Acórdão nº 905/08.0TBALB.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 16 de Janeiro de 2014

Magistrado ResponsávelJOÃO TRINDADE
Data da Resolução16 de Janeiro de 2014
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça : 1- AA, e BB intentaram,em 2008-11-08 contra CC, DD, EE, e FF, acção de condenação, com processo ordinário, pedindo que se declare que o Réu CC é o pai biológico dos A.A. e que seja ordenado o averbamento nos assentos de nascimento da paternidade e avoenga paterna.

# 2 - Para tanto e em síntese alegaram que a sua progenitora manteve com o referido Réu relações de cópula completa, das quais resultou a gravidez e o subsequente nascimento dos A.A.

# 3- Devidamente citados para a causa, nenhum dos Réus contestou.

# 4-Foi proferido despacho que saneou o processo e fixou os factos tidos como provados, elaborando-se base instrutória com os que subsistiam como controvertidos .

# 5- Após realização da audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença em que se julgou a acção totalmente procedente e em consequência se decidiu:

  1. Recusar a aplicação retroactiva do art. 1817°, n.° 1, do CC, na redacção da Lei 14/2009, de 01.04, por inconstitucionalidade material do art. 3o, da Lei 14/2009, de 01.04, às acções entradas em juízo após a publicação do Acórdão do TC 23/2006 e antes da entrada em vigor da referida Lei 14/2009, por ofensa ostensiva das expectativas criadas ao abrigo da declaração de inconstitucionalidade do art. 1817°, n.° 1, da anterior redacção, logo por violação do princípio da confiança ínsito no Estado de Direito Democrático, previsto no art. 2o, da Constituição.

b) Reconhecer que CC, filho de GG e de HH, natural da freguesia de …, concelho de Faro, é pai da A. BB, nascida em … de Março de 19… , no lugar de ..., freguesia e concelho de ..., filha de FF, e do A. AA, nascido em … de … de 19…, no lugar de ..., freguesia e concelho de ..., filho de FF.

Consequentemente, determinou-se o averbamento aos assentos de nascimento dos A.A. do nome do pai e da avoenga paterna nos termos aludidos.

# 6- Desta sentença foi interposto recurso obrigatório pelo MP, para o Tribunal Constitucional ao abrigo do disposto no art° 72, n° 1º, a) da Lei n°28/82, de 15/ 11, na qual foi proferida a seguinte: "DECISÃO SUMÁRIA(Proferida nos termos do n.° l do artigo 78.°-A da Lei do Tribunal Constitucional) 1. No juízo de Família e Menores de Estarreja, comarca do Baixo Vouga, foi proferida sentença em 24 de Novembro de 2010 que, no que agora interessa, julgou inconstitucional a norma do artigo 3 da Lei n. ° 14/2009 de l de Abril . Houve recurso para o Tribunal Constitucional, interposto pelo Ministério Público ao abrigo da alínea a) do n° l do artigo 70° da Lei n.° 28/82 de 15 de Novembro (LTC), que foi recebido no tribunal recorrido por despacho de 28 de Janeiro de 2011. O processo deu entrada no Tribunal Constitucional em 17 de Janeiro de 2012.

  1. Face a divergências ocorridas na jurisprudência das Secções do Tribunal Constitucional, o Plenário do Tribunal proferiu, nos termos do artigo 79°-D da LTC, decisão sobre esta matéria, cumprindo agora fazer aplicação da doutrina assim firmada para os efeitos do disposto no n.° l do artigo 78°-A da referida LTC, o que permite decidir sumariamente o presente recurso.

    Assim; - No Acórdão n. ° 401/2011, decidiu-se não julgar inconstitucional a norma do artigo 1817° n.° l do Código Civil, na redacção da Lei n. ° 14/2009 de l de Abril, na parte em que aplicando-se às acções de investigação de paternidade, por força do artigo 1873° do mesmo Código, prevê um prazo de dez anos para a propositura da acção, contado da maioridade ou emancipação do investigante.

    - No Acórdão n.° 24/2012, o Tribunal decidiu julgar inconstitucional a norma constante do artigo 3. ° da Lei n.° 14/2009, de l de Abril, na medida em que manda aplicar, aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor, o prazo previsto na nova redacção do artigo 1817. ° n° l, do Código Civil, aplicável por força do artigo 1873° do mesmo Código.

  2. No presente caso, deve manter-se o julgamento quanto à desconformidade constitucional da norma do artigo 3. ° da Lei n. ° 14/2009, de l de Abril, na medida em que manda aplicar, aos processos pendentes à data da sua entrada em vigor, o prazo previsto na nova redacção do artigo 1817.° n°l, do Código Civil, aplicável por força do artigo 1873. ° do mesmo Código.

    Em consequência, decide-se - em aplicação da referida jurisprudência - negar provimento ao presente recurso. (...)".

    Após interrupção do prazo os réus apelaram, concluindo nas suas alegações: A)- A investigação de Paternidade não pode ser reduzida a um puro interesse patrimonial, a " activar "pelos investigantes quando oportuno! B)- Por isso mesmo, é que a aplicação retroactiva da lei n°. 14/2009 de 1 de Abril, no presente caso, não deve ser declarada inconstitucional.

    C)- Uma vez que são manifestos os interesses sucessórios e hereditários que lhe estão subjacentes.

    D)- A verdade é que a referida lei n°. 14/2009, veio estabelecer um prazo de 10 anos, posterior à maioridade ou emancipação para a propositura deste tipo de acções. (V. a nova redacção do art°.1817 n°l do C. Civil por remissão do art°1873 do mesmo Código).

    E)- Prazo esse que se aplica aos processos pendentes á data da sua entrada em vigor (V. art°.3°. da lei n°. 14/2009 de 1 de Abril).

    F)- E que perante o " princípio da igualdade de tratamento “ não pode discriminar os investigados nos processos entrados entre 10 de Janeiro de 2006 (data do Acórdão n°. 23/06 do Tribunal Constitucional) e 2 de Abril de 2009 (data da entrada em vigor da lei n°. 14/2009). (V. também a este propósito art°.9°. do C. Civil).

    G)- Pois tal seria tratar formalmente desigual o que é materialmente igual.

    H)- Além disso, parece claro e pacífico que o Acórdão do Tribunal Constitucional n°.23/06, não declara imprescritível o direito à investigação de paternidade.

    I)- Fazendo-o apenas em relação ao prazo de 2 anos.

    J)- Sendo que o prazo de 10 anos fixado na lei 14/2009 é um ponto de equilíbrio aceitável entre a afirmação do direito à identidade pessoal e a do valor da segurança e certeza jurídicas, conforme à actuação do principio da proporcionalidade previsto no n°.2 do art°,18 da C.R.P.

    K)- E conforme aos princípios constitucionais plasmados nos art°s.25 n°.l 26 n°.l e 67 da C.R.P. (integridade moral, direito à reputação e à reserva da intimidade da vida privada e familiar e protecção da família).

    L)- Não podendo o direito à identidade pessoal tornar-se num direito absoluto que torna irrelevante o prazo entre a data em que o investigante atingiu a maioridade e a data da propositura da acção de investigação.

    M)- Pois se assim for estão-se a abrir as portas ao arbítrio e ao exercício ilegítimo dum direito censurável por lei. (V. artº 334 do C. Civil).

    N)- Tanto mais gritante neste caso concreto, quanto é certo que o investigado à data da propositura da acção tinha 73 anos de idade e sofria de doença oncológica grave.

    O)- E que conforme é afirmado também na petição inicial o investigado é dum estatuto social bastante abastado e os investigantes pelo contrário de origem humilde.

    P)- Sendo exactamente a lei nº. 14/2009 e o art°.334 do C. Civil um " tampão " ao exercício abusivo do direito à investigação de paternidade.

    Q) Exercício esse, como no presente caso, que após uma vida inteira de costas voltadas uns para os outros, é exercido às portas da morte do investigado por puros interesses patrimoniais.

    R)- E que deve levar à dissociação entre os efeitos pessoais e os efeitos patrimoniais do estabelecimento da filiação, caso esta venha a ser definitivamente declarada.

    S)- Isto é, o reconhecimento da paternidade, no caso concreto, não pode conceder quaisquer direitos sucessórios ou alimentares aos investigantes.

    O)- E que conforme é afirmado também na petição inicial o investigado é dum estatuto social bastante abastado e os investigantes pelo contrário de origem humilde.

    P)- Sendo exactamente a lei n°. 14/2009 e o art°.334 do C. Civil um " tampão " ao exercício abusivo do direito à investigação de paternidade.

    Q)- Exercício esse, como no presente caso, que após uma vida inteira de costas voltadas uns para os outros, é exercido às portas da morte do investigado por puros interesses patrimoniais.

    R)- E que deve levar à dissociação entre os efeitos pessoais e os efeitos patrimoniais do estabelecimento da filiação, caso esta venha a ser definitivamente declarada.

    S)- Isto é, o reconhecimento da paternidade, no caso concreto, não pode conceder quaisquer direitos sucessórios ou alimentares aos investigantes.

    T)- Devendo o Tribunal da Relação mandar ampliar a matéria de facto, no sentido de esclarecer a existência e o montante do património do aqui recorrente (Io. Co-Réu) e mulher (2a. Co-Ré). (V. art°.712n°.4 do C.P.C.).

    U)- Devendo igualmente ser revogada a inversão do ónus da prova decretada na resposta à matéria de facto , atendendo á legitimidade do comportamento do Réu no que diz respeito à realização do teste de " ADN ". (V. art°.519 n°.3 do C.P.C).

    V)- Por último, remetemos mais uma vez para o douto e esclarecido Parecer aqui junto e elaborado pelo Exmo. Senhor Professor da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra João Paulo Remédio Marques sob o título " Investigação de Paternidade -Caducidade da Acção, Abuso de Direito e ineficácia Patrimonial do Estabelecimento da Filiação ".

    w) Parecer esse elaborado com mestria por aquele insigne Professor e Jurista e que duma forma perfeitamente clara e transparente submete à apreciação deste Venerando Tribunal da Relação de Coimbra a sua razão de ciência em apoio do presente recurso.

    X)- E que duma forma mais elaborada, criteriosa e aprofundada aborda a temática da presente acção de investigação de paternidade e do seu carácter abusivo.

    Y)- E dos efeitos que esta deve e não deve produzir no caso de vir a ser decretada.

    U) Devendo igualmente ser revogada a inversão do ónus da prova decretada na resposta à matéria de facto, atendendo à legitimidade do comportamento do Réu no que diz respeito à realização do teste de " ADN ". (V. art°.519 n°.3 do C.P.C).

    V)- Por último, remetemos mais uma vez para o...

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