Acórdão nº 481/09.7TTVRL-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 04 de Novembro de 2013

Magistrado ResponsávelEDUARDO PETERSEN SILVA
Data da Resolução04 de Novembro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 481/09.7TTVRL-A.P1 Apelação Relator: Eduardo Petersen Silva (reg. nº 321) Adjunto: Desembargadora Paula Maria Roberto Adjunto: Desembargador Machado da Silva Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório O Centro Hospitalar do Porto, E.P.E., com sede no …, no Porto, veio intentar, por apenso ao processo emergente de acidente de trabalho em que é sinistrado B…, com o nº 481/09.7TTVRL, e contra a Companhia de Seguros C…, S.A, e a D…, acção declarativa para cobrança de dívida resultante da prestação de cuidados de saúde, com processo comum, peticionando a final a condenação da Ré seguradora a pagar-lhe €3.769,12 e juros de mora vencidos e vincendos, ou, caso assim se não entenda, a condenação no mesmo pedido da Ré empregadora.

Alegou em síntese que, em consequência directa do acidente de trabalho que vitimou B…, lhe prestou assistência necessária às lesões sofridas. A seguradora, para a qual a responsabilidade estava válida e eficazmente transferida, sempre se recusou a efectuar o pagamento da assistência e a empregadora alegou não ser responsável, em virtude da mencionada transferência, surgindo pois dúvidas sobre o responsável.

Contestou a seguradora, aceitando a existência e caracterização do acidente, e alegando que o mesmo se deveu à falta de asseguramento das condições mínimas de segurança por parte da empregadora na utilização da máquina que lesionou o sinistrado, operada por uma colega deste, e na disposição dos trabalhadores.

Contestou a empregadora, excepcionando a transferência integral de responsabilidade para a seguradora, uma vez que se tratou dum acontecimento fortuito.

Foi proferido despacho saneador e organizada a matéria de facto assente e controvertida, sem reclamações.

Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, conjuntamente com o processo principal, com gravação da prova nela produzida, tendo sido respondida a base instrutória, com a respectiva motivação, e foi seguidamente proferida sentença de cuja parte dispositiva consta: “Tudo visto e nos termos expostos, julga-se a presente acção procedente por provada e em consequência condena-se a aqui R. D… ao pagamento ao demandante da quantia de €3.769,12 (três mil setecentos e sessenta e nove euros e doze cêntimos), acrescida dos respectivos juros moratórios vencidos, à taxa legal, desde a interpelação de 13/02/2009 e dos vincendos até integral pagamento, mais se condenando a R. C…, S.A., no pagamento desta quantia a título subsidiário – cfr. art. 37º nº 2 da LAT.

Custas pela 2ª demandada entidade empregadora – cfr. art. 446º do CPC”.

Inconformada, interpôs a empregadora o presente recurso, apresentando a final as seguintes conclusões: “a) À data do acidente a Ré D…, tinha a sua responsabilidade como entidade patronal, validamente transferida para a Ré Companhia de Seguros C…, pela apólice contratada n.º ……., nos termos do artigo 37º, n.º1 da Lei n.º100/97, de 13 de Setembro, como resulta provado nos autos; b) A máquina que desferiu o golpe na perna do sinistrado, é uma máquina banal, que pode ser adquirida, com facilidade em qualquer grande superfície comercial, sem qualquer tipo de restrição legal, seja de idade ou formação, e claro está a máquina não exige formação especializada para o seu manuseamento, como também resulta provado nos autos; c) A Recorrente D…, deu instrução/formação sobre a forma de operar a moto-roçadora, em segurança, aos seus funcionários. O que resulta tanto dos depoimentos prestados supra evidenciados e que a sentença ora em crise dá como provado, muito embora exista clara contradição entre o ponto 11 e o ponto 17 da matéria dada como provada; d) Não existe qualquer disposição legal ou regulamentar que defina a distância mínima a que este tipo de máquinas tem que estar em relação a terceiros, quando em funcionamento. Existem sim distâncias de referência, que alguns fabricantes aconselham, e que não se compadecem com a realidade da utilização da máquina e que não é respeitada por nenhuma das entidades públicas, cujos serviços de limpeza utilizam a referida máquina; e) Decorre inevitavelmente do bom senso de cada um, que não se deve estar próximo de uma moto roçadora em funcionamento, sendo que a distância deve ser aferida em função da morfologia do local em que opera a referida máquina.

  1. As testemunhas/trabalhadores tinham bem presente que tinham que guardar distância da máquina quando esta estava em funcionamento; g) Ninguém viu o acidente, porquanto ninguém sabe ao certo a distância a que estavam o sinistrado, da máquina em funcionamento, facto este inegável e que resulta provado na decisão proferida quanto à matéria de facto proferida em primeira instância, com data de 26.10.2012 - “Na verdade todas as testemunhas foram unânimes em afirmar que ninguém viu o acidente propriamente dito, já que a trabalhadora E… que operava a máquina que veio a embater no sinistrado estava de costas para este, e o próprio sinistrado estava debruçado sobre as folhas e arbustos que colhia, com a ajuda de uma foice, pelo que só se apercebeu do embate com a máquina quando sentiu o golpe na sua perna.”, sendo de salientar que o Sinistrado declarou que estava de costas para a trabalhadora e respectiva máquina, aquando do acidente! Pelo que é falsa a factualidade dada como provada na sentença ora colocada em crise, quando sem fundamentação refere a distância, entre 1,5 e 2 mts, a que estavam o sinistrado e a funcionária que operava a máquina.

  2. O facto de os trabalhadores estarem de costas voltadas um para o outro, por via da aplicação da teoria da causalidade adequada, por força do artigo 18.º da LAT, afasta qualquer presunção de que o acidente tenha decorrido por via de alguma alegada falta de observância de regras de segurança, higiene e saúde no trabalho; i) Omite o tribunal “a quo”, a fundamentação legal, donde decorrem as normas de segurança no trabalho infringidas, ora não resulta de qualquer disposição legal a distância mínima de segurança, bem como não resulta de nenhum preceito normativo a obrigação de formação específica para manobrar a moto roçadora; j) Não se verificou a falta de observação de regras de segurança no trabalho, muito menos se verificou a falta de observação de qualquer regra que pudesse ter evitado o acidente dos autos, como já se demonstrou supra, pelo que inexiste razão para a desresponsabilização da Ré Companhia de Seguros; Nestes termos (…) deve ser dado provimento ao presente recurso e a sentença proferida em primeira instância ser revogada, e consequentemente condenada a Ré Companhia de Seguros, ao pagamento integral dos custos incorridos, por via do sinistro.

Apenas contra-alegou a Ré seguradora, formulando a final as seguintes conclusões: “1ª- A douta sentença recorrida está profusa e proficuamente fundamentada, não enfermando dos erros e vícios que o recorrente lhe imputa; 2ª- Face aos factos provados, a douta sentença não poderia ter sido outra, que não fosse condenar a recorrente e subsidiariamente a ora recorrida, dentro dos limites consignados.

Efectivamente, 3ª- É falsa, ilógica e absurda a alegação da recorrente de que este tipo de máquina – moto-roçadora – equipada com disco cortante, pode ser comprado em qualquer lugar, sem qualquer limitação legal ou imposição especifica de formação especial, pois que há muito tipo de máquinas que se podem adquirir em qualquer grande superfície, por exemplo uma motosserra, e não deixam de ser perigosas, e obviamente que é preciso saber – ter formação – para segurança do próprio utilizador e de terceiros.

  1. - De igual modo, a recorrente confunde instruções sobre o seu manuseamento – ligar e desligar - com formação em segurança , pois que resulta inequivocamente do ponto 10 dos factos provados que a trabalhadora “ não havia recebido qualquer formação” , bem como do douto despacho de fundamentação à resposta da matéria de facto .

  2. - Não havendo, assim qualquer contradição entre os factos provados no ponto 19 e no ponto 10 da douta sentença, e o facto provado no ponto 20 – utilização a máquina à vez – nada tem a ver com segurança e formação, mas apenas e só com o cansaço decorrente do uso e aumentar a produtividade.

  3. - A distância de 15 metros aposta no braço da máquina, não é de referência, é para respeitar e vem do fabricante, dado o perigo que representa para outros trabalhadores, e a recorrente nunca deu formação ou informação sobre a distância de segurança, ignorando-a completamente, como resulta da sentença e do despacho de fundamentação da resposta à matéria de facto.

  4. - É obvio e manifesto que se o trabalhador estivesse a 15 metros de distância da operadora da máquina, o acidente não teria ocorrido, ao contrário do que sustenta a recorrente, pois o braço da máquina não atingia o autor, dado que só tem 2 metros e a operadora não se moveu, como se refere no douto despacho de fundamentação e sentença; 8ª- E foi devido a tal violação da distância de segurança que decorreu o sinistro, pois estava apenas a 1,5 a 2 metros, resultando o nexo de causalidade inequivocamente desde logo pelo facto de o acidente se ter dado pelas simples rotação da operadora com a máquina – vide resposta à matéria de facto – estando o sinistrado dentro do seu no perímetro de acção; 9ª-Aliás, como se refere no Ac. STJ de 25.11.1988 in Ac. Doutrinais 326º - 256 : “As chamadas presunções judiciais ou materiais assentam em regras de experiência. Não constituem um autêntico meio de prova, mas representam processos mentais do julgador para a descoberta de factos, numa verdadeira dedução decorrente dos factos provados.” 10ª- Relativamente à fundamentação legal, é sabido que os princípios e as obrigações gerais do empregador em matéria de segurança, higiene e saúde no trabalho estão actualmente previstos nos arts 272º, 273º e 278º do C.Trabalho, tratando-se de normas de carácter genérico e de conteúdo indeterminado que devem ser integradas em cada caso com a alegação e prova da factualidade respeitante ás medidas de segurança...

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