Acórdão nº 02718/07.8BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 06 de Dezembro de 2013
Magistrado Responsável | Antero Pires Salvador |
Data da Resolução | 06 de Dezembro de 2013 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo:I RELATÓRIO1.
AMAF...
, identif. nos autos, inconformada, veio interpor o presente recurso jurisdicional do saneador/sentença do TAF do Porto, datada de 7 de Novembro de 2012, que julgou totalmente improcedente a acção administrativa comum, sob forma ordinária e assim absolveu do pedido o Réu/recorrido “ESTADO PORTUGUÊS”.
*2.
A recorrente nas suas alegações, formulou a final, as seguintes conclusões: "1 – A douta sentença recorrida é omissa quanto ao primeiro pedido formulado pela Recorrente, designadamente "Declarar-se que o Estado Português violou disposições comunitárias e da União Europeia, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem e da Constituição da República Portuguesa e outras disposições legais ao não legislar ou não criar medidas para que a autora fosse ressarcida pelo delinquente nos termos em que ele fora condenado, ou ao não criar medidas legais ou outras para que o Estado se substituísse ao delinquente pagando ele Estado à autora a indemnização a que ele fora condenado” violando, assim, o disposto no art. 95º, nº 1, do C.P.T.A que impõe que “ o tribunal deve decidir, na sentença ou acórdão, todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação …” e padecendo do vício previsto no art. 668º, nº 1, alínea d) do C.P.C. o que acarreta a sua nulidade.
2 - Nos termos do disposto no art. 22º da C.R.P. o comportamento ilícito do legislador existe quando viola normas a que está sujeito, constitucionais, internacionais, comunitárias e abarca, desde logo, a postergação do dever de legislar que decorre da exigência constitucional de acção vertida sob o art. 283º, nº 1, da Lei Fundamental. O seu conteúdo está essencialmente determinado ao nível das opções constitucionais e não depende da lei ordinária para se tornar líquido e certo. Tem eficácia imediata, por força do disposto nos arts. 17º e 18º da C.R.P. e deverá aplicar-se mesmo na ausência de lei, sendo dever dos Tribunais proceder à sua aplicação e cabendo-lhes, na ausência de lei concretizadora, criar uma norma de decisão, por aplicação dos princípios gerais de responsabilidade, tendente a assegurar a reparação dos danos resultantes de actos lesivos de direitos, liberdades e garantias ou dos interesses juridicamente protegidos dos cidadão.
3 - À Recorrente assiste o direito fundamental constitucionalmente consagrado de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional, mais lhe assistindo o direito ao efectivo ressarcimento dos danos resultantes da condenação do delinquente nos termos constantes da sentença proferida a 14 de Setembro de 2000 pelo Tribunal de Matosinhos, cabendo ao Recorrido, sob pena de violação dos prejuízos causados, a adopção das necessárias medidas legislativas tendentes a assegurar tal reparação mais lhe cabendo a transposição para a ordem jurídica interna das medidas comunitárias impostas pela Decisão-Quadro do Conselho de 15/03/2011 e da Directiva 2004/80/CE de 29 de Abril de 2004.
4 - A Recorrente alegou os factos nos quais radica a responsabilidade do Recorrido, a culpa, os danos – que não teve, sequer oportunidade de provar – e o nexo de causalidade entre os factos e os danos, nos termos e para os efeitos previstos no art. 483º do C.C. e arts. 2º e 6º do D.L. 48.051 como se impunha, pelo que deveriam os autos prosseguir a sua normal tramitação e a produção e apreciação, em sede audiência, da competente prova.
5 – Tendo a douta sentença recorrida violado o disposto nos arts. 17º, 18º, 20º e 22º da C.R.P. bem como as supra citadas normas vertidas no art. 483º do C.C. e nos arts. 2º e 6º do D.L. 48.0512".
*3.
Notificadas as alegações, apresentadas pelos recorrentes, supra referidas, veio o recorrido ”ESTADO PORTUGUÊS”, apresentar contra alegações, que assim concluiu: "1 - A ora recorrente invocou que a sentença a quo violou o disposto no art. 668.º, n.º 1, al. d) do CPC que impõe que “o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.”, o que acarreta a sua nulidade.
E, 2 – É dever dos Tribunais proceder à sua aplicação e cabendo-lhes, na ausência de lei concretizadora, criar uma norma de decisão, por aplicação dos princípios gerais de responsabilidade, tendente a assegurar a reparação dos danos resultantes de atos lesivos de direitos, liberdades e garantias ou dos interesses juridicamente protegidos dos cidadãos.
Pois que, 3 - À recorrente assiste o direito fundamental constitucionalmente consagrado de acesso aos tribunais e à tutela jurisdicional, mais lhe assistindo o direito ao efectivo ressarcimento dos danos resultantes da condenação do executado que padece de insuficiência de bens ou rendimentos.
Devendo, 4 – Nesse caso, o Estado substituir-se ao executado e pagar à recorrente a indemnização que lhe foi judicialmente arbitrada.
Designadamente, 5 – O Estado devia assumir a sua parte e legislar nesse sentido, nomeadamente transpondo para a Ordem Jurídica interna as medidas comunitárias impostas pela Decisão-Quadro do Conselho de 15/03/2011 e da Directiva 2004/80/CE de 29 de Abril de 2004.
De modo que, 6 - A douta sentença recorrida violou o disposto nos arts. 17.º, 18.º, 20.º e 22.º da CRP bem como as supra citadas normas vertidas no art. 483.º do CC e nos arts. 2.º e 6.º do decreto–lei n.º 48.051.
Porém, 7 – No que concerne à alegada nulidade diga-se que no caso presente, foi determinada a realização das diligências que se mostravam adequadas a alcançar o objectivo de satisfação do crédito da recorrente mas não foi alcançado o objetivo último que era o efectivo pagamento da quantia devida e, por virtude desde resultado que ainda não é definitivo.
Pois que, 8 – na data de instauração dos presentes autos, a ação executiva ainda estava pendente.
Logo, 9 - Não pode ser responsabilizado o Estado.
Acresce ainda dizer que, 10 – A recorrente, ao contrário do que lhe competia, não identificou qual o dever de legislar constitucionalmente imposto que foi violado, não se vislumbrando como pode ser assacada responsabilidade por omissão legislativa ao R., se a própria recorrente não soube (ou pelo menos não concretizou) qual o dever específico de legislar que o Estado - legislador desrespeitou.
Acontece também que, 11 - No que tange à invocada Directiva 2994/80/CE (que tem por objetivo estabelecer um sistema de cooperação destinado a facilitar o acesso à indemnização às vítimas da criminalidade em situações transfronteiriças, obrigando os Estados-Membros a prever na sua legislação nacional um regime de indemnização para as vítimas de crimes dolosos violentos praticados nos respectivos territórios) a mesma foi transposta para a ordem jurídica nacional através da lei n.°31/2006, de 21 de Julho.
Sendo certo que, 12 - A sua aplicação in casu não tem qualquer sentido, dado que à data dos factos e na pendência do processo crime e do processo declarativo não se encontrava fixada esta obrigação, pelo que, tal como sustentou o R., “…não se podia obrigar o Estado legislador à produção de legislação cujos efeitos retroagissem à data da prática dos factos criminosos, que remontam a 1992.
” Assim, 13 – A douta sentença a quo não padece da nulidade prevista no art. 668.º, n.º 1, al. d) do CPC.
Por outro lado, 14 - É sabido que, “só existe obrigação de indemnizar independentemente de culpa nos casos especificados na lei” - art. 483.º, n.º2 do CC.
Assim, 15 - Face à data dos fatos apurados na sentença a quo ora posta em crise, por força do estatuído no art. 6.º da lei nº 67/2007, de 31/12, esta não tem aplicação, mas tão só o decreto-lei nº 48.051, de 21/11/1967, donde só por mero ato de comparação se procedeu à análise dos factos perante ambos regimes legais.
16 - Este último diploma regula três tipos de responsabilidade: a baseada em ato de gestão pública ilícito culposo (arts. 2.º e 3.º), baseada em factos casuais e no risco (art. 8.º) e responsabilidade por atos lícitos (art. 9.º), encontrando-se a definição de atos ilícitos (art. 10.º).
17 - Enquanto aquela lei regula a responsabilidade a baseada em ato de gestão pública ilícito culposo (arts. 7.º e 8.º), em factos casuais e no risco (art. 11.º), decorrente dos exercícios da função jurisdicional (arts. 12.º a 14.º) e da função político-legislativa (art. 15.º) e indemnização por sacrifício (art. 16.º), encontrando-se a definição de actos ilícitos no art. 9.º.
18 - Dispõem: - O art. 1.º decreto-lei nº 48.051, de 21/11/1967: “A responsabilidade civil extracontratual do Estado e demais pessoas colectivas públicas no domínio dos actos de gestão pública rege-se pelo disposto no presente diploma, em tudo que não esteja previsto em leis especiais.”; e - O art. 1.º, n.º 1 da lei nº 67/2007, de 31/12: “A responsabilidade civil extracontratual do Estado e das demais pessoas colectivas de direito público por danos resultantes do exercício da função legislativa, jurisdicional e administrativa rege-se pelo disposto na presente lei, em tudo o que não esteja previsto em lei especial”.
19 - Exige para a afirmação da responsabilidade o nº 1 do art. 7º da citada lei n.º 67/2007, a ocorrência de «…danos que resultem de acções ou omissões ilícitas, cometidas com culpa leve, pelos titulares dos seus órgãos, funcionários ou agentes, no exercício da função administrativa e por causa desse exercício» ou, segundo o nº 3 do mesmo artigo, de danos que «não tenham resultado do comportamento concreto de um titular de órgão, funcionário ou agente determinado, ou não seja possível provar a autoria pessoal da acção ou omissão, mas devam ser atribuídos a um funcionamento anormal do serviço».
20 - Considerando-se ilícitas, por força do art. 9.º do mesmo diploma, «as acções ou omissões dos titulares de órgãos, funcionários e agentes que violem disposições ou princípios constitucionais, legais ou regulamentares ou infrinjam regras de ordem técnica ou deveres objectivos de cuidado e de que resulte a ofensa...
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