Acórdão nº 97/05.7TBPVL.G2.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 11 de Julho de 2013

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução11 de Julho de 2013
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc.97/05.7TBPVL.G2 R-422[1] Revista.

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça AA, menor, representado por sua mãe, instaurou, em 17.12.2004, pelo Tribunal Judicial da Comarca de Póvoa do Lanhoso, acção declarativa de condenação com processo ordinário, para efectivação de responsabilidade civil emergente de acidente de viação, contra: BB, S.A.

Pedindo que esta seja condenada a pagar-lhes a quantia de € 165.954,08, acrescida de juros, à taxa legal, contados desde a citação até integral pagamento.

Para tanto alegou, em síntese, que no dia 3 de Janeiro de 2002, nas demais condições de tempo, lugar e modo descritas na petição inicial, foi atropelado pelo veículo auto ligeiro misto, de matrícula -JX, pertencente a CC, e por este conduzido, seguro na ré, para quem havia sido transferida a responsabilidade civil por danos causados a terceiros e emergentes da circulação desse veículo.

Do acidente, que ficou a dever-se a culpa exclusiva do condutor do veículo automóvel, resultaram para o menor danos de natureza patrimonial e não patrimonial, no montante peticionado.

Citada a ré, veio contestar, impugnando a versão do acidente apresentada pelo autor, contrapondo que o mesmo se ficou dever a sua culpa exclusiva, apontando ainda a existência de responsabilidade da mãe do menor por violação da obrigação de vigilância e, de qualquer modo, acrescenta serem excessivos os montantes peticionados a título de danos patrimoniais e não patrimoniais.

Saneado o processo e discriminados os factos assentes e os controvertidos, prosseguiu aquele a sua tramitação, vindo a realizar-se audiência de julgamento com decisão da matéria de facto controvertida e subsequente prolação de sentença, que condenou a ré a pagar ao autor a quantia de € 20.080,24, a título de danos patrimoniais, acrescida de juros, à taxa de 4%, desde a citação até integral pagamento e a quantia de € 11.000, a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à mesma taxa de 4%, desde a sentença (4/7/2009), até integral pagamento.

Inconformados, apelaram autor e ré, sem êxito, pois esta Relação, por acórdão de 06.07.2010, confirmou a sentença recorrida.

Ainda irresignada, interpôs a ré recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, que, por Acórdão de 24.02.2011, entendendo que a matéria de facto devia ser ampliada, ordenou a remessa dos autos ao Tribunal da Relação de Guimarães para esse efeito, tendo anulado o acórdão por esta proferido.

Recebido o processo na Relação, a Exma. Relatora proferiu decisão singular a ordenar a ampliação da matéria de facto, com repetição do julgamento, nos termos do art. 712º, nº 4, do Código de Processo Civil.

Remetidos os autos à 1ª instância, foram aditados à base instrutória os factos constantes dos artigos 5º, 6º, 7º, 8º, 9º, 15º, 16º, 17º, 40º (parte factual) e 42º, todos da contestação.

Realizado o julgamento, respondeu-se aos novos artigos da base instrutória e esclareceram-se as dúvidas referidas no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça relativamente a outros pontos da matéria de facto, nos termos constantes do despacho decisório da matéria de facto de fls. 463 a 470, o qual não foi objecto de reclamação.

*** Foi proferida sentença a condenar a ré nos exactos termos da sentença anulada, ou seja, a pagar ao autor a quantia de € 20.080,24, acrescida de juros contados desde a citação à taxa de 4% até integral pagamento, a título de danos patrimoniais, e a quantia de € 11.000, acrescida de juros vincendos, à taxa de 4%, desde a sentença (19.11.2012) até integral pagamento, a título de danos não patrimoniais.

*** De novo inconformada, apelou a Ré para o Tribunal da Relação de Guimarães, que por acórdão de 4.4.2013 – fls. 747 a 772 – negou provimento ao recurso confirmando a sentença recorrida.

*** Mantendo o seu inconformismo a Ré recorreu para este Supremo Tribunal de Justiça, e alegando, formulou as seguintes conclusões: 1ª - A divergência da recorrente em relação à douto sentença circunscreve-se à determinação da responsabilidade pela eclosão do sinistro em sede de culpa e de risco, em função da dinâmica do acidente e na determinação da indemnização, atentos os danos alegados.

  1. - Sufragamos a posição do Tribunal recorrido quando da factualidade apurada não resultou a culpa ou responsabilidade do condutor do veículo JX na produção do acidente.

  2. - Nenhum factualismo se tendo provado do qual se possa imputar ao condutor do veículo, por comportamento activo ou omissivo, a produção do acidente em termos de causalidade adequada e por culpa ou negligência.

  3. - Dos factos não resulta provada a alegada e declarada responsabilidade civil por facto ilícito do condutor do veículo, não se mostrando verificados os legais pressupostos do art. 483° do Código Civil.

  4. - Diga-se, desde já, que no nosso entendimento, a atitude do menor foi imprudente, imprevista para o condutor do veículo seguro, irreflectida e imatura (na verdade, tratava-se de uma criança de 6 anos, ainda que com essa idade, devesse estar ciente do perigo representado por um veículo em movimento), foi determinante em termos exclusivos para o atropelamento aqui em crise.

  5. - Entendemos, igualmente, que, mesmo que se não conceda ao comportamento do menor um juízo de censura e a movimentar-nos no domínio da culpa, temos ainda a culpa in vigilando nos termos do art. 491.°, no qual se estabelece uma presunção de culpa in vigilando das pessoas que por lei forem obrigadas a vigiar outras, por virtude da incapacidade natural, como acontece com os pais em relação aos filhos menores.

  6. - E cremos, a exemplo do que foi entendido na decisão recorrida, ser essa a situação dos autos, uma vez que resultou provado que antes do atropelamento o autor estava na companhia de uma irmã, a qual entrou para o interior do JX e deixou o autor só no exterior, altura em que a mãe (e uma outra filha) regressava a casa, encontrando-se entre 10 a 20 metros de distância, viu o autor pendurar-se no taipal do JX.

  7. - Posto isto, vejamos o que dispõe o 505° do Código Civil: ARTIGO 505º: (Exclusão da responsabilidade): Sem prejuízo do disposto no artigo 570º, a responsabilidade fixada pelo nº1 do artigo 503º só é excluída quando o acidente for imputável ao próprio lesado ou a terceiro, ou quando resulte de causa de força maior estranha ao funcionamento do veículo.

  8. - No nosso quadro legal, não há concorrência entre a culpa e o risco. Havendo culpa não há responsabilidade pelo risco.

  9. - Assim, uma situação do tipo da que se discute no caso em apreço, está claramente prevista no já referido artigo 505º do Código Civil, pelo que não há, nem pode haver, repartição de responsabilidades entre o risco próprio do veículo e a culpa do lesado, que é o que aqui está em causa.

  10. - O artigo 570º, nº1, do Código Civil prevê os casos de culpa de várias pessoas, repartindo entre elas a responsabilidade; o artigo 505º prevê os casos de culpa apenas do lesado ou de terceiro, pelo que tal situação não está omissa, não necessitando de se recorrer a analogia para aplicar a doutrina do nº1 do artigo 570º, repartindo a responsabilidade entre o lesado e o detentor do veículo. (cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil anotado, 42 edição, 1 vol. pág. 518).

  11. - Basta reparar que o nº2 do artigo 570º, no que à culpa do lesado diz respeito, refere que a mesma exclui a responsabilidade baseada em presunção de culpa.

  12. - Igual prescrição legal, resulta também do estabelecido no artigo 506º, para a colisão de veículos, sem culpa de qualquer dos condutores, em que a responsabilidade é repartida pelos dois, o que implica que, se houver culpa de um deles, sobre ele recai toda a responsabilidade 14ª - Ou seja, onde há culpa é pela culpa que se afere a responsabilidade; havendo culpa fica afastada a responsabilidade de quem responderia sem culpa, não sendo admissível concorrência de risco do lesante com culpa do lesado.

  13. - Entendemos assim que a melhor interpretação do art. 505° só pode ser aquela no sentido de que a culpa exclusiva do lesado, pois foi isso que resultou provado, por não provada qualquer culpa do condutor da viatura, para a produção do dano exclui a responsabilidade pelo risco, contemplada no art. 503°.

  14. - Devendo absolver a recorrente e decidindo de outra forma, o Acórdão recorrido violou, entre outras disposições legais, o disposto nos art. 483º, 503º, 505º e 570º, todos do Código Civil.

  15. - O presente recurso visa impugnar o decidido quanto à determinação do montante indemnizatório, na dimensão patrimonial e não patrimonial, atenta a factualidade provada.

  16. - Nos presentes autos, ficou provado que o autor passou a padecer de uma IPP de 50%, embora não se tenha provado que dela tenha resultado qualquer perda de retribuição. Mais se provou que o menor tinha, à data do sinistro, 6 anos, pois nasceu em 13.03.1996, sendo que as sequelas de que sofre são compatíveis com o exercício da sua actividade habitual mas implicam esforços suplementares: 19ª - Apesar dessa limitação, o lesado continua a ter possibilidade de futuramente exercer uma actividade profissional, sem perda de retribuição, Bem como o facto de a incapacidade permanente parcial (IPP) constituir um dano patrimonial futuro indemnizável, independentemente da prova de um prejuízo pecuniário concreto dela resultante devido à inferioridade em que o lesado se encontra na sua condição física, quanto a resistência e capacidade de esforços.

  17. - A perda ou diminuição da capacidade laboral por incapacidade permanente parcial pode originar ou não uma perda rendimento, nestes casos, a afectação que a IPP, do ponto de vista funcional, traduz, determina consequências negativas ao nível da actividade geral do lesado, é o chamado handicap – a sua repercussão negativa centra-se apenas na diminuição da condição física, resistência e capacidade por parte do lesado, o que se realiza numa deficiente e imperfeito capacidade de utilização do corpo, no desenvolvimento das actividades pessoais, em geral.

  18. - Devendo mitigar-se a sua repercussão de...

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