Decisões Sumárias nº 508/08 de Tribunal Constitucional (Port, 11 de Novembro de 2008

Magistrado ResponsávelCons. Benjamim Rodrigues
Data da Resolução11 de Novembro de 2008
EmissorTribunal Constitucional (Port

DECISÃO SUMÁRIA N.º 508/2008

Processo n.º 811/08

  1. Secção

Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues

1 – Nos presentes autos vindos do Tribunal da Relação de Coimbra, encontram-se interpostos dois recursos.

Um deles, por banda do representante do Ministério Público, junto daquele Tribunal, nos termos do artigo 70.º, n.º 1, alínea g), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual redacção (LTC), com base na aplicação da norma do artigo 175.º, n.º 4, do Código da Estrada, quando interpretada no sentido de que, paga voluntariamente a coima, não é consentido ao arguido, na fase de impugnação judicial da decisão administrativa que lhe aplique sanção acessória de inibição de conduzir, discutir a existência da infracção, em face do decidido por este Tribunal no Acórdão n.º 45/2008, publicado no Diário da República II Série, de 3 de Março.

O outro recurso foi interposto pelo arguido A., ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, alíneas b) e g), visando também a fiscalização da constitucionalidade da norma do artigo 175.º, n.º 4, do Código da Estrada, quando interpretada no sentido de que, paga voluntariamente a coima, não é consentido ao arguido, na fase de impugnação judicial da decisão administrativa que lhe aplique sanção acessória de inibição de conduzir, discutir a existência da infracção.

2 – A decisão recorrida – Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra, de 24 de Setembro de 2008 – tem, na parte circunstancialmente relevante, o seguinte teor:

APRECIANDO

Atendendo ao disposto no n.º 1 do artigo 75° do DL n.º 433/82 este tribunal conhece apenas da matéria de direito (isto sem prejuízo do dever de conhecimento oficioso de certos vícios ou nulidades, designadamente os vícios indicados no artigo 410º, n.º 2 do CPP, de acordo com o acórdão do STJ para fixação de jurisprudência de 19-10-1995, publicado no DR, I-A Série de 28-12-95), havendo-se como assente toda a factualidade que foi considerada provada.

Sendo o objecto do recurso fixado pelas conclusões retiradas das respectivas motivações, no presente recurso vêm suscitadas as seguintes questões:

- a nulidade de parte da sentença recorrida quando, como “questão prévia” decidiu rejeitar o recurso apresentado na parte em que questiona a prática da infracção contra-ordenacional imputada ao arguido, por tal situação de rejeição de recurso não estar prevista no artigo 63° do DL n.º 433/83, de 27 de Outubro;

- o pagamento voluntário da coima;

- saber se o pagamento voluntário da coima não impede a discussão da existência da contra-ordenação;

*

A –

Pretende o recorrente que seja a sentença recorrida declarada nula por, a título de “questão prévia”, ter decidido rejeitar parcialmente o recurso de impugnação judicial, com a consequente exclusão da apreciação dos factos atinentes à prática da infracção, por a tanto se opor o artigo 63° do DL n.º 43 3/83, de 27 de Outubro.

Efectivamente, o citado artigo 63° prevê a rejeição do recurso em duas situações: quando apresentado fora de prazo ou sem respeito pelas exigências de forma.

Contudo, o invocado preceito respeita ao despacho liminar e não à decisão a que alude o artigo 64° do mesmo diploma, segundo o qual o juiz decidirá do caso mediante audiência de julgamento ou através de simples despacho.

No caso vertente, houve lugar a audiência de julgamento, tendo sido proferida a sentença recorrida.

Na verdade, segundo a estrutura da sentença, a Mma Juiz após o Relatório pronunciou-se sobre o pagamento voluntário da coima por banda do arguido e as consequências desse pagamento, designadamente sobre a impossibilidade de discussão sobre a verificação da contra-ordenação, e fê-lo num ponto que designou por «Questão prévia», tendo decidido rejeitar o recurso apresentado nesta parte.

Entendemos, porém, que a Mma Juiz impropriamente referiu “rejeição do recurso”. Neste momento de prolação da sentença não faz sentido falar em rejeição do recurso. Ao pronunciar-se sobre a referida questão, como decorre da apreciação que efectuou, resulta inequívoca a decisão de que os poderes de cognição da 1ª instância estão limitadas em função do estabelecido nos artigos 172° e 175°, n.º 4 do Código da Estrada.

Improcede pois, a alegação do recurso.

*

B –

Sustenta o recorrente que não resulta dos autos ter efectuado o pagamento voluntário da coima, tendo-se limitado a fazer o depósito equivalente ao montante mínimo da coima, pelo que a sentença recorrida enferma de erro notório na apreciação da prova, quando o tribunal decidiu baseando-se nesse pagamento voluntário da coima.

Também nesta parte falecem os argumentos apresentados pelo recorrente.

Como resulta do auto de contra-ordenação de fls. 1, foi o arguido notificado nos termos e para os efeitos previstos no art. 50° do RGCO, constando expressamente no verso do auto, para além do mais, a possibilidade do pagamento voluntário da coima, as consequências desse pagamento e as instruções para pagamento.

Muito embora nos autos não conste um comprovativo desse pagamento, resulta inequívoco que ele existiu, não se tratando de depósito equivalente ao montante mínimo da coima a que alude o n.º 2 do art. 173° do CE, como alega o recorrente, tanto mais que então não apresentou defesa.

Efectivamente, da ficha do respectivo auto, constante do Sistema de contra-ordenações e cuja cópia consta a fls. 3, mostra-se registado o pagamento da coima, com cobrança pela GNR, o que veio a ser considerado na decisão administrativa.

Por conseguinte, não se verifica o apontado vício da sentença recorrida.

*

C –

Mais alega o recorrente que, mesmo que se considere que procedeu ao pagamento voluntário da coima, a interpretação e a aplicação das normas do Código da Estrada – Arts. 172°, n.º 5 e 175°, n.º 4 -, restringe direitos de defesa do arguido e os direitos à tutela efectiva, na dimensão de garante de controlo judicial das decisões administrativas que lesem direitos e interesses legítimos, mostrando-se ferida de ilegalidade e de inconstitucionalidade.

Vem o recorrente invocar a nulidade da sentença recorrida, por considerar que esta não conheceu das questões alegadas em sede de recurso de impugnação judicial da decisão administrativa, concretamente, sobre a verificação da infracção.

Não lhe assiste razão.

Não há qualquer omissão de pronúncia pois, in casu não tinha o tribunal de apreciar a aludida questão suscitada em sede de impugnação judicial, visto que tendo sido paga a coima voluntariamente, o processo foi remetido para julgamento apenas para verificação da gravidade da infracção e da sanção acessória aplicada, como bem se refere na sentença recorrida.

Assim como, não tem este tribunal de recurso de se pronunciar sobre tal matéria porquanto estão fora do objecto do processo. Este tribunal teria apenas de apreciar a sentença recorrida no tocante à aplicação da sanção acessória (sua suspensão e condição da suspensão) face à matéria de facto e de direito que já havia sido considerada em sede da decisão administrativa, o que aliás não foi questionado no presente recurso.

A contra-ordenação praticada, prevista no artigo 84°, n.º 1 do Código da Estrada, é punível, nos termos do n.º 4, com coima de € 120 a € 600, e ainda com sanção acessória de inibição de conduzir, por se tratar de contra-ordenação grave, como dispõem os artigos 138°, n.º 1 e 145°, al. n) do CE.

Ora, como resultou provado o recorrente efectuou o pagamento voluntário da coima, pelo montante mínimo, como lhe era permitido pelo artigo 172°, n.º 1 do CE.

Porém, acrescenta o n.º 5 (em sintonia com o disposto no art. 50°-A do RGCO) deste preceito que “O pagamento voluntário da coima nos termos dos números anteriores determina o arquivamento do processo, salvo se à contra-ordenação for aplicável sanção acessória, caso em que prossegue restrito à aplicação da mesma.” Portanto, neste caso, a defesa do arguido seria restrita “(...) à gravidade da infracção e à sanção acessória aplicável.”, como estabelece o n.º 4 do art. 175°, uma vez que a medida e o regime da sanção determinam-se em função da gravidade da contra-ordenação (art. 139°, n.º 1 do CE).

Mas se era pretensão do arguido discutir a prática da contra-ordenação, não deveria ter efectuado o pagamento voluntário da coima. A opção de pagar, ou não pagar, foi apenas sua. A lei não lhe impunha este pagamento; poderia ter optado por prestar...

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