas se admite à cautela, concluir-se-á que o legislador, ao prever a possibilidade de a indemnização por sanção abusiva, nos termos do n° 3 do citado art.° 331°, vencida há mais de 5 anos, poder ser provada por documento idóneo, estará a consagrar que o prazo de prescrição aplicável a esta obrigação de indemnização nos termos gerais de direito será o previsto no artigo 337.°, n° 1, do Cód. do Trabalho.

De igual modo, nesta senda, impor-se-á também concluir que a indemnização prevista no n.° 5 do artigo 331.° do Cód. do Trabalho, porque apresenta finalidades marcadamente distintas do ressarcimento real de danos, estará sujeita ao prazo de impugnação das sanções disciplinares não expulsivas, o qual, como acima referido, é de 1 (um) ano após a sua aplicação, por força da integração da lacuna legal existente por recurso ao disposto no artigo 287.° do Cód. Civil.

Assim, e caso...

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