Acórdão nº 98/08.3EACBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 30 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelVASQUES OS
Data da Resolução30 de Outubro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, em conferência, na 4ª Secção do Tribunal da Relação de Coimbra I. RELATÓRIO Na Comarca do Baixo Vouga, Oliveira do Bairro – Juízo de Instância Criminal, o Ministério Público requereu o julgamento em processo comum, com intervenção do tribunal singular, dos arguidos, A...

e B..., Lda.

, ambos com os demais sinais nos autos, imputando-lhes a prática, a cada um, de sete crimes de reprodução ilegítima de programa protegido, p. e p. arts. 14º, nº 1, do Dec. Lei nº 252/94, de 20 de Outubro e 9º, nº 1 e 10º, nºs 1 e 4, da Lei nº 109/91, de 17 de Agosto e hoje, pelos arts. 8º, nº 1 e 9º, da Lei nº 109/2009, de 15 de Setembro.

Por sentença de 24 de Janeiro de 2013 foi o arguido condenado, pela prática de um crime de reprodução ilegítima de programa protegido, na forma continuada, p. e p. pelos arts. 14º, nº 1, do Dec. Lei nº 252/94, de 20 de Outubro, 9º, nº 1 e 10º, nºs 1 e 4, da Lei nº 109/91, de 17 de Agosto, e 30º do C. Penal, na pena de cento e sessenta dias de multa à taxa diária de € 8, perfazendo a multa global de € 1.280, e foi a arguida condenada, pela prática do mesmo crime e nos termos das mesmas disposições legais, na pena de cento e sessenta dias de multa à taxa diária de € 50, perfazendo a multa global de € 8.000, tendo ambos os arguidos sido absolvidos do demais imputado.

* Inconformados com a decisão, recorreram os arguidos, formulando no termo da motivação as seguintes conclusões: “ (…).

1 – A decisão recorrida errou no julgamento da matéria de facto e de direito ao decidir como decidiu os factos considerados como provados nos números 7 e 8. Efectivamente: 2 – Quanto aos pontos n.ºs 7 e 8, deveria ter sido dado como provado que:

  1. O Arguido agiu numa situação de erro, não preenchendo assim a sua conduta o elemento cognitivo do dolo previsto no artigo 14.º do Código Penal; b) O Arguido não sabia que a sua conduta era proibida e punida por Lei; c) A utilização dos computadores e programas era apenas para uso profissional/interno da sociedade arguida, não se encontrando assim preenchido o tipo objectivo do ilícito; d) A comunicação e validação da apreensão efectuada pelo Digno Magistrado do Ministério público foram efectuadas a 29 de Setembro de 2008.

    3 – Pelo que o Tribunal "A Quo" por manifesta insuficiência de prova documental e contradição da testemunhal, não podia ter dado como provados os pontos 7 e 8 incorrendo assim em manifesto erro na apreciação da prova produzida, e violação dos princípios do direito probatório e do principio "in dubio pro reo" o que acarreta a nulidade da douta sentença nos termos do disposto nos artigos 379.°, n.º 1, alínea b) e c) e 374.°, n.º 2, ambos do C.P.P.

    4 – A douta Sentença proferida pelo Tribunal "A Quo" violou entre outras as normas previstas nos artigos 14.°, n.º 1, do Decreto-Lei N.º 252/94 de 20 de Outubro e artigos 9.°, n.º 1, 10.°, nºs 1 a 4, da Lei N.º 109/91, de 17 de Agosto e artigos 30.°, 127.° do Código Penal, artigo 201.°, n.º 2 e 75.° do Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, aprovado pelo Decreto Lei N.º 63/85, de 14 de Março, bem como o previsto nos artigos 118.°, 119.°, 171.° e 178.°, n.º 5, do Código de Processo Penal.

    5 – Ao decidir como decidiu o douto Tribunal "A Quo" cometeu um erro notório na apreciação da prova carreada para os autos, designadamente da prova documentada e gravada, dando como provados factos e outros como não provados que se consideram incorrectamente julgados, tudo sem esquecer uma contradição insanável entre a fundamentação e a decisão, enfermando pois a douta Sentença também do vício previsto no artigo 410, n.º 2, alíneas a), b) e c) e, ainda, em clara violação do disposto nos artigos 374.°, n.º 2, o que acarreta a sua nulidade nos termos do disposto no n.º 1, alíneas a) e b), todos do C.P.P.

    6 – Não se encontrando assim preenchido o tipo legal do crime pelo qual o Arguido vinha acusado.

    7 – A douta Sentença proferida pelo Tribunal "A Quo" não se encontra devidamente fundamentada, ou seja, peca por uma incorrecta interpretação e análise crítica da prova produzida em Audiência de Julgamento, de acordo com o princípio de livre apreciação da prova, e em absoluta inobservância dos critérios da experiência comum e da lógica do homem médio, nomeadamente quanto aos factos dados como provados e não provados, à sua fundamentação, à convicção formada e à aplicação do direito, enfermando, consequentemente, erro no julgamento da matéria de facto ao decidir como decidiu.

    8 – A douta Sentença proferida pelo Tribunal "A Ouo " não fez uma correcta aplicação do direito à matéria de facto provada e não provada, pelo que, obviamente, devia ter decidido de forma diversa.

    9 – O Tribunal "A QUO" ao não fazer uma correcta aplicação do direito à matéria de facto provada violou (nomeadamente) o disposto nos Artigos 9.°, n.º 1, 10.°, n.ºs 1 a 4, da Lei N.º 109/911 e 374.°, n.º 2.°, do Código do Processo Penal.

    TERMOS EM QUE, e nos mais de direito cujo douto suprimento se invoca, deve ser dado provimento ao presente Recurso, e em consequência ser a douta Sentença revogada e substituída por outra que absolva os Arguidos, pela prática dos crimes de reprodução ilegítima na forma continuada, previsto e punido pelos artigos 14.°, n.º 1, do Decreto-Lei N.º 252/94, de 20 de Outubro e artigos 9.°, n.º 1, 10.°, n.ºs 1 a 4, da Lei N.º 109/91, de 17 de Agosto, e artigo 30.°, do Código Penal, tudo com as legais consequências, FAZENDO-SE, ASSIM, A HABITUAL E NECESSÁRIA JUSTIÇA.

    (…)”.

    * Respondeu ao recurso a Digna Magistrada do Ministério Público, formulando no termo da contramotivação as seguintes conclusões: “ (…).

    1 – Não assiste razão aos recorrentes ao alegarem que a apreensão efectuada nos autos a 25.09.2008 não foi validada no prazo legal para o efeito, uma vez que a validação pela autoridade judiciária somente ocorreu a 29.08.2008, conforme decorre de f1s. 2, o que conduz à nulidade de toda a prova.

    2 – Com efeito, e conforme resulta claramente de fls. 6 e 95, a apreensão efectuada pela ASAE foi comunicada e validada pela autoridade judiciária no próprio dia, ou seja, a 25.09.2008, ali constando o seguinte despacho: "Valido a apreensão efectuada, ao abrigo do disposto no artigo 178º n.º 1, 3 e 5 do C.P.Penal. O.Bairro, 25.09.2008", estando devidamente assinado pela Magistrada do Ministério Público.

    3 – A validação constante de f1s. 2, a que se referem os recorrentes, terá sido efectuada por mero lapso, pelo que a apreensão a ter em conta é a supra referida, ao contrário do que é alegado pelos arguidos, não existindo, por conseguinte, qualquer nulidade.

    4 – Ao insurgirem-se contra a matéria de facto dada como assente, em particular quanto aos pontos 7 e 8, e na qual se escorou a condenação dos arguidos, opinam estes no sentido de que a prova produzida e valorada pelo julgador deveria ter conduzido ao apuramento de diferente quadro factual, alegando que a sentença recorrida padece de erro notório na apreciação da prova, de insuficiência para a decisão da matéria dada como provada, bem como a existência de contradição insanável entre a fundamentação e a decisão.

    5 – Defendem os recorrentes na motivação que "(…) os referidos factos, identificados como n.ºs 7 e 8, da lista de factos provados, foram assim fixados, além do mais, em notório erro de julgamento no que tange à apreciação da prova produzida e em manifesta violação do disposto no artigo 374º, n.° 2, do Código de Processo Penal e dos princípios do direito probatório e das regras da experiência comum(…).

    (…) Os factos n.ºs 7 e 8 não podem ser dados como provados, devendo, assim, ser dado como provado que os Arguidos terão agido numa situação de erro, não preenchendo a sua conduta o elemento cognitivo do dolo previsto artigo 14º, do Código Penal".

    6 – Alegam os recorrentes que os depoimentos prestados em audiência de julgamento impunham uma decisão diferente daquela que foi tomada na decisão recorrida, no entanto, não lhes assiste razão.

    7 – Compreendem-se as considerações expendidas pelos recorrentes sobre o que deveria ou não ter sido dado como provado, uma vez que se fundamentam na sua própria e compreensível interessada valoração das provas produzidas, no entanto, não podem tais considerações procederem em detrimento da convicção crítica, isenta, imparcial e objectiva que presidiu à apreciação e valoração da prova feita pelo Tribunal a quo.

    8 – Ora, com as considerações vertidas na motivação do recurso apresentado, pretendem os recorrentes colocar em causa a formação da convicção do julgador, o que não nos parece aceitável, em virtude do processo de formação da convicção do julgador não poder ser sindicado em sede de recurso, na medida em que se refere a algo que deriva da sua intima convicção e, naturalmente, sujeito a uma margem de discricionariedade.

    9 – Os recorrentes não terão atendido ao princípio fundamental da livre apreciação da prova em vigor no nosso direito processual penal, vertido no art. 127º do CPP, o qual estabelece que a prova é valorada e apreciada segundo as regras da experiência e a livre convicção do julgador, o que, contudo, não deve ser confundido com o livre arbítrio ou discricionariedade.

    10 – Ao valorar livremente a prova, procurando através dela alcançar a verdade material, tem o julgador a obrigação de ser claro, enunciando genericamente as suas motivações, explanadas de forma racional, coerente, justa e fundamentada, de modo a afastar o livre arbítrio, e bem assim justificar a confiança no julgador.

    11 – Por outro lado, há que salientar o facto do juiz de julgamento ser também ele o juiz da oralidade e da imediação, encontrando-se, por isso, numa posição privilegiada para melhor apreender as emoções, a sinceridade, a objectividade, a isenção, as contradições, as solidariedades, as pequenas cumplicidades, entre muitas outras, avaliando o mais correctamente possível da credibilidade das declarações prestadas pelos participantes processuais e que facilmente escapam no recurso, tendo, assim, uma percepção própria do material...

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