Acórdão nº 01006/13 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 10 de Julho de 2013
Magistrado Responsável | VÍTOR GOMES |
Data da Resolução | 10 de Julho de 2013 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Formação de Apreciação Preliminar Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo (Relatório) 1. A………………, S.A. propôs acção administrativa especial, impugnando dois despachos que lhe exigiam a restituição de determinadas quantias (€ 1.015.370,19 e € 338.456,73), no âmbito de incentivos financeiros concedidos ao abrigo do Programa Operacional da Região Norte, inserido no III Quadro Comunitário de Apoio. O TAF de Braga anulou os dois actos impugnados por falta de fundamentação de direito.
Por acórdão de 8 de fevereiro de 2013, em provimento de recurso interposto pelo Ministério da Economia da Inovação e do Desenvolvimento, o Tribunal Central Administrativo Norte (TCA-N) julgou improcedente o vício de falta de fundamentação e, revogando a sentença de 1ª instância, determinou que o processo prosseguisse no tribunal de 1ª instância, por ser necessário alargar a base factual relativamente a parte da alegação da autora e ser conveniente a não fragmentação do objecto do processo quanto aos vícios remanescentes.
A fundamentação do acórdão recorrido é, na parte que agora interessa, do seguinte teor: “[…] O recorrente MEID discorda deste julgamento de direito, por entender, primo, que os actos impugnados estão suficientemente fundamentados, e por entender, secundo, que o tribunal de primeira instância deveria ter conhecido se a qualificação de inelegibilidade das despesas em causa, se as ordens de restituição das respectivas quantias, e se a determinação destas em 25% do montante tido por irregular estavam ou não realizadas de acordo com as pertinentes normas legais, pois esse conhecimento oficioso, a seu ver, lhe era imposto pelo artigo 95º do CPTA.
E, continua o recorrente, se o tribunal de primeira instância tivesse conhecido dessas questões, certamente teria concluído que estava perante actos de conteúdo vinculado, que, mesmo perante a sua eventual falta de fundamentação deveriam ser mantidos na ordem jurídica, em nome do princípio do aproveitamento do acto.
Vejamos, antes de mais, o que já temos dito sobre o dever, e o direito, de fundamentação dos actos administrativos.
A obrigação de fundamentar a decisão administrativa surge como uma concretização da obrigação geral de fundamentação dos actos administrativos, os quais, de forma expressa e acessível devem dar a conhecer aos respectivos destinatários os motivos por que se decide de determinado modo e não de outro [artigos 268º nº3 CRP, 124º e 125º CPA].
A fundamentação do acto não consubstancia apenas um dever da administração, é também um direito subjectivo do administrado a conhecer os fundamentos factuais e as razões legais que permitem à autoridade administrativa conformar-lhe negativamente a sua esfera jurídica.
Fundamentar é, portanto, enunciar explicitamente as razões ou motivos que conduziram a entidade administrativa à prática do acto, é enunciar as premissas de facto e de direito nas quais a respectiva decisão administrativa assenta.
O dever/direito de fundamentação visa, além do mais, impor à administração que pondere muito bem antes de decidir, e permitir ao administrado seguir o processo mental que conduziu à decisão, a fim de lhe poder esclarecidamente aderir, ou de lhe poder reagir através dos meios legais ao seu dispor.
A obrigação de fundamentação constitui pois, e deste modo, um importante sustentáculo da legalidade administrativa, e o direito à fundamentação constitui um instrumento fundamental da garantia contenciosa, pois que é elemento indispensável na interpretação do acto administrativo.
A fundamentação de facto não tem de ser prolixa, bastando ser clara e sucinta, e a fundamentação de direito não poderá ser de tal forma genérica que não permita entender as concretas razões de direito que motivaram o acto.
A fundamentação do acto administrativo deverá ser suficiente, clara, congruente e contextual. É suficiente se, no contexto em que o acto foi praticado, permitir que um destinatário normal apreenda o itinerário cognoscitivo e valorativo da decisão tomada. Será clara se permitir compreender, sem incertezas e perplexidades, o sentido e motivação dessa decisão, e congruente se ela surge como conclusão lógica das razões apresentadas. É contextual quando se integra no texto do próprio acto, que a inclui ou para ela remete, ou dele é, pelo menos, contemporânea.
No dizer de jurisprudência constante e uniforme dos tribunais, a fundamentação é um conceito relativo, que varia em função do tipo concreto de cada acto e das circunstâncias em que ele é praticado, cabendo ao tribunal, perante cada caso, ajuizar da sua suficiência mediante a utilização deste critério prático: indagar se um destinatário normal, perante o teor do acto e das suas circunstâncias, fica em condições de perceber o motivo pelo qual se decidiu num sentido e não...
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