Acórdão nº 110/07.3GASPS.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 27 de Novembro de 2013

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução27 de Novembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO No Tribunal Judicial da comarca de São Pedro do Sul foram submetidos a julgamento, em processo comum, com intervenção do tribunal colectivo, os arguidos A...

e B...

, ambos com os demais sinais nos autos, a quem era imputada a prática: - A ambos os arguidos, um crime de furto qualificado, p. e p. pelo art. 204º, nº 2, e), por referência ao art. 202º, e), do C. Penal, e um crime de furto qualificado, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 22º, nºs 1 e 2, a), e 204º, nº 2, e), por referência ao art. 202º, e), do C. Penal; - Ao arguido, um crime de falsidade de depoimento ou declaração, p. e p. pelo art. 359º, nº 2, do C. Penal; - Incorrendo ainda o arguido em condenação em pena relativamente indeterminada, nos termos do art. 83º, nº 1, do C. Penal; - À arguida, um crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo art. 360º, nº 1, do C. Penal, e um crime de favorecimento pessoal, p. e p. pelo art. 367º, nº 2, do C. Penal.

Na audiência de julgamento foi comunicada aos arguidos uma alteração da qualificação jurídica relativamente ao acusado crime de furto qualificado na forma tentada, que passou a ser qualificado como crime de furto qualificado consumado. Por acórdão de 16 de Maio de 2013 foram os arguidos absolvidos da prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º, nº 1 e 204º, nº 2, e), do C. Penal.

Foi o arguido condenado, pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º, nº 1 e 204º, nº 2, e), do C. Penal, na pena relativamente indeterminada correspondente ao mínimo de 2 anos de prisão e ao máximo de 9 anos de prisão, pela prática de um crime de falsas declarações, p. e p. pelo art. 359º, nº 2, do C. Penal, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão, e em cúmulo, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão a cumprir sucessiva e autonomamente com a pena relativamente indeterminada de mínimo de 2 anos de prisão e de máximo de 9 anos de prisão.

Foi a arguida condenada, pela prática de um crime de furto qualificado, p. e p. pelos arts. 203º, nº 1 e 204º, nº 2, e), do C. Penal, na pena de 2 anos e 8 meses de prisão, pela prática de um crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo art. 360º, nº 1, do C. Penal, na pena de 1 ano e 3 meses de prisão e, em cúmulo, na pena única de 3 anos de prisão.

* * Inconformado com a decisão, recorreu o arguido, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: “ (…).

1º. O arguido cometeu um crime de furto qualificado na forma tentada e não na forma consumada como considerou o tribunal "a quo".

  1. Considera o recorrente incorretamente julgado o facto de ter feito seus os bens retirados da habitação e consequentemente se ter apropriado de bens alheios, sendo esse elemento do tipo de crime pelo qual se mostrou acusado, uma vez que os bens foram recuperados tal como confirmado pelas testemunhas e pelo ofendido.

  2. O arguido decidiu cometer um crime de furto, que não chegou a consumar-se, tendo praticado sim, um conjunto de atos de execução, designadamente ter deslocado os objetos para um terreno vizinho, que são idóneos a produzir o resultado típico, a subtração de coisa móvel.

  3. De harmonia com o disposto no art.º 22.º n.º 2 alínea a) os atas praticados pelo arguido são de execução e constituem – em relação ao crime de furto – uma tentativa; o arguido praticou aqueles atos de execução do crime que decidira cometer sem este se consumar.

  4. Apenas foi criado um perigo para os bens. Em bom rigor, o perigo sofrido pelos bens jurídicos protegidos é aqui relativo, o que se coaduna com a natureza tentada da correspondente infração.

  5. Não foi o ofendido lesado no seu património, uma vez que todos os bens foram recuperados e restituídos à situação em que se encontravam antes da intervenção do arguido.

  6. Ao ora recorrente deve ser aplicada uma pena concreta mais próxima do limite mínimo da moldura penal prevista no art.º 204º nº 2 CP, especialmente atenuada em consequência dos artigos 22º, 23º, 72º e 73º CP.

Nestes termos e, sobretudo, nos que serão objeto do douto suprimento de Vossas Excelências, deve ser concedido provimento ao recurso, revogada a decisão recorrida E SER APLICADA AO ARGUIDO UMA PENA EM CONFORMIDADE COM O CRIME PRATICADO, COM O QUE VªS. ExªS FARÃO COMO SEMPRE JUSTIÇA.

(…)”.

* Respondeu ao recurso o Digno Magistrado do Ministério Público junto do tribunal recorrido, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões: “ (…).

1. Como o recorrente não sindicou a matéria de facto dada como assente na douta decisão recorrida nem se verifica nenhum dos vícios previstos no artº 410, nº 2, do Código de Processo Penal, deve ter-se por definitivamente assente essa matéria de facto.

  1. Ora, na decisão recorrida deu-se como assente que o recorrente fez seus os bens que retirou da residência do ofendido, pelo que estamos perante um crime de furto qualificado consumado e não tentado.

  2. Para além disso, afigura-se-nos líquido que a conduta do recorrente integra a prática de uma infracção consumada e não meramente tentada.

  3. Com efeito, depois de penetrar na residência do ofendido, o recorrente retirou do seu interior diversos artigos e transportou-os para um terreno sito a cerca de 50 metros da mesma, para depois os colocar num veículo automóvel onde a co-arguida se encontrava à sua espera.

  4. Ao assim proceder, o recorrente retirou por completo da esfera de disponibilidade do ofendido os bens em causa e passou-os para a sua, o que implica a consumação do furto.

  5. Na realidade, para que o crime de furto se consume basta a transferência da disponibilidade da coisa do seu titular legítimo para o agente, não sendo necessário que este último detenha a coisa de forma pacífica ou em tranquilidade ou sossego.

  6. Este tem sido claramente o entendimento maioritário da nossa doutrina e da nossa jurisprudência, como se pode constatar no recente Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 06 de Fevereiro de 2013, processo n°. 623/12.sPPPRT.P1, consultado no sítio da D.G.S.I.

  7. Pelo exposto, afigura-se-nos líquido que os factos pelos quais o arguido veio a ser condenado integram a prática de um crime de furto qualificado, sob a forma consumada e não sob a forma tentada.

  8. O raciocínio que conduziu à pena concreta aplicada ao recorrente encontra-se correctamente desenvolvido na douta decisão recorrida e não nos oferece qualquer censura, sendo de realçar o vasto rol de antecedentes criminais do recorrente.

    TERMOS EM QUE, E NOS QUAIS V.AS EX.AS SUPERIORMENTE SUPRIRÃO, DEVERÁ O RECURSO INERPOSTO PELO RECORRENTE A (...) NÃO MERECER PROVIMENTO, DEVENDO A DOUTA DECISÃO RECORRIDA SER CONFIRMADA E MANTIDA NA ÍNTEGRA, ASSIM SE FAZENDO JUSTIÇA.

    (…)”.

    * * Igualmente inconformada com a decisão, recorreu a arguida, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: “ (…).

    1 – Entende a recorrente que quanto à matéria de facto, foram incorrectamente julgados os pontos 1; 2; 4 e 19 da Matéria de Facto Provada constante do douto acórdão, quanto ao ponto 1 no que se refere às expressões "…no cumprimento do acordo prévio firmado entre ambos, dirigiram-se … a uma casa de habitação sita na Rua (...)em (...), … com o propósito de a assaltar"; quanto ao ponto 2 às expressões, "ali chegados ... " e a partir de "… enquanto a arguida se manteve no interior do veiculo x (...), nas proximidades do referido local …" até final; quanto ao ponto 4 na referência " … onde se encontrava a arguida à sua espera" e quanto ao ponto 19 em todas as referências que faz à recorrente.

    2 – discordância da recorrente que não se baseia nas "concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida", (artigo 412° n.º 3 do CP.P.) mas na total e absoluta ausência de provas que justifiquem se dê como provada esta matéria e fundamentem a condenação da recorrente por este crime, 3 – o que isenta a recorrente de indicar as concretas passagens dos depoimentos que impõem decisão diversa, porquanto o que se questiona, quanto à matéria de facto, é que a convicção expressa pelo Tribunal "a quo" não tem suporte razoável e bastante em toda a prova produzida, e o que se questiona são os limites do principio da livre apreciação da prova.

    4 – A alegada prova indiciária da comparticipação dos arguidos para que remete o Tribunal "a quo" de página 13 a páginas 16 do douto acórdão não é de "per si", suficiente para dar como provados os factos supra impugnados, impondo-se assim que se dêem como não provados e que a recorrente seja absolvida deste crime.

    5 – Os indícios probatórios da alegada comparticipação são tão desligados dos factos em si (a ausência de trabalho certo e regular da arguida e relacionamento pessoal próximo entre os arguidos e os antecedentes criminais da recorrente) sendo o único facto concreto e relacionado directamente com os acontecimentos desse dia o aparecimento da recorrente no local, após o furto, que, ainda que numa visão alargada e ampla do principio da livre apreciação da prova, não constituem base suficiente para sustentar o raciocínio lógico – dedutivo formulado pelo Tribunal "a quo" no sentido de concluir pela comparticipação da recorrente no crime de furto.

    6 – Tendo no ponto 3 dos factos provados o Tribunal "a quo" dado como provado que o arguido A (...) retirou e levou consigo os objectos " … com o intuito de os levar para parte incerta, assim os fazendo seus …" facto ou matéria contraditória com a dada como provada no ponto 19, impõe-se se dê como não provado o ponto 19 quanto às referências à recorrente e concluir pela absolvição da recorrente.

    Foram violados, entre outros, os artigos 127º do C.P.P. e 204°, n.º 2 alínea e) do C.P.

    Termos em que julgando procedente por provado o presente recurso e absolvendo-se a recorrente do crime de furto qualificado farão V.as Ex.as a costumada justiça.

    (…)”.

    * Respondeu ao recurso o Digno Magistrado do Ministério Público junto do tribunal recorrido, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões: “ (…).

    1. A reapreciação da...

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