Acórdão nº 3761/11.8TBGDM.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Janeiro de 2014

Magistrado ResponsávelJOSÉ AMARAL
Data da Resolução30 de Janeiro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação nº 3761/11.8TBGDM.P1– 3.ª Relator: José Fernando Cardoso Amaral (nº 124) Des. Dr. Trajano Amador Seabra Teles de Menezes e Melo (1º Adjunto) Des. Mário Manuel Batista Fernandes (2º Adjunto) Acordam na 3ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto: I. RELATÓRIO O autor B… instaurou, em 07-10-2011, na comarca de Gondomar-2º Juízo Cível, acção declarativa sumária, contra a ré C…, S.A.

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Pediu a condenação desta a pagar-lhe a quantia de 6.500,00€, acrescida de juros de mora desde a citação.

Invocou, como causa de pedir: incumprimento da obrigação de indemnizar, por danos consequentes a acidente de viação.

Fundamentando, alegou, em síntese, na petição, que, quando o seu veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-GC-.., então conduzido por seu filho, se encontrava parado no eixo da … (por onde ia a circular), no sentido ascendente, junto ao entroncamento desta (à direita, tendo em conta esse sentido) com a Rua …, em …, para ceder passagem ao motociclo LM-..-.. que, conduzido pelo seu dono, por aquela circulava a velocidade superior a 100 km/h e se aproximava em sentido contrário, este, em consequência de ter feito uso do travão, da velocidade e da humidade do piso, despistou-se, ainda a cerca de 25 metros de distância, e, saindo fora de mão, embateu na frente daquele.

Em consequência, o GC sofreu estragos em toda a parte frontal para cuja reparação desembolsou 4.500€ e baixou o seu valor comercial em 1.000€. Por seu turno, o autor sofreu desgosto, incómodo, tristeza, aborrecimento compensável com 1.000€.

Em contestação (fls. 24 a 30), a ré, reconheceu parte da factualidade, impugnou outra e imputou a responsabilidade total pelo evento à conduta do filho do autor.

Com efeito, na sua versão, o LM seguia pela referida Avenida em marcha descendente a velocidade constante não superior a 40 km/h e pretendia prosseguir em frente, enquanto que o GC por ela ascendia e pretendia virar à sua esquerda, no aludido entroncamento.

Porém, não parou, não olhou para a frente, não ligou o “pisca”, iniciou a manobra de mudança de direcção à esquerda, invadiu a via de circulação do LM, cortou a “linha de trânsito” deste, cenário perante o qual o respectivo condutor, tentando evitar o embate, travou, tentou desviar o motociclo para o seu lado esquerdo mas, por estar molhado o pavimento, derrapou e, enquanto o seu condutor foi projectado para a via de trânsito desse lado (atento o sentido em que seguia), o veículo prosseguiu, em derrapagem, em linha recta, dentro da sua hemi-faixa de rodagem e, ainda nesta, embateu na parte frontal-lateral direita do GC, como extrai das fotos juntas Não houve resposta (ao articulado e aos documentos com ele juntos).

Após saneador tabelar (fls. 53 a 58), foi seleccionada a matéria de facto já assente e a ainda controvertida, tendo esta sido objecto de reclamação, atendida.

Indicados os meios de prova, designou-se e realizou-se, em duas sessões (fls. 124 e 141), a audiência de julgamento, nos termos e com as formalidades descritas nas respectivas actas.

Respondeu-se aos quesitos da Base Instrutória nos termos e com os fundamentos de fls. 148 a 154, sem qualquer reclamação.

Por fim, em 14-01-2013, foi proferida a Sentença, conforme fls. 155 a 164, que, entendendo que o acidente foi unicamente causado pela conduta culposa do condutor do veículo do autor, absolveu a ré da totalidade do pedido.

O autor não se conformou e interpôs recurso para esta Relação (fls. 171 a 199), concluindo assim as suas longas alegações[1]: “1) O presente recurso impende sobre a decisão de mérito proferida, indo impugnada não só a decisão proferida sobre a matéria de facto, mas também sobre matéria de direito.

2) A análise crítica e conjugada de todos os documentos juntos aos autos e dos depoimentos das várias testemunhas em sede de audiência de discussão e julgamento, aliada aos critérios da experiência comum e da lógica do homem médio suposto pela ordem jurídica, impõe uma diversa decisão sobre a matéria fatual controvertida, designadamente sobre a matéria constante dos quesitos 7.º, 8.º, 11.º, 12.º, 19.º e 27.º da douta base instrutória.

3) Desde logo, o facto de se ter dado como integralmente não provado que “quando o GC se encontrava parado na intersecção referida em A) para efetuar a mudança de direção à esquerda, surgiu o LM, em sentido oposto, o qual circulava a uma velocidade superior a 100 km/h”, vai ao arrepio da prova produzida nos autos.

4) Efetivamente, não foi possível apurar a concreta velocidade do LM; todavia, no modesto entendimento do autor, com base nos elementos objetivos que constam dos autos – designadamente os danos no GC e no LM, no condutor do LM, e nas marcas de travagem, a única conclusão passível de idónea dedução é o manifesto excesso de velocidade a que o condutor do LM o fazia circular.

5) Com o devido respeito, o Tribunal devia ter dado como provado que o LM, previamente ao embate, circulava a velocidade muito superior à permitida no local (50 km/h). Os elementos objetivos em apreço, apontam efetivamente nesse sentido.

6) Vejam-se as fotografias juntas aos autos comprovativas do estado lastimoso em que ficou a parte frontal direita do GC. Tais danos não são compatíveis com uma velocidade de circulação do motociclo inferior a 40 km/h, como a Ré alega no artigo 14.º da sua douta contestação.

7) Também os danos de elevada monta sofridos pelo condutor do LM - reivindicados no processo 2821/10.7TAGDM, que corre termos no 2.º Juízo Criminal de Gondomar - e pelo motociclo - considerado em perda total (vejam-se as fotografias juntas aos autos e a participação de acidente onde se refere que o “veículo ficou totalmente danificado”) -, o qual, dada a violência do embate, se enfaixou debaixo do GC - indiciam uma velocidade bem superior à permitida no local.

8) Não olvidemos (vd. resposta ao quesito 2.º) que o local onde ocorreu o acidente configura uma reta com cerca de 1000 metros de comprimento, o que aliado à elevada cilindrada do LM – uma Honda … – propiciam a circulação a velocidades elevadas, quiçá bem superior aos 100 km/h apontado pelo autor na petição.

9) Com base nos preditos elementos facilmente se percebe que o embate foi violentíssimo. As regras da experiência e o bom senso sugerem que, com alto grau de probabilidade, o LM (Honda …), circulava a muito mais que 50 km/h.

10) Outrossim, os rastos de travagem referidos no croqui (5,10 m), deixados em piso molhado - devendo ter-se em conta que a travagem pode ter iniciado muitos metros antes - indiciam uma velocidade bem superior à permitida naquele local.

11) Se o LM circulasse a menos de 40 km/h, como alega a Ré teria, forçosamente, que concluir-se seu condutor teria tempo – e esse tempo potenciaria o discernimento - para parar o motociclo no espaço livre e visível à sua frente, ou então para desviar ligeiramente o mesmo para a direita, uma vez que, como se verifica do croqui, tinha espaço mais do que suficiente para essa manobra.

12) Assim, o autor é forçado a concluir que aquilo que foi adequadamente causal do acidente e das consequentes lesões foi o excesso de velocidade a que o LM circulava.

13) A M.ª Juiz do Tribunal a quo levou em linha de conta, para fundamentar a sua resposta à factualidade controvertida, o depoimento do condutor do LM, o qual, afirmou como “sereno e descomprometido”, porém, curiosamente, no que concerne à velocidade, a M.ª Juiz - que tão hábil foi a analisar alguns dados objetivos, como o local do embate, a posição dos rastos de travagem, etc. - concluiu que ninguém a soube concretizar, sendo que apenas o condutor do LM referiu circular a uma velocidade não superior a 50 km/h.

14) Ou seja, acreditou no depoimento do condutor do LM para sustentar a prova relativa à dinâmica do acidente, mas não o valorou no que concerne à velocidade.

15) Daqui se infere que, no seu íntimo, a M.ª Juiz não colheu a tese da Ré no sentido de que o motociclo circulava a menos de 40km/h, pelo contrário, ficou bem ciente que o veículo circulava a velocidade muito superior à permitida, quiçá superior aos 100km/h alegados pelo autor, apenas não o tendo registado na resposta dada aos quesitos por eventual preconceito em relação ao cariz (meramente) indiciário da prova produzida.

16) No modesto entendimento do autor, o Tribunal a quo, com base nos elementos e nos argumentos supra, poderia e deveria ter feito uso de presunção judicial para, pelo menos, dar como provado que o motociclo circulava a mais de 50km/hora, ou mesmo, como referiu o autor na petição, a mais de 100km/hora.

17) Pelos motivos supra alegados, pretende-se que a Relação reaprecie e repondere a prova efectuada, alterando, em conformidade com as regras comuns da lógica, da experiência, do bom senso e, até, dos ensinamentos da ciência, a resposta ao quesito 7.º, que deve ser alterado para provado, com a seguinte redação: “Quando o GC se encontrava parado na intersecção referida em A) para efetuar a manobra de direção à esquerda, surgiu o LM, em sentido oposto, o qual circulava a uma velocidade superior à permitida para o local”.

18) Concomitantemente, deve alterar-se também a resposta ao quesito 8.º, o qual deve ser dado como provado, pois, como bom é de perceber, também por apelo às regras comuns da lógica, da experiência e do bom senso, a velocidade excessiva que o condutor do motociclo imprimia ao LM, aliada à humidade do piso, fez com que, ao fazer uso do travão, o LM entrasse em despiste.

19) O próprio condutor do motociclo admitiu que se “assustou”, tendo perdido o controlo da mota, o que bem revela a velocidade excessiva a que seguia, sendo esse um fator determinante para o despiste, pois, se o condutor seguisse a menos de 40km/h, como a Ré alega, facilmente teria, não obstante o piso molhado, parado ou desviado o motociclo em segurança, no espaço livre e visível à sua frente.

20) Outrossim, é entendimento do autor que, no vertente caso, deveria ter sido dada diferente resposta aos quesitos 11.º e 12.º, devendo, no caso do primeiro quesito...

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