Acórdão nº 0535/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 05 de Dezembro de 2013

Magistrado ResponsávelRUI BOTELHO
Data da Resolução05 de Dezembro de 2013
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção de Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I Relatório O MUNICÍPIO DE SANTA MARIA DA FEIRA interpôs para este Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do art. 150º do CPTA, recurso de revista do acórdão do TCA Norte de 25.5.2012 que concedeu provimento ao recurso deduzido da decisão do TAF de Viseu de 31.1.2011 e julgou procedente a acção proposta por A……….., Lda., declarando nulo, por falta de atribuições, o despacho proferido em 12.1.2006 pelo Vereador do Pelouro do Planeamento e Urbanismo que lhe indeferiu o pedido de licenciamento de um posto de combustíveis.

Para tanto alegou, vindo a concluir assim a sua peça: 1. Nos termos da alínea a) do n.° 1 do artigo 669° do CPC pode qualquer das partes requerer no tribunal que proferiu a sentença, o esclarecimento de alguma obscuridade ou ambiguidade da decisão ou dos seus fundamentos.

  1. O excerto do acórdão que se pretende ver esclarecido/reformado é o seguinte: “estando em causa apenas o tráfego relativo a uma estrada nacional (326) e, verificando-se das plantas juntas ao PA que a entrada e saída de viaturas do posto de combustíveis, apenas se faz por esta mesma estrada nacional, em nada afectando directamente a estrada municipal [o trânsito que provenha ou se dirija ao posto de combustíveis, não aumenta ou diminui o tráfego que circule na estrada nacional que entronca com a estrada nacional n.° 326] e ainda que esta entrada e saída do posto de combustíveis dista de um dos lados da estrada até ao eixo da via 13,4 metros e do outro, 9,5 metros [cfr. planta cartográfica que constitui fls. 7 do PA].

  2. A entidade administrativa, dúvidas não subsistem pela análise dos elementos gráficos apresentados pela A. no PA n.º 1508/2005 (junto aos autos) que o posto pretendido licenciar possui dois acessos, um deles por uma estrada municipal.

  3. Não se percepciona, como é que no douto acórdão se faz remissão para as plantas juntas ao PA, e se conclui que a entrada e saída apenas se faz pela estrada nacional, quando na realidade, o PA está instruído com várias peças desenhadas de onde claramente decorrem dois acessos para o posto de combustíveis.

  4. Aliás, a memória descritiva inserta no processo administrativo refere que: “ Haverá sinalização luminosa da instalação nas entradas e saídas e toda a área será devidamente iluminada”. - sublinhado nosso.

  5. A planta cartográfica a fls. 7 do PA, respeita a uma planta de condicionantes do PDM do Município de Santa Maria da Feira, a qual, relativamente à identificação e número de entradas e saídas do posto (devido à sua escala reduzida), pouco ou nada esclarece! 5. O posto de abastecimento de combustíveis confina a sul com a Estrada Nacional n°326 e a norte com Estrada Municipal, que na planta a fls. 3 - planta das diversas instalações do projecto de arquitectura - aparece assinalada pela própria A. como sendo a E.M.1034.

  6. Pela leitura das plantas a fls. 3, 4 e 5, 43, 44, 45,46, 47 e 48 percebe-se perfeitamente a existência de dois acessos: uma entrada de viaturas para o posto de abastecimento de combustíveis que se faz pela EN 326, e uma saída das mesmas viaturas para a Estrada Municipal.

  7. Assim o trânsito que provenha ou se dirija ao posto de abastecimento de combustíveis aumenta o tráfego que circula na estrada municipal, porque de acordo com o licenciado pelo EP - Estradas de Portugal e pelos desenhos anexos ao PA a circulação de viaturas somente é feito no sentido sul/norte.

  8. Por outro lado, não se percepciona igualmente “que esta entrada e saída do posto de combustíveis dista de um dos lados da estrada até ao eixo da via 13,4 metros e do outro, 9,5 metros [cfr. planta cartográfica que constitui fls. 7 do PA].” 9. Desde logo porque, conforme referimos, a entrada para o posto de combustíveis é feita a norte pela EN e a saída a sul para a EM, e porque na realidade a entrada e saída não distam ao eixo da via 13,4 metros e 9,5 metros.

  9. A entrada e saída são à face da plataforma das estradas (distam 1,50 metros da EN 326 e 1,50 metros da EM).

  10. Refira-se que as distâncias de 13,4 metros e de 9,5 metros são do edifício de apoio ao posto de abastecimento relativamente ao eixo da EN e da EM, respectivamente e não da saída e entrada do posto.

  11. Assim, estaremos perante erro na interpretação do projecto de arquitectura apresentado na autarquia e por consequência perante um erro na análise das peças desenhadas, nomeadamente a planta cartográfica a fls. 7, referida no douto acórdão.

  12. Não se percepciona como é que no douto acórdão se conclui que: “a entrada e saída de viaturas do posto de combustíveis, apenas se faz por esta mesma estrada nacional, em nada afectando directamente a estrada municipal” e ao mesmo tempo, e em contradição, se refere que “esta entrada e saída do posto de combustíveis dista de um dos lados da estrada até ao eixo da via 13,4 metros e do outro, 9,5 metros [cfr. planta cartográfica que constitui fls. 7 do PAI.]” 14. Pois que, com esta última afirmação aceita o acórdão a existência de dois acessos, ou com melhor rigor, a existência de uma entrada e de uma saída.

  13. A fundamentação deste excerto do acórdão desde logo permite aos ilustres desembargadores concluir que “em nada afectando directamente a estrada municipal o trânsito que provenha ou se dirija ao posto de combustíveis, não aumenta ou diminui o tráfego que circule na estrada nacional que entronca com a estrada nacional n.° 326 (...)” 16. Sucede que tal conclusão e face aos elementos disponibilizados ab initio com a remessa do PA é ambígua e obscura (e na nossa opinião, errada!).

  14. Porque existe uma Estrada Municipal, assiste a esta autarquia toda a legitimidade de se pronunciar sobre a sobrecarga que operação urbanística acarreta para a infra-estrutura existente e isto, por força do disposto no artigo 24° do Regime Jurídico da Urbanização e Edificação.

  15. Mostra-se ininteligível a conclusão do acórdão no que: “também não se percebe o que há a garantir quanto à zona de servidão non aedificandi dado que nesta estrada nacional nada mais há que possa ser construído ou se perspective possa vir a ser construído.

  16. Desconhece a autarquia o suporte e a base que sustentou esta conclusão. Até porque parece que o acórdão do TAC se pronuncia sobre toda a Estrada Nacional, quando na realidade o que está assinalado no PA é apenas um excerto da mesma.

  17. E mesmo que de um excedo se trate (como é o caso) não se percebe como pode o acórdão do TAC chegar a tal conclusão! 21. Como tem vindo o STA a entender (v. acórdão de 1/7/2009, proferido no recurso n.° 866/08), só pode aclarar-se ou esclarecer-se um acórdão se ele contiver alguma obscuridade ou ambiguidade, sendo que ele será obscuro se contiver alguma passagem cujo sentido não se compreende e ambíguo quando permita interpretações diferentes (v., por todos, os acórdãos, de 12/1/00 e de 10/5/00, in recursos n°s 13491 e 22648, respectivamente).

  18. Citando o Prof. Alberto dos Reis, in CPC anotado, vol. V, pág. 151 e 153, “a sentença é obscura quando contém algum passo cujo sentido seja ininteligível; é ambígua, quando alguma passagem se preste a interpretações diferentes. Num caso, não se sabe o que o Juiz quis dizer; no outro, hesita-se entre dois sentidos diferentes e porventura opostos.

  19. Para poder ser entendido o requerimento de aclaração, é necessário que se aponte, concretamente, a obscuridade ou ambiguidade, cujo esclarecimento se pretende, e que se trate realmente de vício que prejudique a compreensão da sentença.

  20. No caso em apreço, e pela fundamentação supra constante, não só o acórdão induz em confusão, como se torna ininteligível, dado que presta interpretações diferentes aos elementos constantes dos autos, como de facto se trata de um erro que prejudica a compreensão do acórdão, pelo que urge a reforma do mesmo.

    Sem prejuízo e em abono da admissibilidade do recurso de revista: 25. O art. 150º nº 1 do CPTA prevê que das decisões proferidas em 2ª instância pelo Tribunal Central Administrativo possa haver, “excepcionalmente”, recurso de revista para o Supremo Tribunal Administrativo quando esteja em causa a apreciação de uma questão que, pela sua relevância jurídica ou social, se revista de importância fundamental” ou “quando a admissão do recurso seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito”.

  21. A admissibilidade do presente recurso assume um carácter excepcional, quer em virtude da sua relevância e complexidade lógico-jurídica, quer pelos efeitos da decisão em litígios futuros, quer ainda pela necessidade imperiosa de uma melhor aplicação do direito e prossecução da justiça.

  22. A jurisprudência tem vindo a entender que a relevância jurídica fundamental, exigida pelo artigo 150° nº 1 do CPTA, se verifica tanto em face de questões de direito substantivo, como de direito processual, sendo essencial que a questão atinja o grau de relevância fundamental.

  23. Nos termos daquela jurisprudência, o preenchimento do conceito indeterminado verifica-se, designadamente, quando se esteja perante questão jurídica de elevada complexidade, seja porque a sua solução envolve a aplicação e concatenação de diversos regimes legais e institutos jurídicos, seja porque o seu tratamento tenha suscitado dúvidas sérias, ao nível da jurisprudência, ou ao nível da doutrina.

  24. A admissão para uma melhor aplicação do direito tem tido lugar relativamente a matérias importantes tratadas pelas instâncias de forma pouco consistente ou contraditória, impondo-se a intervenção do órgão de cúpula da justiça administrativa como condição para dissipar dúvidas sobre o quadro legal que regula certa situação, vendo-se a clara necessidade de uma melhor aplicação do direito com o significado de boa administração da justiça em sentido amplo e objectivo, isto é, que o recurso não visa primariamente a correcção de erros judiciários.

  25. Do acórdão a quo extrai-se: “resulta claro que o acto impugnado proferido pela entidade recorrida padece de vício de violação de lei, por falta de atribuições, que...

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