Acórdão nº 571/12.9TTMTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Janeiro de 2014

Magistrado ResponsávelJOÃO NUNES
Data da Resolução06 de Janeiro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. n.º 571/12.9TTMTS.P1 Secção Social do Tribunal da Relação do Porto Relator: João Nunes; Adjuntos: (1) António José Ramos, (2) Eduardo Petersen Silva.

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B… (casada, professora, NIF ………, residente na Rua …, n.º …, ….-… …) intentou no Tribunal do Trabalho de Matosinhos acção declarativa de condenação, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra C…, Lda (NIPC ………, com sede na Rua …, ….-… …), pedindo que: a) se reconheça o seu direito a receber a retribuição correspondente ao nível A8 da tabela salarial aplicável ao ensino particular e cooperativo, de € 1.118,69, e se condene a Ré a pagar-lhe diferenças salariais no montante de € 2.213,14, bem como a realizar os competentes descontos para a segurança social; b) se reconheça o seu (da Autora) direito à resolução do contrato de trabalho, com o consequente pagamento de uma indemnização no valor de € 3.356,07; c) se condene a Ré a pagar-lhe os proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal relativos ao trabalho prestado, no valor de € 2.994,18; d) se condene a Ré a emitir e entregar-lhe (à Autora) a declaração para efeitos de contagem de tempo de serviço; e) se condene a Ré no pagamento de juros de mora.

Alegou para o efeito, em síntese, que é detentora de uma licenciatura em … e profissionalizada, possuindo em 31 de Agosto de 2010 mais de 3 anos de serviço.

Em 13 de Setembro de 2010 foi admitida ao serviço da Ré para desempenhar as funções de professora de … dos 2.º e 3.º ciclos do ensino básico e ensino secundário, mediante um horário semanal de 18 horas lectivas.

À relação laboral é aplicável o Contrato Colectivo de Trabalho do Ensino Particular e Cooperativo e, de acordo com a respectiva tabela salarial, deveria ter auferido a retribuição mensal de € 1.118,69 (correspondente ao referido nível A8 e ao horário de 18 horas lectivas semanais): porém, a Ré pagou-lhe valores inferiores, nunca lhe entregou os recibos relativos a esses pagamentos e só a partir de Novembro de 2010 passou a realizar descontos para a segurança social e apenas pela retribuição mensal de € 450,00.

Ao serviço da Ré não gozou férias, nem recebeu o respectivo subsídio, nem subsídio de Natal.

Tendo-se procedido à audiência de partes e não se tendo logrado obter o acordo das mesmas, contestou a Ré, sustentando, desde logo, a sua ilegitimidade, por a Autora a ter identificado com um número de pessoa colectiva que não lhe corresponde; por impugnação alegou, muito em resumo, que acordou com a Autora a contratação, como professora, para o ano lectivo de 2010/2011, com 18 tempos lectivos semanais, pelo valor de € 38,51/hora, em regime de acumulação com o sector público, onde a Autora dava aulas.

Mais alegou que cumpriu o acordado, designadamente quanto ao valor da retribuição, pelo que não são devidas à Autora quaisquer diferenças salariais, assim como não existe fundamento para a resolução do contrato de trabalho.

E terminou pugnando pela procedência da excepção dilatória de ilegitimidade, ou pela improcedência da acção.

Respondeu a Autora, a sustentar ser a Ré parte legítima para a acção, e que só por mero lapso indicou, em relação à mesma, um número de pessoa colectiva que não lhe corresponde.

Foi dispensada a audiência preliminar, proferido despacho saneador, onde foi afirmada a legitimidade da Ré, dispensada a fixação da base instrutória e fixado valor à causa (€ 8.563,39).

Procedeu-se a audiência de discussão e julgamento, respondeu-se à matéria de facto – a que reclamou, mas sem êxito, a Ré – após o que foi proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente, sendo a parte decisória do seguinte teor: «Nestes termos, tudo visto e ponderado, decide-se: I -Julgar parcialmente procedente, por provada, a presente acção que B… move contra o C…, Lda, e, em consequência, condeno a ré: A) No reconhecimento do direito da A. a receber a retribuição correspondente ao nível A8 da tabela salarial aplicável ao ensino particular e cooperativo, de 1.118,69 € e a condenação da R. no pagamento de diferenças salariais no valor líquido de 2.213,14€ (dois mil, duzentos e treze euros e catorze cêntimos), acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento; B) No reconhecimento do direito da A. à resolução do contrato de trabalho com justa causa, com consequente pagamento da indemnização prevista no art. 396º do Código do Trabalho, equivalente a 3 meses de retribuição base, no valor de 3.356,07 € (três mil, trezentos e cinquenta e seis euros e sete cêntimos), acrescida de juros de mora, à taxa legal, devidos desde a notificação desta sentença e até efectivo e integral pagamento; C) No pagamento à A. dos proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal relativos ao trabalho prestado, no valor de 2.915,94 € (dois mil, novecentos e quinze euros e noventa e quatro cêntimos), acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento; D) A emitir e a entregar à A. a competente declaração para efeito de contagem de tempo de serviço; II - Julgar parcialmente improcedente, por não provada, a presente acção quanto ao mais peticionado, absolvendo nessa parte do pedido a Ré, C…, Lda».

Inconformada com o assim decidido, a Ré interpôs recurso para este tribunal, tendo desde logo arguido, expressa e separadamente, a nulidade da sentença, por omissão de pronúncia sobre a validade e relevância do contrato celebrado entre as partes.

E nas alegações que apresentou formulou as seguintes conclusões: «1 – O acordo contratual entre as partes, após autorização da entidade administrativa competente, ficou assente a sujeito às normas especiais que regulam legalmente os contratos de acumulação prevalecendo estas e no seu âmbito sobre as normas gerais laborais.

2 – A Ré cumpriu escrupulosamente tal contrato, não havendo nada no seu comportamento que possa ser qualificado, como injustamente foi, de má fé.

3 – Ao invés, a A. actuou com manifesta má fé quando invocou justa causa de despedimento, aliás, para além da extinção do contrato.

4 - Qualquer alteração às normas essenciais desse acordo (entidade, local, carga horária, horário e retribuição), autorizado nos termos legais, sempre teria de ser objecto de novo pedido, não podendo ter qualquer efeito sem tal requisito legal.

5 - A A. não tinha direito a receber a retribuição correspondente ao nível A8 do CCT invocado na douta sentença.

6 - Sem prescindir, a A não alegou nem provou quaisquer transtornos ou consequências que a alegada falta de pagamento da retribuição devida lhe teria causado na sua vida pessoal ou familiar e as repercussões que essa pretensa violação teria tido no seu relacionamento com a Ré, pelo que inexiste justa causa para a resolução do contrato em causa.

7 – Sem prescindir, a actuação da A. sempre constituiria abuso do direito, evidenciando um claro venire contra factum proprium, procedimento de longa data condenado pelo Direito.

8 – Ainda sem prescindir, falta o requisito de culpa na invocada falta de pagamento pontual da retribuição.

9 – Ainda sem prescindir, há erro de cálculo ou erro de julgamento quando não se considera como retribuição o pagamento efectuado pela Ré e efectivamente recebido pela A. dos montantes do subsídio de almoço.

10 – A douta sentença em crise violou, directa ou indirectamente, o regime legal especial de acumulação de trabalho de funcionários públicos, muito especialmente a portaria 814/2005 de 14 de Setembro, os artigos 334º do Código Civil e 394º e 395º do Código do Trabalho».

E a rematar as conclusões, pede que o recurso seja julgado procedente e, em consequência, revogada a sentença recorrida.

A Autora respondeu ao recurso, a pugnar pela sua improcedência.

Para tanto, nas contra-alegações que apresentou formulou as seguintes conclusões: «1ª A douta sentença objecto do presente recurso apreciou de forma fundamentada a matéria aprovada, nomeadamente a que respeita às condições acordadas entre as partes e à aplicabilidade da contratação colectiva do Ensino Particular e Cooperativo, não enfermando, pois, de omissão de pronúncia.

  1. A circunstância da recorrida ter exercido funções ao serviço da recorrente em regime de acumulação, como esta bem sabe, não tem a relevância que lhe pretende agora atribuir, dado que a recorrida, contrariamente ao que a recorrente afirma, não era funcionária pública, servindo o pedido de acumulação apenas para assegurar a compatibilidade de horários.

  2. Não há, pois, no presente caso, qualquer prevalência das regras relativas à acumulação sobre normas que disciplinam o contrato de trabalho celebrado entre as partes.

  3. Basta atentar no valor e data dos pagamentos realizados pela recorrente e no valor dos descontos realizados para se concluir que a recorrente não cumpriu as condições acordadas com a recorrida e, muito menos, a retribuição imposta pela contratação colectiva aplicável com realização dos competentes descontos.

  4. É sabido que o acordo das partes na fixação da retribuição de nada vale no âmbito do direito laboral quando não são respeitadas as condições mínimas impostas pela lei ou contratação coletiva.

  5. A recorrente, em função das habilitações e tempo de serviço, tinha direito a auferir a retribuição correspondente ao nível A8 da tabela do Contrato Coletivo de Trabalho do Ensino Particular e Cooperativo identificado na sentença.

  6. Não cabia à recorrida produzir prova quanto aos prejuízos causados pelo não pagamento da retribuição devida mas apenas sobre a verificação de tal requisito, o que fez.

  7. Afigura-se inteiramente destituído de sentido, e até abusiva, a invocação pela recorrente da figura de abuso de direito quando ela própria violou de forma manifesta regras fundamentais do direito laboral, nomeadamente, as respeitantes ao montante e forma de pagamento da retribuição.

  8. Resulta de forma clara e inequívoca da matéria provada que o não pagamento da retribuição devida à recorrida se deveu a culpa da...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT