Acórdão nº 1420/06.2TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Dezembro de 2013

Magistrado ResponsávelSALAZAR CASANOVA
Data da Resolução02 de Dezembro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

P. 2013/1112 1420/06[1] Acordam no Supremo Tribunal de Justiça 1.

AA - …. Lda. propôs no dia 27-2-2006 ação declarativa com processo ordinário contra BB SPA pedindo o seguinte:

  1. Que se reconheça assistir-lhe o direito a haver da ré a indemnização de clientela em consequência da cessação do contrato de concessão comercial.

  2. Que se fixe a indemnização de 2.745.450,11€ e se condene a ré a pagar este montante de indemnização de clientela.

  3. Que sejam considerados os juros de mora, calculados à taxa legal ao ano que sobre esse montante se vencerem desde 1-1-2006 até integral pagamento, calculando-se os vencidos até 15-2-2006 em 30.886,31€.

  4. Que se condene a ré a pagar 46.932,68€, valor dos produtos "CC" que foram entregues pela A. à ré em consequência da cessação do contrato de concessão comercial em causa.

  5. Que se condene a ré a pagar os montantes de 1.174,59€ e 164,44€ correspondentes aos custos de transporte e de seguro de mercadoria suportados pela A.

  6. Que se condene a ré a pagar o IVA correspondente aos valores referidos em d) e e) no montante de 10.144,76€.

  7. E os juros de mora que, calculados à taxa de 12% sobre os montantes referidos em 3 e 4, se venceram e vencerem desde 1-1-2006 até integral pagamento, fixando-se os vencidos até 15-2-2006 em 543,62€.

  1. Alegou a A. que é uma sociedade que tem por objeto a importação e comercialização de produtos cosméticos, dedicando-se a ré ao fabrico e comercialização de produtos cosméticos.

  2. Até ao ano de 2000 era a sociedade de direito italiana CC … Italia, S.A.R.L. a detentora da marca "CC" e produzia produtos cosméticos sobre essa mesma marca tendo a ré adquirido em 2000 a esta sociedade italiana os direitos relativos à aludida marca.

  3. No dia 26 de outubro de 1999 a A. e a sociedade italiana celebraram contrato de concessão comercial nos termos do qual a sociedade portuguesa passou a ser a distribuidora exclusiva desses produtos para Portugal, obrigando-se a ré a comercializar tais produtos unicamente através da autora.

  4. A autora beneficiava de um desconto sobre os produtos adquiridos que era ultimamente de 74% sobre o preço de faturação de todos os produtos.

  5. O contrato iniciou-se em 1 de janeiro de 2000, não tendo sido estipulado prazo de duração.

  6. A ré assumiu , por negócio celebrado durante o ano de 2000 com a sociedade italiana, a posição desta no contrato de concessão comercial firmado com a A.

  7. No dia 21-6-2005 a BB Portugal Lda. remeteu à A. uma carta comunicando que o contrato celebrado no dia 26 de outubro de 1999 em que eram partes a ré a e A. chegaria ao seu termo no dia 31-12-2005, tendo sido confirmada a vontade de pôr termo ao contrato a partir de 1-1-2006.

  8. A A. reclama indemnização de clientela considerando que a média das remunerações recebidas durante os anos de 2001, 2002, 2003, 2004 e 2005 foi de 2.745.450,11€.

  9. A A. dos produtos vendidos pela ré com desconto de 74% beneficiou de um total de 13.727.250,58€ (1.953. 800,91€ - ano 2001, 2.835.301,50€ - ano 2002, 2.967.426,78€ - ano 2003, 3.273.193,48€ - ano 2004, 2.697.527,91€ - ano 2005); a média anual no montante indicado resulta da divisão do mencionado produto de vendas pelo número de anos (5) de duração do contrato.

    11.

    A ré contestou a natureza de concessão comercial do contrato em causa considerando que houve apenas um simples contrato de distribuição em que a A. adquiria produtos à ré para revenda com total independência relativamente à ré, contrariamente ao que sucede no contrato de concessão comercial em que o agente está dependente do principal, agindo por conta deste. No caso não houve nenhuma prestação de informação por parte do agente ao principal no que respeita à situação e desenvolvimento do mercado, o que normalmente se faz por relatórios mensais, não existindo qualquer controlo pela ré da atividade exercida pela autora. Ora tal controlo e a imposição de uma política comercial são elementos chave do contrato de concessão comercial.

  10. A ré nunca requereu o consentimento da autora para a nomeação de duas sociedades destinadas a conduzir em Portugal a sua atividade enquanto subdistribuidoras dos produtos "CC" no mercado português, não existindo obrigação contratual de a A. manter uma certa estrutura, nomeadamente quanto ao pessoal, não tendo sido a ré informada ou consultada sobre a estrutura implantada pela autora que era livre de fixar os preços e de fazer descontos.

  11. Salienta a ré que, embora a A. invocasse que se obrigara a publicitar e promover os produtos da ré, nenhuma atividade é indicada, muito menos são apresentados custos decorrentes dessa atividade.

  12. Contesta a ré que a A. haja angariado 3000 clientes, referindo-se aos seus próprios clientes a quem vendeu os produtos, não sendo esses os clientes existentes dos quais a ré iria beneficiar após a cessação do contrato.

  13. Sustenta ainda a ré que, ainda assim, não se verificam, no caso vertente, os requisitos que, nos termos do artigo 33.º da Lei n.º 178/86, de 3 de julho, justificam a atribuição de indemnização de clientela.

  14. No que respeita aos clientes alegadamente angariados pela A. , que esta considerou serem 3186, apenas 853 estão hoje a usar produtos da marca, o que representa cerca de 26% do total indicado, não sendo estáveis, ou seja, não existe uma base de clientela significativamente fixa, estável e fiel que tenha sido criada pela A. aos produtos da marca "CC".

  15. Constata-se ainda que houve falta de periodicidade das vendas motivada pela falta regular de visitas aos clientes por parte do vendedor; dos possíveis clientes, 53,92‰ responderam que não conheciam o produto e dos que conheciam apenas 16,26‰ declararam usá-lo, o que revela um fraquíssimo desempenho comercial da autora.

  16. Ora a A. não pode reclamar que dos 853 clientes existentes os mesmos vão beneficiar a ré em virtude da sua atividade, uma vez que a qualidade dos produtos e a reputação internacional dos mesmos foram fatores decisivos de angariação de clientela, e não a atividade da autora.

  17. Ora, resultando claro que a atividade da autora foi manifestamente defeituosa e inadequada, exercida de forma insuficiente, não se pode concluir que a ré obteve benefícios consideráveis fruto da atividade da autora.

  18. E isto apesar de a autora ter beneficiado de descontos de 74%, percentagem que não só é a mais alta concedida pela ré a qualquer seu outro distribuidor, cuja média anda pelos 58%, mas muito superior à média de descontos mínimos concedidos contratualmente em contratos de compra e venda. Ora, a fixação dessa percentagem revela a clara intenção de a ré apoiar a A. no desenvolvimento da clientela portuguesa, importando salientar que o máximo de desconto atribuído pela ré a qualquer outro seu distribuidor é de 70,4%.

  19. A inexistência de uma estratégia global por parte da A. evidencia-se ainda pelo facto de , vista a repartição do território pelos dois subdistribuidores, existir uma significativa discrepância de resultados.

  20. Estas razões levaram a que a ré decidisse pôr termo ao contrato firmado com a autora.

  21. Apesar de a ré ter uma sociedade do mesmo grupo em Portugal, a BB Portugal, não foi uma diferente orientação a nível de estratégia que conduziu à cessação, uma vez que foi decidido nomear uma rede de distribuição independente da marca "CC" - mantendo-se, assim, o mesmo modelo de distribuição; se os resultados da A. tivessem sido satisfatórios, não existiria motivo para mudar de distribuidores tendo a decisão da ré de cessar o contrato sido exatamente motivada pelos maus resultados da autora pelo seu comportamento durante o contrato.

  22. Contestou ainda a ré referindo que alguns produtos da marca "CC" tinham sido enviados de Portugal para os E.U.A., durante o ano de 2004, o que resulta do facto de a A. ter vendido grandes quantidades de produtos a uma sociedade que é conhecida em Portugal pela exportação de produtos cosméticos para o estrangeiro, não podendo a A. afirmar que não sabia o destino dos mesmos quando os vendeu a essa sociedade "M... - Importação e Exportação de Cosméticos". A venda de tais produtos está completamente fora do âmbito contratual, constituindo uma violação grave do contrato.

  23. As contas da sociedade revelam que a verdadeira faturação foi de 1.943.209€ em 2003, 1.833.644,33€ em 2004 e 1.548.475,42€ em 2005.

  24. No que respeita aos montantes a considerar a média anual deve ser calculada tendo por base os lucros líquidos do distribuidor distribuídos durante os 5 últimos anos de duração do contrato e não os lucros brutos; o lucro líquido é que equivale à comissão do agente.

  25. Ora, prossegue a ré, a A. nunca recebeu, como média anual de remunerações, a quantia de 2.745.450,11€. Fosse esse o caso, os montantes respetivos estariam refletidos nas perdas e ganhos da contabilidade da autora, sendo que, analisadas todas as sociedades envolvidas, o montante pedido é substancialmente superior à média de vendas anual não só da A., mas também da autora juntamente com a das sociedades DD Lda. e EE Lda. Os lucros líquidos da ré levam a uma média de 16.892€ e das duas sociedades mencionadas, DD e EE, de 123.868€ ( ver artigos 158.º e segs. da contestação, designadamente artigos 187.º a 191.º a pág. 129 do Vol I dos autos).

  26. A sentença julgou parcialmente improcedente a presente ação , absolvendo a ré do pedido efetuado quanto à peticionada indemnização de clientela.

  27. Relativamente à quantia de 58.470,41€ a sentença declarou a inutilidade superveniente da lide e extinta, assim, a instância por facto imputável à ré.

  28. O Tribunal da Relação concedeu provimento ao recurso da A. no que respeita à impugnação da matéria de facto que alterou no que respeita às respostas aos quesitos 21, 38, 40, 41, 42, 43, 59 e 62 , julgou que a sentença não incorria na invocada nulidade e confirmou a sentença de absolvição da ré no que respeita ao pedido de condenação em indemnização de clientela.

  29. Recorre a autora do acórdão da Relação sustentando que a reapreciação da prova gravada supõe a análise concreta e crítica, no mínimo, dos...

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