Acórdão nº 749/08.0TBTNV.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 12 de Setembro de 2013

Magistrado ResponsávelMOREIRA ALVES
Data da Resolução12 de Setembro de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Relatório * No Tribunal Judicial da Comarca de Torres Novas, AA- Importações e Exportações, Ld.ª, intentou a presente acção declarativa de condenação, com processo ordinário, contra BB. – ..., S.A, alegando em resumo: — A A. foi accionista da Ré, tendo sido titular do total de 1.211.689 acções. — Em 05/06/2001, entre a Caixa ..., S. A., como 1º contraente e mutuante; a sociedade BB, ora Ré, como 2º contraente e mutuária; e a ora A, que, com outras entidades, interveio como 3º contraente, na qualidade de accionista da Ré, foi celebrado um 'Contrato de financiamento".

— Nesse contrato, a ora A., enquanto accionista da BB, assumiu diversas obrigações em favor da C..., como garante do cumprimento desse contrato.

— Designadamente, e entre outras obrigações, a ora A. constituiu, a favor da C..., um primeiro penhor sobre as acções nominativas de que era proprietária à data, no total de 900.000 acções, — A A. obrigou-se ainda, perante a C..., a constituir um primeiro penhor sobre todas as acções que viesse a subscrever em futuros aumentos de capital.

—Tal veio efectivamente a acontecer, tendo a A., em aumentos de capital social da Ré, vindo a subscrever acções até ao número de 1.211. 681 acções, — Relativamente aos títulos penhorados, ficava a C... autorizada, nos termos do nº 3 da referida cláusula, em caso de incumprimento de qualquer das obrigações decorrentes do presente contrato a recebê-los e a imputá-los ao pagamento dos juros vencidos se os houver ou ao capital em dívida...

— E, verificando-se o incumprimento, a C….. poderia ainda vender as acções extrajudicialmente, pelo preço “ao melhor” e nas demais condições que entender. Para além do penhor das acções, a Ré concedeu ainda à C... outras garantias, tais como: Cessão de créditos da BB, (C1.27º do Contrato); Penhor de equipamentos e promessa de penhor, (CL. 28º); Constituição de hipoteca e promessa de constituição de hipoteca, (Cls. 29° e 30°).

— Relativamente à hipoteca, foi a mesma constituída, sobre um prédio sito em ..., na freguesia de ..., concelho de ..., inscrito na respectiva matriz sob o art. 3117, e inscrito na Conservatória do Registo Predial de ... sob o nº ....

— Dado que a ré terá deixado de cumprir as obrigações perante a C…. – o que a A. ignorava, pois, não tinha qualquer intervenção na administração e gestão da Ré, tendo o seu representante no Conselho de Administração, Dr. DD, sido destituído sem qualquer fundamento em Assembleia realizada em 29/10/2002 e que não vinha participando na actividade do Conselho de Administração desde Julho de 2002, pois, desde essa altura que lhe estava vedado o acesso às instalações da Ré - a C... lançou mão das garantias de que beneficiava, procedendo à venda de 1.211.689 acções da A., correspondentes à totalidade da sua participação no capital social da Ré.

— A data da venda ocorreu em 26 de Outubro de 2007.

— A C... vendeu a totalidade das acções penhoradas pelo valor global de 6.374.000,00€, — Correspondendo às acções da A. o valor de 1.560,216,00 €.

— Com a venda das acções pela C..., esta considerou liquidada a dívida da BB.

— A Ré deixou, assim, de ser devedora da C... mas, — Considerando que o seu débito foi liquidado por terceiros, nomeadamente a ora A., a Ré passou a ser devedora da A., — Considerando-se esta como sub-rogada nos direitos da C..., Pelo valor correspondente ao valor da venda das suas acções.

* Citada pessoal e regularmente a R. veio contestar pugnando pela improcedência da acção por entender, desde logo, não existir, no caso, direito de sub-rogação já que a R. não o declarou expressamente; (art.º 591º do C.Civil) Nem tão pouco se configura a situação prevista no n.º 2 do art.º 592º do C.Civil já que a A. não procedeu ao pagamento impedindo a execução do penhor. O que sucedeu foi que o penhor foi executado. Aliás não exerceu o direito de preferência previsto no contrato porque não quis. Por outro lado a A. sabia das dificuldades financeiras da R., sabia da necessidade de proceder a aumentos de capital para solver tal financiamento nunca os tendo viabilizado. * * * * Foi requerida a intervenção principal por parte de EE e FF na qualidade de sócios da dissolvida GG, alegando que a sociedade por ambos constituída, GG, Lda., foi dissolvida por deliberação de 24 de Dezembro de 2007; liquidada a sociedade, verificou-se existirem bens não partilhados, concretamente, um direito de sub-rogação constituído sobre a ora Ré, BB, SA; esse direito, titulado por ambos os requerentes, na qualidade de sócios da dissolvida GG, Lda., é paralelo e de natureza idêntica àquele que é invocado pela Autora, AA, Lda., na presente acção, pois que também a GG deu de penhor as suas acções, nas mesmas circunstâncias, tendo vindo a ser vendidas pela C…., exactamente nos mesmos moldes que as da A.

Pedem, em consequência, a condenação da R. pagar-lhes a quantia de 750. 602,24euros, acrescida de juros contados desde 2710.2007 até ao efectivo e integral pagamento acrescido das legais consequências (sub-rogação).

* * * * Foi admitida a requerida intervenção, proferiu-se despacho saneador e procedeu-se à condensação do processo.

* * * * Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença final que julgou a acção improcedente, absolvendo a Ré dos pedidos.

* Inconformados, recorreram, quer a A., quer os intervenientes e com êxito, visto que a Relação, apreciando as apelações as teve por procedentes, revogando a sentença recorrida e condenando a Ré nos pedidos respectivos.

* É, agora, a Ré quem recorre de revista para este STJ.

* * * * Conclusões * A terminar a sua alegação, formula a recorrente, as seguintes conclusões: * Conclusões da Revista da Ré.

* «I. O acórdão recorrido acolhe de forma integral as pretensões dos então recorrentes (autora e intervenientes) dando agora acolhimento àquelas, pela revogação da douta sentença proferida na 1ª instância e desta forma condenando a ré, do que antes havia sido absolvida.

II. Não se resigna a ora recorrente, porém, com o decidido pelos Exmos. Juízes Desembargadores, que reputa de errado e claramente violador da lei substantiva.

III. Antes, porém, desde já se suscita perante este Magnânimo Tribunal outra questão, já ponderada, em sede de 1ª instância, mas sobre a qual não emitiu qualquer juízo o tribunal da Relação recorrido.

IV. É que, sem prejuízo do modelo recursório português se estruturar em torno do modelo da reponderação, que torna imune a instância de recurso à modificação do contexto em que foi proferida a decisão recorrida, o sistema não é inteiramente fechado, sendo que a primeira e significativa excepção a esse modelo, é a representada pelas questões de conhecimento oficioso.

V. De entre estas questões, oficiosamente cognoscíveis, avulta, designadamente e no caso em apreço, o abuso de direito - sobre a qual a Relação não se debruçou - mas que aqui e no presente se invoca como excepção peremptória, de conhecimento oficioso, mesmo em sede de recurso de revista.

VI. Veja-se que nos autos resultou provado, que: "C) A Caixa ..., SA, na qualidade de primeiro contraente, BB, SA, na qualidade de segundo contraente, AA, Lda e GG, Lda, na qualidade de terceiros contraentes foi ajustado um acordo escrito, denominado de "Contrato de Financiamento". D) No âmbito do acordo mencionado na alínea anterior, Caixa ..., SA, prestou a favor da Ré um financiamento no montante máximo de € 8.000.000,00, e um outro financiamento no montante máximo de € 750.000,00. H) Consta da cláusula 26ª do acordo mencionado em C), sob a epígrafe Promessa de Penhor de Acções: I - Os accionistas, com excepção do Município de ... e da HH, obrigam-se perante a C... a subscrever quaisquer aumentos de capital e a constituir primeiro penhor a favor da C..., sobre todas as acções que resultarem de quaisquer aumentos de capital da BB, de modo a que mantenha sempre empenhado, nos termos do presente contrato, pelo menos, 96,25 (noventa seis virgula vinte cinco por cento) do capital social da BB. J) Consta da cláusula 28ª do acordo mencionado em C): 4 - Em caso de incumprimento pela BB de qualquer das obrigações previstas neste contrato, a C... poderá efectuar a venda extrajudicial dos bens dados de penhor, ao melhor e na medida necessária ao ressarcimento dos seus créditos, aplicando o produto da venda na amortização dos montantes em dívida relativos ao presente contrato.".

VII. Mais se provou que: "O conselho de administração da Ré comunicou, junto da assembleia geral mais do que uma vez, que os encargos financeiros desta sociedade para com a Caixa ..., no âmbito do acordo mencionado em C) da matéria assente estavam em falta; o "projectfinance" estava, também, em falta. O conselho de administração da Ré, em mais do que uma assembleia geral e na sequência da comunicação mencionada no número anterior, propôs aumentos do capital social. A AA, Lda, sempre se opôs a esses aumentos do capital social da Ré (excepto acta 23 que não compareceu).".

VIII. Ora o instituto do abuso do direito, bem como os princípios da boa-fé e da lealdade negocial, são meios de que, os tribunais, devem lançar mão para obtemperar a situações em que alguém, a coberto da invocação duma norma tuteladora dos seus direitos, ou do exercício da acção, o faz de uma maneira que - objectivamente - e atenta a especificidade do caso, conduz a um resultado que viola o sentimento de Justiça, prevalecente na comunidade, que, por isso, repudia tal procedimento, que apenas formalmente respeita o Direito, mas que...

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