Acórdão nº 1054/10.7TALRA.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 02 de Outubro de 2013

Magistrado ResponsávelFERNANDO CHAVES
Data da Resolução02 de Outubro de 2013
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 4ª Secção Criminal do Tribunal da Relação de Coimbra I – Relatório 1.

No âmbito do processo comum colectivo n.º 1054/10.7TALRA, a correr termos no 2º Juízo Criminal de Leiria, o Ministério Público deduziu acusação contra o arguido A…, já melhor identificado nos autos, imputando-lhe a prática, em autoria material e concurso real, de quatro crimes de burla qualificada previstos e punidos pelas disposições conjugadas dos artigos 217.º, n.º 1 e 218.º, n.º 1 do Código Penal.

* Ao abrigo do disposto nos artigos 71.º, 74.º e 77.º do Código de Processo Penal foi deduzido pedido de indemnização civil por B..., o qual pediu que o arguido, em virtude dos factos praticados, fosse condenado a pagar-lhe a quantia de 20.377,34 €, a título de indemnização por danos patrimoniais, bem como a quantia de 1.500,00 €, a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescidas de juros de mora, à taxa legal, calculados sobre a importância de 20.000,00 € desde 1/5/2009 e sobre a quantia de 377,34 € desde a data da notificação do pedido, até efectivo e integral pagamento.

* Realizada a audiência de julgamento foi proferido acórdão que decidiu nos seguintes termos (transcrição): «I.

Na decorrência de todo o exposto, julga-se procedente a acusação: a) - Condenando-se o arguido A…, em autoria material e concurso real, pela prática de quatro crimes de burla qualificada, previstos e punidos pelos artigos 217º, nº1, e 218º, nº1, ambos do Código Penal, nas penas de um ano de prisão, um ano e seis meses de prisão, dois anos e três meses de prisão e um ano e cinco meses de prisão; b) - Efetuado o cúmulo jurídico dessas penas, condena-se o arguido na pena única de quatro anos e seis meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, suspensão essa subordinada a regime de prova e ao dever de, até ao termo do período da suspensão, pagar a C… a quantia de três mil euros; a D… e seus pais a quantia de onze mil euros; a B... o montante de vinte mil euros e a E…, Lda. o quantitativo de dez mil euros.

II.

Julga-se parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado nos autos por B... contra o arguido e, na medida dessa procedência, condena-se este no pagamento àquele, a título de indemnização por danos patrimoniais, da quantia de vinte mil euros, acrescida de juros a calcular, à taxa legal supletiva, desde a data da notificação para os termos desse pedido e até integral pagamento, e, a título de indemnização por danos não patrimoniais, do montante de mil e quinhentos euros, acrescido de juros a calcular desde a data da presente decisão e até efetivo pagamento.

No mais, julga-se improcedente o pedido, dele absolvendo o arguido / demandado.

III.

Custas criminais pelo arguido, fixando-se a taxa de justiça devida em 5 UC.

Custas cíveis por demandante e demandado, na proporção dos respetivos decaimentos, que se fixam em 10% para o primeiro e no remanescente para o segundo.» 2.

Inconformado com esta decisão, o arguido dela interpôs recurso, retirando da sua motivação as seguintes conclusões (transcrição) ([i]): «1. O Recurso tem como fundamento a impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto, bem como sobre a matéria de direito.

  1. Vem o presente Recurso interposto do douto Acórdão proferido pelo douto Tribunal Colectivo do Círculo Judicial de Leiria, que decidiu julgar procedente a Acusação deduzida pela Digna Magistrada do Ministério Público e condenar o arguido, ora recorrente, em autoria material e concurso real, pela prática de quatro crimes de burla qualif‌icada, p. e p. pelos artigos 217º, nº 1 e 218º, nº 1 do Código penal, nas penas de um ano de prisão, um ano e seis meses de prisão, dois anos e três meses de prisão e um ano e cinco meses de prisão, cujo cúmulo jurídico determinou a condenação na pena única de quatro anos e seis meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período, suspensão essa subordinada a regime de prova e ao dever de, até ao termo do período de suspensão, pagar a C… a quantia de três mil euros; a D... e seus pais a quantia de onze mil euros; B... o montante de vinte mil euros e a E..., Lda. o quantitativo de dez mil euros.

  2. Vem o Recurso interposto também da decisão que julgou parcialmente procedente o pedido de indemnização civil formulado nos autos pelo demandante B… e, em consequência, condenar o arguido/ demandado no pagamento àquele, a título de indemnização por danos patrimoniais, da quantia de vinte mil euros, acrescida de juros a calcular, à taxa legal supletiva, desde a data da notif‌icação para os termos desse período e até integral pagamento, e, a título de indemnização por danos não patrimoniais, do montante de mil e quinhentos euros, acrescido de juros a calcular desde a data da presente decisão e até efectivo pagamento.

  3. Não ficou gravado no sistema integrado de gravação digital o depoimento integral da testemunha H… e designadamente na parte em que o mandatário do arguido instou a testemunha a clarif‌icar o âmbito da sua intervenção relativamente às entregas do dinheiro ao arguido - (grav. 03/02/2012 - 12:00:55 - 12:42:01).

  4. A falta de documentação das declarações prestadas oralmente na audiência implica a inexistência dessas mesmas declarações, pelo que se verif‌ica a ocorrência de vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada prevista no artigo 410º n.º 2 al. a) do C.P. Penal, tendo como consequência a necessidade de reenvio do processo para novo julgamento nos termos do disposto no artigo 426º n.º 1 e/ ou a renovação da prova nos termos do artigo 430º n.º 1 do C.P. Penal.

  5. Os depoimentos das testemunhas D… - (grav. 03/02/2012 - 10:23:49 - 10:54:12), da sua mãe G… - (grav. 03/02/2012 - 10:55:38 - 11:39:27) e do seu pai H… - (grav. 03/02/2012 - 12:00:55 - 12:42:01), são contraditórios entre si, relativamente aos montantes solicitados pelo arguido, à forma como obtiveram o dinheiro e as condições de lugar tempo e montantes entregues aos Recorrente e pessoas que estavam presentes.

  6. De acordo com as regras da experiência comum e tendo em consideração o curto espaço de tempo que decorreu entre os factos e o julgamento, acrescido dos montantes que estão em causa e da forma como estas três testemunhas descreveram a forma como obtiveram o dinheiro e as condições de lugar, tempo e montantes entregues ao Recorrente e pessoas que estavam presentes, o Tribunal “a quo” fez um julgamento errado dos factos ao dar como provado nos artigos 20º e 21º que a testemunha D... fez a entrega de € 11.000,00 ao Recorrente.

  7. Não obstante ser a audiência de julgamento a sede própria para a produção da prova, os elementos que constam do processo não podem deixar de ser tomados em consideração, sempre que estejam em contradição com a prova produzida em audiência de julgamento.

  8. São contraditórias as declarações prestadas em sede de inquérito pela testemunha F…, também identif‌icada por E..., bem como as declarações da testemunha C…, com as prestadas em audiência de julgamento, relativamente às circunstâncias de lugar e a quem foi entregue o alegado cheque de € 10.000,00, sendo certo que tais depoimentos estão em contradição também com as declarações prestadas em sede de inquérito pela testemunha M…, a f‌ls. 11.

  9. Perante tais elementos o Tribunal “a quo” não podia ter dado como provado o que fez constar dos artigos 42, 43, 44 e 45 dos factos provados, uma vez que o depoimento da testemunha F… foi consertado com a testemunha C..., pelo que se impõe o reenvio do processo para novo julgamento, nos termos do disposto no art° 426º do C.P.P., sendo ordenado que se proceda à inquirição da Testemunha M… melhor identificado a f‌ls. 11, tendo em consideração que o principio da procura da verdade material e uma boa decisão da causa em matéria penal, impõem o reenvio.

  10. No Acórdão proferido, o douto tribunal colectivo concluiu revelar-se adequada a suspensão da execução da medida da pena de prisão em que o arguido foi condenado, por igual período, subordinada ao regime de prova e ainda ao dever de reparar o mal dos crimes por si praticados entrgando, até ao termo do prazo de suspensão da execução da pena, a cada um dos lesados, os valores monetários por que se encontram directamente prejudicados, nos termos do disposto no artigo51º, nº 1 al. a) do Código Penal.

  11. Este dispositivo legal considera como um dever susceptível de ser imposto ao condenado, pagar dentro de certo prazo, no todo ou na parte que o tribunal considere possivel, a indemnização devida ao lesado ou garantir o seu pagamento por meio de caução idónea. A lei refere expressamente, “pagar..... a indemnização devida ao lesado....” ,e não refere “uma indemnização”.

  12. Para que se possa falar em “a indemnização devida ao lesado” seria necessário que o lesado tivesse deduzido pedido cível em conformidade com o disposto nos artigos 71º e seguintes do CPP e que o arguido tivesse sido condenado a pagar a respectiva indemnização.

  13. Apenas o B…deduziu pedido cível, sendo certo que o arguido na qualidade de demandado não se conforma com a decisão proferida pelo douto tribunal colectivo.

  14. Este demandante requereu a condenação do demandado no pagamento de uma indemnização com fundamento nos danos patrimoniais e morais sofridos, em consequência da conduta do arguido.

  15. Arrolou duas testemunhas I... e J... cujos depoimentos constam dos registos 29-02-2012/12:11:08 a 29-02-2012/12:15:43 e 29-02-2012/12:16:16 a 29-02-2012/12:21:16, respectivamente, não constando dos mesmos qualquer declaração que demonstre conhecimento directo dos factos alegados.

  16. Dispõe o artigo 128º nº 1do CPP que a testemunha é inquirida sobre factos de que tenha conhecimento directo e que constituam objecto da prova.

  17. No Acórdão recorrido o douto tribunal colectivo não faz qualquer referência ao depoimento daquelas testemunhas, tendo dado como provados alguns dos factos alegados pelo demandante sem indicar um único meio de prova para fundamentar as suas conclusões, pelo que a decisão é nula por falta de indicação dos meios de...

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