Acórdão nº 666/09.6GALSD.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Novembro de 2013

Magistrado ResponsávelRICARDO COSTA E SILVA
Data da Resolução06 de Novembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso n.º 666/09.6GALSD.P1 Relator: R. Costa e Silva Adjunta: M.ª do Carmo S. Dias Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto,I.

  1. Por sentença, proferida, em 2011/02/07, no processo n.º 666/09.6GALSD, do 2.º Juízo do Tribunal Judicial de Lousada, foi, no que à presente decisão interessa, decidido: I - Condenar o arguido B......, identificado nos autos: a) Pela prática de um crime de violação da obrigação de alimentos, previsto e punido pelo (p. p. p.) art.º 250.º, n.º 1, do Código Penal (CP), em relação à menor C......, igualmente com os sinais dos autos, na pena de 5 (cinco) meses de prisão; b) Pela prática de um crime de violação da obrigação de alimentos, p. p. p art.º 250.º, n.º 1, do CP, em relação à menor D......, igualmente com os sinais dos autos, na pena de 5 (cinco) meses de prisão; c) Em cúmulo jurídico das penas referidas em a) e b) na pena única de 8 meses de prisão; d) Suspender a execução da pena de prisão por um ano, sendo a suspensão subordinada à condição de o arguido proceder, no prazo de um ano, a contar do trânsito em julgado da referida sentença, ao pagamento dos montantes em dívida, calculados até à data da sentença em causa, no valor de € 7.960,00 (sete mil e novecentos e sessenta euros), demonstrando tal nos autos; (…) II - Julgar procedente o pedido de indemnização civil e condenar o demandado B...... a pagar à demandante, E......, em representação das suas filhas menores, o montante de € 6.360,00 (seis mil e trezentos e sessenta euros), a que acrescem os juros legais vencidos desde a data de notificação (2010/10/12) até integral pagamento, bem como a quantia de € 1.600,00 (mil e seiscentos euros), correspondente às prestações de alimentos vencidas, em cada um dos meses de Novembro de 2010 a Fevereiro de 2011, acrescida de juros legais contados sobre € 400,00 (quatrocentos euros), desde o respectivo vencimento até integral pagamento (…) 2. Inconformado com a referida sentença, dela recorreu o condenado B.......

    Rematou a motivação de recurso que apresentou, com a formulação das seguintes conclusões: 1. Nos presentes autos é imputado ao arguido a prática de dois crimes de violação da obrigação de alimentos, sob a forma continuada, previsto e punidos pelos artigos 30°, n.º 2 e 250°, n.º 1 do Código Penal.

  2. O arguido veio a ser constituído arguido neste autos em 22 de Setembro de 2009.

  3. Em 7 de Outubro de 2010 foi expedida carta com o despacho da acusação, carta essa que o mesmo não recebeu uma vez que nessa altura tinha emigrado para Angola, facto que não deu conhecimento ao tribunal, pelo qual desde já se penitencia.

  4. Foram encetadas várias diligências, nomeadamente pela PSP — cumprimento dos mandados de detenção - mas todas falhadas, uma vez que o arguido já nem sequer se encontrava em Portugal — cfr. ofícios da PSP de fls.... dos autos.

  5. Assim e face à impossibilidade de contactar o arguido, foi o arguido julgado na ausência, nos termos do disposto no artigo 333° do Código de Processo Penal.

  6. Ora, conforme resulta do exposto, o arguido foi julgado na ausência, mas, certamente, por lapso, consta na acta de 7 de Fevereiro de 2011 que o arguido esteve presente, tendo o processo sido tramitado como se efectivamente estivesse estado presente na leitura. Mas erradamente. Resulta dos autos, nomeadamente dos ofício da PSP de 07/02/2011 — data da leitura - a fls. 156 a 158 que "não foi possível dar cumprimento ao Mandado de Detenção e Condução referente ao Arguido B......, por este já não residir na Rua …., …., fracção CB — …., e ser desconhecido o seu actual endereço".

  7. O artigo 32° da Constituição da República Portuguesa define as garantias do processo criminal. E o n.º 1 estatui que o processo criminal assegura todas as garantias de defesa incluindo o recurso.

  8. Por seu lado o n° 6 deste normativo estabelece que a lei define os casos em que, assegurados os direitos de defesa, pode ser dispensada a presença do arguido ou acusado em actos processuais, incluindo a audiência de julgamento.

  9. Acresce que o artigo 61.º n° 1 do Código de Processo Penal que versa sobre os direitos e deveres do arguido, dispõe, que "o arguido goza, em especial, em qualquer fase do processo e, salvas as excepções da lei, dos direitos de: a) Estar presente aos actos processuais que directamente lhe disseram (sic) respeito; b) Ser ouvido pelo tribunal ou pelo juiz de instrução sempre que eles devam tomar qualquer decisão que pessoalmente o afecte; f) Ser assistido por defensor em todos os actos processuais em que participar e, quando detido, comunicar, mesmo em privado, com ele; h) Ser informado, pela Autoridade judiciária ou pelo órgão de polícia criminal perante os quais seja obrigado a comparecer, dos direitos que lhe assistem;".

  10. O artigo 332° n° 1 do Código Processo Penal e no que respeita à presença do arguido na audiência estipula que "é obrigatória a presença do arguido na audiência sem prejuízo do disposto nos n°s 1 e 2, do art.º 333.º e nos nºs 1 e 2 do art.º 334.º .

  11. Portanto, a nossa lei consa21gra como regra e, em obediência à nossa Constituição, a regra da presença do arguido em audiência. As excepções admitidas são as que se encontram previstas nos n°s 1 e 2 dos arts 333° e 334° do Código Processo Penal.

  12. O artigo 333° que se refere à falta do arguido notificado para a audiência, do seu n° 1 consta: "Se o arguido regularmente notificado não estiver presente na hora designada para o início da audiência, o presidente toma as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência, e a audiência só é adiada se o tribunal considerar que é absolutamente indispensável para a descoberta da verdade material a sua presença desde início da audiência." Daqui resulta que na data designada para a realização da audiência de julgamento, se o arguido regularmente notificado não estiver presente na hora designada para o início da audiência, o tribunal, ou adia a audiência, ou toma as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a comparência do arguido na audiência.

  13. Todavia, a audiência só pode ser adiada se o tribunal considerar que é absolutamente indispensável para a descoberta da verdade material, a presença do arguido no início da audiência, sendo cero (sic) que a este respeito a cata (sic) nada refere, sobre a indispensabilidade ou não do arguido. Não sendo adiada a audiência, deve o presidente tomar de imediato as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a comparência do arguido faltoso.

  14. Tem havido alguma controvérsia sobre a harmonização da regra do art. 332° do Código Processo Penal que, como vimos, estabelece a regra da presença do arguido na audiência e as excepções previstas nos arts 333° e 334° do mesmo diploma legal.

  15. Há quem defenda que existe nulidade insanável se o arguido não fosse presente nos casos em que o seu defensor tivesse requerido a audição - cfr. Acórdão no proc. n° 10744/07-9, do TRLX de 24/1/08 em www.dgsi.pt -, ou tendo-lhe sido dada a palavra para os efeitos do art.º 333.º n° 3 do Código Processo Penal (o que não veio a acontecer conforme resulta das actas de audiência de julgamento de 30 e 31 de Maio de 2011, respectivamente a fls. 333 a 336 e 352 a 354 dos autos), nada tivesse sido requerido — cfr. Acórdão no processo 0111589 do TRP de 24/4/02.

  16. No entanto, o STJ vem sustentando que nos casos do art.º 333.º do CPP a presença do arguido mantém-se obrigatória e só pode ser dispensada depois do tribunal ter tomado as medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência — neste sentido cfr. os ac do STJ de 24/10/2007 e 2/5/2007, disponíveis em www.dgsi.pt, que, aliás seguimos de perto.

  17. O sumário do Ac .do STJ de 24/10/2007: I - O julgamento na ausência do arguido notificado para a audiência só é possível se aquele para tal der o seu consentimento, como dispõe o n.º 4 do art. 333.º do CPP ao estabelecer que o disposto nos números anteriores não prejudica que a audiência tenha lugar na ausência do arguido com o seu consentimento, nos termos do art. 334.º , n.º 2 do mesmo diploma. Ou seja, o arguido pode requerer ou consentir que a audiência tenha lugar na sua ausência sempre que se encontrar praticamente impossibilitado de a ela comparecer, nomeadamente por idade, doença grave ou residência no estrangeiro. II - Inexistindo consentimento do arguido, é obrigatória a sua presença, sem prejuízo do disposto no art. 333.º , n.º s 1 e 2 do CPP. III - As normas constantes dos n.º s 1 e 2 do art. 333.º são de interesse e ordem pública, prendendo-se com o cerne das garantias do processo penal, e, por conseguinte, com a validade e eficácia do sistema legal processual penal. IV - Como todo o verdadeiro direito público, tem o direito processual penal na sua base o problema fulcral das relações entre o Estado e a pessoa individual e da posição desta na comunidade (Figueiredo Dias, Direito Processual Penal, Lições coligidas por Maria João Antunes, 1988-1989, pág.

    33). A via para um correcto equacionamento de evolução do processo penal nos quadros do Estado de Direito material deve partir do reconhecimento e aceitação da tensão dialéctica inarredável entre a tutela dos interesses do arguido e a tutela dos interesses da sociedade representados pelo poder democrático do Estado (idem, pág. 50).V - Por isso, não exclui a audição do arguido, nem a tomada das medidas necessárias e legalmente admissíveis para obter a sua comparência. Daí que o n.º 7 do mesmo art. 333° explicite que é correspondentemente aplicável o disposto nos arts. 116.º , n. .º s 1 e 2, e 254.º . VI - Sendo a responsabilidade criminal meramente individual, e estando esta a ser apreciada no pretório, a comparência obrigatória do arguido, torna-se necessária ao exercício do contraditório. VII - Por outro lado, o encerramento da discussão da causa apenas ocorre depois das últimas declarações do arguido, pois que, como resulta do art. 361°, n.º s 1 e 2, do CPP: «Findas as alegações, o presidente pergunta ao arguido se tem mais alguma...

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